Um final de semana simplesmente histórico para o Heavy Metal nacional ocorreu nos dias 24 e 25 de julho, pois o Sesc Belenzinho recebeu o evento que celebrou três décadas do lançamento da lendária coletânea “SP Metal”, que foi uma empreitada que surgiu a partir da ideia de Luiz Carlos Calanca, dono da gravadora independente Baratos Afins que, na falta de dinheiro para gravar um disco de cada banda que tinha em mente, resolveu reuni-las em dois volumes do projeto. Na primeira edição, lançada em 1984, marcaram presença Avenger, Salário Mínimo, Centúrias e Vírus, enquanto na segunda, que foi ao mercado no ano seguinte, uniram-se Abutre, Santuário, Korzus e Performances. Há dois dados curiosos a respeito. Um é sobre o fato de que a princípio a coletânea seria lançada como álbum duplo, mas como na época um disco custava muito caro (e ainda custa!) para os consumidores, foi decidido por Calanca lançar em volumes separados. E o outro é que das bandas escolhidas o Korzus entrou na vaga deixada pelo Cérbero, que acabou não participando porque estava fora do país, tornando-se a primeira banda brasileira a se aventurar no exterior.
Há de se ressaltar que naquela época o Brasil ainda engatinhava em termos de Heavy Metal e dispunha de poucos lançamentos no mercado. Com isso, entre 1984 e 1985, tornou-se viável apostar em splits e coletâneas como a “SP Metal”, em vários cantos do país. No Rio de Janeiro, a Dorsal Atlântica e o Metalmorphose juntaram suas forças em “Ultimatum”; Minas Gerais contou com Sepultura e Overdose fazendo o mesmo no Split “Bestial Devastation” e “Século XX”; e o Rio Grande do Sul disponibilizou as coletâneas “Rock Garagem Volume I e II” e “Porto Alegre Rock”, que contavam com diversas bandas no cast.
Voltando a falar do evento, das oito bandas que integraram os dois volumes de “SP Metal” apenas Performances e Avenger não fizeram parte da festa. Em contrapartida, Vírus, Abutre e Santuário retornaram após vários anos, apenas para participar da celebração. A primeira noite representou a edição número um e contou com os shows do Centúrias, Salário Mínimo e Vírus. Com boa divulgação da mídia e ingressos com preços acessíveis que, consequentemente foram todos vendidos, a comedoria do Sesc Belenzinho recebeu cerca de 600 pessoas de várias gerações.
E elas se empolgaram quando às 21h30, viram, após muitos anos, ou pela primeira vez, o Vírus subir em um palco. O grupo deu início com “Ignis”, seguida da conhecida “Matthew Hopkins” que foi cantada por muitos, já que essa foi uma das duas músicas que o grupo registrou na coletânea. Entre os que participaram das gravações, estavam Flávio de Barros (vocal) e os guitarristas Fernando “Piu” e Renato De Barros, que vieram acompanhados pela cozinha formada por Déio (baixo) e Lucio Del Cielo (bateria).
Flávio mostrou carisma e bastante empolgação por estar tocando após tanto tempo. E quem também chamou a atenção dos presentes foi o guitarrista Fernando “Piu”, que continua tocando muito bem – na época, era chamado de Fernando “Piu Blackmore” devido à sua nítida influência de Richie Blackmore. O set seguiu com “Povo Do Céu”, “Sacrifício” e “O Eremita”, esta última tendo Renato prejudicado por algumas falhas que surgiram no som de sua guitarra. Devido a exigência do Sesc, os shows foram curtos, com cerca de meia hora, e então o Vírus se despediu com a outra música que gravou na coletânea: “Batalha No Setor Antares”. Emocionante! É, eles poderiam pensar seriamente em um retorno às atividades ou ao menos registrar um álbum.
Passados 20 minutos após a equipe de palco preparar o terreno, o Salário Mínimosurgiu com China Lee (vocal) e Junior Muzzili (guitarra), que participaram das gravações na época, além de Daniel Beretta (guitarra), Diego Lessa (baixo) e Marcelo Campos (bateria). Com o público na mão, a banda entrou detonando com a ótima trinca “Delírio Estelar”, “Beijo Fatal” e “Anjos da Escuridão”, que contou com o coro da plateia.
Na primeira pausa, China enfatizou “o quão legal estava sendo comemorar os 30 anos desse grande LP, que é como os velhinhos chamam”, brincou. Em “Noite De Rock”, com seu refrão grudento e cozinha pulsante, ficou legal a paradinha feita no meio dela para a plateia novamente participar cantando o refrão. Essa interação proporcionada entre banda e público é algo muito legal de se ver ao vivo. Ao final dessa, China apresentou a banda e dedicou o show ao ex-baterista, o saudoso Bea Junior.
Mas o momento mais legal da apresentação do Salário foi o encerramento com “Cabeça Metal” que, assim como “Delírio Estelar”, integrou o “SP Metal”. Além de Paulão Thomaz, baterista do Centúrias na época, ter subido para cantar junto, China trouxe ao palco a sua filhinha Manuela Lee. Um final muito bacana. Vale ressaltar que outras crianças estavam presentes e se divertiram no evento.
A última banda a se apresentar foi o Centúrias, que às 23h chegou com tudo com “Guerra e Paz”, mostrando sua nova formação. Nilton “Cachorrão” Zanelli (vocal), Ricardo Ravache (baixo) e Júlio Príncipe (bateria) apresentaram o novo guitarrista Eduardo Boccomino (Chaosfear, ex-Scars, Chasing Fear, Sick Mind e Critical Mass), que parecia estar totalmente adaptado ao grupo e, devido a sua experiência no Thrash Metal, adicionou mais peso à banda. Um dado curioso é que da formação atual, nenhum dos integrantes fez parte do “SP Metal”. Mas isso é algo um pouco irrelevante já que, principalmente Cachorrão e Ravache, têm seus nomes marcados na história do Metal nacional, pois antes de gravarem o álbum “Ninja” (1988) com o Centúrias, o baixista gravou o clássico EP “A Ferro E Fogo” (1985) do Harppia. Já o vocalista, que iniciou a carreira no Aerometal, leva os méritos por ter sido um dos primeiros músicos brasileiros a tocar fora do país, tendo excursionado para a Colômbia como ‘frontman’ do próprio Santuário, que tocaria na noite seguinte.
O Centúrias apresentou um set um pouco maior do que o das outras bandas e então vieram vários clássicos, além de “Sobreviver”, que faz parte do single que marcou o seu retorno, “Rompendo O Silêncio” (2013). Não poderia faltar a presença nem de Paulão Thomaz e nem da famosa plaquinha, sendo assim, em “Duas Rodas”, o baterista cantou junto com Cachorrão, que mostrou a plaquinha, que dessa vez não foi de “proibido” e sim de “positivo” para a Baratos Afins de Luiz Calanca. Uma sacada genial da banda que, após mandar “Portas Negras”, encerrou a primeira noite às 23h40 com seu hino “Metal Comando”.
Apesar da forte chuva e do frio que caiu sobre São Paulo na sexta-feira, o público não desistiu de comparecer e isso foi algo animador para a noite seguinte que reservaria outras surpresas…
VÍRUS – Set list:
Ignis
Mathew Hopkins
Povo Do Céu
Sacrifício
O Eremita
Batalha No Setor Antares
SALÁRIO MÍNIMO – Set list:
Delírio Estelar
Beijo Fatal
Anjos Da Escuridão
Noite De Rock
Cabeça Metal
Guerra E Paz
Fortes Olhos
Sobreviver
Cidade Perdida
Senhores Da Razão
Duas Rodas
Portas Negras
Metal ComandoFoto Extra (China Lee): Leandro Almeida