Trinta anos pode não passar de um pequeno sopro para a História da humanidade. Porém, para uma pessoa ou uma banda, é tempo suficiente para deixar um legado na existência. E este legado tem sido comemorado pelo Golpe de Estado desde o ano passado, quando o primeiro disco, autointitulado, completou três décadas de lançamento. A turnê comemorativa voltou ao Grande ABC – onde o Golpe é tratado como da casa – para duas apresentações nas noites de 20 e 21 de janeiro, no palco do teatro do SESC, em Santo André.
Inicialmente foi anunciado que estes shows seriam registrados para o lançamento oficial de um novo disco ao vivo. Infelizmente isso não se concretizou e, portanto, o Golpe de Estado continua devendo um trabalho ao vivo gravado no ABC, cobrança que os fãs da região fazem desde que o grupo lançou o CD “10 Anos Ao Vivo”, gravado em Vinhedo, no interior paulista – e me incluo nessa cobrança.
Como vem fazendo desde o ano passado, para estas apresentações a banda convidou diversos músicos para dividir o palco. No show do dia 20 participaram o trombonista Bocato, o violeiro Ricardo Vignini (Moda de Rock / Matuto Moderno) e os vocalistas Mario Bortolotto (Saco de Ratos) e Nando Fernandes. Na noite seguinte os convidados foram os guitarristas Luiz Carlini (Tutti Frutti) e Martin Mendonça (Pitty), e os vocalistas Marcello Pompeu (Korzus) e Mariana Duarte.
O tecladista Mateus Schanoski (Tomada, Stormsons) também participou do show. Ele tem acompanhado o Golpe desde que a banda foi reformulada com a atual formação: Marcello Schevano (guitarra), Rogério Fernandes (vocal), Roby Pontes (bateria) e Nelson Brito (baixo), o único integrante da formação original.
A ideia de fazer shows com convidados diferentes fez com que a experiência só pudesse ser completa assistindo as duas apresentações. Os ingressos para ambas as noites se esgotaram, porém na sexta-feira (20) a chuva insistente deve ter amedrontado alguns fãs. Já no sábado (21) o teatro estava visivelmente mais cheio. Aliás, o público do sábado se mostrou muito mais animado, o que parece também ter contagiado a banda.
Dia 20
O primeiro show começou com um dos maiores clássicos do Golpe de Estado, “Nem Polícia, Nem Bandido”, e seguiu com “Quantas Vão” e a ótima “Feira do Rato”. Aparentemente logo no início Nelson Brito teve alguns problemas na regulagem da aparelhagem de palco, mas logo resolvido. Antes de “Terra de Ninguém”, Rogério Fernandes dedica o show ao querido e saudoso Hélcio Aguirra, o que resultou em aplausos e gritos da plateia.
Algumas músicas foram apresentadas nas duas noites, mas o repertório de sexta foi o que trouxe as maiores surpresas. A primeira delas foi “Ignoro”, faixa raras vezes apresentada ao vivo e que contou com a viola de Ricardo Vignini. Na sequência o momento ímpar: “Os Mil Sóis”. Belíssima composição de Nelson Brito e Paulo de Tarso que pode ser considerada uma pérola escondida na discografia do grupo. Mário Bortolotto dividiu os vocais com Rogério durante essa música. O convidado parecia pouco à vontade no palco e talvez tenha faltado um pouco de ensaio.
O trombonista Bocato foi o convidado seguinte e tocou com a banda duas faixas em que ele participou das gravações: “Moondog” e “Olhos Vendados”, outra raridade ao vivo. Depois foi a vez do vocalista Nando Fernandes ser chamado ao palco pelo próprio irmão. Emocionado, Rogério declarou que “se hoje estou abrindo a boca aqui pra cantar, com certeza foi esse cara que me criou como cantor”. Juntos cantaram “Todo Mundo Tem Um Lado Bicho”. Por sua vez, ao final Nando comentou que “desde que ele [Rogério] gravou essa música, em 96, meu sonho era cantar junto. Realizei esse sonho hoje, aqui”.
Para encerrar, Nando assume os vocais principais para cantar “Noite de Balada”, finalizando o show da sexta-feira.
Dia 21
No sábado a banda dá início ao show com a mesma dobradinha de “Nem Polícia, Nem Bandido” e “Quantas Vão”. Então Rogério Fernandes relembra que justamente no dia 21 completou-se três anos do falecimento de Hélcio Aguirra. Assovios, palmas e gritos com o nome do guitarrista foram as reações dos fãs.
O primeiro convidado da noite é Luiz Carlini, que participa em “Olhos de Guerra” e “Caso Sério”. Apresentando mais uma faixa poucas vezes tocada ao vivo, o Golpe toca “Cada Dia Bate de Um Jeito” e Rogério comenta que “cantar no Golpe de Estado foi a sorte máxima que eu recebi na vida”, agradecendo o baixista logo em seguida.
A próxima participação foi da cantora Mariana Duarte. A vocalista faz parte de diferentes bandas da região e tem um timbre grave e forte. Junto com Rogério Fernandes canta “Zumbi”, fazendo as partes originalmente gravadas por Rita Lee. Depois, sozinha, canta “Sem Elas”.
Rogério reassume o posto para “Velha Mistura” e chama o guitarrista Martin Mendonça para acompanhar o grupo em “Underground”. Aparentemente o público majoritariamente formado por fãs na casa dos 40 anos não estava muito familiarizado com o guitarrista da banda da Pitty, mas o músico conquistou os presentes com sua performance, além de se mostrar bastante emocionado pela participação no show. Com Martin a banda ainda tocou “Não é Hora”.
Último convidado da noite, Marcello Pompeu subiu ao palco para dividir os vocais em “Cobra Criada”. Antes da música começar, o vocalista do Korzus pediu um minuto de silêncio em homenagem a Hélcio Aguirra e foi prontamente atendido por todos. Ao final, um grito de “rock’n’roll” de Rogério Fernandes trouxe todos de volta à realidade.
Apesar das diferenças de estilo entre Pompeu e o Golpe e a necessidade de leitura das letras, a participação do vocalista valeu pela confraternização. “Cobra Criada”, “Libertação Feminina” e “Noite de Balada” contaram com Pompeu. Em “Libertação Feminina” um garoto da plateia, chamado Diego, aparentando uns 10 anos de idade, se juntou à banda e não fez feio cantando vários versos da canção.
Atendendo aos apelos, a banda volta ao palco para tocar “Paixão”, que não estava programa para esta noite.
Pena mesmo que estas apresentações não vão resultar em um disco comemorativo. Mas, levando em conta os últimos shows, não devem faltar oportunidades para o Golpe registrar uma bela noite de rock’n’roll para o esperado trabalho ao vivo. E, quem sabe, com a presença de ex-integrantes que ajudaram a escrever essa história.
Repertório dia 20:
01. Nem Polícia, Nem Bandido
02. Quantas Vão
03. Feira do Rato
04. Terra de Ninguém
05. Paixão (com Mateus Schanoski)
06. Forçando a Barra (com Mateus Schanoski)
07. Onde Há Fumaça, Há Fogo (com Mateus Schanoski)
08. Mal Social
09. Ignoro (com Ricardo Vignini e Mateus Schanoski)
10. Os Mil Sóis (com Ricardo Vignini, Mario Bortolotto e Mateus Schanoski)
11. Moondog (com Bocato, Ricardo Vignini e Mateus Schanoski)
12. Olhos Vendados (com Bocato)
13. Todo Mundo Tem Um Lado Bicho (com Nando Fernandes)
14. Noite de Balada (com Nando Fernandes)
Repertório dia 21:
01. Nem Polícia, Nem Bandido
02. Quantas Vão
03. Terra de Ninguém
04. Olhos de Guerra (com Luiz Carlini e Mateus Schanoski)
05. Caso Sério (com Luiz Carlini e Mateus Schanoski)
06. Cada Dia Bate de Um Jeito
07. Zumbi (com Mariana Duarte)
08. Sem Elas (com Mariana Duarte)
09. Velha Mistura
10. Underground (com Martin Mendonça)
11. Não É Hora (com Martin Mendonça)
12. Cobra Criada (com Marcello Pompeu)
13. Libertação Feminina (com Marcello Pompeu)
14. Noite de Balada (com Marcello Pompeu)
15. Paixão (com Mateus Schanoski)