Por Leandro Nogueira Coppi
Fotos: Bel Santos
Poucos músicos conseguem transitar com tanta naturalidade entre bandas lendárias e uma sólida carreira solo como Marco Mendoza. Dono de um groove inconfundível e de uma presença de palco magnética, o baixista e vocalista americano já deixou sua marca em grupos de alto nível do hard rock, como Thin Lizzy, Whitesnake, Black Star Riders, Lynch Mob, The Dead Daisies, Blue Murder, Soul Sirkus, Iconic, Gorky Park e Alias. Além disso, contribuiu para trabalhos de artistas icônicos, incluindo Bill Ward, Ted Nugent, Neal Schon (Journey), Tim “Ripper” Owens, Tommy Shaw (Damn Yankees, Styx), Dolores O’Riordan (Cranberries), Right Said Fred e muitos outros. Em sua carreira solo, Mendoza encanta os fãs com uma sonoridade que mescla rock and roll, blues e influências latinas.
No último dia 07 de fevereiro, uma sexta-feira, Mendoza se apresentou pela primeira vez no Brasil como artista solo, em show único em São Paulo, realizado no House of Legends. Minhas expectativas para o show eram altas, especialmente porque, oito anos antes, quando esteve no país com o The Dead Daisies na “Live & Louder World Tour 2017” – antes de deixar a banda -, sua performance foi contagiante. Isso ficou evidente tanto no acústico realizado pela banda no EM&T, em 11 de julho daquele ano, quanto no show elétrico no Carioca Club, dois dias depois (após a apresentação em Curitiba/PR). Com produção da Caveira Velha e da Som do Darma, em seu recente retorno ao país Marco Mendoza dividiu palco no evento Hard Rock Night com as bandas brasileiras Amazing, Urdza e Nite Stinger.
Um bom público compareceu à Hard Rock Night, que teve início por volta das 21h com a banda paulistana Urdza. Exceto por Imperial Seal, Heitor Prado (vocal), Gustavo Correa e Hugo do Prado (guitarras), Cid Costa (baixo) e Igor Mota (bateria) apresentaram um repertório composto por todas as demais músicas de A War with Myself, álbum de estreia do grupo, lançado em agosto do ano passado. Fazendo um heavy metal com referências de thrash, o Urdza deixou uma boa impressão, particularmente pelo groove de Sinner or Liar e de Sign in Blood, pela pegada oitentista de Living in Fear e de Dawn Predator, pelo peso de Dark Ritual, pelo ‘punch’ de Rising from the Fire e, principalmente, pela agressividade de Damnation.

Na sequência, foi a vez de o Amazing mostrar seu hard rock. Para essa apresentação, a banda não pôde contar com seu vocalista, Nyck Pontes, que estava em Brasília, cidade natal do grupo, prestando um concurso público. Diante disso, optaram por vir a São Paulo com um de seus guitarristas, Sir Arthur, assumindo também os vocais em algumas músicas, enquanto o convidado Rodrigo Marenna – talentoso frontman da banda gaúcha Marenna, bastante conhecida entre os fãs de hard e AOR -, ficou responsável pelas demais. O Amazing, completado por Fellipe Nava (guitarra), Rod n Rock (baixo) e Gus D (bateria), entregou um show animado, com muita interação com a plateia, mas acabou exagerando um pouco no tempo dedicado a conversas, o que poderia ter sido aproveitado para incluir ao menos mais uma música de seu ótimo álbum de estreia, Highway to Paradise (2024), como as excelentes Heart Beat, Crying Baby, Take it or Leave it ou a própria faixa-título, por exemplo. No repertório, os destaques ficaram para Hang Up High – uma das faixas tocadas do EP de estreia Hard Rock Crazy Club (2019) -, a acelerada Sober Up… When You Die (com o carismático Sir Arthur nos vocais, assim como na versão de estúdio) e Hard Rock Life, ambas de Highway to Paradise. O cover do hit Lick it Up, do KISS, manteve a energia em alta, antes de o Amazing se despedir com a já mencionada Hard Rock Life.

Chegara a hora da grande atração da noite. Marco Mendoza surgiu no recinto caminhando entre o público rumo ao palco. Ele seu juntou aos jovens brazucas Edu Lersch (guitarra) e Arthur Schavinski (bateria), ambos integrantes do Marenna, que, naquela noite, tinha 3/5 de sua formação representada no palco. Para essa apresentação, o baixista e vocalista havia prometido tocar clássicos que marcaram sua trajetória no rock and roll. Após uma breve introdução, o trio abriu os trabalhos com a eletrizante Viva la Rock, faixa-título do penúltimo álbum solo de Mendoza, lançado em 2018. A agitada presença de palco de Mendoza e Lersch nessa primeira música foi suficiente para conquistar e incendiar o público. A energia visceral seguiu com Take it to the Limit, outro hard rock “levanta-defunto” que abre o mais recente álbum de Mendoza, New Direction (2022). Mantendo o foco em seu repertório como artista solo, Mendoza emendou Sue is on the Run, de Viva La Rock, um ‘hardão’ mais cadenciado, com riff pegajoso e refrão típico de hino de classic rock.
Na primeira pausa, Mendoza perguntou se todos estavam bem e se o som estava alto e claro o suficiente. Ele também comentou que não era necessário mencionar o calor absurdo no palco (e fora dele, idem!). Em seguida, agradeceu e elogiou a equipe de som e a produção do evento, destacando o trabalho de promoção e marketing: “Eu realmente aprecio a oportunidade de vir tocar para vocês. Um garotinho de LA, que é baixista, vindo tocar sua própria música… Sinceramente, admiro isso.” Depois, Mendoza apresentou os músicos que o acompanhava, tecendo elogios a Edu e Arthur não apenas por seu talento, mas também pelo comprometimento, já que os três tiveram apenas poucas horas de ensaio: “Eu não quero prosseguir sem antes dar o crédito a… Bem, há muitas pessoas para agradecer hoje, mas eu vou agradecer principalmente os que estão no palco. O mais importante: esses caras trabalharam duro. Cheguei de Buenos Aires ontem, tivemos apenas algumas horas para ensaiar e aprender as músicas, e eles fizeram um trabalho fantástico. Quero que vocês os aplaudam.” De fato, ambos entregaram uma performance impecável, executando todo o setlist sem dificuldades e nem erros aparentes. Parecia até que Edu e Arthur já tocavam há tempos com o americano, tamanha a química que estava rolando no palco.
Voltando 50 anos na história, Marco Mendoza recordou a parceria com o polêmico, mas talentoso guitarrista e compatriota Ted Nugent. Embora Craveman (2002) tenha sido o único álbum de Nugent que Mendoza gravou (além do ao vivo Full Bluntal Nugity, de 2001), a escolha para o repertório recaiu sobre a malemolente Hey Baby, faixa presente no álbum de estreia homônimo de Nugent, lançado em 1975. Depois dessa, Mendoza e sua trupe atacaram com mais três músicas de sua autoria, New Direction, Scream and Shout e Leah.
Os temas de Mendoza contagiaram a plateia, especialmente aqueles já familiarizados com seus discos. Mas sejamos sinceros: o que os fãs realmente queriam eram os grandes clássicos das principais bandas pelas quais ele passou. E foi exatamente isso que veio a seguir – um momento de arrepiar a alma e emocionar qualquer amante do bom e velho classic rock! Antes de anunciar a próxima música, Marco Mendoza compartilhou uma história marcante: “Comecei a receber muitos telefonemas, e um dos convites mais importantes que recebi… Quero dedicar isso, com muito respeito e amor, ao meu amigo guitarrista que partiu. Espero que eu não fique emocionado. Para o meu amigo que partiu, John Sykes (falecido em dezembro de 2024). Ele me ligou um dia e disse: ‘Marco, estamos retomando o Thin Lizzy. Eu, Scott Gorham, Brian Downey e Darren Wharton. E estamos procurando um baixista. Gostaria que você fosse esse baixista’. E devo dizer que foi o maior sucesso da minha carreira. Eu amo esse cara. Sua morte repentina me atingiu em cheio. Fiquei emocionado por isso. Ele deixou um legado lindo, um catálogo lindo, com músicas lindas”. Com a voz embargada, Mendoza anunciou: “Essa vem da banda Thin Lizzy. Espero que gostem… Ela se chama Chinatown, e temos algumas surpresas para vocês”. Como se não bastasse, logo depois veio um dos grandes hinos da banda: Jailbreak. Foi difícil segurar as lágrimas!
Nessa segunda música, Marco convidou Rodrigo Marenna para se juntar a ele e aos outros dois integrantes do Marenna. E no palco o cantor permaneceu por praticamente todo o restante do show. Dando continuidade, Mendoza, Marenna, Arthur e Edu fizeram todo o House of Legends cantar com o hino mor do Journey: Don’t Stop Believin’. Vale explicar que, além de ter contribuído com o Journey por um curto período, Mendoza também acompanhou o guitarrista Neal Schon em seu projeto paralelo chamado Journey Through Time.
Se o clima já estava literalmente fervendo, e com a plateia participando efetivamente na cantoria, o ápice da noite aconteceu com a sequência seguinte, formada por três clássicos absolutos da fase oitentista do Whitesnake, banda da qual Marco Mendoza fez parte entre os anos de 2003 e 2005: Here I Go Again (confira no vídeo abaixo, postado no canal “Rod Marenna”), Bad Boys e Still of the Night. Foi de tirar o fôlego de quem, naquela altura, já estava praticamente derretendo com o calor do verão paulistano.
Fã declarado de jazz fusion, além de nomes como Aerosmith, Stevie Wonder, Cream, The Beatles, Hendrix, Nirvana, KISS, Kings of Leon, Grand Funk e Black Sabbath, Marco Mendoza dedicou a próxima, um cover, a outra banda que adora: o Deep Purple. Ele e o trio do Marenna apresentaram um mini medley com Burn e Stormbringer, dois clássicos da fase do Purple com Glenn Hughes, justamente o músico que assumiu o baixo (e os vocais também) do The Dead Daisies quando Marco Mendoza decidiu deixar o grupo formado em 2012 pelo guitarrista, empresário e aviador australiano David Lowy.
Após essa avalanche de clássicos que encantaram os fãs de classic rock, hard e AOR, e de uma pausa para dar uma refrescada no camarim, Mendoza, Arthur e Edu retornaram para a última música. Antes de encerrar, Mendoza brincou com os fãs, misturando idiomas e perguntando: “Viernes, sexta-feira em São Paulo, vocês ficarão mais loucos do que isso, certo? Mostrarão mais energia do que fizeram até agora? Talvez. Estão esperando pelo domingo? “Fechoada” (feijoada), né? Oh, meu Deus, é caipirinha que vocês estão esperando?” E brindou: “Saúde, pessoal. Vamos beber nessa noite linda de hoje.” Depois disso ele agradeceu e fez um pedido: “Muito obrigado. Eu aprecio todo o apoio de vocês. Gostaria que vocês subissem tudo isso (vídeos e fotos do show) para as redes sociais. Preciso do apoio de vocês para que eu possa voltar. Querem me ver voltar? Porque eu quero voltar, então, vamos lá!”. Em tempos em que alguns artistas se irritam com o uso de celulares na plateia, foi bacana ver esse gesto de humildade de Marco, vendo essa prática como algo positivo, que pode convencer outras pessoas a assistirem ao show e se sentirem atraídas a vê-lo ao vivo em uma próxima oportunidade. Para o encerramento, ele escolheu justamente uma das melhores músicas de sua discografia como artista solo: Sweetest Emotions, do ótimo Viva La Rock.
Foi um showzaço, onde Marco demonstrou todo seu talento como baixista e vocalista de rock, com a raíz e o groove do funk (é clichê dizer isso, mas me refiro ao verdadeiro funk, não a essa praga de gosto duvidoso criada e propagada no Brasil). Após o show e alguns minutos de descanso, Marco Mendoza desceu do mezanino e atendeu aos fãs na pista, distribuindo sorrisos, simpatia, autógrafos e selfies, mostrando que além de grande músico é um verdadeiro gentleman.
Para surpresa dos (não muitos) que permaneceram no local, a banda paulistana Nite Stinger, que estava programada para ser a primeira da noite, assumiu o palco após a despedida de Marco Mendoza. Atualmente composta por Jack Fahrer (vocal), Ivan Landgraf e Bruno Marx (guitarras), Bento Mello (baixo) e Leandro Araújo (bateria), a banda cativou o público restante com sua sonoridade, claramente influenciada pelo hard rock americano dos anos 80.
No repertório, o grupo apresentou algumas faixas de seu álbum de estreia autointitulado, lançado em 2021. Dele, tocaram a acelerada You Want You Got it – que se encaixaria perfeitamente no álbum de estreia homônimo (1987) da pouco conhecida banda californiana Babylon A.D. -, a cadenciada Heading Out, as ‘dokkenianas’ That Feeling e Good Some Good Lovin’ (esta última com muito também de Danger Danger), Danger Zone (uma mistura de Def Leppard, Ratt e Warrant) e a festiva Saturday Night (se você, caro (a) leitor (a), for fã de Poison, tem que ouvi-la!). Uma pena que faixas como Crank it Up, Hot for Trouble (Ratt total) e Hell is Getting Higher ficaram de fora. No entanto, o grupo apresentou duas novas composições, Only You e You Know Why. Tomara que essas sejam indícios de um novo álbum e que mantenha a qualidade do debut.
Apesar de o evento ter se estendido até a madrugada, em um horário que prejudicava aqueles que dependiam de transporte público, quem permaneceu no recinto presenciou um bom show do Nite Stinger, tendo a opção de virar a noite bebendo no próprio House of Legends ou nas diversas opções de bares localizados no tradicional bairro da Vila Madalena.
Nite Stinger – setlist:
You Want You Got It
Heading Out
That Feeling
Only You (nova)
You Know Why (nova)
Danger Zone
Let Me In
Gimme Some Good Lovin’
Saturday Night
Marco Mendoza – setlist:
(Intro)
Viva La Rock
Take it to the Limit
Sue is on the Run
Hey Baby (Ted Nugent)
New Direction
Scream and Shout
Leah
Chinatown (Thin Lizzy)
Jailbreak (cover do Thin Lizzy)
Don’t Stop Believin’ (cover do Journey)
Here I Go Again (cover do Whitesnake)
Bad Boys (cover do Whitesnake)
Still of the Night (cover do Whitesnake)
Burn (cover do Deep Purple)
Sweetest Emotions
Amazing – setlist:
Forbidden Fruit
Let Me Be Your Lover
Sex Machine
Hang Up High
Sober Up… When You Die
Lick it Up (cover do KISS)
Hard Rock Life
Urdza – setlist:
Wrath of God
Sign in Blood
Living in Fear
War with Myself
Damnation
Dawn Predator
Sinner or Liar
Dark Ritual
Rising from the Fire
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