Por Valtemir Amler
É um fenômeno frequente e de fácil constatação: Cada época tem o seu rebento musical próprio, um movimento ou gênero que surge e capta com perfeição a aura da época, e que logo mostra ao mundo suas garras com o surgimento de várias bandas. Se sempre tem sido assim, é natural que no metal extremo acontecesse algo semelhante, e foi isso que vimos acontecer desde meados dos anos 80. Uma década depois, em meados dos anos 90, era a mistura brutal entre o grind e o slam death que começava a dar as cartas. Influenciados por bandas como Suffocation, Terrorizer, Repulsion e Napalm Death, aquelas novas bandas injetavam uma alta dose de ‘groove’ em seu som, criando ‘breakdowns’ que se tornariam verdadeiros ‘agentes do caos’ durante suas apresentações ao vivo. Uma das principais lideranças nesse segmento, do início até os dias de hoje, é o lendário Dying Fetus, e é justamente ali que começa a nossa história. No início dos anos 2000, Kevin Talley (bateria), Sparky Voyles (guitarra), Bruce Greig (guitarra, falecido em 2022) e Jason Netherton (baixo e vocal) resolveram sair do Dying Fetus e começar sua própria banda, dando assim início a jornada do Misery Index. Com o passar dos anos a banda passou por transformações de formação, atingindo seu melhor momento na composição com a chegada do guitarrista Mark Kloeppel, um antigo fã que elevou a música de seus ídolos a outro patamar. Conversamos com ele sobre toda sua história, e o resultado você confere na sequência.
Você anda vive em Baltimore?
Mark Kloeppel: Não, eu já moro em Columbia, Missouri há alguns anos. Mas Baltimore ainda é, digamos, a ‘cede’ do Misery Index, pois é lá que vivem Adam Jarvis (bateria, Pig Destroyer, Scour, Lock Up e outros) e Darin Morris (guitarra, ex-Autumn Dawn), então, dois quartos da banda ainda residem por lá. Eu me mudei para o Missouri quando tive meu primeiro filho, que hoje tem dez anos. Então, já faz um bom tempo que me mudei.
Bom, então acho que não é o caso de parabenizá-lo pela melhora no baseball do Baltimore Orioles.
Mark: Ah cara, não mesmo (risos). Mas a razão é que eu realmente não sou muito antenado com o que acontece no mundo dos esportes, nenhum esporte, para ser sincero. Acho que você já imagina como é difícil para eu fazer novos amigos, já que nunca tenho assunto para entrar nas rodas de conversa (risos). Infelizmente nunca tenho muito a acrescentar numa conversa sobre esportes (risos).
Pode ser, mas acho que você tem algumas coisas a dizer quando o assunto é guitarra, certo?
Mark: Bem, mais do que sobre esportes (risos). Mas, a verdade é que as pessoas imaginam que eu sei fazer muito mais do que eu realmente consigo fazer. Não sou um guitarrista exageradamente técnico, não sou o mais rápido e nem nada do tipo, mas sou bom criando riffs, e entendo bastante sobre equipamento e timbres, então, acabo me saindo bem. A verdade é que para mim a guitarra é isso, é tudo sobre timbres e ritmos. Não tenho muita vaidade quanto a tocar, apenas gosto de saber fazer aquilo que a banda precisa que eu faça. E, geralmente, é importante você ser bom com timbres e ritmos, pois na hora de compor um álbum, não adianta apenas ter boas ideias, você tem que ser capaz de tirá-las da sua cabeça e pôr em prática.
É verdade. Ter uma boa ideia e então não conseguir executar por não conhecer o timbre adequado é muito frustrante.
Mark: É, basicamente é uma ideia morta. Claro que você precisa ter habilidade para tocar, mas a música que fazemos demanda bem menos perícia técnica do que as pessoas imaginam. É basicamente plugar o equipamento, e depois manter a concentração e o ritmo. As músicas são simples em sua base, mas têm muitos movimentos, quebras de ritmo e assim por diante. Se por um segundo você perder a concentração, vai ferrar a música inteira, pode ter certeza.
Em uma banda com dois guitarristas, imagino que você poderia retornar rapidamente aos trilhos sem causar grandes estragos, mas seria um problema enorme se Adam perdesse a concentração.
Mark: Ah, sim. Aí seria um trem descarrilhado (risos). Um baterista não pode perder a concentração, especialmente nesse tipo de música. Se ele colocar um tempo que seja fora do lugar, a banda toda ficará no vazio, e teríamos que retomar tudo do início.
Você mantém essa postura em mente quando está escrevendo uma nova música?
Mark: Sim, de outra maneira acho que nem conseguiria ser produtivo.
Que conselho você daria para um guitarrista de death metal que está começando a compor suas primeiras músicas?
Mark: Bem, eu daria um conselho que vem de algo que aprendi ao longo dos anos: muitas vezes você tem a tendência de compor a música com o instrumento na cabeça, você quer que ele brilhe. Você começa a compor já com a guitarra nas mãos, pois quer fazê-la brilhar. Veja, o que você realmente deveria fazer é largar a guitarra e simplesmente imaginar melodias, imaginar ritmos e aí sim você pega a guitarra e tenta traduzir a ideia que teve para a linguagem do instrumento. A guitarra deve entrar no final do processo, acho que é com essa abordagem que você acaba conseguindo as ideias mais originais.
Concordo. Começar já com a guitarra nas mãos acaba facilitando o caminho para você seguir uma tendência.
Mark: Sim, é isso mesmo que quero dizer. Se as suas mãos trabalharem mais rápido que o seu cérebro, elas simplesmente vão seguir o caminho mais cômodo para elas, vão meio que seguir o padrão, no automático. Respire, solte a guitarra por um instante, pense primeiro no que vai fazer e então faça.
Isso é bem importante, especialmente num momento em que o death metal está voltando mais e mais aos holofotes.
Mark: É isso. É importante evitar as armadilhas. Esse gênero existe há quase trinta anos, muita coisa já foi feita, se você é fã e toca o estilo, tem que cuidar para não seguir no piloto automático. É importante que as bandas não soem todas exatamente iguais, pois a música precisa evoluir. O death metal só existe porque no passado um grupo de músicos não se contentou em simplesmente fazer o que os outros faziam.
É verdade. Bem, você se uniu ao Misery Index em 2005, mas já estava envolvido com death metal antes, com a banda Cast The Stone, certo?
Mark: Exato, e essa foi a razão de Adam e eu termos nos encontrado pela primeira vez. Nós tocávamos na cena de St. Louis, eu com o Cast The Stone, e ele com o All Will Fall. Tocávamos basicamente nos mesmos clubes, e como ambas as bandas estavam indo bem, costumeiramente estávamos abrindo as apresentações das bandas maiores que passavam por St. Louis. Foi assim que Adam conheceu Kevin Talley (ex-baterista do Misery Index) e os outros caras, e eventualmente ele acabou substituindo Kevin no Misery Index.
Então, foi ele que basicamente abriu as portas para você.
Mark: Sim. Ele estava na banda, e quanto Mike Harrison decidiu que não queria mais seguir com o Misery Index, Adam rapidamente me mandou um email, perguntando se eu gostaria de tentar a vaga. Essa foi uma história engraçada, pois o email que eu usava era o da banda, do Cast The Stone. Todos na banda tínham acesso a ele. Então, era final de 2004, o Misery Index estava precisando de um guitarrista, e Adam me mandou um email perguntando se estava interessado na vaga. Meus colegas de Cast The Stone viram aquele email antes que eu, então, o que você acha que eles fizeram?
Bem, não acho que eles tenham te parabenizado.
Mark: Não mesmo (risos). Eles simplesmente deletaram o email para que eu não visse (risos gerais).
Como você acabou sabendo da vaga?
Mark: De novo, isso foi engraçado (risos). Na época eu era ‘bartender’ em um ‘country club’ no Missouri, e eu sabia que o All Will Fall estaria tocando em Sauget, no Illinois em algum dia daquela semana, mas havia esquecido por completo a data do show. Adam ainda estava na banda, então eu queria muito ver a banda do meu amigo, mas a coisa simplesmente fugiu da minha cabeça. Bem, numa sexta-feira eu saí do trabalho, fui direto para casa e fiquei olhando a programação dos shows para o fim de semana, caçando o que estava acontecendo, sabe? Quando comecei a ler, quase fiquei maluco, ‘caralho, o All Will Fall está tocando agora!’. Eu saí de casa sem nem trocar de roupa, dirigindo como um louco para chegar a tempo do show em outro Estado (risos), e ainda consegui chegar a tempo da última canção da noite, Brickshard Foundry. Depois do show, Adam veio falar comigo todo empolgado, tipo ‘obrigado por vir, mano’, e então lançou em seguida, ‘e aí, porque você ainda não respondeu meu email?’. Eu fiquei ‘mas, que email, cara?’, então ele mandou ‘aquele em que perguntei se você queria entrar para o Misery Index, porra!” (risos gerais). Eu nem pensei, só disse para ele ‘cara, eu nunca recebi esse email, mas estou dentro!’
Você era fã da banda?
Mark: Sim, eu era antes de tudo um grande fã do Dying Fetus, e o Misery Index eram os párias daquela banda, era a versão mais suja, punk e política do Dying Fetus. Sendo sincero, quando ouvi o Misery Index pela primeira vez, não fiquei muito impressionado, era punk demais para o meu gosto. E claro que era, essa era a ideia! Acabei me apaixonando pela música deles depois, e adicionei um pouco do meu gosto na mistura também, eu diria (risos).
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