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METALLICA em Belo Horizonte (MG) – 12 de maio de 2022

Texto: Thiago Prata / Fotos: Denilton Dias

O Metallica já havia executado com classe e fúria (por mais ambíguo ou antagônico isso possa parecer) a trinca Hardwired, Ride the Lightning e Wherever I May Roam, quando James Hetfield mencionou o fato de estarem na “terra natal do Sepultura”, culminando em gritos e palmas de 54 mil fãs que lotaram o coliseu do futebol mineiro, o Mineirão, na noite da última quinta-feira (12). “Por isso vocês são tão loucos”, arrematou o vocalista e guitarrista do grupo norte-americano, pouco antes da execução de Seek & Destroy, oriunda daquele que é considerado por muitos (ao lado de Show no Mercy, do Slayer, ambos de 1983) o marco-zero do thrash metal (sem contar demos e participações em coletâneas, claro). E juntamente com esse momento específico há um sentido simbólico.

Lá na primeira metade da década de 1980, o Metallica (e outras bandas conterrâneas e contemporâneas) influenciou diretamente o Sepultura e toda uma cena que efervescia em Belo Horizonte. Seja pelo lirismo, as palhetadas rápidas, as vestimentas ou o puro sentimento emanado daquele então jovem quarteto que não intentava gravar videoclipes e queria cantar e tocar o mais alto possível, os monstros da Bay Area influenciaram os grupos mineiros (e de vários cantos do país). É sintomático ouvir Seek & Destroy quase que como uma homenagem… Ou melhor, uma celebração ali na terra do Sepultura, do Sarcófago, do Mutilator, do Overdose, do Chakal… De toda uma cena que, direta ou indiretamente, o próprio Metallica ajudou a graduar.

Posto isso, vamos voltar alguns minutos em nossa construção narrativa. Após os brasileiros do Ego Kill Talent e os americanos do Greta Van Fleet (mais abaixo você confere a respeito desses dois shows), os fãs aguardavam ansiosamente a hora em que o Metallica subiria ao palco, prevista para as 21h. E para quem esperou dois anos por conta da pandemia (ou 41 desde o nascimento do grupo ou 33 desde a primeira vinda da banda ao país, em 1989, enfim…), alguns minutos de atraso do início da apresentação não iriam gerar insatisfação (ainda que a ansiedade de muitos estivesse elevadíssima). Mas foi o suficiente para a velha rivalidade do futebol. No local também conhecido como “Salão de Festas” para os atleticanos e “Toca III” aos cruzeirenses, vieram os cânticos de “Galo”, prontamente respondidos pelos torcedores celestes. Tudo de forma sadia, na brincadeira.

Veio então o hino It’s a Long Way to the Top (If You Wanna Rock ‘n’ Roll), do AC/DC, para unir novamente todos no Mineirão em prol do Metallica, o time do coração de milhares ali presentes (inclusive eu): era a senha para a clássica introdução The Ecstasy of Gold, composição do saudoso Ennio Morricone na trilha do filme “The Good, The Bad and the Ugly” (1966). Diferentemente de outras praças, em que Whiplash era (um puta) pontapé inicial do setlist do Metallica, o Gigante da Bay Area subiu ao palco do Gigante da Pampulha com Hardwired, do mais recente trabalho de estúdio Hardwired… to Self-Destruct, de seis anos atrás, o que também não deixa de ser um baita começo – o público curtiu; a banda, idem.

Os primeiros acordes de Ride The Lightning estremeceram o Mineirão, com o refrão sendo cantado em uníssono, assim como a primeira do “Black Album” (1991) da noite, Wherever I May Roam, quinta faixa do mais bem-sucedido disco do grupo. Aliás, Ride e Black foram os álbuns com mais músicas tocadas nesse show, com cinco, cada.

Depois de Seek & Destroy, Moth Into Flame era mais uma de Hardwired…, contando com pirotecnia, para o deleite dos presentes, embora não tenha sido recebida da mesma forma que as anteriores. Coube a One conduzir a uma catarse espiritual no estádio, com James, Lars Ulrich (bateria), Kirk Hammett (guitarra) e Robert Trujillo (baixo) mandando ver. Importante salientar que eram notórios os erros de execução da banda até então, o que não atrapalhava o resultado final, nem o entusiasmo da galera presente. Em seguida, Hetfield, assim como em São Paulo, fez a piada do “se você for ter um bebê, tem um canto aqui do lado”, referindo-se ao parto realizado durante o show da banda em Curitiba, no último dia 7, e arrancando risadas da plateia e ao qual James ainda rotulou como “incrível”. Momento que antecedeu a um discurso de um emocionado vocalista que se dizia “inseguro” em estar nos palcos novamente e que foi ovacionado pelos fãs.

A euforia tomou conta com Sad But True. Depois, uma “baixa” no ânimo do público (em comparação, logicamente) com a surpresa da noite Cyanide, de Death Magnetic (2008) – gosto é gosto, tem quem aprecie essa música; não é o caso deste que vos escreve, nem de muitos ali no Mineirão. The Unforgiven recolou o Metallica no jogo, e a trinca For Whom the Bell Tolls/Creeping Death/Fade to Black (todas de Ride) foi êxtase sonoro para os fãs mais old school. Antes do bis, Master of Puppets… E esta sempre vai merecer um capítulo à parte.

A introdução de Master te “obriga” a fazer “air guitar”, “air drum”, “air bass”… E os riffs o convidam para bangear sem parar. Assim como o refrão o faz ficar rouco (se àquela altura você já não estivesse sem voz). O dueto de James e Kirk na parte do meio chegou a arrancar lágrimas, enquanto os telões mostravam imagens das clássicas cruzes dos cemitérios, em alusão à capa do imortal álbum de mesmo nome de 1986. Por sinal, as imagens nos telões ajudavam a criar todo um conceito ao show, como em One, For Whom the Bell Tolls, Cyanide e tantas outras.

No bis, a parte acústica que inicia Fight Fire With Fire dava indícios de mais um convite ao mosh. Coisa linda ouvir o Metallica executando a primeira faixa de Ride. Interessante notar que o show em BH contou com gratas mudanças no repertório em comparação com outros lugares (felizmente, não tivemos que ouvir nada de St. Anger, algo que São Paulo precisou aguentar com a péssima Dirty Window). O encerramento, no entanto, não abriu espaço para mais novidades. Nem era preciso. Nothing Else Matters (com alguns erros de execução no fim, OK, tá valendo) e a antológica Enter Sandman encerraram uma noite para lá de marcante para todos que foram conferir na “terra natal do Sepultura” os “responsáveis pelo embrião de uma das mais importantes cenas do país e do mundo do metal”. Ou, se você achar que há um exagero quanto a isso, os pais (novamente, ao lado do Slayer) de um gênero que ajudou a cunhar muitas bandas clássicas brotadas em solo verde-amarelo. E isso não é pouco!

Aberturas

Por volta das 18h30, a banda brasileira Ego Kill Talent cumpriu muito bem sua função de abertura para os dois grupos norte-americanos. Com uma junção de hard moderno, heavy e grunge, acento pop e flertes com outros estilos, Jonathan Dörr (vocal, ex-Reação em Cadeia), Theo Van Der Loo (baixo e guitarra, ex-Sayowa), Jean Dolabella (bateria e guitarra, ex-Sepultura, Diesel e Udora), Raphael Miranda (bateria e baixo, ex-Sayowa) e Niper Boaventura (guitarra e baixo, ex- PullDown) mostraram muita energia, aquecendo o público. Não faltaram aplausos e gritos efusivos.

O Greta Van Fleet veio em seguida para uma aula de hard rock. E, sim, aos críticos de que a banda é uma “cópia do Led Zeppelin”, há pelo menos de se reconhecer que foi um show muito bom – para dizer o mínimo. Em promoção ao álbum The Battle at Garden’s Gate (2021), a banda formada pelos irmãos Kiszka – o vocalista Josh, o guitarrista Jake e o baixista, pianista e tecladista Sam – e o baterista Danny Wagner fez um set curto, porém, extremamente competente. Do início com Built By Nations ao encerramento com o hit Highway Tune, destilou uma fusão muito bem-vinda de qualidade técnica, química, diversão e rock’n’roll. Obviamente eles não são o Led Zeppelin (apesar de Jake aludir a Jimmy Page, inclusive com as vestimentas). Mas são o Greta Van Fleet, e cabe a você reconhecer isso.

 

Em suma, mais uma noite histórica no Mineirão. E que o Metallica, o Greta e o Ego possam voltar novamente a Belo Horizonte. A gente agradece!

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