Por Heverton Souza
Com seus 50 anos de história, finalmente o Pentagram, a lenda heavy-doom conhecida como “a resposta americana ao Black Sabbath”, deu o ar da graça em terras tropicais. Numa noite úmida e gelada de domingo (11 de setembro), uma fila de headbangers ia se formando do lado de fora do tradicional Hangar 110, localizado no Bom Retiro, bairro da região central de São Paulo.
Antes disso, ainda no fim da tarde, com os primeiros fãs espalhados pela área, foi possível ver o vocalista Bobby Liebling deixando o local após passagem de som. Dali até o fatídico show seriam longas horas para todos. Uma fila imensa ia se formando na calçada, surpreendendo os mais céticos quanto ao público que estaria interessado em ver a banda. Não é que ela não mereça, mas é que diante de todo histórico de Liebling com o uso de drogas que tanto afetou sua saúde ao longo de toda sua carreira, seria impossível não ficar pelo menos inseguro em saber se o vocalitsa estaria em capacidade física de se apresentar. Então, talvez o carisma e importância histórica do Pentagram tivessem mais peso a todos ali que exatamente uma performance que poderia ser duvidosa em palco.
“É muito difícil compartilhar o que passei, porque só quem esteve envolvido seriamente com isso sabe da gravidade. Ainda mais no meu caso, pois fui um dependente de narcóticos e, nos anos 90, cheguei ao fundo do poço. Aquilo tirou até o meu interesse de tocar. Tornei-me um recluso, não queria mais sair de casa. Minha vida estava totalmente desarrumada”, declarou Liebling certa vez à ROADIE CREW (N.R.: assista ao documentário ‘Last Rites: The Fall And Rise Of Bobby Liebling’).
A casa já beirava a lotação de sua pista e passava de uma hora de atraso da abertura do evento anunciada ao público quando, às 20h, a banda paulista Grindhouse Hotel teria a ingrata missão de abrir um show que alguns ali passaram a vida esperando. Divulgando os três trabalhos lançados desde seu início de carreira, em 2010, o stoner rock da banda traz uma combinação do clássico com o que há de mais atual no estilo, esta última parte muito mais a cargo dos vocais do guitarrista e vocalista Leandro Carbonato. Com direito à som inédito e a uma bela versão de Fortunate Son, do Credence Clearwater Revival, entregou um bom show, mas talvez não tenha empolgado tanto os presentes, seja por todo horário que visivelmente o evento se arrastaria numa noite de domingo ou pela ansiedade em ver a atração principal.
E enquanto a atração da noite não começava seu show, havia aquela velha reunião de pessoas que se encontram esporadicamente, além de, felizmente, uma galera jovem, que traz uma esperança em manter tudo isso vivo por longos anos.
Às 21h20, o público chamava pelo nome de Bobby quando, sem pompas, Matt Goldsborough (guitarra), Greg Turley (baixo), “Minnesota” Pete Campbell (bateri) e, claro, a lenda Bobby Liebling, apareceram para todos no abrir de cortinas para iniciar o show do Pentagram com Run My Course, música do lendário primeiro álbum, que levou 15 anos para ganhar vida. Starlady já nos colou nos anos 1990 da carreira da banda, assim como Ask No More, do fantástico álbum Be Forewarned (1994).
A pergunta de quem está lendo e não viu o show da banda: “como estão ao vivo?” Todo o trio instrumental é impecável em escolhas de timbres, execuções e perfomances. O músico mais novo na banda é o guitarrista Matt Goldsborough, que está na formação desde 2019, enquanto Pete está desde 2015 e Greg, o mais veterano entre os três, segue desde 1995. Porém, o entrosamento dos caras faz a gente ter a impressão de que estão todos juntos desde os anos 1980. Já Bobby… Bem, Bobby era ali uma bela supresa ao vivo, não apenas cantando com vigor, mas performando com suas caras e bocas e seus movimentos “sexys”. Mesmo parecendo uma versão mais velha do personagem Bruxa do 71, o Sr. Liebling estava mais vivo que nunca, claramente tendo seus anos de abusos como parte passado. E não tinha como assistir a entrega dele, com seus 68 anos de idade e não notar que tudo vinha com aquele sentimento de que só estar em palco faz sentido na vida do cantor.
Após The Goul, mais uma clássica voltando ao disco homônimo, Bobby falou sobre essa tour de 50 anos e anunciou a seguinte com um trocadilho “I Have to Review My Choices”, ou seja, Review Your Choices era dona da vez, faixa-título do disco de 1999. Já a música Be Forewarned não apenas representa um dos melhores discos do Pentagram, mas foi uma das melhores de todo o show, com o público cantando junto. E veio numa sequência matadora com o hino Sign of the Wolf (Pentagram).
Com mais uma “dancinha sensual”, Bobby se introduz, com o perdão do trocadilho, para When the Screams Come. Mas foi mesmo com Petrified que sentimos todo o peso da banda, em um grave que vibrava até o piso do Hangar 110. As colunas que tanto atrapalham a visão, certamente seguram o teto de não cair em nossas cabeças nessas horas. Sem deixar um segundo de silêncio sequer, Liebling chamou por Dying World e, ao convocar o público para o ‘Hey hey’ no meio dela, foi prontamente respondido.
Ao perguntar se estão todos bem e ter uma resposta de poucos, o vocalista questiona novamente e com mais força para, aí sim, ter uma resposta mais firme do público. A sequência com Devil’s Playground e Relentless encerrou a primeira parte do set, mas a banda não demora a voltar ao palco.
Simpático, mas sem sair de seu personagem, Bobby fala sobre a banda estar passando pela América do Sul pela primeira vez em seus 50 anos de história musical e nisso veio a premissa de Last Days Here. Bobby agradece a todos e sem delongas, a banda inicia aquela que todos esperaram por toda a noite: o clássico Forever My Queen. É curioso como músicas tanto de discos como o de estreia, lá de 1985, como de álbuns como de Show ‘Em How ou Curious Volume, de 2004 e 2015, respecticvamente, soem todas ao vivo como de uma mesma época, de forma atemporal mesmo, fazendo com que o show, por mais nostálgico que o seja, musicalmente se mantenha sempre numa mesma pegada e com uma boa dose de peso.
E entre as reclamações com o horário, com o show encerrado após as 22h30 da noite de domingo, também se ouvia muitos suspiros de satisfação em ver ao vivo uma lenda da história da rock, que talvez não tenhamos a chance de ver novamente em nossas terras tropicais.
“Hoje posso ver as coisas claramente, porque quando estava nas drogas não dava. O que mais quero fazer é gravar, produzir e cantar ao vivo. Antes, pensava nos meus prazeres, mas agora quero agradar o público, pois sem ele não há nada” – Bobby Liebling.
Setlist Pentagram:
Run My Course
Starlady
Ask No More
The Ghoul
Review Your Choices
Be Forewarned
Sign of the Wolf (Pentagram)
When the Screams Come
Petrified
Dying World
Devil’s Playground
Relentless
Last Days Here
Forever My Queen
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