Após 16 anos sem passar pelo Brasil, finalmente o guitarrista norte-americano Marty Adam Friedman (ex-Megadeth, Cacophony, Hawaii, Vixen e Deuce), conhecido mundialmente como Marty Friedman e que está radicado há uma década no Japão, voltou a nos visitar, dessa vez em uma extensa turnê, agendada para nada menos do que 20 cidades brasileiras. Marty já havia feito ‘workshops’ em São Paulo nos anos de 1994 e 1999 e agora o local escolhido foi o tradicional Blackmore Rock Bar, contando com a abertura do também guitarrista Douglas Jen, que integra a banda paulistana de Prog Metal, Suprema, que em 2013 lançou o ‘debut’ “Traumatic Scenes”. O início programado para as 20h00 teve atraso de 1 hora e dez minutos e Douglas chegou mostrando suas habilidades com composições próprias e de sua banda, apresentando riffs e solos bastante pesados e melodiosos em cima de bases ‘sampleadas’, que é algo extremamente comum em ‘workshops’.
Com o público ainda em pequeno número, Douglas informou que sua apresentação seria nos mesmos moldes a da atração principal, sendo assim, seriam tocadas algumas músicas e também haveria espaço para perguntas dos presentes, que a princípio se mostravam bastante tímidos, já que muitos ainda não conheciam o trabalho do guitarrista. De qualquer forma, Douglas conseguiu agradar e aos poucos passou a responder as dúvidas e curiosidades que surgiam. Além de apresentar composições do Suprema, Douglas encerrou seu set tocando trechos de temas do Dream Theater.
Faltando 10 minutos para a sua apresentação, o carismático Marty Friedman chegou ao Blackmore e com a casa cheia entrou em cena às 22h10, trajando uma camiseta da Seleção Brasileira de Futebol, personalizada com seu logotipo e detonando três petardos de sua carreira solo. Após passar pelo Brasil com o Megadeth nos anos de 1991, 1994, 1995, 1997 e 1998, Marty já havia se apresentado sozinho por aqui em 1999.
Falando nisso, o guitarrista aproveitou para promover seu mais novo álbum, o pesado e aclamado por imprensa e fãs, “Inferno”, que foi lançado em 2014 e é o décimo primeiro de sua carreira.
Após a sequência inicial, Marty disse estar muito contente por voltar ao Brasil e foi ovacionado por todos. O problema é que assim como aconteceu na apresentação de Douglas Jen, Friedman se viu dependente de uma qualidade de som fraca e abafada, o que o irritou visivelmente, e por várias vezes reclamou e se desculpou pelas falhas surgidas.
Contando com um interprete, entre uma música ou outra apresentada, Marty foi bombardeado de perguntas dos fãs, desde as mais cômicas até as mais sérias, relacionadas tanto ao seu modo de tocar, as suas técnicas, influências, o passado em bandas como Cacophony e, principalmente o Megadeth, quanto dicas solicitadas pelos guitarristas presentes no local.
Sobre a peculiar maneira de tocar com a mão direita, Marty brincou dizendo que a desenvolveu ainda adolescente “praticando” no banheiro. Claro que arrancou risos gerais. Falando sério, o músico explicou que essa foi a forma mais confortável que encontrou e que lhe possibilita usar não só a palheta, mas também os dedos, deixando as primeiras notas fluírem de forma mais “humana” e menos “abafada”, já que pode usar a mão afastada das cordas.
Muitos perguntavam como foi tocar com músicos como Jason Becker e Dave Mustaine, mas Marty prontamente solicitou que fossem feitas perguntas mais objetivas para que ele pudesse desenvolver respostas interessantes, evitando apenas soltar um “foi ótimo, de verdade”.
Aos iniciantes que lhe pediam dicas e conselhos, Marty mostrou simplicidade e apenas recomendou que não ficassem tocando solitariamente, mas que montassem bandas ou mostrassem o que tinham em mãos para seus parentes, amigos ou qualquer pessoa disponível a ouvi-los para que dessem opiniões e a partir delas pudessem se desenvolver.
As pausas nas perguntas deram espaço para algumas músicas do álbum “Inferno” serem tocadas integralmente, como a faixa título e a bela “Undertow”, por exemplo, que possui um clima próximo ao dos álbuns “Scenes” (1992) e “Introduction” (1994).
Falando nesses álbuns que possuem um clima voltado a New Age, Marty Friedman comentou sobre a importância de ter trabalhado com o renomado músico japonês Kitaro, e lhe deu os méritos pela sonoridade de ambos os álbuns, já que o considera um mestre no gênero.
Sobre os ritmos orientais que incorpora em suas composições, Marty salientou que a música japonesa realmente lhe acrescenta bastante influência, assim como as músicas populares dos países por onde passa. Há de usar como exemplo disso a música “Rio”, presente no álbum “True Obsessions” (1996), a qual certa vez em entrevista Marty explicou que a compôs quando passou pelo Rio de Janeiro, onde foi obrigado a ficar trancado no quarto do hotel, perdendo a oportunidade de conhecer e usufruir das belezas da cidade, sendo assim, a composição ganhou uma atmosfera melancólica.
Entre várias solicitações de músicas que o público pedia, Friedman despejava trechos e solos de músicas de seus álbuns mais antigos, outras do Cacophony como “Black Cat”, por exemplo, e, logicamente, do Megadeth, como as clássicas “Lucretia” e a tão aguardada “Tornado Of Souls” – certamente a música mais solicitada a ele no mundo todo -, que possui um dos solos mais inspirados e influentes da história do Metal mundial. À respeito dessa música, Marty comentou que antigamente ele fazia coisas que ninguém notava, mas após escrever esse solo, Dave Mustaine e David Ellefson ficaram perplexos e lhe deram tapinhas nas costas como cumprimentos, e talvez esse gesto de ambos tenha sido a sua aprovação para entrar no Megadeth.
O ‘axeman’ também brincou com o fato de que não se lembrava de muitas músicas que estavam sendo solicitadas, dizendo que era como se você tivesse namorado uma garota na adolescência e vinte anos depois alguém lhe perguntasse qual a data de aniversário dela.
Após atender a inúmeras perguntas, pedidos de músicas e palhetas, Friedman, apresentando cansaço, se despediu pontualmente à meia-noite tocando uma versão que nunca gravou para o hino cristão “Amazing Grace”. Ao final da apresentação, Marty ainda atendeu cerca de 40 fãs no já tradicional ‘meet and greet’.
Uma pena que para um evento como esse, o equipamento tenha deixado os músicos na mão em alguns momentos, mas nada que tenha tirado o brilho de suas apresentações, principalmente a de Marty Friedman, que ainda nutre o sonho de muitos headbangers de vê-lo de volta ao posto de ‘guitar hero’ do Megadeth, mas que tudo indicia que não será dessa vez, já que o brasileiro Kiko Loureiro (Angra) foi oficializado. Enquanto isso, Marty Friedman vai consolidando ano após ano o seu nome dentro da música instrumental, graças também a uma carreira bem sólida na terra do sol nascente.