Por Rogério SM
Fotos: Belmilson dos Santos
O Rock In Rio de 1985 “abriu as portas” para que o Brasil se tornasse rota quase obrigatória para bandas mundo afora. De lá pra cá, pudemos presenciar shows históricos e memoráveis de diversos grupos, antigos e novos, que fizeram do país um destino certo para qualquer turnê de sucesso. Porém, isso não impediu que, ainda hoje, nomes importantes não tenham nos visitado, mesmo que os fãs rezem dia e noite para isso. Um desses nomes era o FM. Digo “era” porque esse erro finalmente foi corrigido no dia 20 de março, uma quarta-feira quente que praticamente pegou fogo dentro do tradicional bar paulistano Manifesto.
Uma das mais celebradas, clássicas e incomparáveis bandas de AOR de todos os tempos mostrou que a máxima do “antes tarde do que nunca” continua fazendo (muito) sentido. O grupo inglês formado há exatos quarenta anos e liderado pelo incrível vocalista Steve Overland trouxe todo seu carisma para nossas terras em uma apresentação única (em todos os sentidos). Acompanhado dos membros originais Merv Goldsworthy (baixo) e Pete Jupp (bateria), além dos talentosos Jim Kirkpatrick (guitarra) e Jem Davis (teclados), Overland mostrou que alguns grupos resistem ao tempo quando o assunto é qualidade.
Com a casa lotada, os fãs mal acreditaram quando a intro com o tema da 20th Century Fox soou nos alto-falantes. Nada mais apropriado, pois o que vimos nas próximas quase duas horas foi um verdadeiro filme, uma aventura de volta aos anos 1980. E a “viagem” se iniciou com “Synchronized”, faixa do álbum de mesmo título lançado em 2020. Sim, o clima oitentista estava presente, mas não se tratava apenas de saudosismo. O FM continua produzindo músicas de extrema qualidade. Tanto que a resposta do público foi total: todos aos gritos e braços erguidos cantando o refrão em uníssono.
De cara, a qualidade do som chamava a atenção. Tudo muito bem equalizado, em volume alto, mas definido. Méritos do técnico de som James Ridley e do próprio Manifesto, que nunca decepciona nesse sentido. Além disso, alguns já pareciam não acreditar que Overland, hoje com 66 anos, estivesse cantando com o vigor de alguém que acabara de entrar na casa dos vinte. Voz potente, conhecimento e malícia, entregando tudo como se estivéssemos ouvindo uma música de estúdio gravada em 1984. E detalhe: o vocalista se manteve assim até a última música. A técnica, o entrosamento e o profissionalismo de todos na banda encantaram até o mais exigente dos fãs. Ali começava uma verdadeira aula de musicalidade.
O show continuou com “Though It Out”, faixa-título do segundo álbum, emendando com “Killed By Love”, de “Atomic Generation” (2018). A mescla de clássicos com músicas mais recentes caiu como uma luva e provou que os presentes poderiam cantar junto qualquer música que o grupo resolvesse tocar.
Percebendo que o jogo estava ganho, o quinteto não parava de sorrir no palco, especialmente Goldsworthy. Aliás, ele e Kirkpatrick providenciaram backing vocals dignos de prêmio. Depois de tantos anos de estrada, é de se esperar que músicos desse calibre dominem o palco como se fosse a sala de suas casas. Mas, ainda assim, não havia uma pessoa sequer que não estivesse de queixo caído enquanto a banda emendava um clássico no outro. “Someday (You’ll Come Running)”, “Let Love Be The Leader” e “Everytime I Think of You” mantiveram o clima lá em cima. Overland lamentou o fato de termos que esperar quarenta anos para poder ver o grupo. A essa altura, já estavam mais do que desculpados.
Na sequência, “Out Of The Blue”, do novo álbum “Old Habits Die Hard”, que deve ser lançado em maio, mostrou mais uma vez a força das composições atuais, algo que possibilitou um show basicamente sem pontos baixos. “The Dream That Died” e “Don’t Stop”, ambas de “Tough It Out”, jogaram os presentes novamente para algum filme dos anos 1980. A alegria dos fãs era mais do que notória em qualquer ponto em que se olhava da plateia. Só que havia muita reciprocidade, visto que os cinco músicos também não escondiam a satisfação de estarem finalmente em palcos brasileiros. Essa troca de energia gerou diversos momentos em que todos cantavam forte algum refrão enquanto a banda parava momentaneamente de tocar só para ouvir o coro.
Mesmo não interagindo tanto com palavras, dentro de uma típica empolgação contida própria dos britânicos, a simbiose entre banda e público era total. “Foi incrível! Esperamos 40 anos para tocar na América do Sul e ver isso se concretizar, além de pessoas na frente do palco chorando e cantando todas as músicas, é algo muito especial e que nunca iremos esquecer. Espero que tenha sido inesquecível tanto quanto foi para nós. Iremos voltar em breve!”, comentou Overland.
“American Girls”, “Frozen Heart”, ambas do debut “Indiscreet” (1986), e “Does It Feel Like Love”, de “Tough It Out”, fizeram a melhor sequência da noite, emendando com o clássico absoluto “That Girl”. A faixa de abertura de “Indiscreet”, que chegou a ser coverizada pelo Iron Maiden, foi entoada aos gritos por todos os presentes.
Mesmo que o show terminasse aqui, a “dívida” do FM com o público brasileiro já estaria mais do que bem paga. Só que ainda havia espaço para mais. “Bad Luck”, “I Belong to the Night” e “Turn This Car Around” mostraram a vitalidade dos integrantes, que mantinham a mesma energia como se cada música fosse a primeira do show. “Story Of My Life” deixou o clima mais tranquilo para o encerramento definitivo com “Face To Face” e “Other Side Of Midnight”, ambas de “Indiscreet”, e fazendo dessa abafada noite de quarta-feira uma verdadeira ode aos anos 1980, à música e à vida. Long Live FM!
Setlist:
Synchronized
Tough It Out
Killed By Love
Someday (You’ll Come Running)
Let Love Be The Leader
Everytime I Think of You
Out Of The Blue
The Dream That Died
Don’t Stop
American Girls
Frozen Heart
Does It Feel Like Love
That Girl
Bad Luck
I Belong to the Night
Turn This Car Around
Story Of My Life
Face To Face
Other Side Of Midnight
Siga o canal “Roadie Crew” no WhatsApp: