SWEDEN ROCK FESTIVAL 2019 5 a 9 de junho de 2019 – Norje (SUE)

Por Alexandre de Lima e Giovanna Tomiotto
Uma das coisas que fez com que a edição de 2019 do “Sweden Rock Fest” fosse tão especial foi a quantidade de bandas que estavam fazendo sua turnê de despedida. E estamos de ícones do metal e do hard rock, que deram vida a canções que embalaram os sonhos de gerações de fãs e influenciaram centenas de músicos. Nada menos que Slayer, UFO, Krokus e Kiss dariam seu adeus aos palcos suecos. Outro ponto que chamou a atenção foi a quantidade de excelentes bandas predominantemente femininas, ou com mulheres à frente… Lucifer, Thundermother, Arch Enemy e Burning Witches mostraram toda a força e talento das mulheres no metal. Que sirvam de inspiração para cada vez mais meninas ao redor do mundo.
DIA 1
O habitual ‘warm-up’ começou com o metal tradicional dos finlandeses do OZ. Porém, a coisa realmente esquentou quando o DEMON, habitué da casa, subiu ao Sweden Stage. Este seria um show especial, já que tocariam o aclamado álbum “The Unexpected Guest” (1982) na íntegra. O icônico vocalista Dave Hill entrou fantasiado de sacerdote, com o rosto pintado de branco e com a mesma máscara chifruda que usou na tour de 82. E foi um show inteiro de clássicos da NWOBHM, que começou com “Night of The Demon”, “Total Possesion”, “The Spell” e a maravilhosa “Sign of a Madman”. A emoção tomou conta na forte “Strange Institution”, que ao vivo tem uma energia sensacional. Surpreendente, também, o peso extra que “Grand Illusion” e “Beyond The Gates Of Hell” ganharam e, mantendo a tradição, o encerramento veio com a metálica “One Helluva Night”. Porém, foi estranho não terem tocado a excelente “Fill Your Head With Rock”, de “Unbroken” (2012), composta em homenagem ao Sweden Rock Festival. Independentemente disso, foi um show espetacular, como sempre.
Havia uma grande expectativa para o show do GATHERING OF KINGS, projeto formado por renomados artistas como Rick Altzi (Masterplan), o versátil Björn Strid (Soilwork e Night Flight Orchestra), Jens Westin (Corroded) e Apollo Papathanasio (Spiritual Beggars). Guardada as devidas proporções, é como se fosse uma releitura do Phenomena, principalmente pelo estilo das músicas, em sua maioria, pautadas por um AOR/melodic rock muito inspirado e original. O processo de divulgação da banda foi curioso, pois começou com o lançamento do excelente single “Forever And a Day” nas plataformas digitais em 2017, seguido por “Out of My Mind” quase um ano depois e tendo o lançamento de fato do álbum de estreia, “First Mission”, apenas neste ano. As boas-vindas ao show vieram com a execução do primeiro single, mas, infelizmente, o som estava muito baixo, o que tirou toda a energia da música, mesmo com Bjorn cantando muito. Em “Saviour”, com Apollo nos vocais, o som começou a melhorar. Que voz esse cara tem! Aliás, não dá para entender por que o festival ainda não escalou o Spiritual Beggars em todos esses anos. Os pontos altos vieram com a empolgante “Lonely Road”, em que Jens Westin tem uma interpretação surpreendentemente boa; “The Runaway”, a melhor música do álbum e cover da artista sueca Carola; e o encerramento com “Out of My Life”, em que os seis vocalistas dividiram o palco.
Representando o Brasil, o KRISIUN trouxe um som para o público de um espectro mais extremo do metal. Na grade, ao lado direto do palco, um grupo de brasileiros de todos os cantos do país, que se conheceram ali, esperava ansiosamente pelo trio de death metal. Do começo ao fim, o som cru e pesado fez até o pessoal da segurança em frente ao palco balançar a cabeça. Apesar de esta ser a turnê de “Scourge of the Enthroned”, que contou com a volta do produtor Andy Classen, a banda tocou somente a música título e “garantiu a vitória” com as clássicas “Blood of Lions”, “Combustion Inferno” e “Descensing Abomination”. Sorriso no rosto ao ver tantos suecos com camisetas da banda e curtindo o show. Orgulho de ver o Brasil tão bem representado.
Seguimos para o Sweden Stage, onde se apresentaria ninguém menos que JOE LYNN TURNER, um dos grandes vocalistas do hard rock mundial, com passagens marcantes por Rainbow, Deep Purple e Yngwie Malmsteen, além de uma prolífica carreira solo. O vocalista se apresentaria na edição de 2018, mas devido a um ataque cardíaco sofrido meses antes, teve que cancelar a tour. E valeu muito a espera dos fãs. Após a execução de “Over the Rainbow”, Turner entrou com tudo mandando “Death Alley Driver”, do álbum “Straight Between The Eyes” (Rainbow), seguido por “Power”, em que o quase septuagenário mostrou-se totalmente em forma e recuperado do grave problema de saúde do ano passado. Como era esperado, o show foi repleto de clássicos, como a emocionante “Street of Dreams”. As grandes surpresas ficaram por conta da linda “Can’t Let You Go” (Rainbow), “King of Dreams”, seu maior hit com o Deep Purple, a banda favorita do vocalista segundo ele, e “Deja Vu”, em que ele “judiou” da sua competente banda de apoio formada pelos caras do Dynazty! Para coroar a memorável apresentação, ainda teve “Rising Force”, “Long Live Rock’n’Roll”, dedicada ao saudoso amigo Ronnie James Dio, e a funkeada “Jealous Lover”. Grande show!
Do classic rock direto para o thrash metal da Bay Area, representado pelos veteranos do DEATH ANGEL. O gênio Rob Cavestani (guitarra) subiu ao palco e, sem dizer uma palavra, começou a dedilhar a introdução da pedrada “Thrown to The Wolves”, de “The Art of Dying” (2004). A sequência veio com a destruidora “Claws In So Deep” e “Voracious Souls”. É simplesmente impossível ficar parado nessas músicas e, após o show do Slayer em 2016, os suecos aprenderam a fazer um mosh pit de respeito. Porém, para surpresa de todos, seguranças entraram no meio dos headbangers e não permitiram a formação do “liquidificador”. Ponto negativo para a organização.
Já com o público totalmente na mão, que gritava o nome da banda entre uma música e outra, o carismático vocalista Mark Osegueda agradeceu a paixão dos fãs. Ele disse que aquela era uma ocasião especial, pois a banda voltava ao festival após um longo período de nove anos desde sua última apresentação. E mais importante, aquela era uma celebração do ‘fucking metal’! Assim, emendaram com “Father of Lies”, “The Moth” e “The Dream Calls for Blood” sem parar para respirar. E eis que a tentativa de mosh emerge mais uma vez… Osegueda novamente agradeceu a oportunidade de voltar ao festival e, antes de anunciar a cadenciada “Lost”, disse que o que eles gostam mesmo é de tocar música para pessoas que apreciam música. Só então tocaram uma do novo álbum, a faixa-título do ótimo “Humanicide”, que havia sido lançado apenas alguns dias antes. A sequência veio com “The Pack”, dedicada aos brasileiros do KRISIUN, que estavam assistindo ao show na lateral do palco. O final veio com a intro de “The Ultra Violence” e “Mistress of Pain”. Estranho não terem tocado nenhuma de “Act III”, mas, mesmo assim, foi uma aula de thrash metal.
Uma das – várias – vantagens de um festival como esse é poder ver uma banda como DYNAZTY tocando em casa. Eles fizeram uma turnê nos Estados Unidos em 2017, e claro que não decepcionaram, mas, no geral, tiveram um público pequeno. Ainda assim, na Suécia, e Europa, a banda tem outras proporções. Trata-se de uma experiência completamente diferente. Trinta minutos antes do show começar, o palco Rockklassiker já estava lotado. Começaram com “The Northern End”, do álbum “Renatus”, que muita gente considera o ponto de virada para a banda, de um estilo mais 80’s hard rock para uma atitude power metal. O repertório foi baseado nas músicas do seu ultimo álbum, lançado no final de setembro, “Firesign”. Também rolou a faixa mais acessada nas plataformas digitais, “The Human Paradox”, de “Titanic Mass”, colocando todo mundo para pular com sua incrível letra e batida contagiante. Para honrar o lado hard rock, tocaram “Raise Your Hands”, de “Sultans of Sin”, e terminaram com “Starlight”. Um show divertidíssimo, uma explosão de energia.
Para encerrar este que, sem dúvida, foi o melhor ‘warm-up’ da história do Sweden, nada menos que SKID ROW. O som mecânico com “Blitzkrieg Bop” e o palco com luzes giratórias vermelhas preparavam o clima. A banda, que atualmente conta com ZP Theart (ex-Tank e Dragonforce) nos vocais, entrou com todo gás com “Slave to the Grind”, e, por alguma razão, Dave “Snake” Sabo não estava presente e foi substituído nesta apresentação por Ryan Cook (Gene Simmons, The Big Rock Show, Hair Of The Dog). Mas não faltaram hits no set, como “I Remember You”, “18 and Life” e “Monkey Business”, além do sempre presente cover dos Ramones, “Psycho Therapy”. A noite foi fechada com a dobradinha “In A Darkened Room” e “Youth Gone Wild”, cantadas a plenos pulmões.
DIA 2
O segundo dia começou com um dos shows mais esperados desse ano: SEVENTH WONDER. A banda, que em 2018 lançou seu novo álbum, “Tiara”, e tem como frontman o talentoso Tommy Karevik (Kamelot, Ayeron), fez um show impecável, com uma coleção de músicas que esbanjam técnica e, principalmente, feeling. “The Everones”, com seu belíssimo refrão, é daquelas que já nasceu clássica. Aliás, é impressionante a quantidade de refrãos maravilhosos que esses suecos compõem. A sequência veio com “Welcome to The Mercifalls” e fez todo mundo pular e cantar junto. Em “Alley Cat”, o guitarrista Johan Liefvendahl mostrou todo seu talento, e a emocionante “Tears For a Father” foi, literalmente, de arrepiar… Como esse cara canta! As espetaculares “Hide And Seek” e “Inner Enemy” colocaram todo mundo para pular de novo, enquanto o encerramento da memorável apresentação ficou por conta da nova “Exhale”.
Então, chegou o momento de uma das despedidas. O KROKUS faria sua derradeira festa no Festival Stage. Isso, por si só, já dava um aperto no coração dos fãs ali presentes, uma nostalgia antecipada que bate junto com a consciência de estarmos vivendo um momento histórico e que deve ser aproveitado ao máximo. A celebração começou com “Headhunter” e “Long Stick Goes Boom” e, ao anunciar “Hellraiser”, o vocalista Marc Storace convocou a plateia: “Let’s raise some hell!”, o que, obviamente, foi prontamente atendido.
Imagine este momento: uma belíssima tarde de sol, com milhares de pessoas sorrindo e dançando ao seu redor, com uma banda tão importante como o Krokus tocando clássicos como “Bedside Radio” e “Easy Rocker”. Sem dúvida, algo para guardar com muito carinho na memória. E o adeus dos suíços aos palcos nórdicos ficou por conta de “Live For The Action” e do ‘rockão’ puro e sem gelo, “Heatstrokes”! Tomara que venham se despedir dos fãs aqui no Brasil também.
A beleza da música é que ela é eterna… E, enquanto bandas que nos acompanharam a vida toda penduram as baquetas, outras surgem para manter a chama acesa. É o caso do LUCIFER, capitaneado pela enigmática Johanna Sadonis (vocal) e por ninguém menos que Nicke Andersson (bateria, The Hellacopters, Entombed, Imperial State Eletric), que lançou dois álbuns totalmente inspirados no occult hard rock dos anos 70. A cantora, vestida com uma roupa branca bem retrô, com franjas na manga à la Ozzy Osbourne, entrou segurando uma garrafa de espumante, enquanto soavam os primeiros acordes da doom “Faux Pharaoh”, seguida da pesada e envolvente “Eyes In The Sky” e do single “Dreamer”, que conta com um clipe bem bacana. A essa altura o público já estava hipnotizado pela performance magnética da vocalista. Destaques para os covers “Dancing With Mr. D” (Rolling Stones), “Snowblind” (Black Sabbath) que ficou sensacional e “Bomber” (Motörhead). A saideira veio com “California Sun”, outro single do novo álbum e que traz fortes influências de Uriah Heep.
Com a música perfeita para entrada, “The Pursuit of Vikings”, os suecos do AMON AMARTH chegaram com tudo. No palco, no lugar do barco Viking, agora um enorme elmo dos guerreiros nórdicos foi colocado bem no centro do palco, com a bateria em cima. O vocalista Johan Hegg interagiu com o público – em sueco – diversas vezes durante o show; os guitarristas Olavi Mikkonen e Johan Söderberg mostraram uma precisão incrível, enquanto Ted Lundström e Jocke Wallgren marcavam o ritmo. Com “The Way of Vikings”, uma batalha viking foi recriada no palco, e, claro, a clássica “Raise Your Horns”, com Johan levantando o seu chifre “Skal”… Impossível ser mais viking que isso!
Depois, lá fomos nós iniciar a despedida a mais um ícone, dessa vez um dos criadores do thrash metal. A banda mais brutal de todos os tempos… Sim, estamos falando do SLAYER! Imagens com o logo da banda sobre um pentagrama eram projetadas em uma cortina semitransparente, de forma que fosse possível ver as imensas labaredas de fogo atrás no palco, enquanto “Delusions of Saviour” já anunciava a chegada do caos… A cortina caiu e a banda entrou com o rolo compressor “Repentless”. As luzes vermelhas, sincronizadas com a bateria, e as imensas chamas que saiam por todos os lados do palco completavam a visão do inferno. Todo mundo cantou o refrão de “Evil Has No Boundaries”, enquanto a agressividade explícita de “Hate Worldwide” levou o público à loucura. É preciso ser dito que Gary Holt é um monstro. Com sua sarcástica camiseta escrito ‘Kill the Kardashians’, o guitarrista, também integrante do Exodus, simplesmente não para de bangear um segundo sequer… É impressionante!
O show seguiu com pedrada após pedrada e, após “Seasons in The Abyss”, o palco ficou todo escuro apenas com duas labaredas nas laterais que permitiam enxergar as silhuetas dos integrantes da banda. Ao primeiro acorde do petardo “Hell Awaits”, chamas gigantes eram lançadas formando crucifixos de ponta cabeça. Esse visual somado a talvez uma das introduções mais fortes do metal nos sugaram para dentro daquela atmosfera apocalíptica. Não dava nem para piscar, ainda mais porque o que veio depois foi um teste cardíaco para qualquer fã: “South of Heaven”, “Raining Blood”, “Black Magic”, “Dead Skin Mask” e a maldade em forma de música, “Angel of Death”, durante a qual rolou um inevitável mosh pit. Ao final, Tom Araya, Kerry King, Gary Holt e Paul Bostaph foram à frente do palco, visivelmente felizes, agradecer ao público. A emoção bateu forte quando todos se retiraram, exceto Araya, que permaneceu imóvel na beira do palco por uns cinco minutos apenas olhando, absorvendo, registrando o momento com olhos marejados, enquanto o público não parava de aplaudir calorosamente. Obrigado, SLAYER!
DIA 3
O nosso bom dia foi dado pelas meninas do BURNING WITCHES, que fazem um heavy metal old school com aquele tempero ardido de speed metal. Aos sons de sinos e gritos macabros elas entraram vestidas com roupas e adereços de couro preto e correntes, como manda o figurino do 80’s heavy metal, e abriram com “Executed”, de “Hexenhammer” (2018). Elas estavam visivelmente muito empolgadas por estarem tocando num festival dessa magnitude, mas parece que isso gerou uma certa tensão que atrapalhou um pouco a performance no início do show. O produtor e “padrinho” da banda, Schmier (Destruction), assistiu atentamente ali do nosso lado, muitas vezes esboçando um orgulhoso sorriso. Elas disseram que estavam realizando um sonho de tocar no SRF e mandaram dois covers – “Jawbreaker” (Judas Priest) e “Holy Diver” (Dio) – antes de encerrar com “Burning Witches”.
THE NIGHT FLIGHT ORCHESTRA se consolidou como banda e não apenas como mais um projeto que reúne alguns músicos famosos. Björn Strid (vocal), David Andersson (guitarra), Sharlee D’Angelo (baixo) e companhia já lançaram quatro bem-sucedidos álbuns, com composições inspiradíssimas e que bebem direto da fonte da disco music e do funk do final dos 70’s e início dos 80’s, agregando elementos de hard rock, AOR e progressivo. As duas simpáticas backing vocals entraram fantasiadas de aeromoças, com microvestidos colados e segurando taças de champanhe, dando as boas vindas a essa deliciosa viagem no tempo que começou com “Sometimes The World Ain’t Enough”, faixa que dá nome ao álbum lançado em 2018. Provavelmente por conta de outros compromissos com o Arch Enemy, Sharlee D’Angelo não se apresentou com a banda, o que não comprometeu a festa, que continuou com “Living For The Nighttime”. “Gemini”, um dos seus hits, colocou todo mundo para dançar. Basta um show bom como esse para esquecermos o cansaço físico que já começa a aparecer após dois dias de pouquíssimas horas de sono e intensa maratona…
A forte influência de Survivor veio com “Something Mysterious” que tem uma levada envolvente, enquanto que a grooveada “Paralyzed” remeteu o público aos tempos áureos da disco music. “1998” começou com um belo arranjo com apenas piano e a voz de Strid, que foi servido de uma taça de espumante pelas aero backing vocal. O ponto alto do show foi a espetacular “West Rue Avenue”, que fez com que algo inédito acontecesse: centenas de pessoas simplesmente formaram um trenzinho que saiu dançando por toda a área do Sweden Stage. Nem a banda acreditou naquilo… A alegria estava no ar. Que vibe inacreditável!
Outro show em que as mulheres brilharam foi o THUNDERMOTHER, com destaque para a voz rouca de Guernica Mancini e para a energia da única remanescente da formação original, a guitarrista Filippa Nässil. A área do 4Sound Stage estava abarrotada de gente que queria se divertir ao som do rock’n’roll direto e reto das suecas. “Deal With The Devil” foi dedicada ao saudoso ícone Lemmy e a guitarrista subiu no ombro de um cara da equipe e saiu tocando no meio da galera! Isso é rock’n’roll. A banda só desacelerou na lindíssima balada “Fire In The Rain”. Outro grande show!
A grande surpresa no line-up desse ano foi o EASY ACTION. O grupo sueco, que tem como principal componente o guitarrista Kee Marcelo, famoso por sua brilhante passagem no Europe, lançou o aclamado álbum “That Makes One” em 1986. Em seguida, a banda se separou para então retornar aos palcos 20 anos depois, justamente no Sweden Rock. Em 2008 se reuniram novamente para regravar algumas músicas e, desde então, não se teve mais notícias do Easy Action. Por isso, a expectativa com este show era grande, e os caras não decepcionaram. Tocaram seu mais famoso álbum na íntegra com a banda soando revigorada e muito bem ao vivo. Uma curiosidade, escute “We Go Rocking”, lançada em 1983, e, em seguida, “I Want Action” do disco de estreia do Poison, de 1986. Teve até processo por plágio em que os suecos, obviamente, ganharam.
Deu para conferir uma música do surpreendente DIZZY MIZZ LIZZY, antes de nos posicionarmos para o show do THE QUILL que estava para começar na tenda. Essa era mais uma atração que estava escalada para a edição do ano passado, mas devido a uma cirurgia de emergência que o vocalista Magnus Ekwall (Ayeron) teve que se submeter, acabaram cancelando a apresentação. Na verdade, adiaram para 2019. A banda tem oito álbuns lançados em 24 anos de estrada e completam a formação Jolle Atlagic (bateria, Hanoi Rocks, Eletric Boys), Roger Nilsson (baixo, Spiritual Beggars) e Christian Carlsson (guitarra).
As boas vindas não podiam vir com outra senão “Snake Charmer Woman”, que foi feita para abrir shows. De cara, fica evidente a coesão do som dos caras, e, principalmente, a potência da voz de Ekwall. A sabbathzenta “Ghosthorse”, também do excepcional “Born From Fire” (2017), ficou ainda mais pesada ao vivo. Já na bela “Keep Together”, o público ficou em êxtase pelo feeling absurdo da interpretação dos músicos. A sequência, com “American Powder” colocou todo mundo pra bangear, enquanto que a devida homenagem aos mestres do Sabbath veio com o sacudo cover de “Fairies Wear Boots”. A consagração final foi com o hit “Stone Believer”, em que todos cantaram junto com a banda. Que continuem lançando muitos álbuns e fazendo muitos shows.
Chegava a hora de vermos os barbudos mais carismáticos do rock, o ZZ TOP. De cara, começaram com “Got Me Under Pressure”, com seus instrumentos super coloridos e a voz rasgada de Billy Gibbons. Em mais uma bela tarde ensolarada, os milhares de fãs se divertiram com o trio completado pelo simpático baixista Dusty Hill e o discreto Frank Beard na bateria, ao som de sucessos que resistem ao tempo, como “Gimme All Your Lovin’”, “Sharped Dressed Man” e “Legs” (com guitarra e baixo de pelúcia!). É impressionante como esses caras ainda se divertem no palco! Eles sorriem e brincam uns com os outros o tempo todo, mesmo depois de quase 50 anos tocando juntos. Talvez esse seja o segredo: se divertir!
A fantástica “Beer Drinkers & Hell Raisers” foi uma grata surpresa, já que essa música não é tão frequente nos sets da banda. E ninguém menos que Paul Stanley e Tommy Thayer assistiram tudo na lateral do palco. Hill pediu a Gibbons para tocar “aquela coisa que ele toca nessa guitarra quadrada”. Foi a deixa para “La Grange”. E a saideira veio com “Tush” e “Jailhouse Rock”.
Eis que chega o momento mais forte do ano… Dar o primeiro (espero que de muitos) adeus à banda que, para centenas de milhares de fãs, extrapolou as fronteiras musicais por meio de sua imagem, das letras de suas canções e, principalmente, pela abordagem positiva com que Gene Simmons e Paul Stanley sempre demonstraram com relação à vida, pregando por meio das suas respectivas trajetórias que todos os sonhos são possíveis. Para muitos, o KISS serviu de base para a concepção de um estilo de vida, em que as pessoas se sentem confiantes para ser quem são e fazerem o que quiserem, independentemente dos inevitáveis e hipócritas julgamentos alheios. Além disso, é incontável o número de bandas, hoje famosas, em que seus integrantes pegaram em um instrumento musical pela primeira vez após terem visto um show, ou até mesmo um clipe do Kiss.
O símbolo do KISS Army, fã clube da banda, apareceu nos telões, enquanto o palco foi coberto por uma gigantesca cortina com o logo dos mascarados. O tradicional anúncio “You’ve wanted the best, you’ve got the best” abriu caminho para o riff do hino “Detroit Rock City”. A cortina caiu e revelou um palco com centenas de luzes coloridas, enquanto fogos de artifício estouram em todos os lados. Naquele momento a emoção já tomou conta e só aumentou com “Shout It Out Loud”, também do premiado “Destroyer” (1976).
Paul Stanley é a definição de rockstar. Ninguém jamais terá tamanho poder sobre o público em um show de rock como o que ele tem… A sequência veio com “Deuce” – com sua icônica coreografia – e “Say Yeah!”, de “Sonic Boom”. O show todo foi um desfile de clássicos de todas as fases, como a obrigatória “I Love It Loud”, além de “Heaven’s On Fire”, “Lick It Up” e “Calling Dr. Love”. Em “100.000 Years”, Stanley fez o tradicional malabarismo enrolando o cabo do microfone no pescoço, como fazia na tour de “Alive I” em 75. Durante “Cold Gin”, competentemente cantada por Tommy Thayer, imagens dos primórdios da banda eram exibidas no telão e lasers super potentes eram projetados sobre os milhares de presentes.
Gene fez sua tradicional performance em “God of Thunder” e todo mundo cantou o hit “Psycho Circus”, enquanto as bases das plataformas no alto do palco projetavam as imagens da capa do disco homônimo de 1998. Também como acontece em todos os shows há muitos anos, o Starchild voou até um minipalco no meio da plateia para cantar “Love Gun” e “I Was Made For Lovin’ You”. “Black Diamond” como sempre foi muito emocionante, especialmente no momento em que os pilares elevatórios da bateria foram revelados, exibindo os tigres da celebrada capa interna do “Alive II”.
No bis, um piano branco foi colocado no palco e Eric Singer executou uma emocionante versão do clássico “Beth”. Agora o ponto alto do show, sem dúvida, foi com “Crazy, Crazy Nights”. Em treze anos frequentando o Sweden Rock, nunca vimos tanta gente junta pulando, sorrindo, se abraçando, chorando e cantando… Tudo isso enquanto enormes bolas pretas e brancas com o logo da banda e os ícones das maquiagens pipocavam nas mãos da extasiada plateia, dando o toque final ao belo cenário. Arrepiante! E o final, como não podia ser diferente, veio com a apoteótica “Rock’n’Roll All Nite” e a tradicional chuva de papéis coloridos. Enquanto “God Gave Rock’n’Roll To You” ecoava pelos PAs após o término do show, muita gente ficou ali paralisada, olhando para o palco e tentando assimilar o que havia acabado de acontecer… O show do Kiss é o maior espetáculo da terra! E ainda bem que essa turnê ainda vai levar mais uns dois anos, porque não estamos prontos para um mundo sem Kiss…
Ainda tinha mais um show para conferirmos na madrugada sueca: DREAM THEATER faria o encerramento do terceiro dia no Rock Stage. Com uma bela produção de palco, os americanos começaram com “Unthetered Angel”, faixa de abertura do novo álbum, “Distance Over Time”, e, de cara, deu pra ver que capricharam muito no peso. A sequência com a paulada “As I Am” foi de levantar defunto, enquanto a também nova “Fall Into The Light” ficou bem mais interessante ao vivo, especialmente o inspirado solo de John Petrucci, em que o guitarrista mostra mais uma vez que, além da óbvia técnica absurda, também tem feeling de sobra. “Peruvian Skies” foi uma bela adição ao set, que nos levou de volta à inesquecível estreia dos caras em palcos brasileiros, naquele show no Clube Atlético Aramaçan, em Santo André (SP). Bom momento. Porém, em “Dance of Eternity”, a energia caiu bem… Definitivamente, não é uma boa escolha para um festival, ainda mais com um set curto. Mas o gás voltou com a força de “Lie”, emendada pela cansativa “Pale Blue Dot” e…. FIM! Isso mesmo. Assim, do nada, com mais tempo disponível, os caras simplesmente falaram obrigado e foram embora. Ninguém entendeu nada… Em outros festivais eles estavam tocando “Pull Me Under”, seu maior hit, e que, por isso, todo mundo estava esperando. Enfim, frustrante.
DIA 4
No início da manhã caiu uma chuva muito forte que assustou os bangers. Afinal, chuva complica bem as coisas em um festival a céu aberto onde passamos 15 horas por dia. Mas São Rock entrou em ação e logo um belo sol mais uma vez apareceu. E o começo foi com uma banda que tem ganhado força desde que foi assinada pela Nuclear Blast há alguns anos, BEAST IN BLACK foi formada em 2015 pelo guitarrista Anton Kabanen (Battle Beast). Com um entusiasmo inigualável, todos os membros tinham um sorriso no rosto do começo ao fim do show. Yannis Papadopoulos, vocalista grego, pulou, correu, chutou ainda assim atingindo notas extremamente altas fazendo arrepiar! De “Cry out for a Hero”, “Beast in Black”, “From Hell with Love” até o hino “Blind and Frozen” não dá pra negar o talento, habilidade e energia contagiante da banda.
Em seguida fomos ver ELETRIC BOYS, figurinha carimbada no Sweden Rock. Com o palco Rock lotado, os caras fizeram um show super alto astral com seu hard rock grooveado e criativo, que conta com dois bateras tocando juntos o set todo. Os destaques ficam para “Hangover In Hannover”, a acelerada faixa de abertura do ótimo novo disco, “The Ghost Ward Diaries”, “Angel In An Armoured Suit” e a empolgante “First The Money, Then The Honey”, a melhor do novo disco.
Os veteranos do STYX fizeram um show impecável no palco principal. É impressionante como essa banda cresce ao vivo, o que ficou evidente logo na primeira música “Gone Gone Gone”. Em seguida Tommy Shaw mostra que continua um senhor vocalista com a favorita de muitos fãs, “Blue Collar Man (Long Nights)”, um pouco mais cadenciada que a versão original. Com o cabelo, jaqueta e tênis azuis, o irrequieto tecladista Lawrence Gowan é um show à parte! Ele corre de um lado para o outro, pula, brinca com o público, sobe em cima do teclado giratório, toca de costas e ainda por cima canta muito! Aliás, todos são músicos fora da curva. Todd Sucherman, por exemplo, foi nomeado o melhor baterista do mundo pela Modern Drummer.
E todo mundo bateu palma e pulou no pique de “Rockin’ The Paradise”, em que Lawrence agora usava um paletó cintilante e uma cartola com penas. Ao anunciar a bela “Radio Silence” do último disco, “The Mission”, Tommy disse que era da época em que os álbuns eram feitos para serem ouvidos inteiros, e que essa música foi composta em homenagem a isto. O único membro original, James “JY” Young anunciou que tocariam metade do seu álbum de maior sucesso, “The Grand Illusion” (1977), antes de começar “Miss America”. Nesse momento era visível a felicidade dos caras. Eles se divertem muito no show, o que acaba contagiando a plateia. O baixista original Chuck Panozzo, diagnosticado com HIV na década de 90, foi chamado ao palco para tocarem “Fooling Yourself (Angry Young Man)”, seguida de “Too Much Time On My Hands” (com as duas palmas obrigatórias no refrão). Em homenagem a Freddie Mercury e ao sucesso do filme sobre sua carreira, tocaram uma parte de “Bohemian Rhapsody”. E, para manter os arrepios, vieram com a belíssima “Come Sail Away”, arrancando lágrimas de alguns fãs… O final ficou por conta das obrigatórias “Mr. Roboto” e “Renegade”. Simplesmente uma aula de rock!
O MYRATH, da Tunísia, surpreendeu pelo excelente e super bem produzido show que fizeram na tenda e ainda subiram umas 20 posições no conceito dos organizadores do festival ao aceitarem substituir o BEHEMOTH, fazendo uma segunda apresentação no mesmo dia, mas dessa vez no palco Rock (o segundo maior), já que os “capetudos” tiveram um problema com o voo e não conseguiram chegar a tempo de fazer o show.
No caminho para o UFO, deu para ver alguns segundos do DEMONS & WIZARDS – projeto capitaneado por Jon Schaffer (Iced Earth) e Hansi Kürsch (Blind Guardian). Mas, infelizmente, não havia como perder a despedida de uma das bandas mais importantes do hard rock mundial, em sua derradeira tour batizada “Last Orders” em que também comemoram 50 anos de estrada. Houve um rumor que o show poderia ser cancelado, já que o tecladista e guitarrista Paul Raymond havia falecido menos dois meses antes. Porém, mantiveram os planos e trouxeram o competente Neil Carter, que já havia tocado com o UFO na década de 80, para completar o time.
Foi muito forte ver ao vivo talvez pela última vez as eternas “Lights Out”, “Only You Can Rock Me”, “Rock Bottom” e “Doctor Doctor”. Vinnie Moore é um verdadeiro guitar hero, tem um estilo único e conseguiu adicioná-lo aos clássicos gravados por ninguém menos que Michael Schenker, mas sem perder a aura original das canções. Já Phil Mogg, que bebericava uma cerveja durante o show, é o carisma em pessoa. Sua figura frágil contrasta com sua ainda tão potente voz. É difícil destacar algumas músicas em um show inteiro de clássicos, mas, sem dúvida a emoção transbordou em “Love to Love”. Simplesmente maravilhoso…
O som mecânico no palco principal com “It’s A Long Way To The Top (If You Wanna Rock’n’Roll)” preparava a chegada do SAXON, que, como sempre, fez um show animal. Foi basicamente o mesmo repertório que os fãs brasileiros puderam conferir há alguns meses, com todos os hinos que não podem faltar em nenhuma coleção de um headbanger que se preze. Afinal, o Saxon é sim tão importante quanto o Iron Maiden para o heavy metal. Como nunca havia tocado no Festival Stage, o grandalhão Biff Byfford estava visivelmente impressionado com a quantidade de pessoas assistindo ao show, e fez questão de dizer isto umas quatro vezes durante a apresentação. Ao anunciar “Denim And Leather”, Biff disse que banda está comemorando seu aniversário de 40 anos e que escreveu essa música sobre as pessoas que estavam ali, que não importa nada o quão velho você seja. É tudo sobre a música, sobre a paixão e sobre “the fucking denim and leather!”. E ele está certo, já que, com 40 anos de carreira, os caras nunca soaram tão coesos e pesados quanto agora. O baixista Nibbs Carter agita o show inteiro, enquanto Nigel Glockler parece um rolo compressor na bateria. Já o discreto, mas genial, Paul Quinn parece que tem uma tonelada de peso na mão direita. “And The Bands Played On” foi dedicada aos festivais de rock no mundo todo, enquanto que a emocionante “Broken Heroes”, do excelente e injustiçado “Innocence Is No Excuse”, foi muito comemorada pelos fãs. Outro grande show!

O clip de “(We Make) Sweden Rock”, nova música do HAMMERFALL, começou a ser exibido nos telões do palco Rock, quando milhares de fãs já estavam posicionados para conferir a apresentação dos suecos, que são muito grandes em sua terra natal. Em um belo palco com um backdrop gigante em que o mascote Hector aparecia com chifres e asas negras de anjo, a abertura veio com “Legions”, seguida de “Hammer High”, em que Oscar Dronjak usou sua guitarra em forma de martelo. “Renegade” foi cantada a plenos pulmões e em “Riders of the Storm”, Joacim Cans foi para a galera, pegou uma bandeira do Brasil e gritou ‘Brasil!’. Porém, durante o show soubemos da triste notícia do falecimento do nosso maestro Andre Matos… Para o grupo de brasileiros que estava conosco, ali acabou o clima para curtirmos o restante da apresentação.
O final desta edição tão especial do Sweden Rock foi histórico. “Land of Hope And Glory” e “Over The Rainbow” executadas no som mecânico, abriram alas para RITCHIE BLACKMORE’S RAINBOW fechar com chave de ouro o Sweden Rock Festival 2019. Havia certa apreensão de alguns fãs com relação à performance do vocalista espanhol Ronnie Romero. Afinal, não é tarefa simples interpretar músicas que entraram para a história nas vozes de Ronnie James Dio, Joe Lynn Turner e Graham Bonnet. No entanto, bastaram alguns segundos de “Spotlight Kid” para qualquer dúvida se dissipar, pois ele manda muito bem.
“I Surrender” ganhou energia nova com essa nova formação que ainda conta com o experiente Jens Johansson nos teclados e a bela e talentosa Candice Night, esposa do Chefe, nos backing vocals. “Mistreated” nos transportou para outra dimensão. É um privilégio gigantesco ver uma lenda do calibre de Ritchie Blackmore tocando um dos maiores clássicos da história. O trecho inicial (“I’ve Been Mistreated”) bate como um soco no estômago, de tão forte que soa. Essa música é puro sentimento.
Apenas em “Since You Been Gone”, mais conhecida pela versão do álbum “Down To Earth” de 1979, ficou faltando aquele algo a mais na voz de Romero. Não que ele tenha feito feio, mas o vozeirão de Bonnet, que é muito difícil de emular, marcou muito essa música. A trinca seguinte foi um presente aos fãs: “Man On The Silver Mountain”, “Perfect Strangers” e “Black Night”. Antes do bis, ainda tivemos a sequência “Difficult To Cure”, “All Night Long”, “Stargazer”, em que foi inevitável imaginar a emoção se fosse o baixinho cantando ali, “Long Live Rock’n’Roll” e “Burn”. E, para encerrar, tivemos a música que tem o riff mais icônico e mais conhecido do rock. Sim, fecharam com “Smoke On The Water”! A música foi parando aos poucos e as pessoas continuaram ali batendo palmas e cantando o refrão com força, até que todos largaram seus instrumentos e foram à frente do palco agradecer o público que não parava de bater palmas e cantar. Mais um momento sensacional…
O significado do Sweden Rock é muito bem representado por um trecho de “Crazy, Crazy Nights” do Kiss que, em uma livre tradução diz: “Eles tentam nos dizer que nós não pertencemos / Tudo bem, nós somos muito fortes / Esta é minha música, me deixa orgulhoso / Este é meu povo e esta é minha multidão / Se a vida é um rádio, coloque no volume dez!”
O que acontece naquele lugar é um encontro de pessoas que são diferentes dos padrões da sociedade. Pessoas que talvez nunca se viram antes e que, no decorrer de quatro dias, dividem lágrimas, gargalhadas, abraços e sorrisos. Uma multidão com algo forte em comum: uma paixão indescritível pelo rock’n’roll, hard rock, heavy metal e todos os seus sabores. Keep the fire burning!