O mês de maio de 2019 foi sensacional, especialmente se você é fã de rock/metal, e curte apresentações ao vivo. O mês já começou incrível na Capital Paulista, logo na primeira noite do mês tivemos a chance de conferir ao vivo os italianos do Fleshgod Apocalypse destruindo o palco do The House, ao lado dos finlandeses do Wolfheart, que estreava por aqui. O mês seguiu cheio de atrações, com Blackberry Smoke, Mark Farner, Vuur, Cradle Of Filth, Graveyad… Sério, foram tantos shows e tão variados que às vezes precisamos conferir na lista para lembrar de tudo o que rolou. E, já que em maio tudo começou em alto estilo na The House, nada mais justo que encerrar em grande estilo, na mesma casa de shows.
Para dar início a celebração de encerramento deste mês incrível, os equatorianos do TOTAL DEATH tomaram o palco. Ainda pouco conhecidos do público brasileiro, eles tiveram de encarar a difícil missão de abrir o show de uma das bandas extremas mais conhecidas e amadas pelos paulistanos, e isso pode ser um pouco intimidador. Mas, se estavam intimidados com a grandiosidade de sua tarefa, Ider Farfan (guitarra e voz) e seus companheiros de banda não deram mostras. O show começou com Intento, a faixa de abertura de seu álbum completo mais recente, Inmerso en la Sangre, de 2014. Logo de cara, se percebia que o Total Death não é uma banda que segue pelos trilhos mais primitivos do metal extremo, mas que agrega ao primitivismo sonoro dos antigos mestres um algo de gótico e até progressivo, criando uma sonoridade única, e bem por isso, nada caricata.
Assim, a banda acabou agradando bem mais do que poderíamos imaginar. Olvida (também do álbum mais recente) e a antiga Cenit de la Esperanza (que apareceu no split Ecuador Subterráneo, de 1997) mantiveram o clima denso e lúgubre da apresentação, e em certos momentos confesso ter me pegado pensando em como seria legal assistir um show do Total Death ao lado do português Moonspell. Talvez um dia tenhamos essa chance, mas o momento de divagação logo foi encerrado, pois a banda tinha uma de suas melhores composições na sequência My Suicide Light, que fecha o álbum de 2010, Somatic. Por um instante, a apresentação soou quase como um rito fúnebre, e o olhar quase tétrico do público em direção ao palco mostrou que os equatorianos conquistaram alguns fãs nesta apresentação. Por fim, a celebração do extremismo latino terminou com Nunca, e a banda deixou o palco sob aplausos. Um belo show, que esperamos não demore para ganhar uma ‘atualização’ por estas terras.
Então, era a vez da atração principal, o poderoso ROTTING CHRIST. Considerados com toda justiça como pais do metal helênico, os irmãos Themis (bateria) e Sakis Tolis (guitarra e voz) são venerados em todo o mundo, e acabam de trazer aos nossos ouvidos a décima-terceira oferta de estúdio de sua banda principal, o ótimo The Heretics. E foi justamente com uma faixa deste novo álbum que a apresentação teve início, com a arrastada e climática Hallowed Be Thy Name, que, pode acreditar, soa ainda mais densa (e tensa!) ao vivo, quando acompanhada pelos gritos de uma plateia que neste momento já lotava a casa.
Após a ‘benção’ tradicional de Sakis Tolis sobre os presentes, Kata ton Daimona Eaytoy, faixa-título do álbum de 2013, trouxe um clima mais rápido e extremo para a apresentação, com Themis Tolis empilhando blast-beat sobre blast-beat, um espetáculo de força e fúria, digno da história de um dos pais do black metal grego. Mas, se aquilo que você esperava era ver os antigos clássicos, saiba que eles estariam sim presentes, apenas tenha um pouco de paciência, afinal, estamos falando de uma banda com mais de trinta anos de história. Após perguntar aos berros se estávamos nos divertindo, mais uma do novo álbum, a impactante Fire, God and Fear. A curta introdução, cortada abruptamente pelo riff seco e ríspido da guitarra de Giannis Kalamatas trouxe uma das melhores canções do novo álbum para apreciação, obtendo uma ótima acolhida. Da minha parte, admito, estava esperando para conferir o incrível solo de guitarra, um dos melhores da carreira dos gregos.
Sakis aproveitou Elthe Kyrie para ‘passear’ pelo palco e saudar os presentes, distribuindo saudações para aqueles que estavam mais próximos do palco. Apage Satana é mais ‘hino’ do que música, e manteve Rituals (2016) na jogada, mas as atenções voltaram para The Heretics com a emblemática Dies Irae. Mas, enfim era chegada a hora da naftalina, a hora de revirar o guarda-roupas para encontrar aquela jaqueta antiga que serve ainda melhor do que as novas, se você me entende. Sakis, de forma casual e despreocupada anunciou, ‘vamos começar a tocar algumas músicas antigas agora, tudo bem para vocês?’. Acho que você pode imaginar o que o público respondeu, e The Forest of N’Gai veio diretamente do EP clássico Passage To Arcturo (1991) e ganhou a plateia ainda antes de soar o primeiro acorde. Nada como um pouco de metal extremo clássico, não é mesmo?
Se para muitos a noite já tinha valido a pena, os gregos ainda tinham muito para apresentar, e King Of A Stellar War (Triarchy Of The Lost Lovers, 1996), Grandis Spiritus Diavolos e Under the Name of Legion representaram momentos diferentes na carreira da banda, mas sempre recebendo acolhida calorosa do público. Mas, o que pode ser dito de um encerramento de apresentação que traz dois dos maiores clássicos do repertório, The Sign of Evil Existence (Thy Mighty Contract, 1993) e Non Serviam (Non Serviam, 1994)? Simples, é aquilo que já disse outras vezes, e que volto a repetir aqui: se uma banda clássica do metal grego toca em sua cidade, você não pensa, você vai ao show. Simples assim.