Quando falamos de death metal norte-americano, é quase impossível não sucumbir à tentação de falar sobre as bandas que fizeram história na Costa Leste do país, especialmente aquelas que transformaram a Flórida em sinônimo do gênero nas décadas de 80 e 90. Porém, do outro lado do país, na Costa Oeste, sempre houveram muitas ótimas bandas. Desde as lendárias Possessed, Terrorizer e Autopsy, passando por Deeds Of Flesh, Decrepit Birth e Exhumed, até desembocar em Cattle Decapitation, Vastum e toda a moderna cena, a Califórnia sempre apresentou algo de único ao estilo, e esta chama parece ainda muito longe da extinção. Surgido em Whittier em 2011, o Skeletal Remains é mais um dos grupos que chegou para reforçar o legado californiano, e desde seu primeiro álbum, Beyond The Flesh (2012) vem se provando como um dos melhores nomes do cenário. Chegando agora ao seu quarto álbum completo de estúdio, The Entombment Of Chaos, o grupo passou por transformações, mas que sempre permaneceu sob a liderança de Chris Monroy (voz, guitarra), que nos atendeu para falar sobre as antigas e novas odisseias da ‘congregação da carne’.
Qual foi a banda responsável por colocar você no mundo do death metal?
Chris Monroy: A primeira banda de death metal que eu ouvi na minha vida foi o Cannibal Corpse. E foi engraçado, porque eu odiei aquilo (risos). A verdade é que naquela época eu estava muito conectado com o metal mais clássico, mal tinha começado a ouvir coisas um pouco mais pesadas como o Metallica e Slayer, o meu lance era meio suave naqueles dias (risos). Quando ouvi o Cannibal Corpse, aquilo pareceu extremo demais para mim, aqueles vocais realmente eram agressivos demais, o timbre era muito baixo, não cativou minha atenção. Mas aquela pequena fagulha thrash acendida em mim pelo Metallica e o Slayer acabaram por me guiar mais profundamente nos caminhos do thrash, e então entrei em contato com os discos do Demolition Hammer, Solstice, Devastation e Sepultura, e todas essas bandas tinham elementos de death metal em sua música. Esse foi o ponto de virada para mim. Então, vai parecer um pouco estranho e até controverso para as pessoas, pois não temos ali vocais guturais e vários aspectos clássicos do death metal, mas o disco que me colocou dentro do gênero definitivamente foi o Hell Awaits, do Slayer. Tudo estava ali: agressão, velocidade, riffs e solos matadores, bateria explosiva, letras maníacas… Esse disco me colocou no mundo do metal extremo. Mas não deixa de ser curioso pensar que hoje o Cannibal Corpse é uma das minhas principais influências e uma das minhas bandas favoritas (risos).
Legal você falar das suas raízes no thrash, já que eu ia mesmo perguntar sobre sua experiência no Fueled By Fire. O quanto a sua passagem por aquela banda ajudou a tomar melhores decisões no Skeletal Remains?
Chris: Eu acho que uma das grandes contribuições, quer dizer, meu grande aprendizado no Fueled By Fire foi no aspecto dos negócios. Eu tinha dezesseis ou dezessete anos naquela época, eu só queria sair e me divertir, mas sair em turnê envolve muito mais negócios do que diversão, infelizmente (risos). Você procura diversão e realmente encontra, mas a verdade é que quando está com a sua banda, você quer ser o mais profissional possível, você não quer fazer uma apresentação terrível por estar bêbado demais. No Fueled By Fire eu tive a chance de aprender a separar as coisas, eu queria sair e beber com a galera que aparecia nos shows, queria me divertir, mas existe a hora certa para isso. No fim, foi uma ótima experiência na minha vida, toquei ótimos shows, conheci pessoas muito legais, como os caras do Violator e tantas outras bandas que admiro muito. Foi um longo aprendizado, e com ótimas músicas, mas chegou um momento em que eu queria dar um passo mais largo. Eu queria tocar as minhas próprias músicas, queria ter a minha banda, e foi por isso que o Skeletal Remains nasceu.
Sim, e o Skeletal Remains já está chegando ao quarto álbum completo, The Entombment Of Chaos. Engraçado pensar que duas bandas que você citou como referências, Demolition Hammer e Devastation, ainda não possuem um quarto álbum, mesmo depois de 30 anos…
Chris: Pois é, isso é uma loucura… Acho que eles pegaram um período realmente complicado para uma banda nesses moldes, aquele período dos anos 90 foi duro para muitas bandas. Quer dizer, ainda é brutal, precisamos de muito trabalho e estresse para chegar onde chegamos, mas sinto que valeu a pena cada momento. Tem sido uma experiência incrível, chegamos a um posto que nunca imaginei, e mal posso esperar pelos próximos passos.
Bem, vocês têm feito um ótimo trabalho na reabilitação daquela visão clássica do old school death metal. Além da música propriamente dita, vocês têm escolhido trabalhar com lendas do estilo, como é o caso de Dan Seagrave, que é o autor das capas de muitos dos meus discos favoritos.
Chris: Sim, ele trabalhou em tantos clássicos que é quase impossível mencionar todos, e essa é basicamente a razão pela qual fizemos questão de trabalhar com ele. A verdade é que eu queria ter trabalhado com ele desde o nosso primeiro álbum, mas ele não é exatamente um artista barato, então fica bem complicado para uma banda iniciante, sem um grande aporte da gravadora. Não pudemos ter ele em Beyond The Flesh (2012) ou Condemned To Misery (2015), pois estávamos em um selo pequeno (N.R: F.D.A. Records) e tudo tinha que sair do nosso próprio bolso, mas assim que chegamos na Century Media as coisas ficaram mais claras, e trabalhamos com Seagrave desde Devouring Mortality (2018). Sério, é como um sonho se tornando realidade.
Imagino que seja semelhante a sensação de trabalhar em estúdio com Dan Swanö…
Chris: Ah, cara, nem me fale… Quer dizer, olha o currículo desse cara, ele vem de bandas como Edge Of Sanity, Infestdead, Bloodbath, Nightingale, Whiterscape, e tem trabalhado com Asphyx, Incantation, Pestilence e todas as bandas legais do cenário em todos os estilos, ele tem um conhecimento imenso, e poder contar com ele em um disco nosso é absolutamente incrível! E eu sinto que ele entende o Skeletal Remains, ele sabe onde queremos chegar desde o primeiro minuto de trabalho, e nos entrega exatamente a sonoridade que tínhamos em mente com brilho extra. Além de tudo, é uma pessoa incrível, um profissional acima da média e que não tem um pingo de egocentrismo, adoramos trabalhar com ele. Foi uma honra trabalhar com Seagrave e Swanö, e sinto que esta não foi a última vez que trabalhamos juntos. Sinto que ainda tem muito vindo dessas parcerias.
Muito bom, e melhor ainda quando ouvimos o álbum e percebemos que a boa impressão não se resume à imagem… As guitarras soam excelentes na sua música, os riffs certeiros, os solos baseados na alavanca, como Jack Owen e Bob Rusay faziam nos álbuns antigos do Cannibal Corpse, aquele tremolo típico de Rick Rozz no Death… Grandes referências aqui também!
Chris: Muito obrigado, meu amigo, fico feliz que tenha gostado, e posso te dizer que foi um trabalho grandioso para conseguirmos essa sonoridade (risos). Quer dizer, é um pouco mais complicado para mim, já que tenho que dividir a minha atenção com os vocais. Eu trabalho com certa variação na voz, então sinto que não consigo entregar meu potencial completo na guitarra, e essa é uma das principais mudanças que temos neste The Entombment Of Chaos, já que no álbum anterior eu trabalhei em todas as partes de guitarra, seja base ou solos. Aqui não, desta vez temos um time completo, e isso além de gerar mais variação na hora de compor, também é fundamental na hora de executar as ideias. Foi trabalhoso, então, obrigado mesmo por destacar essa parte.
Também imagino que tenha sido ótimo trabalhar novamente com Mike De La O, certo?
Chris: Sim, foi incrível, e uma coisa que eu sempre quis fazer, meu amigo. Sabe, ele esteve comigo nos primeiros dias do Skeletal Remains, mas nunca havia gravado um álbum conosco. Antes de gravarmos o nosso primeiro álbum ele precisou sair da banda, mas finalmente temos ele de volta, e isso já transparece na forma como abordamos as guitarras em The Entombment Of Chaos, então eu não poderia estar mais satisfeito.
Não tem erro quando mesclamos solos com alavanca e riffs pungentes em death metal.
Chris: É verdade, é a mistura perfeita, e mergulhamos fundo nisso neste novo álbum. É mais ou menos como o Death, o som era perfeito porque lá você tinha Chuck Schuldiner com uma abordagem mais técnica e melódica, e junto dele Rick Rozz arregaçando tudo com a alavanca (risos), não tem como ser melhor que isso!
Uma das músicas que destacam tudo o que falamos é Congregation Of Flesh, uma das minhas favoritas aqui.
Chris: É uma das minhas favoritas também, e foi uma das que escrevi para este novo álbum. Essa música tem aquele groove típico do death metal dos anos 90, e ajuda a termos um álbum mais dinâmico dessa vez.
Falando em dinâmica, Eternal Hatred é um novo universo comparada as demais.
Chris: Sim, e nessa canção temos muito mais daquele sentimento do doom, e quisemos tentar algumas coisas novas nela também. Foi a primeira vez que usamos vocais limpos em uma música, e estávamos ansiosos para saber como os fãs encarariam isso. Até agora, sem problemas, pois todos entenderam que não vamos abusar disso no futuro (risos gerais).