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BATUSHKA – SÃO PAULO (SP)

10 de agosto de 2024 - VIP Station

Por Daniel Agapito

Fotos: André Santos

De alguns anos para cá, poucas bandas de black metal tiveram tanto impacto no mundo do metal quanto os poloneses do Batushka. Com sua estética – tanto sonora quanto visual – baseada nas religiões ortodoxas do leste europeu, eles têm oferecido uma abordagem diferente ao subgênero, que tem uma relação de amor e ódio com o mesmo conceito. Em dezembro de 2018, pouco após sua primeira vinda à América Latina, o Batushka, assim como muitas religiões, se dividiu em duas cismas. Uma delas liderada por Krzysztof “Derph” Drabikowski, guitarrista e idealizador do projeto original; a outra de Bartłomiej “Bart” Krysiuk, vocalista contratado por Derph para integrar a formação inicial. De maneira simplificada, tanto Derph quanto Bart fizeram álbuns sucessores de seu primeiro álbum, um pelas costas do outro e contra o outro. Bart assumiu o controle das mídias sociais e assinou contrato com a Napalm Records, seguindo com o nome e fazendo esta turnê latina.

Desde então, a banda se encontra dividida, porém tanto Drabikowski quanto Krysiuk ainda fazem uso do nome Batushka. No entanto, após uma decisão jurídica em sua terra natal, os direitos foram retirados de Krysiuk, fazendo com que esta latino-americana seja possivelmente uma das últimas vezes que veriamos o Batushka de Bart, com alguns lugares já até cantando o fim do “Batushka da Shopee”. Talvez, com sua passagem ao Brasil, o grupo passe por um numerólogo e troque seu nome para Baatushka. De qualquer forma, o futuro das duas versões continua bastante nebuloso.

O evento foi iniciado pontualmente às 15h30, meia hora após a abertura das portas, com o Shaytan, banda liderada por Daniel Blasphemoon, ex-vocalista do NervoChaos. Devido ao horário, foram poucos os que conseguiram apreciar o show do quarteto mogiano, mas aqueles que estavam presentes, receberam o agradecimento da banda, que estava visivelmente feliz com a oportunidade de tocar no evento. Em termos de sonoridade, o Shaytan apresentou um black metal bem executado e direto, embebido na fonte dos grandes nomes da segunda onda do gênero. Foi meia hora de blast beats, riffs com tremolo, vocais gritados que vêm do fundo da alma e linhas de baixo simples, porém avassaladoras. Quanto ao repertório, a banda focou nas faixas de seu primeiro álbum, Occult Aeon, lançado este ano, executando faixas como Ishtar, The Possession e Dark Mistress of Death. Apesar do público reduzido e do tempo curto do show, o Shaytan fez uma apresentação de qualidade, mostrando estar confortável em cima do palco e executando um som de qualidade.

Os veteranos da Spiritual Hate foram os próximos a assumir o palco do VIP Station, que ainda estava longe de estar cheio, mas com mais pessoas chegando. Formados em 2007, fizeram jus ao seu status como um dos nomes mais conhecidos da cena paulista, esbanjando química e colocando o público na mão. Era comum o vocalista, Blackmortem, soltar vários gritos de “fodidos”, impressionado com a reação do público. Assim como no show do Shaytan, não faltaram agradecimentos ao público e à produção do evento, com o vocalista constatando que estava honrado em poder tocar com tantas bandas de relevância nacional. A organização do evento realmente merece palmas por ter dado tanto espaço ao underground local, algo que certos eventos acabam não fazendo. O setlist passeou pela década e meia de carreira da banda, com destaque para Malvm Perpetvm, o mais recente lançamento do Spiritual Hate, Awaiting Fucking Jesus e  a saideira Behind the Lies of God, que em 2015 foi incluída em um compilado da finada Terrorizer Magazine. No fim das contas, esse foi um ótimo aquecimento para as horas de blasfêmia que teríamos pela frente.

Continuando com as bandas underground, a “legião impura” do Amazarak, formada na capital paulista em meados da virada do milênio, foi a próxima a espalhar a palavra do profano. Logo de cara, chamou a atenção o interessante colar de ossos do seu “frontbeast”, Cavalo Bathory, e as vertiginosas viradas de bateria de Orlando Vulcano, recheadas de rototons. Mais ou menos no meio do show, como o início de um ritual macabro, com um canto sinistro ecoando pelo som mecânico, a banda toda se virou de costas para o público, menos o vocalista, que empunhava uma foice. Homenageando o grande King Diamond, fizeram um cover pesado da clássica Black Funeral, hino do Mercyful Fate. Fechando sua performance, executaram a já clássica Lendários Batedores de Cabeça, que foi descrita como um som “de headbanger para headbanger” e dedicada aos organizadores do evento. Vidrados pela apresentação, os fãs gritaram a plenos pulmões o controverso refrão desta última faixa: “Destruindo os cristãos com os nossos sons a profanar/ Nós somos os lendários batedores de cabeça…/ E do inferno viemos atacar!”

Com metade das bandas tendo já se apresentado, a trilha sonora que recebeu mais uma boa quantidade de pessoas que adentraram o local foi o Paradise In Flames, banda mineira de black metal que acompanhava o Batushka em todas as suas seis paradas no Brasil. Apresentando um som diferenciado e incorporando elementos sinfônicos, conseguiram criar uma sonoridade grandiosa, balanceando a agressividade e caráter sinistro do metal extremo com nuances da música clássica e ópera, soando até melhor ao vivo do que em estúdio. Assim como nas outras datas de sua “Age of Death Tour”, iniciada ainda em março, quando abriram para o Rotting Christ em Brasília, o foco de seu setlist era promover seu quinto álbum, Blindness, lançado em junho deste ano. Vendo o show, fica óbvio pelo qual o Paradise in Flames foi escolhido para acompanhar os poloneses: conseguiram não só maravilhar o público com sua sonoridade complexa (que tinha tudo para dar muito errado), mas também apresentar um nível técnico elevado, com destaque para o trabalho de Samuel Bernardo, metade homem/metade máquina, um baterista que realmente “bate na bateria”. Concluíram com Endless Night Battle e The Way to the Pentagram, single épico lançado em 2021.

Com a casa ainda preocupantemente longe de estar em sua capacidade máxima de público e o relógio se aproximando das 19h10, os ânimos iam crescendo para ver a instituição de metal que estava para tocar. O Krisiun (que parece estar em 60% dos shows de maior porte) não se segurou nem um pouco no início, e começou com dois pés na porta, levando os fãs de volta aos tempos do álbum Conquerors of Armageddon (2000) com Hatred Inherit. Não precisavam nem terminar a música para poder sentir a conexão com os fãs, que, enlouquecidos, gritavam o nome da banda. Seguiram destacando o mesmo álbum com a pesada Ravager, que foi bem recebida pelos fãs. Dando espaço também para suas composições mais novas, executaram uma dobradinha letal formada por Combustion Inferno e Scourge of the Enthroned. Era porrada atrás de porrada. O apreço dos fãs ao Krisiun era completamente recíproco, com Alex Camargo (baixo e voz) fazendo numerosos elogios aos paulistanos. Um deles foi quando disse que, “se não fossem vocês, a gente não estaria vivo!”

Camargo também exaltou o metal nacional, dizendo que “cenas como essa me dão orgulho de ser brasileiro” e comentando que “o metal nacional é um dos melhores do mundo, doa a quem doer!”. Em seu repertório, misturaram bem músicas das antigas, como a pesadíssima Vengeance’s Revelation de Apocalyptic Revelation (1998), e outras mais novas, entre elas Serpent Messiah, do último álbum, Mortem Solis (2022). Independente da época em que foram compostas, todas as músicas, sem exceção, provocaram diversas rodas furiosas ao centro da pista. Pulando para o brilhante The Great Execution (2011) e após Alex brincar levemente com o riff do clássico Sunshine of Your Love, tocaram Descending Abomination. Atendendo aos pedidos dos fãs, seguiram com Black Force Domain, faixa cujo nome havia sido gritado incessantemente em diversos outros pontos do show.

Demonstrando bastante humildade, Alex Camargo relatou que eles não eram melhores do que ninguém e que continuariam levantando a bandeira do metal nacional até o fim; até a morte. Após essa fala do vocalista, tanto ele quanto Moyses Kolesne (guitarrista) se retiraram do palco, dando espaço para o irmão Max Kolesne fazer um solo monstruoso de bateria. Com um pedido ao público para “receber bem os gringos”, anunciaram sua última música, aquela que não poderia faltar: Blood of Lions. Tudo o que já falei até aqui se mantém, então resumirei em prol da concisão: roda animal de grandiosa, todo mundo cantando junto, banda agradecendo = baita show.

Desde sua última passagem pelo Brasil, o Batushka mudou muito. Antes, os polacos tinham apenas um álbum de estúdio – o ótimo Liturgiya – e, mais importante: somente uma “versão” da banda. Como dito no início, Derph e Bart se separaram, e,  com o tempo de estrada da banda, perderam um pouco do impacto visual. Adotando as palavras do colega Valtemir Amler, que cobriu a primeira passagem do grupo ao Brasil: “quem de nós não viu milhares de vezes os vídeos do Batushka ao vivo pela internet?” Apesar disso, à medida que os aparatos da missa negra eram colocados no palco (inclusive pelo próprio Bart, devidamente vestindo um moletom camuflado para não ser visto), toda a intriga e misticismo ao redor da banda ressurgiam aos poucos.

O relógio marcava 20h45, e nada. Dez minutos depois, um membro da equipe acendeu as velas dispostas ao centro do palco, enquanto cantos sinistros dominavam o sistema de som. Com boa parte das velas acesas, as luzes diminuíram. Vinte minutos depois, duas figuras encapuzadas subiram ao palco para acender as velas restantes, marcando assim o início da liturgia. O VIP Station foi tomado por um forte cheiro de ervas e incenso. Com todas as velas agora devidamente acesas, o resto da banda, exceto Bart, se juntou aos dois indivíduos. O vocalista surgiu na sequência, defumando o ambiente.

Finalmente o ambiente do culto estava preparado, então o icônico início de Yekteniya I: Ochishcheniye soou. Seja Batushka falso ou verdadeiro, seja a primeira ou a segunda vez por aqui, algumas coisas não mudaram. Novamente citando Valtemir Amler, quando a bateria entrou e os vocalistas começaram a cantar, “parecia que aquele show era a única coisa acontecendo no mundo”. A sensação era indescritível, algo verdadeiramente único. Logo no início, estava claro que a experiência que seria proporcionada pelo Batushka iria além de um simples show.

Não seguindo a ordem do disco original, a banda trouxe peso com Wieczernia, de Hospodi, o tão polêmico primeiro álbum da fase Bart, lançado em 2019. Os novos fieis gritavam e batiam cabeça ao som do riff insanamente envolvente. O público já estava completamente “convertido”, louvando o Batushka. Bastava o vocalista levantar os braços, e um mar de mãos ia ao ar.

Powieczerje começou com os dois vocalistas de trás levantando imagens de santos, enquanto o vocalista principal acendia mais uma chama no centro do palco e levanta um crânio, que permaneceria em sua mão pelo resto da música.

Voltando ao Liturgiya, bastaram os icônicos sinos de Yekteniya III: Premudrost’ soarem para que os fãs fossem à loucura. A cada tilintar, muitos batiam palmas no alto repetindo o ritmo. Krisiyuk pegou um quadro com a capa do primeiro disco, levantou-o e ficou no meio do palco provocando o delírio do público. Quando entrou o riff, foi um momento de catarse, uma explosão de ‘headbangings’. Um real momento de revelação, iluminação.

Pismo I seguiu na mesma linha, com o vocalista mostrando uma imagem, enquanto todos estavam engajados aos riffs monstruosos. Polunosznica, uma das primeiras músicas lançadas pelo “clero”, foi recebida com gritos cadenciados dos fãs, que também replicaram os cantos dos três vocalistas em uníssono no refrão, criando uma atmosfera intensamente grandiosa, como se realmente fosse um mágico ritual.

Vale destacar também as habilidades técnicas de cada membro, especialmente Jakub Wieczerzycki, baterista que vem acompanhando a banda em turnê, e os guitarristas Tarlachan e Boruta. Embora não interagisse diretamente entre ela durante o show, a dupla tem uma química incrível, tantos nos riffs quanto em presença de palco. A performance de Krysiuk dispensa comentários, tanto em termos de habilidades musicais quanto à sua participação no ritual geral, sendo ele a figura central. Após o refrão de Polunosznica, ele comandou os fãs a replicarem um gesto com o dedo médio, o indicador e o polegar, quase formando um “L”. Esse sinal foi repetido pelos fãs ao longo do show, seja acompanhando os guitarristas em Uterina ou por vontade própria, saudando a banda ao final.

Irmos II começou mais calma, atmosférica, com o vocalista virado para trás, e com três gritos de “amen”, ecoados pelos “fieis”, entrava o peso da música. Irmos III, por outro lado, começava caótica, explosiva, até tendo um pseudo-breakdown no meio. Yekteniya IV, última do primeiro álbum a ser tocada, começou com um riff devagar, soturno, carregado de melancolia e tristeza. Krysiuk acendeu duas velas e as segurou, enquanto que, atrás, os outros cantores acenderam duas chamas, como se estivessem simbolizando o calor do show esquentando de novo, mesmo já chegando ao final. Em seguida, os dois vocalistas do fundo desceram segurando crânios e se ajoelharam, primeiro esticando as caveiras para o público, depois recuando os braços e colocando-os em seus rostos. Acabando a música, o vocalista apagou as duas velas.

No final da missa, enquanto a banda iniciava Pismo VI, Bart novamente acendeu as velas e as usou para acender outras duas chamas, uma em cada canto do palco, em estruturas com cruzes que foram colocadas no início do show. Ele passou um tempo virado para trás, depois voltou ao meio, pediu silêncio, pegou o livro da liturgia e começou a ler, cantando baseado nos escritos. Após cantar, fechou o livro e o mostrou ao público, manipulou seus aparatos e benzeu os fãs, sinalizando o final da missa. Ele e os demais vocalistas se retiraram do palco, aplaudidos pelos presentes no Vip Station, transformando em uma verdadeira igreja. Pouco depois, os guitarristas tocaram ajoelhados, fizeram o sinal da cruz, jogaram palhetas e foram embora.

O Batushka é tudo isso mesmo? Sem dúvida. Falso ou verdadeiro, legítimo ou não, entregaram um ótimo espetáculo. Diria que não há problema em se curvar a falsos profetas na religião do Batushka. A situação dos membros originais realmente é complicada, e a questão do que acontecerá com o Batushka de Bart segue no ar. No entanto, aquele sábado foi uma noite histórica. Novamente citando o tão mencionado Valtemir, “posso dizer que ainda temos fé”. Quem não foi, perdeu um dos melhores shows do ano. Aliás, acima de um show, uma verdadeira experiência. Agora fica a pergunta, será que algum produtor trará o “Batrueshka”, de Derph?

Shaytan – setlist:

Night of Sacrifice

I Am the Hellfire

Lords of Hell

Ishtar

The Possession

Funeral Soul

Dark Mistress of Death

 

Spiritual Hate – setlist:

Intro*

Malvm Perpetvm

The End is Now

Awaiting Fucking Jesus

Anguish of a Dying Soul*

With Black Wings Through the Ages

Merciless and Abyssal

Hæreticvm

Behind the Lies of God

Amazarak – setlist:

Intro*

Impuro Armagedom

Comando Blasfêmia

Sovereign and Proud

Ascensão do Anticristo

Sob Ataques Profanos

Sangue Manchado no Trono de Deus

O Filho da Serpente

Hino de Blasfêmia

Hellbangers begin The Killing

Black Funeral (Mercyful Fate)

Lendários Batedores de Cabeça

 

Paradise in Flames – setlist:

Desolate Words*

Concerto no6, in C Minor , Cold Spring*

Unseen God

Black Wings

Reasons to not Believe

Old Ritual to an ancient curse

Bringer of Disease

I Feel the Plague

Endless Night Battle

The Way to the Pentagram

Krisiun – setlist:

Hatred Inherit

Ravager

Combustion Inferno

Scourge of the Enthroned

Necronomical

Vengeance’s Revelation

Serpent Messiah

Descending Abomination

Black Force Domain

Solo de Bateria

Blood of Lions

Batushka – setlist:

Yekteniya I: Ochishcheniye

Wieczernia

Powieczerje

Yekteniya III: Premudrost’

Pismo I

Polunosznica

Utrenia

Irmos II

Irmos III

Yekteniya IV: Milost’

Pismo VI

*pelo sistema de PA

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