O “Rock na Praça”, evento gratuito em formato ‘open air’, idealizado pelo músico Fabrício Ravelli (Imbyra, Harppia e Hirax), com apoio da Prefeitura de São Paulo, tomou forma no dia 13 de dezembro de 2015, quando naquela primeira edição reuniu na tradicional Rua 24 de Maio – estrategicamente em frente ao edifício Grandes Galerias, que popularmente é mundialmente conhecido como Galeria do Rock -, as bandas Project 46, Nervosa, Worst e Pompeu & Amigos. O projeto foi um sucesso de organização e de público, e agora, apenas quatro meses depois, os headbangers paulistanos puderam conferir a tão aguardada segunda edição. Ao chegar ao local, a sensação era de ‘deja vu’ para muitos que compareceram também na primeira data, pois tudo a lembrava: a temperatura, a estrutura, a pacificidade entre as pessoas e o clima amistoso nos bastidores, fora o que acontecia no palco. Sobre o critério de escolha das bandas que tocaram dessa vez, Sinaya, Woslom, John Wayne e Torture Squad, Ravelli explicou à ROADIE CREW: “A Sinaya foi através do cadastro do site do evento, todas as outras foram escolhidas a dedo, para provermos o que há de melhor no Rock em São Paulo. A primeira edição foi um sucesso graças ao público, mas também muito graças ao Project 46, ao Worst, ao Nervosa e à banda do Marcello Pompeu (Korzus). E essa não foi diferente. O clima atrás do palco era de família, e a gente faz questão de que isso aconteça”.
Apesar da informação de que a primeira banda subiria ao palco às 14h, houve um atraso de uma hora devido à passagem de som. Mas isso não foi problema, já que ninguém se importou com esse detalhe. Assim que tudo foi resolvido, o mestre de cerimônias do “Rock Na Praça”, Marcello Pompeu, fez as honrarias pedindo que todos fizessem um juramento de que iriam se comportar, sem causar briga ou bagunça. Após dar as boas vindas ao público, convocou ao palco as garotas do Sinaya que deram início ao evento, com uma breve introdução instrumental, que antecedeu a certeira “Pure Hate”, que em seu decorrer foi acometida por algumas falhas técnicas no som. Antes da próxima, a vocalista e guitarrista Mylena Monaco solicitou ao público: “Vamos mostrar que nossa cena não tem lixo no chão, não tem treta, mas tem muito ‘circle pit’!” E teve! Isso porque “Life Against Fate”, música do EP “Obscure Raids” – único material lançado até o momento -, já começou porrada. O público não ficou indiferente e agitou o tempo todo. Melhor ainda que a partir dela os problemas técnicos foram sanados.
A bola da vez então foi a faixa título do EP, que conta com uma linha vocal bem marcante. Atualmente a banda está preparando seu primeiro ‘full lenght’ e algumas músicas foram apresentadas, começando por “Bath Of Memories”. Essa havia sido finalizada dias antes, e foi anunciada após Mylena explicar o conceito lírico da composição: “A próxima é sobre a Segunda Guerra Mundial e a desigualdade da época. Esperamos que hoje muita gente não tenha desigualdade, nem de raça, nem de cor… Enfim, preconceito algum, pois debaixo daqui (da pele) é todo mundo igual”. Então a guitarrista Renata Petrelli – que sempre toca bastante centrada -, deu início a essa que é uma das melhores e mais diferentes composições do Sinaya. No decorrer Mylena foi atendida quando, na paradinha, quis ver do público outro ‘circle pit’.
Quem também agitava bastante era a baixista Camila Toledo, que se movimentava pelo palco e ‘bangeava’ ao melhor estilo Alex Webster, baixista do Cannibal Corpse. Outra música nova, “Coven Of Panic”, teve alguns momentos de desentrosamento entre a banda e Ellen War, mas isso era justificável, já que a baterista estava fazendo ali a sua estreia. No mais, Ellen segurou muito bem a bronca. A também novata “Buried By Terror” agradou bastante, pois já era conhecida do público devido ao videoclipe. O ato final se deu com “Legion Of Demons” – particularmente, acho essa não só a melhor de “Obscure Raids”, como do Sinaya mesmo. Foram 45 minutos de set, com as garotas sendo muito bem recebidas pelo público. A Sinaya têm tido um ótimo ano, que começou com a abertura do show do Exodus em São Paulo, e agora esse show, a expectativa que fica é para o álbum de estreia, que se vier no nível das novas músicas que foram executas, surpreenderá.
Antes da próxima a equipe de palco trabalhou rápido e então Pompeu entrou em cena, proferiu algumas palavras sobre o evento e convocou Fabrício Ravelli para falar com a plateia. Entre discursos e agradecimentos, o idealizador perguntou se todos ali gostariam que o “Rock Na Praça” passasse a acontecer todo último domingo de cada mês. Tendo a resposta positiva e unânime do público, avisou que está trabalhando para que isso seja concretizado. Após a ótima notícia, Fabrício comentou sobre a atração seguinte, falando que ela havia acabado de lançar o álbum “A Near Life Experience”. Foi assim, e com todos gritando seu nome, que o Woslom entrou em cena, ainda com a introdução mecânica que abre o novo disco rolando, para dar início com a nova “Underworld Of Agression”. Sem perder o pique, foi a vez de o grupo mandar a mais extensa do novo material, a própria “A Near Life Experience”, que soou muito bem ao vivo, principalmente devido ao refrão, que fica na cabeça. Nessa hora, o ‘circle pit’ comeu solto na plateia, tanto que assim que a música acabou o vocalista e guitarrista Silvano Aguilera comentou: “O pessoal da roda está animado aí. Essa próxima vai dar mais gás ainda pra vocês!”. E então veio “Beyond Inferno”, do primeiro álbum da banda, “Time To Rise” de 2010.
A formação do Woslom, que é completada pelo baterista Fernando Oster – único remanescente da original -, Rafael Iak (guitarra) e Andre G. Mellado (baixo) vive um ótimo momento e ao vivo está bem entrosada. Oster está tocando ainda melhor, enquanto que Iak e Mellado – que parece a reencarnação de Cliff Burton, tamanha a semelhança e a influência, desde seu baixo Rickenbacker, até a forma com que toca e agita – mostram boa performance, com direito a backing vocals que são indispensáveis para as composições do Woslom.
Voltando a falar do show, logicamente que o grupo não deixaria de fora músicas do aclamado penúltimo álbum, “Evolustruction” – lançado em 2013 -, e então mandou de uma só vez “Purgatory” e a pesadíssima e veloz “Pray To Kill”, que pôs todo mundo a agitar bastante. Antes de outra das novas, “Unleash Your Violence”, a banda ainda ensaiou o coro com a platéia, que respondeu positivamente. Porém, uma das que mais empolgaram foi a já conhecida “Time To Rise”.
E foi do primeiro disco também que tocaram aquela que encerrou o show, “Mortal Effect”. Em resumo, o Woslom teve uma atuação impecável e apesar de ter priorizado seu repertório em músicas de “A Near Life Experience”, incluiu músicas essenciais dos outros dois álbuns – ainda que, em minha opinião, tenham ficado de fora “Evolustruction” e “Haunted By The Past” do material anterior. Agora a banda se prepara para representar novamente o Brasil lá fora, embarcando para a sua quarta turnê europeia.
Assim que acabou a apresentação do Woslom, a turma do Metalcore imediatamente ficou ansiosa para conferir a banda seguinte, que no ano anterior teve como feito a experiência de tocar no “Rock In Rio”. Àquela altura, o calor intenso que fazia no centro de São Paulo já estava amenizando com o cair da tarde e pontualmente às 17h30 o John Wayne, através de Fábio Figueiredo (vocal), Rogério Torres (guitarra), Junior Dias (guitarra), Denis Dallago (baixo) e Edu Garcia (bateria), assim como o Woslom, entrou em cena ao som da introdução mecânica, chamada “Passagem”, que antecedeu a brutal “Quatro Velas”. A banda segue em divulgação de seu segundo ‘full lenght’, o bem sucedido “Dois Lados – Parte 1”, que foi lançado em 2015. Com a recepção calorosa dos fãs, a banda foi mandando mais petardos do novo álbum, então vieram a cadenciada “Dois Lados – Parte I [Inferno]” e a ‘groovada’ “Identidade”. Como vocalista, Fábio dispõe de um vocal agressivo e extremamente gritado e rasgado, já como ‘frontman’ mostra domínio do espaço que tem de palco e nesse dia até ousou a ir várias vezes até as caixas de som que ficavam pelas laterais frontais, para poder falar com o público. Isso sem contar que em dado momento ele foi, literalmente, aos braços da plateia.
No primeiro de seus vários discursos, o vocalista alertou sobre o respeito ser um dos princípios básicos da vida, e na sequência aproveitou para comemorar: “Hoje estamos usando este espaço que há muito tempo foi tomado da gente, da época do Street Rock, e atualmente muitas pessoas estão lutando pra conseguir este espaço de volta, e nós devemos fazer a nossa parte”. E soltou a voz: “Assim, todo último domingo de cada mês, vai ter “Rock Na Praça”!”.
Seguindo a tradição das bandas de mesmo gênero, o John Wayne tem como características instrumentais, um som bastante porrada e ao mesmo tempo técnico, que conta com afinações baixas. Entretanto, a dupla Júnior e Rogério tem melodia, principalmente nos solos e em alguns ‘licks’ de guitarra. Vale destacar também o trabalho impecável de Edu Garcia, principalmente no que diz respeito aos bumbos, já que ele sapateia nos pedais de forma precisa, ao melhor estilo Vinnie Paul (Hellyeah, ex-Pantera, Damage Plan, Rebel Meets Rebel) – não é de se estranhar que o cara toque no Unscarred, banda tributo ao Pantera. Voltando ao show, o álbum de estreia, “Tempestade” (2012), foi revisitado, então veio uma sequência formada pela música homônima e também por “Retrato Da Nossa Miséria”, “Ascensão” e “Lágrimas”.
Daí então foi a vez de mais uma do novo, “Recomeço”, até que, com uma hora cravada, o John Wayne encerrou seu show com outra do ‘debut’, “Aliança”, com direito até a um ‘wall of death’ organizado por Fábio. Do começo ao fim, os fãs do grupo cantaram todas as músicas e fizeram rodas e mais rodas, mostrando que o Brasil é um dos países mais fortes no que diz respeito ao Metalcore, e as bandas que cantam em português, como o próprio John Wayne e o Project 46, por exemplo, caíram nas graças de muita gente.
Uma das, senão a mais aguardada banda da noite se preparava enquanto Fabrício Ravelli subia ao palco para fazer os devidos agradecimentos, acompanhado de alguns dos apoiadores do evento, Marcelo Pimentel, Clayton Bartalo e Marcel Giovananni, dos coletivos Gang da 13, Live Metal Fest e Base Rock, respectivamente, mais o Redator-Chefe da ROADIE CREW, Ricardo Batalha. Fabrício agradeceu também a vocalista do Ajna, Tibet, do coletivo Quem Sabe Faz Autoral, que não pôde estar presente no palco, mas apareceu para conferir o evento. Após os recados, finalmente o Torture Squad foi anunciado, para delírio geral dos headbangers. O grupo está divulgando seu novo EP, “Return Of Evil”, com a nova formação que, além dos originais, Amílcar Christófaro (bateria) e Castor (baixo), agora é completada por Renê Simionato (guitarra – Em Ruínas, Guillotine, Bergenteif) e Mayara “Undead” Puertas (vocal – ex-Necromesis).
O início se deu com a introdução mecânica que faz parte do novo material, que nada mais era do que o baixo de Castor, com um fundo sombrio, soando tão sinistro quanto o de D.D. Verni do Overkill em “Horrorscope” (1991). Obviamente que abriram com a própria “Return Of Evil”, música longa e bem porrada, onde ficou evidente que agora, voltando a ser um quarteto, e tendo a voz gutural de Mayara à frente, O Torture Squad traz de volta as suas raízes Death Metal, deixando um pouco de lado a veia Thrash que vinha sendo explorada com o ‘line up’ anterior, que tinha André Evaristo na guitarra e vocal. Após o solo de “Return Of Evil” o som da guitarra de Rene sumiu, só que logo o problema foi resolvido e a banda tratou de emendá-la com “Pull The Trigger”, do conceitual e mais recente ‘full lenght’, “Esquadrão De Tortura” (2013), e com a clássica “Horror And Torture”.
Quando Mayara falou pela primeira vez com o público, salientou: “É muito importante pra gente tocar neste evento e ocupar as ruas de São Paulo com Metal”. E antes de tocar outra das novas, a vocalista pediu que todos agitassem, pois a música seria gravada para o novo videoclipe. Tratava-se de “Swallow Your Reality”, uma verdadeira cacetada, com ‘blast beats’ insanos de Amílcar, que dispensa maiores apresentações.
A veloz “Dreadful Lies” foi a última do EP a ser executada, ficando de fora apenas a instrumental “Iron Squad”. Daí para frente os headbangers foram bombardeados por outros clássicos antigos da banda, e devem ter ficado com seus pescoços doloridos durante a semana após o atentado que sofreram com “The Unholy Spell”, “Living For The Kill”, “No Escape From Hell” e “Chaos Corporation”, que deveria ter sido a última da noite. Mas o público ainda não se dava por satisfeito e clamou por mais. Prontamente a banda atendeu aos pedidos e Mayara comentou a respeito da música escolhida para encerrar a segunda edição do “Rock Na Praça”: “Essa próxima é para quem gosta das antigas e também para quem não é desse mundo!”. Essa deixa foi bem sacada para “Abduction Was The Case”
O Torture Squad saiu de cena sendo bastante saudado pelo público. A nova formação já está claramente bem entrosada e os novos integrantes acrescentaram muito peso à banda. Falando especificamente de Mayara Puertas, a vocalista tem muita potência na voz, uma performance impecável, e é bem comunicativa. Casou perfeitamente para o Torture Squad. Como aconteceu na primeira edição, Fabrício e Pompeu subiram ao palco, convidaram todos os músicos para a tradicional foto em conjunto e agradeceram o público que mais uma vez deu um belo exemplo de cidadania, curtindo cada momento sem causar nenhum tipo de transtorno. Vale dizer que roupas e alimentos foram arrecadados e doados para moradores de rua da região que, inclusive, se prontificaram a ajudar as pessoas que foram contratadas para a limpeza do local.
Durante a semana, músicos das quatro bandas atenderam a ROADIE CREW para comentar sobre o evento. Rogério Torres do John Wayne comemorou o sucesso dessa segunda edição: “O Rock Na Praça” foi um dos maiores festivais que o John Wayne já tocou. Foi uma experiência incrível. A organização foi impecável e o público interagiu com as bandas do início ao fim. Não presenciamos nenhuma briga ou confusão. Foi fantástico. O público do Metal realmente é demais!”. Já Fernando Oster do Woslom salientou a importância de tocar em um evento desse porte dentro da própria cidade natal da banda: “Tocar em nossa cidade e ter esse apoio todo da nossa cena local foi demais. O Fabrício Ravelli tem razão quando diz que nós precisamos ocupar o espaço público da nossa cidade e trazer um pouco mais da nossa cultura, a dos “camisetas pretas”, para as autoridades verem que podemos nos unir, fazer eventos e nos divertir, sem bagunça e sem incidentes. Espero que essa iniciativa faça com que olhem com mais atenção para nós!”. Amílcar Christófaro do Torture Squad pegou o gancho: “Para mim, não foi legal só o fato de ter tocado, mas sim de tocar na frente da Galeria Do Rock! É algo muito especial. Todos se sentem parte da cidade”. Mylena Monaco da Sinaya foi só elogios: “A união entre as bandas, a organização, a logística, o apoio e o respeito durante o evento foram muito gratificantes e isso foi mais uma prova de que não deve existir competição nesse meio. Posso dizer, com toda a certeza, que o “Rock Na Praça” não é apenas um evento de Metal gratuito, por trás dele há o suor e dedicação de muitos. A ideia também é reunir alguns integrantes das bandas que tocaram para levar a cultura Rock para espaços precários, captar doações nesses eventos e direcioná-las para instituições beneficentes, entre outros, tudo por meio da nossa cena”.
A palavra final foi do idealizador, Fabrício Ravelli: “Foi uma grande responsabilidade. Parecida quando você tem uma banda e grava o primeiro CD. O segundo tem que ser tão bom quanto, ou ainda melhor. Mas quando você acredita no que faz isso não é um peso, mas sim uma responsabilidade maior. O “Rock Na Praça” mostra cada vez mais que nossa cena é sim muito forte e unida, só precisa de iniciativas e tenho certeza que outras pessoas estão procurando fazer o mesmo. É preciso dizer que o “Rock Na Praça” tem a prerrogativa de levar ao conhecimento do poder público que a nossa cultura é um forte instrumento de inclusão, de desenvolvimento social e de educação por meio da nossa cultura e da nossa música. Por isso que sempre digo que o “Rock Na Praça” não é só um evento com grandes bandas que reúnem cinco mil pessoas para assisti-las, mas sim um projeto, que leva nossa cultura até para pessoas que não conhecem esse tipo de música ou que não sabem como funciona um show de Rock. Merecidamente é a vez do Rock ter uma programação na agenda da cidade e nós vamos levar isso até o poder público”.
TORTURE SQUAD – Setlist:
Intro
Return Of Evil
Pull The Trigger
Horror And Torture
Swallow Your Reality
Dreadful Lies
The Unholy Spell
Living For The Kill
No Escape From Hell
Chaos Corporation
Abduction Was The Case
JOHN WAYNE – Setlist:
Intro
Quatro Velas
Dois Lados – Parte I [Inferno]
Identidade
Caim
Pesadelo Real
Tempestade
Retrato Da Nossa Miséria
Ascensão
Lágrimas
Recomeço
Aliança
WOSLOM – Setlist:
Intro
Underworld Of Agression
A Near Life Experience
Beyond Inferno
Purgatory
Pray To Kill
Unleash Your Violence
Lapses Of Sin
Time To Rise
Mortal Effect
SINAYA – Setlist:
Intro
Pure Hate
Life Against Fate
Obscure Raids
Bath Of Memories
Coven Of Panic
Infernal Sight
Buried By Terror
Legion Of Demons