A maneira de consumir música vem mudando de tal maneira que a experiência é abraçada por diferentes gerações. No meu caso – e este texto de abertura precisa ser em primeira pessoa –, o K7 e o vinil conviveram muito bem durante bastante tempo, afinal, a fitinha era necessária para fazer o que hoje chamamos de “playlist”, só que com gravações extraídas de programas de rádio ou compilações de faixas de vários LPs. Aí veio o CD…
A mídia digital trouxe uma melhor qualidade de áudio – para alguns, teoricamente – e, também, a praticidade de precisar de menos espaço para armazenar a coleção – em termos de mobilidade, nem tanto, uma vez que o “walkman” já dava conta do recado. Aí veio o MP3…
Os arquivos digitais bagunçaram o mercado musical por causa dos downloads ilegais – o que não vem tanto ao caso aqui, mas procure ler “Como a música ficou grátis” (2015), de Stephen Witt, e “Appetite for Self-Destruction: The Spectacular Crash of the Recording Industry in the Digital Age” (2009), de Steve Knopper. Aí vieram as plataformas de streaming…
Os aplicativos de música tornaram obsoleto o download de MP3, mesmo de forma legal, uma vez que você tem as maiores lojas de música na palma da mão, sempre atualizadas com os lançamentos. Literalmente, porque os apps estão presentes nos smartphones, o que decretou o fim dos tocadores de MP3 (quem aí ainda tem um iPod Classic funcionando?).
Enfim, entre as opções para ouvir música onde quiser e na hora que der vontade, uma plataforma criada na França, em 2007, chegou ao mercado brasileiro com uma proposta para atrair o ouvinte que preza pela qualidade sonora, principalmente. O Qobuz (disponível tanto para iOS quanto para Android) entrega, entre outras peculiaridades, músicas em Audio Hi-Res, e isso faz diferença.
Pude testar o aplicativo durante três meses, e a promessa é cumprida. A diferença já é notável ouvindo diretamente no celular ou mesmo jogando no som do carro via Bluetooth; e se você espelhar na TV via Chromecast, mas com a possibilidade de ouvir no home theater ligado a uma linha auxiliar, vai ter a sensação de estar ouvindo um CD.
A biblioteca musical? Eu apostaria que não deixa a dever à da sua plataforma favorita, e falo isso como um usuário que, apesar de nunca ter abandonado o produto físico, usa o streaming com frequência. Entre outras peculiaridades do Qobuz, é bem atrativa a possibilidade de ouvir música enquanto lê reportagens no mesmo ambiente do aplicativo. E é algo a ser constantemente aprimorado, visando a um maior volume de artigos (e com temas mais abrangentes, claro).
E manter a foto do artista atualizada é um ponto de atenção. Nem todo usuário vai ligar para isso, mas os “chatos”, como eu, podem ver isso como descaso – além de que bandas como o Queensrÿche, por exemplo, certamente não querem que a sua imagem ainda esteja atrelada ao ex-vocalista, Geoff Tate, até porque Todd La Torre está no posto há dez anos. Além disso, convenhamos, fotos de divulgação são de divulgação, ou seja, não custam nada e são de fácil acesso.
E para completar essa análise, mandamos algumas perguntas ao diretor-geral do Qobuz para América Latina e sul da Europa, Pierre Largeas, que respondeu a uma pauta jornalística baseada não somente no teste de consumidor que foi realizado, mas também em fatos e curiosidades de mercado. Confira, teste o app e tire suas conclusões. A boa música e a música boa agradecem.
As plataformas de streaming foram basicamente a pá de cal no download ilegal, deixando à disposição do usuário a maior loja de discos do mundo, mesmo que virtual. Qual o papel do Qobuz nessa transformação?
Pierre Largeas: O uso do formato MP3 foi adotado para streaming, embora arquivos mal compactados proporcionem uma experiência de som alterada, na qual a qualidade do áudio é sacrificada em favor da redução do tamanho do arquivo. O Qobuz foi criado durante esse período com uma forte vontade de oferecer aos amantes da música uma experiência musical de alta qualidade. Nossa visão de streaming já estava à frente de seu tempo: o streaming de música deveria ser um serviço pago, as recomendações de especialistas deveriam ser incluídas, e novas perspectivas para a qualidade do som deveriam ser desenvolvidas. O Qobuz desenvolveu uma abordagem fundamentalmente diferente da indústria. Em 2008, fomos a primeira plataforma a oferecer downloads com qualidade de CD, integrando depois em nosso catálogo os dez primeiros álbuns em alta resolução. Desde então, continuamos trabalhando para oferecer música com a melhor qualidade de áudio disponível para os nossos clientes.
E o Qobuz está chegando ao mercado brasileiro, onde outros apps já estão com os pés bem fincados. Como se destacar nesse cenário local? O que o Qobuz apresenta de diferencial para o usuário? Qual a experiência que ele terá aqui e que não terá em outros?
Pierre: O Qobuz se destaca por três pontos principais. O primeiro é a qualidade de som, porque todas as nossas ofertas são em alta resolução, o áudio Hi-Res, e qualidade sem perdas, que é a qualidade de CD. Atualmente, oferecemos 90 milhões de faixas em alta resolução e qualidade sem perdas, a mais ampla escolha de referências de alta resolução. O segundo ponto tem oferta editorial e curadoria humana, pois o Qobuz é uma “mídia”. Nossa equipe de especialistas é formada por pessoas com conhecimento e cultura musical incomparáveis. Eles trabalham duro para oferecer uma gama excepcional de conteúdo editorial exclusivo e listas de reprodução artesanais. Além de alguns recursos específicos, nosso aplicativo usa alguns algoritmos para criar suas milhares de listas de reprodução. Essa abordagem humana é única na indústria. Por último, temos streaming e downloads. Somos uma das únicas plataformas a oferecer streaming e download em qualidade de alta resolução. Assim como o vinil, adquirir sua música favorita significa que você paga apenas uma vez e pode aproveitá-la para sempre, o que é muito importante para muitos de nossos clientes. Esses são diferenciais-chave que tornam o Qobuz uma plataforma única no mundo.
E ao navegar pelo aplicativo, duas coisas chamaram a minha atenção: a primeira são os discos, especialmente os lançamentos, mas também os álbuns mais clássicos, com áudio em alta resolução…
Pierre: Para o Qobuz, a música é uma arte de 360°: tem passado, presente e futuro. É por isso que os gêneros de música clássica e jazz são nossos pontos-chave de diferenciação. Quando os álbuns são relançados em alta resolução, é importante engregar essas informações aos nossos assinantes. É também uma oportunidade de destacar nosso conteúdo editorial por meio de artigos ou panoramas vinculados a esses lançamentos.
E o outro ponto são as matérias na seção “Panoramas”, meesmo. Para mim, o mais interessante, porque torna a experiência de ouvir música mais interativa, no mínimo, e permite que o usuário não saia do aplicativo enquanto ouve música. Qual o retorno que vocês têm recebido?
Pierre: “Panoramas” são conteúdos que você não encontrará em outra plataforma por demanda. O Qobuz se apresenta como uma loja de discos, e nossos panoramas são conteúdo editorial cinco estrelas, uma forma mais interativa de ouvir música, de se aprofundar na história da música e em todos os gêneros musicais!
Ainda sobre “Panoramas”, quais os pontos de aprimoramento em que estão trabalhando? Isso porque o volume ainda não é significativo, naturalmente, mas especialmente porque, por exemplo, não há conteúdo voltado ao público de heavy metal.
Pierre: Destacamos todos os gêneros musicais no Qobuz, com mais de 300 panoramas. Nossos ouvintes de metal também já podem ler conteúdo sobre Alice Cooper, Metallica, o “Back in Black”, do AC/DC, Black Sabbath, Lemmy, a origem do death metal sueco, a era de ouro do death metal americano, Guns N’Roses et cetera.
Sobre a constante atualização de informações que qualquer app deve fazer, como é o trabalho no Qobuz? Por exemplo, eu obviamente fui atrás das minhas bandas favoritas para testar o serviço, e uma delas, o Queensrÿche, está com a foto da banda em sua formação de 2008…
Pierre: Essa parte, de fotos das bandas, não é tão simples. Especialmente quando o artista em questão tem uma carreira muito, muito longa. Você quer uma foto deles do começo de carreira, do meio ou de agora? Para algumas bandas, às vezes é melhor usar uma foto antiga, às vezes não…
Um ponto delicado é a relação das plataformas de streaming com os artistas em relação à remuneração, ou seja, direitos autorais, de reprodução et cetera. Qual seria o diferencial do Qobuz nesse sentido? Qual é o acordo com os músicos?
Pierre: Desde a sua criação, em 2007, a Qobuz defende a música de qualidade que aumenta o valor e a riqueza da própria música e, também, ajuda a desenvolver um modelo sustentável para artistas e detentores de direitos. Fazemos isso por três razões: incentivar a assinatura de streaming e a compra, duas modalidades complementares de consumo que garantem uma remuneração mais justa para artistas e detentores de direitos; promover o modelo pago, o modelo mais remunerador e solidário para todos os acionistas da indústria musical. Nossa plataforma não propõe ofertas gratuitas e não impõe publicidade, e dá preferência por assinaturas de streaming de alta resolução; e promover artistas menos ouvidos. O modelo de pagamento mais utilizado funciona através do pagamento aos detentores de direitos, que, por sua vez, pagam aos artistas, de acordo com a sua quota de audição. Ao destacar mais artistas e não superestrelas, contribuímos para garantir que eles recebam, por meio de seus detentores de direitos, uma melhor remuneração.
Enquanto muitos artistas entendem o streaming como um caminho sem volta, mesmo com um aumento nas vendas de CDs depois de 17 anos, outros boicotam e criam seus próprios serviços – Neil Young, inclusive, comprou briga com uma concorrente por causa da disseminação de fake news em podcasts. Qual a posição do Qobuz em relação a isso?
Pierre: Não comentaremos nenhuma questão relacioada ao Neil Young, que sempre foi um artista icônico no Qobuz. Como um reprodutor 100% puro de música, estamos entusiasmados em oferecer toda a sua discografia em streaming de alta resolução em todos os nossos aplicativos.
No geral, os artistas defendem que o governo legisle para que eles artistas tenham direito a um retorno financeiro justo, equiparado ao das empresas, em relação à receita gerada pelo streaming de suas obras. E foi a França, país de origem do Qobuz, que adotou direitos conexos no streaming depois de um acordo entre sindicatos e representantes de artistas e produtores. É algo local, nacional, mas que pode ser modelo para o resto do mundo. Como isso afetou o Qobuz na França e, claro, como a empresa pode levar isso para os outros mercados em que está presente?
Pierre: O Qobuz fundou e desenvolveu seu modelo para apoiar a qualidade e a criação artística e, também, oferecer um modelo que cria valor para os artistas e toda a indústria musical. Este é o mesmo modelo que oferecemos em todos os países onde operamos.
O Qobuz ainda é novidade para um sem-número de usuários de streaming, mas já está no mercado desde 2007. Quais foram os principais desafios nos últimos 15? E os desafios num mercado de streaming cada vez mais competitivo?
Pierre: O Qobuz apostou na criação de uma oferta de nicho, para amantes de música e audiófilos. A nossa chegada a novos mercados, como a América Latina, vai nos permitir ter mais visibilidade e propor a nossa oferta a mercados onde as expectativas para ter um serviço de música do mais alto nível são cada vez maiores. Nossa ambição é dar acesso a um público mais amplo de música de alta qualidade. Continuamos aumentando nosso número de faixas e listas de reprodução em alta resolução, e enriquecendo nosso conteúdo para dar às pessoas acesso a mais informações e notícias sobre seus artistas e álbuns favoritos. Trabalhamos continuamente para criar um ambiente de primeira classe, onde os amantes da música possam descobrir, experimentar, aprender, coletar e compartilhar música deliberadamente. Nossa ambição é nos tornarmos a mais autêntica e comprometida comunidade musical.
Por último, como você analisa o futuro mercado da música, tanto físico quanto digital, nesta década que mal começou? Globalmente falando.
Pierre: Acreditamos que ainda há muitas oportunidades na indústria da música. Em 2021, o setor de música movimentou US$ 25,9 bilhões, um aumento acentuado em relação à taxa de crescimento do ano anterior, que foi de +7,2%. No mesmo ano, as receitas de streaming aumentaram 24,3%. O crescimento foi impulsionado pelo streaming, especialmente pelas receitas de streaming de assinatura paga, que aumentaram 21,9%. Havia 523 milhões de usuários de contas de assinatura paga no fim de 2021. O crescimento nas receitas de streaming mais do que compensou a queda nas receitas de outros formatos, incluindo as receitas físicas, que caíram 10,7%. Esses números foram divulgados pela IFPI em seu Global Music Report 2022 (N.R.: o balanço anual da Federação Internacional da Indústria Fonográfica).