Sabe aquele gol de placa que o seu time faz numa decisão de campeonato, que proporciona aquela sensação prazerosa de bem estar e liberdade? Da mesma forma só que com o foco na música, os gaúchos do Torvo tornaram isso possível em seu novo disco, Into the Pressure. Bebendo nas melhores fontes do thrash metal, o quarteto formado por Tiaraju Lima (vocal), Marcelo Santos (guitarra), Roger Veeck (baixo) e Igor Schneider (bateria) compôs um disco classudo, que pode ser colocado no pódio do thrash brasileiro. Em entrevista à ROADIE CREW, o guitarrista nos falou sobre a elaboração do disco, o feedback recebido e sobre solidariedade.
O mais recente trabalho do grupo, o álbum Into the Pressure foi lançado em 2018, mas o processo de composição dele foi iniciado quatro anos antes. O que pensam que esse longo caminho contribuiu no resultado final?
Marcelo Santos: Como somos uma banda independente, os prazos dependem da nossa própria disposição. É bem difícil conciliar compromissos pessoais, pois todos trabalham e precisam se organizar previamente. Mas, de certa forma, essas dificuldades fizeram com que pudéssemos avaliar o processo de produção do álbum com mais calma. Acredito que, neste sentido, a demora fez com que lapidássemos o máximo possível cada detalhe de cada música.
Antes de o álbum ser lançado oficialmente vocês o enviaram a um grupo seleto de músicos para receberem um feedback. Como surgiu a ideia de fazer isso e no que isso ajudou na divulgação do trabalho?
Marcelo: Nós pensamos que seria legal mandar o som para pessoas que trabalham com música e têm certa influência neste meio. Eles teriam propriedade para fazer uma avaliação mais detalhada e dar um respaldo um pouco mais completo de todo o trabalho. Todos responderam positivamente. Sempre que uma pessoa influente neste meio fala bem do seu trabalho é sinal de que você está no caminho certo e o público, em geral, acaba confiando mais no que você tem a oferecer. E foi exatamente isso que aconteceu, quando colocamos na rede depoimentos de caras como o Davi Piangers, o Sasha, o Dio Britto e outros grandes músicos.
Vocês utilizaram dois estúdios em Caxias do Sul para a concepção do material. As gravações rolaram no Black Stork e a mixagem no Estudio Noise. Por que estúdios diferentes para a elaboração do álbum?
Marcelo: Nós começamos a gravar em 2014 no Black Stork, do Thiago Caurio e do Benhur Lima, mas as versões mixadas das músicas não estavam da forma como gostaríamos. O processo de gravação foi excelente, mas o som final não era bem o que a gente queria. Em 2015, quando eu produzi o disco da Southern, conheci o Carlos Balbinot do Estúdio Noise. Ele e o Zanco, seu sócio, trabalham com diversos estilos musicais e acho que essa multiplicidade é o que fez com que confiássemos nosso som para um resultado final com eles. Queríamos uma sonoridade mais crua e orgânica, e conseguimos.
Into the Pressure é um verdadeiro convite aos fãs de thrash metal, graças à energia contida nas canções. Faixas como I Will Confront e Don’t Stop the Kill representam bem isso. Em contrapartida temos a trampada Live Like a Puppet, remetendo os ouvintes a discos como Rust in Peace (Megadeth) e Extreme Aggression (Kreator). Esse som em especial, teve algum tipo de desafio ao executar os instrumentos ou mesmo a voz?
Marcelo: Acredito que não. Nós vamos fazendo a coisa acontecer dentro dos nossos próprios limites. Essa música, especificamente, saiu com bastante facilidade. Eu me propus a compor uma música, como desafio, que ficasse dentro da escala cigana, na guitarra. Eu gosto da sonoridade desta escala e queria fazer alguma coisa com ela. Então os riffs vieram e depois trabalhamos as dinâmicas e os andamentos. Gostamos também do groove que ela incita e da levada quase “vanerão” do refrão. A letra fala sobre o fato de vivermos sobre o comando de certas hierarquias e a possibilidade de sermos mais autônomos em relação a isso. Essa música é uma boa porta de entrada para quem quiser conhecer o som da banda.
A banda recebeu um feedback bem favorável em sites e revistas especializadas em metal. Visto que a música pesada não é uma atividade rentável, qual a satisfação e motivação de lançar um material que está sendo aceito e bem difundido entre os fãs do gênero?
Marcelo: O valor de um reconhecimento tão amplo, de pessoas importantes do meio musical e mais ainda do público em geral – inclusive de pessoas que não são headbangers de carteirinha – é muito maior do que o valor financeiro. Pode ser que este estilo não seja rentável financeiramente no Brasil, que não tem por cultura colocar o heavy metal no mainstream. Mas no continente europeu e nos EUA é possível viver de metal, mesmo sendo uma banda em ascensão. O respaldo que tivemos de fora é talvez parte da nossa motivação e algo que ainda mantém a chama acesa. Quem sabe um dia a Torvo ainda não consiga aliar o valor do reconhecimento com o valor financeiro!
Além de darem conta do recado fazendo os bangers chacoalharem os pescoços, vocês se envolveram numa causa social num evento realizado em dezembro ao lado de bandas como Scraper Head e Ossos. Qual a importância das bandas de metal participarem desse tipo de evento?
Marcelo: Esse é o espírito do underground: todos se ajudam. Nossa participação no Natal do Metal já tem história. Tocamos em algumas edições deste evento e sempre tivemos uma ótima performance e retribuição do público, que comparece em peso em prol das causas: a social e a musical. Lembro de termos tocado numa dessas edições às 04:30 da manhã com casa lotada e energia a mil! Foi um dos grandes momentos da banda. Sempre que pudermos, participaremos de eventos como esse.