Se há para o Exodus um lugar no mundo fora de seu território onde o grupo possa se sentir em casa, certamente esse lugar é o Brasil, afinal, aqui a banda conta com uma verdadeira legião de fãs e é sempre bem recebida a cada passagem sua. Só que, dessa vez, a vinda ao país foi novamente cercada de polêmicas, similares com as ocorridas em 2004. Naquela ocasião, os shows foram cancelados devido à saída do vocalista Steve “Zetro” Souza. Pouco depois, a banda acabou vindo, mas trazendo o vocalista suplente Steev Esquivel (Skinlab/Defiance), que não agradou nenhum pouco os fãs do grupo. Como se não bastasse, os integrantes fizeram um show de apenas vinte minutos no Recife e se mandaram, o que deu início a trocas públicas de farpas com a organização do evento. Agora, praticamente a mesma coisa aconteceu nessa recente passagem do Exodus ao país. Faltando poucos dias para a banda desembarcar em nosso território, os fãs ficaram aborrecidos com a notícia de que Gary Holt não viria, sob a alegação de que o músico tinha compromissos profissionais e questões familiares que lhe impossibilitariam de vir. Houve, inclusive, quem se recusasse a assistir a banda sem o guitarrista. Para seu lugar, veio Kragen Lum (Heathen, Prototype e Psychosis). E assim como aconteceu em 2004 no Recife, agora o episódio se repetiu no nordeste, mais precisamente em Fortaleza (CE), só que com um final ainda pior. A banda tocaria no festival “Fortaleza Open Air”, só que desistiu em cima da hora, alegando diversos problemas para a realização de sua apresentação, entre eles, o não cumprimento do pagamento da parte restante do cachê, a falta de alimentação, problemas no equipamento disponibilizado causado pela chuva e o horário tardio do show o que, lamentavelmente, resultou em um quebra-quebra no local. Durante os dias seguintes, houve bastante diz-que-me-diz por parte do Exodus e sua equipe e também da produtora contratante do show que se explicou e apontou diversas mentiras por parte da banda. No fim das contas, somente os envolvidos saberão quem está ou não com a razão, mas aproveito para dizer que nada justifica o prejuízo causado pelos headbangers na casa de shows, que apenas cedeu o espaço para a realização do evento. Há formas legais, justas e corretas de o público conseguir o ressarcimento do prejuízo financeiro a que fora acometido.
Felizmente, o restante da turnê aconteceu sem nenhum problema evidente, sendo assim, o Exodus passou por Limeira (SP), Manaus (AM), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Rio de Janeiro e São Paulo. Na véspera de feriado do aniversário de 462 anos da popularmente chamada “terra da garoa”, independente da não vinda de Holt, o tradicional Carioca Club recebeu um ótimo público. A abertura foi realizada pontualmente às 19h00 pela emergente banda feminina Sinaya, que entrou surpreendendo com o peso brutal da breve introdução instrumental “The Resurrection”, que logo foi emendada pela visceral “Pure Hate”, música de seu único material lançado até o momento, que é o bom “Obscure Raids”, que foi lançado no ano de 2013. A banda passou por uma considerável reformulação, e da formação que gravou o EP restou apenas a guitarrista Mylena Monaco, que assumiu também o microfone e passou a ser acompanhada por Renata Petrelli (guitarra), Camila Toledo (baixo) e Aline Dutchi (bateria).
As garotas iam cumprindo bem o seu papel, mostrando um Death Metal old school, carregado de influências das escolas norte-americana e sueca do gênero do início dos anos 90, agradando a todos os headbangers que naquele momento já marcavam presença em bom número. O tempo de palco disponibilizado para elas era bem curto, então, sem delongas, Mylena, com sua voz amena – diferente do gutural agressivo mostrado nas músicas -, anunciou a nova “Life Against Fate”, que fará parte do ‘debut’. A banda contou com uma qualidade de som impecável, com destaque para o timbre de caixa da baterista Dutchi, que estava muito bem regulado. Méritos para Marcello Pompeu (Korzus), que comandava a mesa de som. Em exata meia hora de show, Mylena, Renata, Camila e Aline ainda apresentaram a faixa título do EP e algumas outras músicas novas, incluindo “Buried By Terror”, que recentemente ganhou videoclipe. Foi uma performance correta, bem entrosada, com uma qualidade de som bastante regular, e certamente conseguiu cativar a quem estava prestigiando. Destaque para a baixista Camila Toledo que além de tocar bem, agitou o tempo todo, girando a cabeça ao melhor estilo Alex Webster do Cannibal Corpse.
Após meia hora de espera, finalmente a introdução mecânica que antecede a música de abertura do álbum “Blood In, Blood Out” (2014) tomou conta do lugar, para euforia dos fãs do Exodus que entrou arregaçando em alto e bom som (aliás, excelente), com a pesada e veloz “Black 13”, logo emendada pela já bastante comemorada faixa título. E o que posso dizer desse começo avassalador é que está para nascer a banda de Thrash Metal que proporcione ‘circle pits’ tão insanos quanto os que acontecem em um show do Exodus. A pancadaria sonora, o comando do vocalista Steve “Zetro” Souza e a energia que a banda mostra em palco é tanta, que é impossível assistir contido o seu show. Repito: impossível!
Na primeira pausa, Zetro elogiou o público paulistano e pediu que todos ali tomassem conta um do outro para que não se machucassem, percebendo o quão agitada estava a pista. O último show do Exodus na capital paulistana aconteceu dez dias antes do lançamento de “Blood In, Blood Out”, então, naquela oportunidade nada foi tocado do material. Dessa vez, porém, muitas músicas dele estavam incluídas no set list da turnê, sendo assim, os fãs presentes aguardavam ver outras além dessas duas primeiras, fora os clássicos eternizados da banda. E o primeiro deles foi “And Then There Were None” do lendário “Bonded By Blood” (1985). Para quem reclamou da ausência de Gary Holt, na hora do show nem se abateu por isso, já que a dupla formada por Lee Altus e o seu companheiro de Heathen Kragen Lum mostrou muito entrosamento por tocar não só em sua banda, mas também quando Gary está longe. Isso sem contar que ambos têm presença de palco e bastante simpatia. Cabe lembrar também que assistir a performance monstruosa de Tom Hunting atrás dos tambores já vale o ingresso, não porque ele é membro fundador somente, mas também porque além de ser um baterista ícone do gênero, o cara ainda está em plena forma, tocando absurdamente bem e com a mesma pegada de sempre.
Após revisitar o segundo álbum, “Pleasures Of The Flash” (1987), com sua música de abertura “Deranged” e executar a imponente “Body Harvest” – que certamente é um dos destaques do último disco -, foi a vez de mais clássicos de “Bonded By Blood”, com uma trinca impiedosa para os pescoços, composta, “apenas” por, “Metal Command”, “Piranha” e “A Lesson In Violence”. O que dizer de uma sequência dessa? Bem, a roda alucinada que se formou talvez responda essa pergunta. Devo confessar que sou da turma que coloca o álbum “Tempo Of The Damned” (2004) entre os melhores do Exodus, e ao lado de muitos, comemorei quando tocaram a brutal “Blacklist”. Pena que de “Tempo…” essa foi a única incluída no repertório – Embora tenham tocado “War Is My Shepherd” em algumas outras cidades. De repente, para histeria de todos, Zetro – que estava cantando absurdamente bem – anuncia: “Vamos voltar a uma época foda, antes mesmo de “Bonded By Blood”. A próxima música foi escrita por Tom, Gary, Kirk Hammett e Paul Baloff”. Assim foi apresentada “Impaler”, música que apareceu em uma demo de 1982, no ao vivo “Another Lesson In Violence” de 1997 e gravada oficialmente apenas em “Tempo Of The Damned”. Nada que fosse de álbuns lançados nas últimas décadas foi tocado a partir daí, sendo assim, sem bis, a banda montou um final apoteótico, começando pela mais aguardada de sempre, “Bonded By Blood”, que dá nome a um dos álbuns mais consagrados da história da música pesada. Aí então, veio a inesquecível “Toxic Waltz” – única representante do aclamado “Fabulous Disaster” (1989) – e a despedida com “Strike Of The Beast”, que promoveu o ‘wall of death’ mais surpreendentes dos últimos tempos.
Estava nítida no semblante dos integrantes a felicidade de mais uma vez estar tocando no Brasil, mais precisamente em São Paulo. Lee e Lum tocavam sorridentes e Zetro fazia questão de a todo instante ressaltar que a cidade é a segunda casa da banda. Uma pena que exatamente o show de São Paulo acabou sendo o mais curto de toda a turnê brasileira, já que a banda extraiu do set as músicas “Children Of A Worthless God”, “Salt The Wound”, “The Ballad Of Leonard And Charles” e “Wrapped In The Arms Of Rage”. Mesmo assim, esse é, facilmente, um forte candidato a um dos melhores shows de 2016 nas listas de fim de ano, ainda que sem Holt, já que Kragen cumpriu muito bem o seu papel. Recado para os responsáveis do Carioca Club, vocês se lembram de minhas últimas resenhas de shows realizados aí na casa, em que apontei que a qualidade (?) de iluminação está péssima? Pois é, vocês ainda não solucionaram esse problema. Fica mais uma vez então o meu puxão de orelha. Se puderem resolver essa questão, os fotógrafos agradecem e o público idem.
EXODUS – Set list:
Black 13
Blood In, Blood Out
And Then There Were None
Deranged
Body Harvest
Metal Command
Piranha
A Lesson In Violence
Blacklist
Impaler
Bonded By Blood
Toxic Waltz
Strike Of The Beast
SINAYA – Set list:
The Resurrection
Pure Hate
Life Against Fate
Obscure Raids
Coven Of Panic
Buried By Terror
Infernal Sight