Por Luiz Cesar Pimentel
Desalmado transita pelo universo extremo há mais de década e meia, só que mais recentemente parece ter conseguido colocar a cabeça para fora das águas turvas do mar nichado independente brasileiro. Com influências que vão de thrash metal a grindcore, o vocalista Caio Augusttus e o baixista Bruno Teixeira contam como lidam com a cena no país e como a política afeta a produção artística da banda paulista.
Vamos começar contando a história do Desalmado, afinal vocês não são os Beatles. Ainda (risos).
Bruno Teixeira: O Desalmado começou em 2004 como um sexteto e com um som que era mais próximo do grindcore. O Caio (vocal), Estevam (guitarra) e eu estamos desde o início, quando a banda ainda se chamava El Fuego. Durante este período nós lançamos duas demos e tivemos algumas trocas na formação, que se estabilizou com a entrada do Ricardo Nützmann na bateria, que foi quando mudamos o nome para Desalmado. Esse era o nome de uma música que estava em uma das demos do El Fuego. De lá pra cá, temos seis lançamentos oficiais entre álbuns, splits e compactos. O nosso som mudou bastante desde o início, algo mais próximo de um Death Grind. Nós também fizemos três turnês pela Europa e diversas turnês pelo Brasil.
Como vem sendo a evolução desde o começo da banda? Pergunto para saber se para o tipo de som que fazem acham que o cenário é favorável, desfavorável, promissor ou o quê.
Bruno: No caso do Desalmado eu vejo uma evolução muito favorável na nossa carreira, mas acho que as coisas melhoraram de verdade quando a gente decidiu se dedicar mais à banda, tanto nos ensaios quanto na organização. Nós sentimos estarmos no momento mais Do It Yourself (faça você mesmo) da nossa história, correndo ao lado de outras bandas que tem a mesma filosofia. Fácil nunca foi, mas penso que muita banda acredita na ilusão de que será descoberta por uma espécie de “olheiro do som pesado”. O Desalmado é muito pé no chão, sabemos que o mercado é restrito e que se ficarmos parados nada acontece. Então estamos tentando trilhar o nosso caminho, sem ilusão e sempre priorizando a mensagem do nosso som.
Quais são as referências que cada integrante traz para o som?
Caio Augusttus: No geral, as influências são quase as mesmas. Estevam e Bruno bebem muito na formação clássica do fã de música pesada que viveu os anos 90, tem muito Sepultura, Ratos de Porão e Napalm Death neles, essa é a essência de todos mas são traços fortes em ambos. O Alemão (Ricardo Nützmann) tem muito Slayer, as bandas que ele tocou antes do Desalmado eram de thrash metal, tem muita coisa do Dave Lombardo ali. No começo do Desalmado minha referência era o Max (Cavalera), sempre o achei único, mas sempre fui mais do death metal e o Napalm, Cannibal e Morbid Angel exerceram influências muito maiores. Atualmente acho que não ouvimos boa parte do que nos influenciou no dia a dia. Eu, particularmente, ouço muita coisa nova e sempre estou repassando para os caras, quando vamos compor resgatamos um ou outro clássico, mas não é algo que exerce influência de fato na criação de uma música.
Você acha que existe público crescente para som extremo no Brasil? Mais importante: dá para viver de música extrema no país?
Caio: Não dá pra viver de música extrema aqui, isso é uma ilusão. Aliás, sou da opinião de que em nenhum lugar do mundo, a menos que você abra mão do mínimo de conforto, conseguirá viver de música extrema. Conheço casos aqui de parceiros que se dedicam às suas bandas e não ganham muito, o necessário para sobreviver. Sobre o público extremo, não sei, acho que na real o público de metal envelheceu enquanto a molecada caiu mais para o hardcore, espero que as bandas extremas que surgiram como o Desalmado influenciem também os mais novos a fazer som extremo, assim como o Krisiun fez recentemente.
Conte mais sobre o lançamento mais recente.
Bruno: Neste ano soltamos um EP chamado Rebelião, com duas músicas em Português que trazem uma mensagem bem direta, que mostra a nossa visão de mundo. Para o lançamento a gente fez um mini documentário, que traz as duas músicas junto com depoimentos de diversos músicos da cena que se posicionam contra o atual governo. A resposta foi excelente, tanto do público quanto da mídia especializada. Ao longo dos 16 anos de carreira a gente construiu uma base fiel de fãs, que nos apoiam muito e receberam muito bem a mensagem do Rebelião. Nós estamos com um disco novo pronto, com capa e nome definido. Por conta da pandemia a gente resolveu esperar um pouco para definir a data de lançamento, mas deve ser no primeiro semestre de 2021.
Sei que o Caio é bastante engajado em questões políticas. Essa é característica do grupo inteiro?
Caio: O maior engajamento é meu, acompanho e estudo política há anos, além de ser militante marxista. Os demais integrantes são progressistas e estão no campo da esquerda, afinal eles são parte de uma banda que quer levar uma mensagem de transformação e quando escrevo repasso a eles para que possamos adequar o que for necessário e montar uma música. Então o processo é sempre o mesmo, toda ideia e conceito são debatidos e quando existe unanimidade sobre essa ideia, ela é executada. Temos algo muito claro também, que é o fato de a banda sempre levar uma mensagem crítica e não ser objeto de militância, nós temos entendimento dos limites e até aonde podemos chegar
Neste 16 anos de carreira, qual foi o show mais marcante para vocês?
Bruno: Vou responder por mim, mas o Abril pro Rock de 2019 foi incrível! Era o sonho de todos nós, mas que quase virou o pesadelo, pois no meio da turnê no Nordeste o Caio acabou perdendo a voz, fazendo todos shows no sacrifício. Um dia antes do show no Abril pro Rock ele estava completamente sem voz. Quase como um milagre, no dia do show a voz dele voltou e fizemos um dos melhores shows da nossa vida, realmente inesquecível. Muito obrigado pelo espaço, é só procurar o Desalmado nas redes sociais para continuarmos trocando ideia. Tudo está disponível no desalmado.com, valeu!
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