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EDENBRIDGE: O CHAMADO DO ÉDEN

Por Valtemir Amler

Às vezes as coisas seguem por um caminho muito mais elevado do que planejamos. Isso foi basicamente o que aconteceu com o Edenbridge, um dos principais nomes da cena metal da Áustria na atualidade. Em primeiro lugar, não vamos dizer que o começo foi humilde, afinal, o grande nome por trás do nascimento do grupo é Arne “Lanvall” Stockhammer, um talentoso e experiente multi-instrumentista que já tinha uma sólida carreira solo. Mas, fato é que ele pensava no Edenbridge apenas como um ‘projeto de estúdio’, e essa limitação é algo que ele nunca de fato conseguiu. Culpa de uma criatividade aguçada ou da companhia de bons parceiros (provavelmente ambas as coisas), a carreira do Edenbridge foi selada quando a vocalista Sabine Edelsbacher, o baixista Kurt Bednarsky e o baterista Roland Navratil se uniram ao grupo, ainda em 1998. Se já estava decidio que o Edenbridge não era mais um ‘projeto’ mas sim uma ‘banda’, o que faltava para selar o destino dos austríacos era um grande álbum, e foi justamente isso que eles fizeram já na estreia, com Sunrise In Eden (2000). Arcana (2001) e Aphellion (2003) colocaram de vez o então quarteto entre os favoritos dos fãs de metal sinfônico, e desde então eles já somam onze álbuns completos de estúdio, sendo o mais recente deles Shangri-La, lançado em 2022. Mantendo todos aqueles elementos que se tornaram sua marca registrada, os austríacos evoluem ainda mais sua fórmula no novo álbum, conforme nos contam Lanvall e Sabine.

Olá Lanvall e Sabine, é bom falar com vocês! Bem, em 2019 vocês lançaram o elogiado Dynamind, e em 2020 todos sabemos o que aconteceu. Então, como foi esse período até o novo álbum para vocês?

Lanvall: Pois é, tínhamos algumas ótimas ideias para Dynamind, e claro que várias delas precisaram ser abortadas, mas a verdade é que estou grato por pelo menos ter feito algumas apresentações para promover aquele álbum, tocar aquelas músicas ao vivo. Em 2019 mesmo, logo após o álbum ser lançado, nós fizemos uma turnê pela China, e em seguida estivemos ocupados com o cruzeiro/festival 70.000 Tons Of Metal. Dali, os planos eram girar através da Europa pelo início de 2020, o que naturalmente acabou não acontecendo. A verdade é que, quando tudo começou a ficar sério, já durante as três primeiras semanas do ‘lockdown’, eu parei para analisar a situação que tínhamos em mãos. Estava bem na cara que não iam rolar turnês, então que passo deveríamos dar em seguida? Era importante conseguir entrar no clima para escrever um novo álbum, pois não poderíamos simplesmente deixar a banda parada sem uma perspectiva clara de quando o mundo voltaria a girar. Bem, passei a me dedicas a encontrar novas energias, novas inspirações e motivações para escrever novas canções, essas que agora vocês podem ouvir em Shangri-La. Esse foi, ao todo, um processo bem longo, apenas o processo de composição tomou mais de um ano e meio, então acabamos nos mantendo bastante ocupados nesse período, pois focamos em manter as coisas funcionando, ao menos composição e gravações, que era o que estava nas nossas mãos.

Imagino que não tenham tido problemas com a gravação e produção do álbum por conta dos lockdowns na Áustria.

Lanvall: Não, especialmente no tocante a produção e gravação. Tivemos alguns lockdowns severos por aqui, mas como vivemos numa região mais rural, longe das grandes cidades, acabamos não sendo tão afetados por todo aquele problema. A produção correu bem, o único porém foi em relação a mixagem de Shangri-La, uma vez que não pude ir até Londres para fazê-la, algo que sempre fiz antes. Desta vez tudo teve que ser feito através da internet e usando softwares profissionais que permitem acessar todos os plugins reais do estúdio, e então fazíamos nossa comunicação em tempo real com a equipe de lá via Whatsapp. Quer dizer, essa foi uma diferença real, algo que teria evitado se pudesse, mas que no fim das contas acaba contando também como uma nova experiência e um aprendizado. Você nunca deve deixar de aprender coisas novas, certo?

É isso aí. Bom, existe um conceito ligando todas as faixas de Shangri-La, podemos considerá-lo como um álbum conceitual?

Sabine Edelsbacher: Eu não diria que ele é exatamente um álbum conceitual, mas existe sim uma ideia central que é abordada ao longo das faixas desse álbum, claro, especialmente através das letras. Acho que uma ideia que vêm se mantendo ao longo de todos esses anos, desde o primeiro álbum do Edenbridge, é que queremos usar a nossa música e as nossas letras para trazer algum tipo de energia positiva para as pessoas, algo que faça com que elas consigam entrar em contato verdadeiro com seu eu interno. Nesse álbum, tentamos trazer a mensagem que devemos entrar em contato com nosso próprio Shangri-La, todo mundo deveria ter esse ‘abrigo’ interno, esse lugar de segurança onde você pode se isolar e encontrar o equilíbrio que precisa para seguir em frente. Espero, sinceramente, que a nossa música ajude a criar essa conexão.

Lanvall: É isso mesmo, e foi uma ideia que foi se estabelecendo aos poucos, não surgiu como uma ideia pronta na minha cabeça ou algo assim. Quando comecei a trabalhar no novo material, a primeira letra em que trabalhei foi The Road To Shangri-La, e quando trabalhamos na letra dela, a coisa meio que surgiu daquela maneira, dando uma ideia geral para o que faríamos em seguida. Foi por isso também que decidimos chamar o álbum Shangri-La, pois, quando estávamos com várias canções escritas, percebemos que a maior parte delas parecia se conectar com aquela mesma ideia que tivemos em The Road To Shangri-La. É por isso que não gosto de começar o processo colocando muita pressão em como o álbum deve se chamar, pois isso acabaria forçando algo em uma direção. Neste caso foi o contrário, já tínhamos a maior parte das músicas feitas, e foram elas que ditaram o título do álbum.

Parece uma forma mais natural.

Lanvall: Sim, pois você simplesmente vai deixando com que as coisas fluam de forma natural, sem pressão em uma direção específica. Por exemplo, se tivéssemos de início decidido que o título seria Shangri-La e que esse seria um álbum realmente temático, todas as letras teriam que se encaixar nisso. As músicas também, todas elas deveriam criar uma atmosfera exata para se encaixar no todo, tornando o álbum mais homogêneo, mas também mais previsível. E isso não é algo necessariamente ruim, já trabalhei dessa maneira, no passado. Mas não era isso que queríamos aqui, o que realmente queríamos é deixar que as coisas tomassem seu caminho natural, e que de forma natural se encaixassem no todo. Como o curso de um rio ao longo das montanhas, sabe?

Sim, e isso acaba deixando o álbum soar mais ‘solto’, o que acaba tornando-o mais atrativo para um maior número de pessoas, eu diria. Você sabe, nem todos ficam muito empolgados em digerir um álbum conceitual quando vão ouvir música.

Lanvall: Ah, com certeza (risos). Pessoalmente, sou um grande fã de álbuns conceituais, mas reconheço que eles demandam um bocado mais de paciência do que qualquer outro álbum quando se trata de ouvir e assimilar a música. É claro, pois é tudo tão fechado e pensado, acredito que seja algo bem inacessível quando tudo o que você quer é extravasar e se divertir.

É difícil extravasar e se divertir quanto tudo parece tão calculado. Gosto muito de música atmosférica, desde que soe natural, e não como algo que um robô poderia ter feito em uma planilha do Excel.

Lanvall: Eu entendo perfeitamente o que quer dizer (risos gerais). E foi justamente isso que quisemos evitar aqui. Não queríamos que alguém colocasse o disco para rolar e, oito minutos depois estivesse pensando, ‘oh meu deus, isso é tão aborrecido, parece que estou participando de um seminário’ (risos gerais). Antes de qualquer coisa, a pessoa tem que ter algum alívio, tem que ter bons momentos quando vai ouvir música. Como a Sabine disse antes, trazer algo de positivo e bom para as pessoas é algo que sempre tentamos, e foi isso que buscamos aqui. As músicas são abertas o suficiente para não sufocar o ouvinte, e feitas com zelo e cuidado o suficiente para capturar a atenção das pessoas. Ao menos é isso que buscamos.

E acredito que conseguiram. Na citada The Road To Shangri-La, é notório o cuidado que tiveram ao incluir todos aqueles elementos que nos remetem até o Oriente. E aqui está o detalhe: é um trabalho que soa cuidadoso, até minucioso, mas em nenhum momento forçado. Tanto que esses mesmos elementos não se repetem o tempo todo.

Lanvall: Ah, que bom que percebeu isso! Desde os primeiros dias, sempre fui o responsável pelo aspecto musical do Edenbridge, e sempre tentei equilibrar as coisas para que as pessoas percebessem que tenho respeito por elas, que procuro entregar o melhor que posso, mas sem soar arrogante. Não quero provar que sou um músico ou compositor extremamente habilidoso, só quero compor boas músicas, por isso tanta atenção aos detalhes. Se, por um minuto que for conseguirmos tirar a pessoa do lugar comum e das preocupações mundanas e levá-lo até um lugar onde ele está feliz e despreocupado, terá valido a pena. Esse é o elogio que realmente me interessa. 

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