Por Heverton Souza
Fotos: Roberto Sant’Anna
Imagine a cena: você indo a uma apresentação de dois músicos de renome do metal mundial, dentro de um shopping, para assistir a um show não-metal. E foi assim que, na noite chuvosa de sábado (07), São Paulo recebeu a turnê “Six Strings and Voice – An Evening With Anneke Van Giersbergen and Marko Hietala”, estrelando o ex-baixista e vocalista do Nightwish, Marko Hietala, e a ex-vocalista do The Gathering, Anneke Van Giersbergen.
Na ocasião, a dupla esteve acompanhada pelo músico Tuomas Wäinölä, conhecido na Finlândia por seu trabalho com a banda Raskata Joula. O que se sabia sobre o evento, que ocorreu no belíssimo Teatro Bradesco, localizado em um shopping na Zona Oeste da cidade, era que seria completamente acústico. Alguns dias antes, vídeos da apresentação no Chile começaram a surgir no YouTube, oferecendo uma breve prévia do que o público poderia esperar: uma noite de diversão.
Então, os fãs de metal começaram a ocupar a praça de alimentação do Bourbon Shopping com suas camisetas pretas, muitos deles lembrando sua paixão pela banda Nightwish. Às 21h10, Marko Hietala e Tuomas Wäinölä subiram ao palco. Alguns no público pareciam um pouco desapontados pelo baixista servir como ato de abertura, mas Hietala não demonstrou qualquer incômodo com isso. Ele começou interagindo com a plateia, apresentou seu parceiro Wäinölä e iniciou o set com “Stones”, de seu primeiro álbum solo, “Pyre of the Black Heart” (2019). Após a música, compartilhou histórias sobre a canção seguinte, “Isäni Ääni”.
Inicialmente, o público parecia admirado, porém tímido, possivelmente devido ao ambiente intimista do local. No entanto, à medida que o show progredia, um certo cansaço parecia se instalar, não por causa das músicas, mas devido à quantidade de histórias e conversas em inglês. Nem todos os presentes eram fluentes no idioma, e mesmo aqueles que compreendiam bem o inglês não pareciam apreciar a extensão das conversas. No entanto, Hietala mostrou-se simpático e descontraído, conduzindo o evento de maneira amigável.
No decorrer do show, os músicos começaram a explorar versões acústicas de clássicos do heavy metal, começando com “Crazy Train”, e Hietala compartilhou sua admiração por Ozzy Osbourne. A plateia se animou consideravelmente, especialmente com a maestria de Tuomas ao tocar seu violão e controlar o ritmo com um pedal percussivo. Hietala aproveitou a oportunidade para falar sobre sua colaboração com Tuomas Wäinölä e apresentou a nova música “Two Soldiers”, destacando seu talento vocal e sua interpretação.
O tom do set mudou quando Marko abordou um tema político, expressando sua antipatia pelo presidente russo, Vladimir Putin, e expressando o desejo de que os boatos sobre sua saúde fossem verdadeiros. A plateia foi então agraciada com uma versão acústica de “Children of the Grave” (Black Sabbath), que manteve a intensidade da canção, mesmo em uma versão desplugada. O clima “sombrio” do momento foi interrompido por um espectador que gritou ‘gostoso’, ao que Hietala respondeu com bom humor em português, gerando risadas na plateia.
Para encerrar a parte de Marko Hietala, a balada “Child of Babylon” do Whitesnake começou com uma figura ruiva adentrando o palco e cantando junto. Era a vez de Anneke entrar em cena, e vale ressaltar que a música teve um momento acapella com as três vozes (incluindo Tuomas), arrepiando a todos com sua harmonia perfeita. Anneke, sorridente e um pouco tímida, demonstrou como sua presença cativa o público e muda a atmosfera. Ela explicou que estava ali para dar uma pausa aos colegas, que estavam esperando algo nos bastidores. Marko brincou sobre o que poderia ser, mas não entrou em detalhes.
Às 22h03, Anneke Van Giersbergen iniciou seu show. Sozinha com seu violão, ela abriu com “Lo & Behold”, de seu álbum mais recente, “The Darkest Skies are the Brightest” (2021). Em seguida, apresentou “Saturnine”, sua canção favorita do The Gathering e que faz parte do álbum “If Then Else” (2000). Uma voz na plateia se destacou, cantando no meio de uma passagem de violão, o que fez Anneke rir.
Para alegria dos fãs, ela interpretou “Valley of the Queens”, uma faixa do projeto Ayreon, que apresenta sua voz na versão de estúdio. No entanto, o ponto alto para os fãs antigos foi “The May Song”, do clássico “Nighttime Birds” (The Gathering). Anneke, assim como Marko, conversou com o público durante as músicas, compartilhando histórias pessoais, como a inspiração por trás da música “I Saw a Car”. Ela também apresentou sua versão da música “Cloudbusting” de Kate Bush, substituindo “Like a Stone” do Audioslave, que havia sido interpretada em apresentações anteriores. Anneke anunciou a última música de seu show, “Hurricane”, e depois de cometer alguns erros ao tocar e cantar, encerrou sua apresentação com um momento mais intimista, iluminada por uma luz vermelha que arrepiou a plateia.
Marko e Tuomas voltaram ao palco, e a partir desse ponto, apresentaram uma série de covers e versões, começando com “Catch the Rainbow” do Rainbow, com todos os três contribuindo com suas vozes para interpretar a música. O entrosamento das três vozes, com destaque tanto para Marko quanto para Anneke, foi notável. Tuomas surpreendeu o público ao introduzir “Wasted Years”, um grande clássico do Iron Maiden, com um trecho de bossa nova. Outra surpresa veio com “I See Fire”, da trilha sonora do filme “O Hobbit”. Marko pegou um violão de doze cordas e apresentou “The Islander”, fazendo a alegria dos fãs do Nightwish. No entanto, a expectativa de ouvir Anneke interpretar uma música da banda desvaneceu, já que essa música tem como vocal principal a voz de Marko.
A noite foi encerrada com uma versão ousada de “Perry Mason” (Ozzy), com destaque para o solo de violão de Tuomas, que mereceu aplausos. O trio agradeceu e, finalmente, encerrou a noite com uma bela interpretação de “The Sound of Silence”, uma música original da dupla folk americana Simon & Garfunkel, que se tornou famosa no metal graças às interpretações do Disturbed e Nevermore.
Em resumo, o evento proporcionou duas horas e meia de música e entretenimento, embora alguns espectadores tenham expressado desejo de menos conversa e mais música. Além disso, Marko Hietala tem uma carreira bastante extensa para focar tanto em covers e pouco em tudo que já lançou em bandas e projetos. Mas é inegável que é um evento divertido, leve e que funciona tanto em um teatro quanto em uma roda de fogueira. E, claro, mostra que a combinação dos dois artistas nessa tour conjunta casa muito bem e pode render frutos futuros. Só nos resta torcer!