Por Luiz Tosi
Fotos: Belmilson dos Santos
Recentemente, a expressão “mulherão da porra” ganhou bastante força por aqui. É aquela mulher que impõe respeito, tem estilo, presença, talento – e não abaixa a cabeça pra nada. No mundo do rock, não faltam exemplos: Joan Jett, Debbie Harry, Patti Smith, Lita Ford… e, claro, Chrissie Hynde. Aos 73 anos, a líder do The Pretenders subiu ao palco do C6 Fest, no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, neste sábado, 24 de maio, e mostrou exatamente por que ela merece esse título.
Surgido no final dos anos 70, o Pretenders misturou como poucos a intensidade do punk com o bom gosto melódico do pop rock. De lá pra cá, emplacaram hinos como Brass in Pocket, Back on the Chain Gang e Don’t Get Me Wrong. Não à toa, foram parar no Rock and Roll Hall of Fame em 2005. E muito disso vem da figura magnética de Chrissie Hynde, uma das grandes personagens femininas da música e dona de um timbre único que o tempo não conseguiu tirar.
Chrissie, aliás, se sente em casa por aqui. Já morou em São Paulo nos anos 2000, fala um português charmosamente destrambelhado e se diz uma “quase paulistana”. E no C6 Fest, jogando em casa, ela estava visivelmente à vontade. Bonita, segura, afinada e com aquela atitude que mistura elegância com certa rebeldia chique. O público, que lotou o Ibirapuera com ingressos esgotados, estava nas mãos dela do começo ao fim.
O Pretenders não pisava em solo paulistano desde 2018. E se a espera foi longa, a recompensa veio em forma de um show direto ao ponto, bem construído e com aquele charme inglês que só eles têm. A formação atual – elegante, coesa e muito competente – é um caso à parte. James Walbourne, na guitarra desde 2008, esbanja categoria e feeling, com uma clássica correia de relâmpagos à la Ace Frehley. No baixo, Dave Page, com seu lindo Fender Precision, segura tudo com classe, enquanto Rob Walbourne, irmão de James, é um relógio suíço na bateria. É uma banda que toca bonito, sem firula, com precisão e alma.
O setlist foi construído com sabedoria e segurança, sem se apoiar unicamente nos grandes hits. Abriram com Hate for Sale e Turf Accountant Daddy, do disco homônimo de 2020, e logo emendaram clássicos como Kid, My City Was Gone e Private Life. A cada música, uma aula de como equilibrar potência e sensibilidade. Back on the Chain Gang foi um dos momentos mais emocionantes, assim como a delicada Hymn to Her e a deliciosa Don’t Get Me Wrong, que levantou geral.
Ainda teve espaço pra pérolas como Talk of the Town, Thumbelina, Junkie Walk, Time the Avenger e Night in My Veins e Let the Sun Come In, do álbum mais recente, Relentless (2023). Moderna, vibrante e cheia de personalidade, a faixa mostrou que o Pretenders ainda tem muito a dizer. No fim, a trinca Message of Love, Middle of the Road e I’ll Stand by You fez todo mundo cantar junto. E, claro, a clássica Precious encerrou tudo em alto estilo.
O C6 Fest, vale dizer, está de parabéns. Criado em 2023 com a missão de honrar o legado do lendário Free Jazz Festival (e do saudoso Tim Festival), o evento entregou uma edição impecável. Estrutura excelente, line-up bem pensado e uma vibe que mistura música de qualidade com conforto e organização – algo ainda raro por aqui. Quando o assunto é estrutura e experiência, o C6 Fest é, ao lado do Bangers Open Air, o melhor festival do Brasil. E quem voltou no domingo ainda presenciou um espetáculo de Nile Rodgers. Um privilégio.
No fim das contas, foi uma noite pra lembrar. Chrissie Hynde e o Pretenders mostraram que atitude, talento e boas canções não envelhecem. E que o rock, quando é feito com verdade, continua sendo o melhor lugar do mundo.
Setlist
Hate for Sale
Turf Accountant Daddy
Kid
My City Was Gone
Private Life
Back on the Chain Gang
Talk of the Town
Hymn to Her
Don’t Get Me Wrong
Thumbelina
Let the Sun Come In
Junkie Walk
Time the Avenger
Night in My Veins
Message of Love
Middle of the Road
I’ll Stand by You
Precious
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