O Judas Priest é uma das poucas bandas de Heavy Metal que conseguiu se tornar atemporal e influenciar uma, duas e até três gerações. Talvez por isso, muitos não estranharam quando o grupo inglês optou por Richie Faulkner para substituir K. K. Downing em 2011. O fato de Faulkner ser três décadas mais jovem que o restante da banda não atrapalhou em nada na sua integração durante a “Epitaph World Tour (2011-2012)”, mas dúvidas quanto a sua permanência e participação em um novo trabalho de estúdio do Judas Priest sempre foram especuladas. Com o recém-lançado “Redeemer of Souls”, não há ninguém melhor que o próprio Richie Faulker para contar como foi essa experiência de trabalhar num disco de uma banda lendária nesta entrevista exclusiva para a ROADIE CREW.
Logo que passou a integrar o Judas Priest você participou de uma longa turnê mundial ao invés de ir para o estúdio gravar material. O quanto essa experiência na estrada ajudou na química entre você e a banda na hora de trabalhar em “Redeemer of Souls”?
Richie Faulkner: Acho que isto é algo importante de ser observado, pois colaborou muito com o que acabou se tornando ‘Redeemer of Souls’. Ficamos na estrada de 2011 até 2012 e esse período foi ótimo. Sob esse tipo de circunstância você constrói amizades, ganha confiança, um valida a opinião do outro – você se torna uma família. Além disso, houve a digestão de quarenta anos de carreira – as músicas do repertório da ‘Epitaph World Tour’ refletiam esses anos do Judas Priest. Há todas essas coisas correndo no seu subconsciente. Você está construindo relações e ganhando confiança e quando vai para o estúdio você sabe que a sua opinião será avaliada. Olhando para trás, eu acredito que foi muito importante termos feito isso. Nós não planejamos fazer assim, as coisas apenas aconteceram. A gente sabia que talvez houvesse um disco no futuro, mas não nos demos conta de como seria essa experiência. Acho que essa é uma boa pergunta.
Você estava acostumado com um tipo de cenário e quando iniciou as gravações deve ter se deparado com uma situação completamente diferente. O que o deixou mais surpreso nessa nova etapa?
Richie: Acho que o mais me surpreendeu enquanto eu compunha e grava com o Judas Priest foi algo positivo. A gente sempre tem expectativas de como uma banda é, mas nós nunca sabemos da situação dela. Quando eu entrei e passei a ver as coisas de dentro, as minhas expectativas foram superadas. A atmosfera ali dentro era muito familiar – não foi como em algumas situações em que há uma ditadura. Perguntas como: ‘Qual a sua opinião?’ ou ‘O que podemos fazer para deixar isso melhor?’ foram feitas. Isso foi uma surpresa muito positiva e um grande aprendizado. Rob Halford poderia muito bem dizer que algo seria daquele jeito simplesmente porque era ele quem estava falando, mas não foi assim. Em certa ocasião, ele me mostrou uma melodia que havia criado enquanto estava no trânsito e perguntou se eu tinha alguma ideia para completar aquilo. Foi uma experiência libertadora e criativa. Como disse antes, a ‘Epitaph World Tour’ ajudou muito com a dinâmica no estúdio. Tivemos liberdade e confiança, foi uma fase muito criativa. Esta foi a grande surpresa – você sempre espera algo, mas nunca sabe o que vai acontecer e o resultado foi acima das minhas expectativas.
“Redeemer of Souls” é um disco que traz muito da sonoridade clássica do Judas Priest. Esta foi uma decisão planejada?
Richie: Não foi uma decisão consciente, a ideia era fazer algo puro e cru, algo honesto e do coração do Judas Priest. Quando fomos para o estúdio compor, a gente considerou aquilo que veio do coração. Não foi uma decisão consciente voltar no tempo e revisitar qualquer fase da carreira da banda ou recriar fórmulas de sucesso. Nós apenas fizemos as coisas com o coração – como vem sendo feito à quarenta anos. A personalidade de cada músico é imensa e quando você junta tudo, cria essa personalidade do Judas Priest que as pessoas associam ao som clássico da banda. A gente apenas teve a intenção de ir para o estúdio e compor o que surgisse. Desta vez decidimos não fazer algo conceitual, queríamos apenas algo que viesse do coração e ‘Redeemer of Souls’ alcançou isso, pois ele é cru, honesto e poderoso – é o Judas Priest clássico.
A produção do disco também trouxe uma sonoridade mais crua e direta.
Richie: O último disco trouxe uma sonoridade bastante polida e grandiosa. Para este trabalho nós queríamos que a música e personalidade da banda aparecessem. Nós apenas buscamos um som honesto. A guitarra ligada direto no amplificado. A bateria de Scott não tem triggers ou o que quer que seja. Ele é certamente um dos melhores bateristas de Heavy Metal do mundo, então porque diluir a sua dinâmica e energia com triggers? A gente buscou uma abordagem natural.
Quando começou a compor com o grupo você teve que incorporar o estilo da banda no seu jeito de tocar ou foi o seu estilo que se encaixou naturalmente na música do Judas Priest?
Richie: Acredito que foi um pouco dos dois. Eu diria que foi 95% natural. Como um fã de Judas Priest eu busquei compensar esses 5% tentando deixar um riff ainda mais Judas Priest, afinal eu sou um fã e quero recriar essa vibração. Acho que essa é uma boa pergunta e o correto é dizer que há as duas coisas. Eu cresci influenciado por Judas Priest, Iron Maiden, Black Sabbath, Thin Lizzy etc. Eu olhava para esses caras a fim de ganhar experiência, aprender a compor, como juntar diferentes partes e como transmitir emoção através de diferentes texturas musicais. Foi algo muito orgânico. Quando fui para o estúdio eu não tive que tocar de um jeito diferente. Acho que foi por isso que tudo funcionou muito bem. Claro que ainda sou um fã da banda, então houve momentos em que pensei em incluir um acorde diferente para dar mais tensão à música, deixá-la com um ar mais Judas Priest. Eu comecei a ter interesse pela guitarra quando ouvi Jimmy Hendrix e Blues – Glenn Tipton e K.K (Downing) também tiveram as mesmas influências, então nós temos essas similaridades. Olhando para trás você consegue perceber como todas essas influências fazem sentido e contribuem para o processo orgânico de composição.
O que de fato aconteceu para que este disco demorasse tanto para ser lançado?
Richie: Alguma coisa das composições foi iniciada em 2011, antes de eu entrar na banda, e isso foi retrabalhado depois. Nesse meio tempo nós fizemos a ‘Epitaph World Tour’. Em 2012 nós começamos a compor juntos, depois fizemos turnê pela Europa e Ásia e então voltamos para o estúdio para mais composições. No início de 2013 demos continuidade nos trabalhos. Esta foi a linha do tempo que mostra que estávamos compondo e fazendo turnês. Em 2013 fizemos o início da produção, os ensaios, revisamos tudo e começamos a mapear o trabalho. Nós juntamos tudo em 2013 e estamos lançando agora em 2014 – foi isso que aconteceu. Sim, faz seis anos que Nostradamus foi lançado, mas desde então a banda tem sido uma máquina em atividade. Teve a ‘Nostradamus Tour’, ‘British Steel 30th Anniversary Tour’, ‘Epitaph Tour’ e agora estamos lançando o disco. Às vezes algumas pessoas pensam que nós paramos por um tempo, mas isso não é verdade, estávamos na estrada e temos muito orgulho disso.
Pode-se afirmar que “Redeemer of Souls” vem para comemorar esses quarenta anos de
lançamentos?
Richie: Você está absolutamente certo. Esta é uma época muito empolgante para nós. São quarenta anos desde o lançamento de ‘Rocka Rolla’ e trinta de ‘Defenders Of The Faith’. Esta é a força e o poder do Heavy Metal – depois de quatro décadas uma banda ainda pode continuar seguindo em frente, mesmo que haja referências do passado no nosso som, mas seguimos olhando para o futuro e criando novas músicas. Acho que isso prova para a banda e para o Heavy Metal que a música continua viva e está mais forte do que nunca. Este aniversário atesta isso – estou muito orgulhoso da banda, do Metal e dos fãs. Eu sou um fã, todos na banda são fãs e sei que também há milhares de fãs pelo mundo. Nós continuaremos a crescer como uma comunidade, uma família – é muito lisonjeiro poder fazer parte disso.
Como andam as expectativas de um retorno do Judas Priest para o Brasil?
Richie: Eu sempre digo que cada país tem o seu charme e os fãs de todas as partes sempre são malucos, mas há algo especial com relação ao Brasil que eu não sei exatamente o que é. Parece que ir ao Brasil é como assistir a uma partida de futebol com anabolizantes – os fãs são tão apaixonados e malucos, num bom sentido, é claro! É muito empolgante. Estamos planejando algumas datas para o próximo ano. Faremos a turnê norte-america, depois paramos para as festividades de final de ano e em 2015 faremos Europa, Ásia e América do Sul. O Judas Priest irá para o Brasil, não se preocupe!