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SEPULTURA | RAIMUNDOS – São José (SC)

Por Alessandro Bonassoli

Fotos : Dudu na Festa

Era para ter sido em 18 de fevereiro, mas a pandemia acabou provocando o adiamento do reencontro de Sepultura e Raimundos em Santa Catarina para a noite do último sábado, 20 de agosto. As bandas que tocaram com o Ramones na histórica “Acid Chaos Tour”, em 1994, voltaram a compartilhar o mesmo palco, agora no imponente Hard Rock Live Florianópolis, com seu palco de 540 metros quadrados e 24 metros de boca de cena.

Exatamente às 22h14, a pesada Baile Funky abriu o desfile de sucessos do Raimundos, já puxando Mato Véio e o Pão da Minha Prima. Foi o suficiente para mostrar que a conexão entre o grupo brasiliense e o público de Florianópolis ainda é a mesma da década de 1990, no auge da carreira do quarteto. Não à toa, Digão disse em alto e bom som “como é bom tocar em casa”.

Ainda que boa parte do público headbanger torça o nariz para o Raimundos – para muitos, só mais uma banda pop –, o antídoto para o radicalismo veio com Be a Bá, cujo final teve um cabuloso trecho de Raining Blood. Sim, do Slayer! O porrete continuou descendo com Palhas do Coqueiro seguida por um wall of death convocado por Digão. Foi bacana ver alguns xiitas boquiabertos no meio da galera, assustados com o fato de, mesmo que tenha características de música pop, na real, Raimundos faz é um som pesado de qualidade. Nega Jurema e Rapante – onde rolaram dois moshpits poderosos – subiram tanto o volume que, provavelmente, a turma dos “anti” sequer notou que Digão, Canisso, Marquim e Caio Cunha, também mandaram ver 20 e Poucos Anos, clássico de Fábio Júnior que o grupo gravou para um reality show da extinta MTV Brasil.

Com Pompem começou a sessão que, certamente, irritou os xiitas. O modo “acessibilidade” para o público não metal contou ainda com Reggae do Manêro e o hit I Say You Saying (That You Say That You Saw). Entre elas, o vocalista lembrou da tour de 1994 com o Sepultura e sugeriu uma nova versão, agora com Marky Ramone. Alô, produtores! #ficaadica. Mais tarde, Andreas Kisser também citaria aquela histórica noite.

Mal acabou Pitando No Kombão, o público pediu e ganhou Blitzkrieg Bop, dos Ramones. “Floripa é um sonho”, citou Digão para conquistar o público de vez, se é que alguém no Hard Rock Live Florianópolis ainda não tinha simpatia pelo quarteto.

A segunda sessão das faixas mais “radiofônicas” uniu Me Lambe, Lugar ao Sol (do Charlie Brown Jr.), A Mais Pedida e Mulher de Fases. Foi o último descanso, pois na fase final Puteiro em João Pessoa (cantada em uníssono pelo público), Herbocinética e Esporrou na Manivela fizeram o clima ferver novamente. O inusitado cover de Aerials, do System Of A Down, foi uma grata surpresa, enquanto Eu Quero Ver o Oco fechou a apresentação em alto nível.

Em cerca de 30 minutos, a equipe da atração principal remontou o cenário. Um dos mais simples e eficientes que já vi. No backdrop, todo em preto, em tamanho “imenso”, a ilustração da capa de Quadra, o álbum mais recente do Sepultura.  Com o jogo de luzes sobre a arte, não havia como não se impressionar. O tempo todo me lembrei do mesmo recurso utilizado pela banda na tour de Roots (1996). Quando o relógio mostrou que o 14º minuto do domingo já era realidade, veio do sistema de som do Hard Rock Live Florianópolis a versão original de Polícia, dos Titãs, que Andreas Kisser, Paulo Jr. e os irmãos Cavalera gravaram na edição nacional de Chaos A.D. (1993).

Era a senha para Isolation encerrar, finalmente, um jejum de oito longos anos sem que o maior nome da música pesada brasileira voltasse para Floripa. Territory levou a galera ao delírio, puxando Means To An End e Capital Enslavement, duas das mais fortes de Quadra. No lado esquerdo do palco, Paulo Jr. mantinha sua costumeira discrição, mas com a firmeza do único remanescente da formação original da banda. Ao fundo, na batera, Eloy Casagrande parecia ter uns 22 braços. É impressionante como ele une técnica e porrada com a facilidade de quem toma uma xícara de café enquanto folheia um jornal em uma descompromissada manhã de domingo. Na direita, Andreas Kisser, um gigante do metal nacional. Solos e riffs apresentados com a mesma fúria dos tempos em que ele substituiu Jario Guedz, levando a pegada thrash metal para o grupo, ainda na era do fundamental Schizophrenia (1987). Ao centro, Derrick Green esbanjava presença de palco e carisma com o público. Também, são 24 anos no Sepultura, nem poderia ser diferente. Que me perdoem as “viúvas” de Max Cavalera, mas Derrick é Sepultura sim!

A faixa-título de Kairos (2009) puxou uma série de antigas. Mas foram a pesadíssima versão de Propaganda (de 1993) e a emblemática Dead Embryonic Cells (de 1991) que fizeram o público ferver em moshpits intensos. Ao retor era fácil notar várias famílias. Pais e mães com filhos, no fundamental ritual de dar continuidade e criar uma renovação de público. Meninos e meninas de 13, 14 anos, curtindo com alegria uma saudável e segura noite heavy metal.

O belo dedilhado no violão que introduz Guardians Of Earth tornou ainda mais impactante a questão do cenário citada acima, principalmente pelos trechos mais épicos e intrincados dos arranjos, que se complementam com o jogo de luzes e cores da iluminação de palco. É sempre difícil fazer exercícios de futurologia, mas arrisco dizer que esta música permanecerá no setlist do Sepultura por muitos anos. Last Time, outra recente, assegurou mais uma sessão ‘from hell’, com a agressividade sonora alcançando um nível ainda superior quando Cut-Thoath, do revolucionário Roots (1996), veio em seguida.

Era hora de outro salto no tempo e, quem acompanha a carreira do Sepultura, foi transportado para 2003. Corrupted, uma das mais bacanas do subestimado álbum Roorback, foi outro ponto alto da apresentação. E a “máquina do tempo” continuou com Machine Messiah (2017) e a espetacular Infected Voice (1991), quando o pescoço deste redator deu provas que, aos 49 anos de idade, ainda é possível agitar como você fazia aos 19 anos. A bela Agony Of Defeat, uma das mais calmas do catálogo do Sepultura – bem, “calma” dentro do padrão Sepultura, claro – foi uma surpresa. É daquelas que, quanto mais se escuta, mais se tem vontade de ouvir novamente.

Iniciava então a reta final, com a dobradinha vitoriosa das antológicas Refuse/Resist e Arise. A tradicional saída do palco seguida pelo retorno a ele para o “bis” garantiu ainda uma descontraída interação de Andreas e Eloy com trechos de Walk This Way, do Aerosmith, e Owner Of A Lonely Heart, do Yes. Era a deixa para o encerramento, com Ratamahatta e Roots Bloody Roots. Senti falta de Escape To The Void, Troops Of Doom e Inner Self, mas não se pode reclamar, afinal não há como encaixar todas as favoritas dos fãs em uma só noite. E, ainda bem, o Sepultura faz questão de, a cada tour, tocar músicas novas, ao contrário da maioria das bandas. Fecho a resenha deixando o pedido para a banda e aos produtores do show: não deixem o público de Florianópolis esperar outros oito anos para rever o Sepultura.

Setlist Raimundos

Baile Funky

Só no Forevis

Mato Véio

O Pão da Minha Prima

Be A Bá (mais trecho de Raining Blood)

Palhas do Roqueiro

Nega Jurema

Rapante

20 e Poucos Anos

Pompem

Reggae do Manêro

I Saw You Saying (That You Say That You Saw)

Pitando no Kombão

Blitzkrieg Bop

Me Lambe

Lugar Ao Sol

A Mais Pedida

Mulher de Fases

Puteiro em João Pessoa

Herbocinética

Esporrei na Manivela

Aerials

Eu Quero Ver o Oco

Setlist Sepultura

Isolation

Territory

Means To An End

Capital Enslavement

Kairos

Propaganda

Dead Embryonic Cells

Guardians Of Earth

Last Time

Cut-Throat

Corrupted

Machine Messiah

Infected Voice

Agony Of Defeat

Refuse/Resist

Arise

Ratamahatta

Roots Bloody Roots

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