Por Luiz Tosi
Fotos: Roberto Sant’Anna
O Dream Theater é, sem dúvida, uma das bandas mais importantes da história do heavy metal. Essa afirmação pode parecer exagerada para alguns, mas a verdade é que eles ajudaram a moldar e definir todo um gênero, o prog metal, tornando-se referência incontestável no segmento. A banda não apenas criou um estilo único, mas também inspirou inúmeras outras bandas que se espelham em seu som e sua técnica, influência que já se estende por quatro décadas.
A saída de Mike Portnoy em 2010 foi um momento de grande incerteza para os fãs. O icônico baterista, um dos membros fundadores e figura central na banda, deixou um vazio que parecia impossível de preencher. Durante o período com Mike Mangini, o Dream Theater lançou excelentes álbuns que mantiveram a qualidade esperada, mas muitos fãs sentiram falta da química única que Portnoy trazia. Pessoalmente, acredito que Mangini foi um substituto perfeito para Portnoy, não fosse um detalhe: Portnoy é insubstituível. A notícia de seu retorno para a “40th Anniversary Tour 2024 – 2025” foi recebida com enorme comoção. Esta turnê não é apenas uma celebração de 40 anos de música, mas também uma reunião que muitos acreditavam ser impossível. De quebra, a banda também anunciou o lançamento do seu décimo sexto disco, Parasomnia, prometido para fevereiro do próximo ano.
O show do domingo, dia 15, no Vibra São Paulo (SP), fez parte de uma série de cinco apresentações no país. Antes, o Dream Theater passou por Belo Horizonte e Rio de Janeiro, e ainda se apresentaria em Curitiba e Porto Alegre.
A experiência de assistir a um show do Dream Theater nesta turnê é verdadeiramente especial. É uma daquelas bandas que não têm apenas fãs, mas uma verdadeira torcida. Desde o momento em que as luzes se apagam, pontualmente às 20h, e os primeiros acordes de Metropolis Pt. 1: The Miracle and the Sleeper ecoam pelo local, é como se o tempo parasse. A música é cantada em uníssono. Aliás, não só as músicas, mas todas as passagens instrumentais são acompanhadas pelo público, uma dinâmica que se mantém ao longo de todo o show. Uma verdadeira catarse.
Falar sobre Jordan Rudess, John Petrucci e John Myung é chover no molhado. O que os três entregam ao vivo é de uma excelência musical difícil de descrever em palavras. Todos são lendas em seus próprios mundos – o carismático Rudess girando sua plataforma em diferentes ângulos, Myung com seu comportamento calmo e composto e Petrucci com seu timbre característico, mostrando por que é tão cultuado. Mas os destaques especiais vão mesmo para James LaBrie e Mike Portnoy. LaBrie conduz o público com uma presença magnética, misturando carisma e técnica vocal impressionante. É notável a capacidade do vocalista de cantar melodias fáceis e agradáveis sobre uma base complexa e intrincada, transmitindo emoção em momentos que alternam entre notas poderosas e passagens mais suaves, cativando a plateia. Sua interação com o público é calorosa e genuína, criando uma conexão que vai além da música.
Já Portnoy, apresentado por LaBrie como “o elefante na sala”, trouxe uma energia renovada e uma química inegável com seus companheiros de banda. Sua performance é uma mistura de força bruta e sutileza, e ele parece estar em perfeita sintonia com cada mudança de tempo e dinâmica. Não importa para que time você torce, sabe aquela alegria de quando um grande ídolo volta ao seu clube do coração? Essa era a sensação. Mike aparentemente devolveu uma espontaneidade que a banda parecia ter perdido. Em entrevista recente, o músico revelou ter pedido que a banda, em seu retorno, abandonasse o uso de metrônomo ao vivo, conferindo muito mais naturalidade e leveza às apresentações. Isso cria uma experiência que é tanto uma demonstração de virtuosismo quanto uma celebração da música em sua forma mais pura. Cada membro brilha em seu próprio universo, mas é a sinergia entre eles que realmente faz do Dream Theater uma banda lendária.
A euforia aumenta ainda mais com Overture 1928 e Strange Déjà Vu, transportando o público para o universo conceitual de Metropolis Pt. 2: Scenes from a Memory, possivelmente o álbum mais cultuado da banda, seguidas pela improvável The Mirror e pela matadora Panic Attack, com sua linha de baixo frenética, executadas com uma intensidade única. Barstool Warrior, de Distance Over Time (2019), foi uma excelente escolha para representar a fase Mangini. Um primor de solo! E falando em solo, a faixa seguinte é Hollow Years, que, na minha opinião, traz o melhor solo de Petrucci em toda a discografia da banda. Nem mesmo a escolha desnecessária pela sua versão Demo 96, que só serviu para deixar o público no vácuo em algumas passagens, tirou a beleza da música.
Constant Motion e As I Am combinaram perfeitamente juntas, criando um dos momentos mais pesados e crus do set, que termina com a clássica intro/virada de bateria de Where Eagles Dare, do Iron Maiden, numa bonita homenagem a Nicko McBrain, que se despediu da banda há uma semana, na mesma São Paulo.
Fim da primeira parte e um intervalo de 20 minutos é anunciado ao som de Dance of the Dream Man, uma colaboração com Angelo Badalamenti e David Lynch para a trilha sonora de Twin Peaks (1990), adicionando um elemento cinematográfico ao show.
A segunda parte do show foi uma verdadeira viagem através do tempo, começando com uma Orchestral Overture que incorporou trechos de todos os álbuns da banda, levando os fãs a uma jornada nostálgica e emocionante. Este segmento focou em faixas menos óbvias do repertório do Dream Theater, proporcionando uma experiência única e surpreendente. A primeira delas foi Night Terror, o primeiro single do vindouro álbum Parasomnia. Ficou claro que o público já decorou (devorou?) cada detalhe da faixa, cantando junto com entusiasmo. Em seguida, This Is the Life, uma das joias da fase Mangini, encaixou perfeitamente no set. Under a Glass Moon foi ovacionada, com o público cantando suas partes de teclado mais alto que a própria banda.
O segmento se concluiu com uma trinca de faixas esquecidas há praticamente duas décadas. A curta Vacant, seguida pela longa instrumental Stream of Consciousness, ambas do álbum Train of Thought (2003), foram executadas com uma precisão que só o Dream Theater consegue alcançar. Essa última, com seus acentos à la To Live is to Die, do Metallica, destacou a habilidade técnica e a coesão da banda. Este trecho abriu espaço para a obra-prima Octavarium, com sua estrutura complexa e crescendos emocionantes ao longo dos seus 24 minutos de viagem sonora numa performance de arrepiar, mostrando por que o DT é uma lenda do prog metal.
There’s No Place Like Home, acompanhado por um clipe do filme “O Mágico de Oz”, serve tanto como uma clara referência à volta de Mike Portnoy, simbolizando seu retorno ao lugar onde sempre pertenceu, quanto como a introdução perfeita para Home, que é executada à perfeição. A performance dela é intensa e envolvente, capturando a essência emocional da música e transportando o público para um estado de pura imersão. O tiro de misericórdia vem com The Spirit Carries On, que eleva a experiência a um nível indescritível. Esta faixa cria uma conexão entre público e banda que é raramente vista, com todos os presentes se unindo em um coro poderoso e emotivo, transformando o momento em uma celebração coletiva de esperança e continuidade. O show culmina com o primeiro e maior sucesso da banda, Pull Me Under, encerrando uma celebração a quatro décadas de arte, técnica e paixão que definem o prog metal.
Segundo Portnoy, essa perna da turnê faz parte de um ciclo composto por duas fases. A primeira, focada no 40º aniversário e celebração da reunião desta formação, já a segunda, prevista para todo o ano de 2025, promete revisitar as mesmas cidades, desta vez, porém, concentrando-se no novo álbum, Parasomnia, que será executado na íntegra. “A ideia é meio que dar a volta ao mundo duas vezes e fazer ambos os ciclos; a primeira metade olhando para trás e a segunda olhando para frente”, disse o baterista. O que não vai faltar é “come to Brazil” nas redes sociais da banda, refletindo a expectativa e o entusiasmo dos fãs brasileiros para receber novamente os gigantes do prog metal em seu país!
Setlist
Metropolis Pt. 1: The Miracle and the Sleeper
Overture 1928
Strange Déjà Vu
The Mirror
Panic Attack
Barstool Warrior
Hollow Years (’96 demo version)
Constant Motion
As I Am
Orchestral Overture
Night Terror
Play Video
This Is the Life
Under a Glass Moon
Vacant
Stream of Consciousness
Octavarium
Home
The Spirit Carries On
Pull Me Under
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