Por Marcelo Sant’ Anna
Fotos: Leonardo Benaci
Pela terceira vez em terras brasileiras (2009, 2017 e agora em 2023), o icônico grupo de death metal melódico In Flames veio com uma nova formação, com nomes que fizeram história em outras grandes bandas de metal mundial, como Chris Broderick na guitarra (ex-Megadeth, Act of Defiance, Jag Panzer, Nevermore), Liam Wilson no baixo (ex-Dillinger Escape Plan) e Tanner Wayne na bateria (que já passou pelo Underoath), além dos membros remanescentes, Bjorn Gelotte na guitarra e o carismático e versátil Anders Frídén nos vocais. O grupo realizou a sua única apresentação no Brasil no último dia 9 de novembro no Tokio Marine Hall, em São Paulo.
A responsabilidade de abrir o evento ficou com o Kryour, que soube aproveitar cada minuto. Com um setlist enxuto, mas competente, Gustavo Iandoli (vocal e guitarra), Gustavo Muniz (baixo), Guba Oliveira (guitarra) e Matheus Carrilho (bateria) apresentou um metal variado, mesclando prog metal, metalcore, metal melódico e, principalmente, death metal melódico de maneira coesa e intensa. A influência nórdica adiciona um toque especial ao som dos caras, elevando-os a um patamar superior. O Kryour foi uma grata surpresa e, felizmente, tive a oportunidade de vê-los pela primeira vez nesta noite, em um palco grande com equipamentos de primeira linha e som perfeito. A música “Restless Silence” é impressionante, sendo motivo de orgulho ver uma banda brasileira atingir esse nível de profissionalismo. Ao pesquisar mais sobre eles, fiquei ainda mais impressionado com a qualidade dos vídeos. Espero vê-los novamente em shows menores, com um setlist mais extenso, e que os festivais pelo mundo descubram esses talentosos músicos em breve.
“Olê, olê, olê, olêêê, In Flames, In Flames”… Assim a plateia brasileira canta e celebra a presença dos suecos no Brasil. Com menos de 10 minutos de atraso, o grupo sueco, que atualmente possui três integrantes americanos, sobe ao palco trazendo um clima de nostalgia por seus mais de 30 anos de carreira e 14 álbuns de estúdio. Ao mesmo tempo, o In Flames exibe um vigor sonoro ímpar. Para uma banda com uma discografia tão ampla e sonoridade agressiva, os “senhores” na casa dos 50 anos de idade aparentam uma jovialidade de início de carreira, apesar dos cabelos e barbas grisalhas.
Já na música de abertura da noite, “Great Deceiver”, ficou nítido que as décadas fizeram muito bem ao In Flames, principalmente para o destaque da voz de Anders Frídén, impecável em todas as variáveis, tanto nos vocais rasgados quanto nos guturais e melódicos. Os vocais de Frídén, que completou 50 anos em 2023, são a prova de que ele está em excelente forma física e vocal. A performance ao vivo nesta turnê e, especialmente em São Paulo, confirmou a grande fase pela qual passa o grupo oriundo de Gotemburgo.
A movimentação em palco, principalmente dos guitarristas (Chris e Bjorn), mostra dedicação, empolgação e ensaio para interagir com o público. Chris, em particular, foi uma ótima adição ao In Flames. Além de virtuoso, ele tem uma presença de palco intensa que se encaixa perfeitamente com o resto da banda em sua proposta visual. Inclusive, sua estatura imponente e a guitarra parecendo de brinquedo contribuem para essa imagem. Enquanto isso, a “cozinha” com o baterista Tanner, que impressionou com sua performance precisa e coesa, e o competente baixista Liam Wilson, mostram competência. Wilson, veterano do Dillinger Escape Plan, já demonstra seu domínio do instrumento e das pernas que nos remetem a um caranguejo. Certamente, ele entende de som “pesado”.
Os PAs proporcionaram uma experiência sonora diferenciada para quem estava no camarote, com uma nitidez quase “cristalina”. Isso merece elogios à produção pelos equipamentos e, principalmente, aos técnicos de som pelo magnífico trabalho. Apesar de o som na pista VIP não ter alcançado a mesma qualidade, isso não diminuiu a entrega de qualidade por parte da banda.
Nesta turnê, a banda deve estar enfrentando o desafio de escolher as faixas para o setlist. Com um vasto material de estúdio, diversos singles e muitos sucessos, conseguiram condensar tudo em 17 faixas, proporcionando cerca de 1 hora e 20 minutos de puro metal com muito groove e feeling.
Das 17 performances desta noite, as que mais se destacaram para mim, contando com a abertura “Great Deceiver”, foram “Everything’s Gone”, faixa de “Siren Charms”, um dos álbuns mais controversos da banda, uma pancadaria organizada com vocais variados e riffs virtuosos, funcionando perfeitamente ao vivo. Frídén usa a voz com um tom mais “empostado” e grave, e que traz um clima de filme de terror, fluindo para vocais rasgados e riffs virtuosos, e que funcionam perfeitamente ao vivo.
Antes de iniciar a maravilhosa “Ordinary Story”, Anders fez um breve discurso elogiando o público, dizendo, entre outras coisas, “que o público europeu deveria conhecer o que acontece aqui no Brasil, e que acordou naquele dia com a certeza de que teriam um show foda naquela noite”, referindo-se ao calor humano da plateia e à interação com a banda.
“Deliver Us” é daquelas em que a introdução já faz arrepiar, muito groove e peso para “bater cabeça” até doer o pescoço, e a letra que a galera canta junto. “The Hive” mostra o death metal melódico em sua melhor forma, com destaque para a interação de Anders com um fã.
“Cloud Connected” destacou a pegada de heavy metal moderno e elementos eletrônicos que funcionam muito bem ao vivo. “Only For The Weak” é um clássico absoluto da banda. Essa, inclusive, é a mais ouvida no Spotify e, com certeza, ao vivo foi uma das que a galera mais cantou junto. Com execução precisa e perfeita, chegou muito perto da gravação do álbum. Perfeição que fala, né?… Da mesma forma, ocorreu com “Foregone, pt.1” que, apesar de se encaixar bem com as demais, o público assistiu sem interagir tanto.
“Alias”, com um dos riffs de guitarra mais marcantes da história do metal, fez a galera vibrar e cantar junto mais uma vez em uníssono, com destaque para a iluminação de palco que nesta música fica ainda mais perfeita. Outro belo trabalho da produção da banda. Muito virtuosismo e competência ao vivo é o que se confirma nesta faixa.
“Mirror’s Truth” veio em tom de despedida, sendo um dos maiores clássicos da banda e uma das mais cantadas do set. “I’m Above”, por sua vez, foi o ápice da noite, com uma energia poderosa e um refrão “chiclete” que cativou a plateia. “Take This Life” encerrou o set com agradecimentos e a plateia dividida entre cantar e participar do moshpit.
O único show do In Flames no Brasil foi praticamente um “fan service”, agradando e cativando o público em todas as 17 músicas executadas nesta noite de celebração ao metal moderno e ao Death Metal Melódico. O semblante dos fãs ao saírem do show era de satisfação e realização plena. Particularmente, senti falta de algo do espetacular “Battles” (2016), como “The End”, “The Truth” e “Here Until Forever”, mas isso não ofuscou em nada o brilho de uma apresentação impecável.
Setlist – In Flames
1 – Great Deceiver (Foregone de 2023)
2 – Pinball Map (Clayman de 2000)
3 – Everything’s Gone (Siren Charms de 2014)
4 – Ordinary Story (Colony de 1999)
5 – Deliver Us (Sounds of Playground Fading de 2011)
6 – Behind Space (The Jester Race de 1996)
7 – Graveland (The Jester Race de 1996)
8 – The Hive (Whoracle de 1997)
9 – Cloud Connected (Reroute to Remain de 2002)
10 – Only for the Weak (Clayman de 2000)
11 – Quiet Place (Soundtrack to your Escape de 2004)
12 – Forgone pt.1 (Foregone de 2023)
13 – State of Slow Decay (Foregone de 2023)
14 – Alias (A Sense of Purpose de 2008)
15 – Mirror’s Truth (A Sense of Purpose de 2008)
16 – I’m Above (I, the Mask de 2019)
17 – Take This Life (Come Clarity de 2006)