Falar das dificuldades de se fazer um show de rock aqui no Brasil seria contar novamente uma piada velha – e sem graça. Se a banda é de heavy metal, então, o negócio fica ainda mais complicado. Então, que tal uma banda de metal fazer uma verdadeira turnê, passando por oito estados e pelo Distrito Federal, totalizando dezoito apresentações em pouco mais de um mês? Soa como um delírio, não é mesmo? Não se estivermos falando do Hangar. O empreendedorismo do batera Aquiles Priester é conhecido por todos e nesse caso não foi diferente. Viajando num microônibus personalizado, Aquiles, Pedro Campos (vocal), Nando Mello (baixo), Cristiano Wortmann (guitarra) e Fábio Laguna (teclado) fizeram a terceira parada dessa tour na noite de domingo, 4 de novembro.
Diante de um público bom e animadíssimo (dava pra dizer “furioso”), os trabalhos foram abertos pelo power trio Acid Tree. E talvez pela primeira vez em mais de trinta anos de jornalismo musical não vou poder opinar sobre uma banda. A qualidade do som estava tão ruim, mas tão ruim que ficou impossível entender o que estava acontecendo no palco. Pra resumir, durante o curto show do grupo praticamente se ouviu apenas a bateria – a voz aparecia lá no fundo de vez em quando, também dava pra perceber a vibração do baixo, mas a guitarra ninguém sabe, ninguém viu – ou melhor, ninguém ouviu… Lá pro fim do show pareceu que a coisa ia se resolver, mas aí o guitarrista pegou um violão. OK, voltemos à prancheta… Essa vamos ficar devendo.
Já o Hangar entrou em cena com a qualidade de som e de performance que nos acostumamos a ver na banda. O show foi baseado em seu último disco, Stronger than Ever (2016) – aliás, o mesmo nome da turnê. Nada menos que seis faixas do álbum foram apresentadas no show, começando com a dobradinha Reality Is a Prision e The Revenant.
Valendo-se de várias introduções pré-gravadas que funcionavam como vinhetas para ligar algumas das músicas, o Hangar, de cara, mostrou quem seria a atração principal da apresentação. Tudo bem, Cristiano Wortmann é daqueles guitarristas técnicos, mas também cheio de feeling e que faz com que as melodias intrincadas que produz pareçam extremamente fáceis de tocar. Fábio Laguna continua sendo o cara que levou o teclado a um outro patamar no heavy nacional, dividindo com maestria bases e solos com Wortmann. Nando Mello é daqueles baixistas que não precisa de um milhão de notas pra mostrar o quanto é bom, além de ter um entrosamento fantástico com seu velho parceiro de cozinha, Aquiles. E este ainda é o melhor baterista do Brasil e um dos melhores do mundo. Além da técnica apuradíssima, toca como se o show fosse o último de sua vida, tal a garra que imprime em cada música. Porém, o destaque do show atende por Pedro Campos. Não à toa, Aquiles apresentou-o como “a voz definitiva” do Hangar. Esbanjando carisma em cena, sorrisão na cara o tempo todo, Pedro mostrou alcance, potência, afinação irrepreensível e uma bela extensão vocal. De fato, é o cara certo pra empunhar o microfone do Hangar.
Um detalhe bastante interessante do show foi o fato de o grupo incluir no repertório, além do power metal de sempre, várias baladas. E assim pudemos perceber claramente como o Hangar é bom para criar melodias agradáveis. Apresentadas em sequência, Just Like Heaven, Dreaming of Black Waves, Based on a True Story (uma das mais belas composições do metal brasileiro), Time to Forget e Call Me in the Name of Death deram um respiro interessante ao show – mas notem: o fato de serem temas mais lentos não significa que o peso foi deixado de lado, o que torna essas músicas ainda mais interessantes.
Foram duas horas de apresentação, encerradas com mais um tema mais lento, Haunted by Your Ghosts, e duas porradas do álbum The Reason of Your Conviction (2007), Hastiness e a faixa-título. Depois, sem pressa, a banda ainda atendeu a numerosa galera que lá estava. Como disse Aquiles, “sem meet-and-greet pago, sem mimimi!” Enfim, do jeito que tem que ser.