Texto e fotos por Leandro Nogueira Coppi
Prestes a lançar o décimo quarto álbum de inéditas de sua carreira, Machine Messiah, o Sepultura encerrou as gravações do primeiro videoclipe do novo álbum, que está sendo feito para a música que será o carro-chefe, “Phantom Self”. Foram apenas dois dias de gravações e, a convite da própria banda, a ROADIE CREW esteve presente no segundo para conferir Derrick Green (vocal), Andreas Kisser (guitarra), Paulo Jr. (baixo) e Eloy Casagrande (bateria) gravando seus ‘takes’.
Nos intervalos entre uma cena e outra, conversamos com Kisser e Green, que nos contaram vários detalhes sobre o videoclipe e também sobre a música e o novo álbum de maneira geral. “Não é uma ideia ‘sci-fi’ futurista, é mais sobre o que a gente vê hoje em dia mesmo”, afirmou Andreas Kisser. “É um clipe em que o principal é a história. Ele vai misturar a performance da banda – muito pouca, por sinal – com alguns personagens que irão mostrar a relação do ser humano com robôs, telefones, próteses, óculos especiais… Enfim, sempre existe alguém procurando alguma vantagem, ser o mais rápido, conseguir enxergar mais longe, tudo isso através das máquinas”, revelou o guitarrista. “A banda entra em um processo de mostrar que o caminho para você ter um acesso mais sensorial seria o contato com a natureza, o desenvolvimento do cérebro, uma coisa mais humana realmente. As pessoas estão procurando ter certas vantagens através das máquinas e a gente quer mostrar que o caminho não é esse. No final do vídeo tem essa surpresa de mostrar o Messias e essa relação do que seria a tal salvação – se ela está dentro de nós, se cada um desenvolveria e assumiria certos erros para crescer ou se jogariam tudo num robô, num Messias, numa religião, esperando que as coisas venham de fora e se resolvam praticamente sozinhas”, prosseguiu Kisser. “Machine Messiah é um pouco disso e Phantom Self mostra parte da relação de cada um desses personagens com a robótica e também aquilo que estão almejando em suas vidas. A gente tem o conceito de uma máscara e iremos apresentar esse Messias através de um processo de efeitos especiais, de animação. Tem a parte dos atores e a gente também fará parte do elenco, não iremos só tocar”, detalhou.
Derrick Green contou sobre a temática abordada na letra de Phantom Self: “É uma música interessante, sobre um jovem que sofreu um acidente e teve perda completas de sua personalidade. Ele carrega um fantasma que o persegue com seu passado. No geral, a letra é sobre como lidar com o passado e a tecnologia. Fala de como ser capaz de tirar vantagem dessa química entre mudanças completas de personalidade e a tecnologia. E a tecnologia usada nesse caso de perda de memória e para coisas desse tipo, é algo muito interessante.”
Quanto ao conceito do álbum, ele foi inspirado no processo de robotização. Kisser explicou: “Eu trouxe o nome Machine Messiah e a gente começou a conversar a respeito. Dentro da banda temos duas opiniões diferentes e isso é do caralho. Tem que haver um equilíbrio entre as coisas, analisar os lados positivos e negativos, se somos escravos dos robôs ou se eles podem ser nossos aliados.” E Andreas revela do que a gente vê hoje em dia: “Apesar de o álbum ter esse conceito do Messias que ‘está por vir’, é mais sobre o dia a dia que vemos atualmente: chips, Google Glasses, próteses, GPSs, smartphones, computadores, enfim, tudo isso que faz parte da gente atualmente. Até que ponto isso tudo ajuda ou prejudica a médio ou a longo prazo? Até onde chegaremos se nos robotizarmos completamente ou se exercitarmos esse lado humano, esse contato com a natureza que é tão diversa, sensorial? Eu observo muito os animais. Por exemplo, quando aconteceu o tsunami na Indonésia e na Tailândia em 2004, os elefantes já haviam corrido para regiões mais altas muito antes de a sirene tocar para os seres humanos saberem que alguma coisa estava errada. A águia tem como enxergar com um alcance muito maior, um cachorro tem o lance do faro… Então, acho que o ser humano poderia desenvolver mais se ele não estivesse tão ocupado com nossos robôs.”
Kisser ainda esclareceu se há relação entre o tema principal de Machine Messiah e a religião: “Não é uma questão de crenças, mas sim de possibilidades. Se você analisar de uma forma mais ampla, existem várias religiões. Temos o privilégio de viajar o mundo, já tocamos em inúmeros países, de tudo que é tipo de religião, de política, de ditadura e os pontos de vista são muito diversos. Não é uma questão de crença nossa, mas de realidade, do dia a dia atual, da relação que temos com nossos filhos, com nossa família, com nossos amigos, de como a gente viaja, de como fazemos o ‘check in’, ou seja, de coisas que os robôs estão tomando conta e em relação a muitas delas nós não temos mais tanto poder de argumento, de negociação, de você tentar fazer algo, de respeitar o momento. Você perde muito disso com o robô. Em suma, é mais sobre essa relação do dia a dia, da percepção de viver o hoje e não de imaginar o futuro.” Ele prossegue: “Tudo bem que essa ideia do Messias tem uma concepção religiosa, mas esse não é o ponto. Se esse robô voltar, qual religião ele vai representar? Depende do que você colocar de informação nele. É como aconteceu com a gente. Dependendo da escola que eu ou você estudamos, do seu lar ou do meu, nossa concepção será totalmente diferente. De certa forma, somos robotizados. O coração e a intuição, algo mais humano como a percepção, o olhar, aquela coisa da conquista, estão se perdendo. Acho que nossa preocupação é mais com esse equilíbrio entre nossa relação com os robôs e até que ponto temos como evoluir nossa relação com a natureza.”
Amante de futebol, Andreas traçou um paralelo entre esse esporte e o conceito de Machine Messiah: “Hoje a garotada vai a uma quadra fechada, a uma escolinha com professor, não é mais aquela coisa de amizade. Futebol era uma paixão, mas além da coisa de rua e de fazer o gol, havia o contato, você ia à casa do colega tomar uma limonada. Hoje o lance são os ‘youtubers’, algo que é impressionante. Não conheço nenhum, mas meu filho de 11 anos conhece todos. Ele acompanha umas coisas de futebol e de videogame e esses canais têm milhões de seguidores. Mas é aquele negócio, tudo ali está preso na telinha. O Messias seria essa procura de solução de fora para dentro”. E, por falar dessa robotização nas novas gerações, Andreas Kisser deu seu parecer: “É uma questão de educação. A educação de hoje cria robôs. O cara tem que passar no vestibular pra pagar contas, pra manter o sistema funcionando. Não tem mais o respeito pelo talento, pela ambição ou pelo tempo de cada um. Você pega uns dez meninos e vê que eles evoluem de maneira e em tempos diferentes uns do outros. Não existe um respeito por isso. Quanto mais a gente souber além do que é a lua, de qual é a interação que uma árvore tem com um peixe, melhor, porque tudo isso existe, mas cada vez estamos mais afastados como parte da natureza, estamos perdendo essa conexão. Deveríamos investir mais nesse aspecto educacional. Quanto ao equilíbrio, estamos trabalhando mais as máquinas e menos o tutano!”
Sobre a música em si, Kisser explicou Phantom Self: “Ela tem todos esses elementos que a gente vai sentir durante todo o disco. Ela é a terceira faixa do álbum e começa com uma introdução de maracatu e violinos, o que significa que tem uma parte instrumental grande e bastante elaborada. A letra dela é mais direta, tem um refrão forte, ou seja, ela é uma música mais completa.”
O guitarrista também falou sobre a capa de Machine Messiah, assinada pela artista filipina Camille Dela Rosa: “Como tem também esse lance de Messias, essa conotação religiosa, a capa mostra o conceito da ilustração ‘Deus Ex-Machina’, na qual quem criou tudo foi uma máquina, um extraterrestre. Phantom Self trata disso e o clipe dela vai dar uma geral do que a gente fala no disco inteiro. Essa música conta a história de um cara que mudou o intelecto após um acidente de carro, virou outra pessoa.” E prossegue: “Nesse clipe mostraremos algumas pessoas querendo meio que ser um robô, vendo as coisas através da máquina, enquanto a gente, como músicos com nossos instrumentos, mostramos que elas não precisam ter uma perna mecânica, elas podem pôr o pé na areia, sentir a água, como se fossemos um condutor com a natureza, a realidade. Nossa ideia é dar uns toques como: ‘Tira o Google Glass e vai pra uma praia; guarda o celular quando você estiver em um show e curta o que está assistindo.’ Esse lance de show, a galera está filmando e não consegue sentir realmente essa relação direta do palco, já que ela tenta passar pela telinha do celular.”
Segundo Andreas Kisser, a intenção é lançar o videoclipe de Phantom Self antes mesmo de Machine Messiah chegar ao mercado. O álbum estará disponível em 13 de janeiro de 2017 via Nuclear Blast. Um ‘lyric video’ para o single digital I Am The Enemy também está sendo preparado.