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WITHERFALL: O SOM DOS ESQUECIDOS

Foto: Stephanie Cabral

Por Daniel Agapito

Formada em 2013 na cidade de Los Angeles, na Califórnia, o quinteto dark metal Witherfall, sempre apresentou um trabalho de qualidade espetacular, mas parece que sempre houve alguma “conspiração do universo” para não quebrar o teto de vidro e atingir o reconhecimento internacional. Logo antes de entrar em turnê em promoção do seu primeiro álbum, Nocturnes and Requiems, lançado em 2016, seu baterista, Adam Sagan, infelizmente foi dessa para pior. Em 2021, depois de já terem sofrido bastante com a pandemia, a divulgação de seu terceiro álbum, Curse of Autumn teve que ser toda refeita por conta do caso do Jon Schaffer, vocalista do Iced Earth (que à época era integrado por Jake Dryer, guitarrista da Witherfall) que invadiu o capitólio americano. Agora, tudo está no caminho certo. Sounds of the Forgotten foi lançado sem sustos e foi aclamado mundialmente, impressionando tanto fãs quanto críticos. Lá no velho continente, fizeram sua primeira turnê como headliner, e também passaram um bom tempo abrindo para o Angra. A ROADIE CREW conseguiu trocar algumas palavras com Joseph Michael, o vocalista (e primo distante do Dio), que nos permitiu dar uma olhadinha na loucura que tem sido esses 11 anos de banda, também falando extensivamente da conexão da banda com o Brasil.

 

Vocês acabaram de sair de uma turnê europeia como headliner, que veio logo depois de uma turnê seguindo o Angra. Como foi excursionar pelo velho mundo ao lado dos gigantes do power metal nacional?

Joseph Michael: Sabe, sabíamos que seria muito bom e que os fãs deles eram super apaixonados e dedicados àquela banda, mas, honestamente, superou todas as nossas expectativas em relação a como os fãs realmente eram incríveis. Conhecíamos o Bruno (Valverde) por ele ter feito alguns shows com a gente; ele tocou no Keep It True Metal Festival em, acredito, 2019 ou 2018, então somos amigos dele há muito tempo. Ele tocou várias vezes com nosso baixista, Anthony Crawford. Era como uma turnê em família, foi muito legal, todo mundo se deu muito bem.

 

Antes de fazer a turnê, vocês lançaram a faixa Echoes nas plataformas digitais, sendo que ela já tinha sido disponibilizada como “faixa escondida” da edição de vinil de seu aclamado quarto álbum Sounds of the Forgotten. Qual é a história por trás desta música, e porque acabou se tornando “escondida”?

Joseph: Nós não “guardamos” músicas enquanto escrevemos; quando estamos trabalhando em um novo álbum, estamos totalmente focados nele. À medida que o novo álbum começou a tomar forma, percebemos que uma música específica não se encaixava realmente na narrativa, na sequência ou no clima do álbum. Então, decidimos fazer algo interessante — incluí-la no vinil sem anunciá-la. Queríamos ver se ela chamaria atenção nos fóruns. Alguns fãs na Alemanha, particularmente no fórum Deaf Forever, começaram a se perguntar sobre o que era essa música.Também estamos experimentando a ideia de voltar ao estilo antigo, beneficiando os fãs que compram produtos físicos. Hoje em dia, todo mundo ouve todas as músicas digitalmente de imediato, mas os fãs que gastam dinheiro em álbuns físicos frequentemente acabam ouvindo a música por último — especialmente aqueles que não usam serviços de streaming. Alguns fãs esperam até o dia do lançamento para receber o álbum e só então ouvir as músicas. Chegamos a considerar uma abordagem diferente: lançar o CD primeiro e depois liberar as faixas digitalmente, uma de cada vez, talvez uma por mês. Dessa forma, os fãs que realmente pagam pela música poderiam ouvi-la primeiro.

 

Dentre as músicas da nova edição deluxe do novo álbum, está um cover da clássica Kings and Queens do Aerosmith. O que exatamente inspirou sua inclusão no disco, e qual foi o processo para realmente transformá-la em uma versão Witherfall?

Joseph: Bem, nós sempre fizemos covers de músicas clássicas de rock. Por exemplo, fizemos I Won’t Back Down do Tom Petty e Foreplay/Long Time do Boston. Essa música em particular era uma que sempre quisemos fazer, mas o clima do álbum precisava estar adequado. Para este álbum, algumas músicas estavam mais inclinadas para uma pegada de rock, então pensamos: “Sim, agora é a hora”. Queríamos manter o cover relativamente fiel ao original, só que talvez um pouco mais pesado, com mais solos de guitarra. Acho que cheguei no agudo mais que o Steven [Tyler] no final. Claro, não cheirei 30 quilos de cocaína nem estou vivendo aquele estilo de vida rockstar como ele vivia. Mas, cara, não tem como não amar o Steven Tyler — ele é único.

 

Sounds têm recebido diversos elogios de críticos do mundo inteiro, já se estabelecendo como um marco na trajetória da banda. Como você diria que vocês evoluíram desde sua formação em 2013, ainda com o finado Adam Sagan na bateria, passando pelos singles e o primeiro álbum em 2016 e 2017, A Prelude em 2018, o EP um ano depois, o terceiro em 2021, chegando no novo álbum esse ano?

Joseph: Todo álbum que fazemos parece vir acompanhado de algum tipo de desastre — alguém morre, é preso, o estúdio é destruído ou alguma outra tragédia acontece. É quase uma maldição. Quando fizemos Curse of Autumn, o mundo basicamente parou por dois anos, e depois, o Jon Schaffer invadiu o Capitólio. Estamos sempre lidando com contratempos. Nunca é culpa de ninguém da banda, mas algo sempre acontece. Por exemplo, quando o Adam Sagan faleceu, não conseguimos fazer a turnê do nosso primeiro álbum. Ele morreu antes do lançamento do álbum, e não conseguimos encontrar um substituto a tempo para tornar a turnê possível. Mas, para este álbum, foi diferente. Esta é a primeira vez que tivemos uma formação realmente sólida, com músicos que realmente contribuem com algo significativo. E, como mencionei, acabamos de concluir cerca de seis semanas de turnê. As coisas estão melhorando. O show ao vivo sempre foi a peça que faltava no quebra-cabeça do Witherfall, e finalmente parece que estamos acertando essa parte.

 

Diria que todas essas tragédias refletem nas composições?

Joseph: Ah, com certeza. Quero dizer, somos uma verdadeira banda de death metal. Só porque há vocais limpos não significa que não seja death metal. Nossas músicas lidam com histórias reais, tragédias reais e perdas reais. Por exemplo, os irmãos do Adam realmente subiram ao palco do cruzeiro 70,000 Tons of Metal e espalharam suas cinzas no palco durante nosso primeiro show. Quero dizer, não dá para ficar muito mais sombrio do que isso.

 

Esse novo disco também conta com a volta de Marco Minnemann, baterista que gravou a percussão do último disco e já trabalhou com nomes como Joe Satriani e Jordan Rudess (Dream Theater). Como foi essa reunião com ele?

Joseph: O Marco tem sido nosso baterista de estúdio “coringa” há um bom tempo. Ele é incrivelmente versátil e muito fácil de trabalhar no estúdio. Não sei o quanto você sabe sobre o nosso processo, mas seguimos o estilo clássico — nossos álbuns levam meses para serem feitos e custam bastante dinheiro. Então, ter alguém como o Marco, que chega e, em uma semana, grava todas as faixas de bateria que precisamos, é uma enorme vantagem. É meio como o que o Steely Dan fazia, sabe? Nós construímos uma espécie de família musical que podemos chamar para lidar com partes diferentes de músicas diferentes, dependendo do que é necessário.

Sobre as letras do disco, você disse que “Estávamos escrevendo músicas melancólicas e depressivas no início, mas logo mudamos o tom para algo mais empoderador”. Há alguma história, ou algo do tipo, que faça uma “ponte” entre uma e outra?

Joseph: Não dessa vez. Este álbum é mais clássico. Alguns dos nossos outros discos eram mais no estilo King Diamond, com uma linha narrativa percorrendo todas as músicas. Mas, desta vez, é apenas uma coleção de músicas que sentimos que funcionavam muito bem em conjunto. A jornada é feita para valer a pena ser ouvida como um todo. Se você prestar atenção na sequência, vai perceber que tudo é intencional. Até incluímos transições entre algumas músicas e introduções, para que o fluxo seja contínuo.

 

Dentre todas as músicas do álbum, uma das que mais me chamou a atenção foi a épica  What Have You Done?, que fecha o álbum. Depois de mais de 10 minutos de metal melódico incrível, ela fecha com algumas frases um tanto melancólicas, até ermas: “What will it take to see the light again?/After all you still don’t see, what you have done./What have you done?”. Qual a história por trás dessa letra em específico, e como ela conclui as ideias apresentadas ao longo do LP?

Joseph: Bem, sabe, este álbum meio que resume nossas experiências, como tentar superar a COVID e lidar, você sabe, com o que aconteceu com o John Schaffer. Tudo isso realmente atrapalhou nossos planos. Quero dizer, tivemos turnês canceladas, a gravadora arrancando, você sabe, todos os adesivos nos vinis e CDs que tinham o nome do John. Foi uma loucura. E, sim, como já mencionamos antes, essa música é sobre o John e toda a situação que aconteceu no dia 6 de janeiro.

 

Em uma entrevista de 2017 para a revista alemã Deaf Forever, vocês comentaram que o Witherfall é seu próprio gênero, e que não tentam “caber em molde algum” durante o processo de produção. Diria que isso segue sendo real?

Joseph: Com certeza. Com certeza. Acho que somos, obviamente, vistos como uma banda de metal, sabe, com guitarras altas, bateria e, claro, vocais em falsete. Mas admiramos mais bandas como, quero dizer, Aerosmith, Queen ou até Guns N’ Roses, onde cada música é algo único. É completamente diferente. Tipo, você não pode ir até um amigo e ele perguntar: “Como é o som do Queen?” e simplesmente mostrar uma música. Isso não funciona. Há tanta variedade que você precisaria, no mínimo, montar uma seleção de algumas músicas para dar uma ideia.

 

Fora o Witherfall, você também é vocalista da lendária Sanctuary, substituindo o finado Warrel Dane em 2018. O último lançamento da banda foi o compilado Inception em 2017, antes mesmo de você entrar – e um dos últimos registros do antigo vocalista. Existe alguma possibilidade de vocês voltarem ao estúdio e lançarem material novo, ou o plano agora é só continuar honrando o trabalho de Dane ao vivo?

Joseph: Sim, temos trabalhado em algo há bastante tempo. Quero dizer, não sei se você percebeu, mas esses caras demoram muito para lançar um álbum. Eles fizeram três álbuns em 40 anos, então estou fazendo a minha parte, na medida do possível. Eles são bem old school — precisam se reunir e tocar juntos. Sabe, um dos bateristas mora na Flórida, então voar para Seattle é caro. Quando estávamos em turnê com mais frequência, era mais fácil, porque ele podia simplesmente trabalhar com o Lenny (Rutledge, guitarrista) enquanto ensaiavam e tudo mais. Mas agora, com algumas turnês bagunçadas por causa da COVID, ficou mais caro e inviável. Mas, respondendo diretamente à sua pergunta, temos três músicas gravadas com o Zeus (Chris Harris, produtor), e, na verdade, duas delas têm o Jake Dryer na guitarra solo. Temos muito mais material; só que nem todas as peças do quebra-cabeça estão no lugar ainda. Sabe, arrumar o orçamento e tudo mais. Mas tem algo vindo, e é muito bom. Eu realmente gosto das músicas.

 

Dei uma fuçada na internet e descobri que você é primo do Ronnie James Dio. Sei que você não conseguiu se conectar muito com ele antes de partir, mas você diria que ele é uma grande influência no seu trabalho?

Joseph: Sim, bem, demorou um pouco para eu realmente reconhecer o Dio como uma influência. No início, eu não estava exatamente— quer dizer, eu gostava de todos os álbuns, mas levou um tempo para eu realmente apreciar o que ele traz. Há um foco intenso no timbre e na produção com ele, algo que muitos cantores não têm. Ele não tem o maior alcance vocal se comparado a alguns dos caras considerados os grandes, mas o tom dele é simplesmente tão puro. Dá para perceber que é algo no qual ele realmente trabalhou.

 

Tem algo que ele falou, algo que ele fez que você leva para a vida, algo do tipo?

Joseph: Bem, ele me disse: “Não mencione meu nome na imprensa da próxima vez, a menos que pergunte antes.” Não, isso foi antes mesmo de ele saber quem eu era. Recebi uma ligação da Wendy (esposa de Dio). Eu tinha feito um cover de Heaven and Hell, isso foi lá atrás, tipo em 2007 ou algo assim. E eu fiquei tipo: “Meu Deus, Wendy?” E ela: “Sim, lemos o comunicado de imprensa da Earache Records quando eu estava no White Wizard, e mencionamos o Ronnie,” e, sabe, algo como: “Quais membros da família?” Então eu meio que tive que explicar. Aí ela disse: “Ei, coloca ele no telefone.” E eu pensei: “Ah, claro, talvez seja você mesmo.” E ela falou: “Olha, da próxima vez, só dá um toque pra gente quando for dar entrevistas.” Mas eu nunca cheguei a conhecer o Ronnie. Só falei com ele duas vezes antes de ele falecer. Foi bem antes de ele morrer, então ele provavelmente estava apenas em casa, descansando. Provavelmente foi assim que eles me acharam—devem ter estado em casa sem muito o que fazer. Mas foi triste. Fiquei realmente triste por ele ter morrido antes de eu ter a chance de conhecê-lo.

 

Podemos dizer que a conexão do Witherfall com o Brasil é profunda, não só por você integrar o Sanctuary, que tem uma boa base de fãs por aqui, Jake Dreyer, o guitarrista, integrou o Iced Earth e participou da turnê do Dystopia aqui, Adam Sagan, baterista, já veio para cá com o Circle II Circle. Fora isso, já até tiveram integrantes brasileiros, com o Bruno Valverde (Angra) fazendo alguns shows. O que você diria que é o grande diferencial do Brasil e de seu público?

Joseph: Bom, na verdade, eu nunca fui ao Brasil. Estou realmente ansioso por isso, mas, hum, tem algo nos fãs brasileiros que sempre curtiram esse tipo de música. Tivemos um cara no Brasil que criou um fã-clube para a gente no Instagram. Chama Witherfall Fan Page Brazil e tem uns 5 mil seguidores—nós nem fizemos nada para isso. Ele estava enviando camisetas para várias meninas metaleiras, e eu não tive nada a ver com isso. Aconteceu de forma totalmente orgânica. Então, espero que consigamos ir para aí. Eu sei algumas coisas sobre o país, e gosto de boa comida e vinho.

 

Então, era isso que eu ia perguntar: será que o famoso ‘come to Brazil’ vai se tornar realidade em breve?

Joseph: Acho que sim. Sabe, fomos contatados pelo nosso pessoal, e estamos começando a nos conectar com uma equipe que está nos ajudando a nos estabelecer mais. Então, acredito que provavelmente dentro do próximo ano vocês nos verão por aí.

Foto: Stephanie Cabral
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