Por Heverton Souza
Fotos: Roberto Sant’Anna
Em uma noite gelada de domingo com fim de outono se aproximando para a chegada do inverno, nada como fechar o fim de semana tirando os sobretudos do guarda-roupas para ver um dos medalhões do gothic rock e um dos mais amados nomes da música dark. Com todo um trânsito tomando a região, o Tokio Marine Hall, ainda lembrado por muitos como o antigo Tom Brasil, já estava com seu entorno tomado por roupas pretas antes mesmo das 19h, quando, já em palco, a banda 3 Pipe Problem se encarregava de tentar aquecer o público que vinha de fora da casa com temperaturas em 13 °C.
O rock alternativo do 3 Pipe Problem deve agradar bastante fãs de nomes como Pixies, Sonic Youth e ainda ousa mais com riffs pesados e passagens punks que beiram o hardcore. Porém, do público dark ali presente, arrancou mesmo observação e respeito em sua curta apresentação e um maior apreço por tocarem “Double Dare”, da banda inglesa Bauhaus. Hafa, vocalista e guitarrista, comentou a experiência: “Foi uma explosão de sentimentos, primeiro pela sensacional infraestrutura e profissionalismo do staff do Tokio Marine Hall, segundo pela honra de abrir o show de uma das bandas que mais influenciaram musicalmente o 3 Pipe Problem.”
Uma breve saída para as interações entre amigos que só se encontram em shows como esse, e a volta revelou ao repórter aqui uma bizarrice nunca vista em 19 anos cobrindo eventos: para adentrar à pista, o público estava sendo conduzido através da cozinha da casa até uma entrada espremida no canto esquerdo. Ou seja, as pessoas com suas tosses, respirações de cigarro recém apagados e roupas poluídas do ar seco de São Paulo nessa época do ano, passaram em massa pela cozinha, numa fila indiana. Parecia cena de filme, na qual o mocinho está fugindo dos bandidos por uma cozinha aos fundos de algum lugar obscuro.
Batia 20h nos “ponteiros de celular” quando uma introdução começava a soar do palco: era a hora de Andrew Eldritch & Cia. nos darem mais um show dos Sisters of Mercy. Dias antes, muitas pessoas se questionavam se seria um dos bons shows dos caras ou um dos ruins, ambos já vistos antes pelo público paulista. E talvez a melhor resposta aqui seja que tivemos ambos. Um set com tudo que tem direito entre lados-b e hits, porém sempre nas versões mais curtas e radiofônicas que conhecemos e ainda com ausência de clássicos como “Black Planet”, “Walk Away” ou a famosa versão da banda para “Gimme Shelter”, dos Rolling Stones. Um palco seco, sem nem mesmo um backdrop sequer e a eterna iluminação em forma de penumbra. Sobre esse palco, além de um Eldritch sempre mais escondido que presente, os performáticos guitarristas Ben Christo e Dylan Smith, assim como Ravey Davey, responsável pelos teclados, baixo e bateria.
A abertura com “Don’t Drive On Ice” revelava um som baixo, fraco! Quando isso é um problema a ser solucionado, dura no máximo três, quatro músicas, só que pareceu mesmo intencional, já que durou exatamente metade do set. Ou seja, cerca de 4 mil pessoas ouviram entre músicas como “Ribbons” e “Summer”, hits como “Dominion/Mother Russia”, “Marian”, e “More” com um som parecendo que estávamos ouvindo dos PAs um mono de fita K7. Foi quando em “Instrumental 86” a coisa mudou e melhorou significativamente, deixando até mesmo a banda mais empolgada, inclusive Andrew, que melhorou em uns 10% no quesito, porém seu vocal foi mesmo mais baixo que o ideal por todo o show.
Eldritch tem hoje 64 anos e mais de 40 dedicados ao The Sisters of Mercy, mas nada justifica a voz por vezes fraca (e não falo do já citado volume) e sem postura, em momentos até partindo para um drive, que soaria melhor se parecesse algo intencional de interpretação e não apenas uma fuga técnica. Como se isso não bastasse, o conhecido estilo mais acanhado e sem interação segue firme e, se diferente, poderia compensar a falta de um vocal mais inspirado.
Vale citar que os guitarristas, diferentemente de Andrew, são mais ativos, presenciais e ainda dividem bem os vocais. O set seguiu por mais seis músicas, com destaques positivos para “Crash and Burn” e o medley “Doctor Jeep/Detonation Boulevard” (essa última um pouco mais rápida para sincronizar com a primeira) e destaque negativo para “When I’m on Fire”, cujo violão “tocado” por Dylan Smith era na verdade um playback.
Parada clichê de poucos minutos e logo a banda volta para uma sequência de seus maiores hits, com exceção da já executada “More”, ou seja: “Lucretia My Reflection”, “Temple of Love” e “This Corrosion”, que encerrou a apresentação com um público outrora com cara de “chamem o Procon”, mudando para a total euforia, inclusive com muitos dançando em pista.
Fato é que, para muitos, só de estarem diante de um dos nomes mais clássicos da história do gothic rock, por menos que se conseguisse ver o dono do nome, já foi sim uma satisfação e para outros, talvez após passar a empolgação do final, achar um Reclame Aqui do Reino Unido seja uma opção.
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