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ANATHEMA “Acoustic Resonance” – 2 de fevereiro de 2019, São Paulo/SP

Daquela geração incrível que formou a chamada ‘sagrada trilogia do doom inglês’, o Anathema certamente é a banda que mais intrinsecamente se viu conectada ao espírito da mudança. Se Paradise Lost e My Dying Bride arriscaram forte e retornaram para uma sonoridade mais próxima dos seus primeiros dias, o grupo de Liverpool nunca deixou de arriscar, e na verdade vem se dando muito bem com uma sonoridade que não conhece nem limites, e nem tampouco amarras. Trilhando por caminhos que vão do progressivo ao experimental, passando pelo alternativo e até pelo pop, o Anathema realmente não parece disposto a deixar de ousar. Talvez por isso ficamos tão interessados quando este espetáculo – tão bem nomeado como ‘Acoustic Resonance’ – foi anunciado para a Capital Paulista.

Se você parar para pensar, não era nada que justificasse tanta comoção: violão, voz, baixo, teclado e um MacBook no palco, nada próximo do que costumamos ver em um show de um dos pioneiros do doom/death, certo? Errado, trata-se dos irmãos Cavanagh, trata-se de Duncan Patterson, trata-se de um repertório único e especial, sendo executado por alguns dos sujeitos mais talentosos do cenário musical.  Por fim, trata-se, digamos, de uma celebração especial de Alternative 4, álbum lançado em 1998, que marcou a última colaboração de Vincent e Danny Cavanagh ao lado de Duncan Patterson como Anathema. E, amigos, isto é especial.

Para começar, nada menos que Springfield, uma das músicas mais bonitas que foram escritas nesta última década. A música, presente no mais recente álbum de estúdio do Anathema, The Optimist (2017) contou com a presença única de Daniel Cavanagh no palco. Solitário sob as luzes do Carioca Club e empunhando seu violão, Danny parecia brilhar ainda mais sob a comovente e introspectiva melodia da canção escolhida para abrir a apresentação, que infelizmente teve uma pequena parte do seu brilho abreviado por um problema no volume do microfone.

Ainda divididos entre a necessidade de sinalizar para o palco que o volume do microfone estava baixo, e a vontade de cantar junto uma melodia que não precisavam ouvir para cantar, os fãs começaram a ficar mais relaxados e abertos com a chegada de Vincent Cavanagh, que se juntou ao irmão para tocar Untouchable (Part 1) e Untouchable (Part 2) em sequência, as duas únicas faixas de Weather Systems (2012) tocadas nesta noite.  Seja nas lindas passagens de violão e voz, seja na belíssima melodia do teclado – onde Danny parecia roubar todo o ar dos presentes na segunda parte – este foi um dos momentos mais belos da noite, e foi surreal ouvir os fãs cantando todos os versos junto a dupla.

Amado tanto pelos fãs de Anathema quanto pelos admiradores de Steven Wilson e do Porcupine Tree, o álbum We’re Here Because We’re Here (2010) não poderia ficar de fora, e Thin Air chegou para representar o álbum.  Judgement (1999) veio trazido por One Last Goodbye, e novamente um Danny Cavanagh solitário comandou o coro dos presentes, algo muito emocionante e lindo de se ver. Mas, como que para completar a celebração, era hora de Duncan Patterson assumir seu posto à esquerda do palco, para começar a tocar o repertório que ajudou o Anathema a criar. A primeira dessa época saudosa foi Fragile Dreams, seguida por Shroud of False, Lost Control, Destiny e Inner Silence, uma belíssima sequência para todos aqueles que amam o último álbum da parceria Patterson/Cavanagh, o assintomático Alternative 4 (1998).

Considerado por muitos dos fãs mais dedicados como o melhor álbum dos ingleses, Eternity (1996) também tomou uma parte importante nessa retrospectiva acústica da brilhante carreira desses ‘outros’ garotos de Liverpool. As três partes da canção que dá nome ao disco foram tocadas, assim como a sensacional Angelica e o cover de Hope (Roy Harper), também presente naquele mesmo álbum de 1996. Para este repórter, que antes havia pensado neste show como ‘uma ideia razoável’, esta foi a sequência que tornou o evento brilhante, já que possuo uma ligação especial com este álbum, o primeiro do Anathema que ouvi, há mais de vinte anos.

Esta espécie de torpor cheio de memórias que tomou a minha mente naquele momento só chegou ao fim quando vieram do palco as primeiras notas de Eleanor Rigby, um dos grandes clássicos da banda mais famosa de Liverpool, aquele quarteto do penteado engraçado e do talento imbatível, que acho que não preciso nomear. Para dar fim a esta celebração, outro cover, desta vez de uma banda londrina que se transformou em uma lenda mundial: Confortably Numb, do Pink Floyd.

No fim das contas, essa viagem de volta ao passado acabou sendo uma das melhores experiências que vivi, pela quantidade de memórias que despertou, pela qualidade das composições que ouvi. Presente na música do Anathema, ou até mesmo nos covers escolhidos, essa jornada pela música inglesa só me fez ficar com ainda mais vontade de ver o Anathema em todo o seu potencial, com toda a sua formação, e talvez, quem sabe, com este mesmo repertório. Que eles voltem em breve, com mais peso na bagagem, e com este mesmo talento de sempre. Estaremos esperando.

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