Por Luiz Tosi
Fotos: Roberto Sant’Anna
No último domingo (18), São Paulo recebeu a primeira edição do Knotfest Brasil, festival que traz, além do Slipknot, banda que dá nome ao evento, os veteranos do Judas Priest, a volta do “Pantera” e as bandas Bring Me the Horizon, Sepultura, Trivium, Mr. Bungle, Motionless In White, Vended, Project46, Oitão e Jimmy & Rats. Antes, porém, os bangers paulistanos ganharam de quebra uma apresentação solo Judas Priest, com direito a abertura do Pantera, realizada na quinta-feira (15) no Vibra São Paulo (antigo Credicard Hall).
Confesso que nunca fui um grande fã de Pantera. Longe de achar ruim, apenas não me faz tanto a cabeça. É um tipo de banda que basta um ‘Greatest Hits’ na minha coleção. De qualquer modo, me colocando no lugar dos fãs, acho que não teria curtido nadinha eles se reunirem usando esse nome. Preferiria que preservassem a “lenda”, adotando um nome-tributo (“Cowboys From Hell” funcionaria bem). Mas enfim, é direito deles.
Dos membros originais, apenas o vocalista Phil Anselmo compareceu, uma vez que o baixista Rex Brown foi diagnosticado com Covid-19 ainda durante a passagem da banda pelo Chile, e teve que ser substituído por Derek Engemann, companheiro de Anselmo nas bandas The Illegals e Scour; transformando então o “Pantera” numa espécie de “Phil Anselmo & Friends”. Com relação aos membros convidados, Zakk Wylde sempre pareceu a escolha mais óbvia, já que os rumores sobre essa reunião com ele na guitarra datam de 2013, antes mesmo de o baterista Vinnie Paul falecer. A presença de Charlie Benante foi outra escolha previsível e acertada, não só pela suas técnicas “baterísticas”, como também pela relação de amizade de mais de 25 anos entre Anthrax e Pantera.
A expectativa pela apresentação do Pantera era grande por parte do público, que veio em peso para ver a banda. Pela minha pesquisa “Data-Camisetas”, dá para dizer que o Pantera praticamente dividiu o Vibra SP com o Judas Priest. A banda entrou com A New Level, levando alguns fãs às lagrimas. Ninguém parecia se importar que de “Pantera” mesmo, só tinha Phil Anselmo, e o público realmente abraçou a ideia da volta da banda. Alguns chegaram até a gritar “não acredito que eu estou vendo Pantera”. Acho que vai continuar sem ver, mas deu para entender o ponto.
Verdade seja dita, a banda fez por merecer a recepção calorosa entregando um ótimo show. O setlist agradou dos mais fanáticos, que cantaram (berraram?) as letras até de faixas menos óbvias como Yesterday Don’t Mean Shit; até os “fãs de Greatest Hits”, como eu. Difícil ficar parado com Becoming, I’m Broken, 5 Minutes Alone e Walk, ou com os hinos Mouth for War e Cowboys From Hell. Também não faltaram homenagens aos irmãos Abbot. “Há um milhão de coisas que eu poderia dizer agora, mas tudo o que vou dizer é que cada nota que tocamos, cada letras e cada melodia são para Vinnie e Dime”, disse Anselmo logo no início do show. No meio do show, um dos momentos mais emocionais, quando os telões um vídeo em tributo aos irmãos, primeiro ao som de Cemetery Gates e, em seguida, com a banda executando Planet Caravan, cover do Black Sabbath.
O público foi bastante participativo, mas se portou de modo bem comedido. Nada de moshpit, pula-pula e stage dive. Em contrapartida, sobrou celular pro alto, gravando tudinho. Outro detalhe que chamou a atenção foi a presença de Rob Halford ao lado do palco durante grande parte do show do Pantera e parecendo gostar bastante.
Quanto às performances, não tenho muito embasamento para avaliar o vocal de Phil Anselmo, que costuma ser questionado pelos fãs, mas não achei nada de errado com a sua performance. Pelo contrário, gostei muito. Entendedores, por favor, comentem. Água no chope à parte, Derek Engemann tirou o desafio de letra e entregou uma performance bastante sólida e segura no baixo. Mas o que todo mundo queria ver mesmo era Charlie Benante e Zakk Wylde.
Benante é um nerd-cdf, como tal, parece ter estudado cada detalhe de Vinnie. Do som de bateria, trigado como o do baterista do Pantera, à interpretação em si, tudo pareceu pensado nos detalhes para levar o público de volta à experiência de sentir a bateria do amigo ao vivo. E aqui o verbo correto é “sentir” mesmo. Aplausos para Charlie. Já Zakk Wylde… bom, Zakk Wylde foi Zakk Wylde. E, como era de se esperar, Zakk Wylde tocando Pantera soa exatamente como… Zakk Wylde tocando Pantera. Ele nem de longe tentou replicar e capturar o som e a pegada de Dime. Não fez questão nenhuma de emular o guitarrista original, abusando dos seus harmônicos e timbres característicos. Ficou interessante, porém, nem sempre funciona. Como Phil, Charlie e Derek executam vocais, bateria, baixo em linhas bem próximas às versões originais, a guitarra de Zakk acabava se destoando como o “elemento diferente” e, às vezes, isso acaba te tirando das músicas. This Love foi um exemplo disso. De qualquer modo, maioria esmagadora dos fãs parece ter aprovado Zakk e essa nova encarnação do Pantera. Sendo assim, quem sou eu para discordar? Vinda longa ao Pantera!
O intervalo para troca de palco foi extremamente lento, atrasando bastante o início do show do Judas Priest. A nota negativa da noite vai a desorganização, o despreparo e a falta de estrutura do Vibra SP. Uma aula de ineficiência na organização das filas de entrada e orientação do público, além de filas intermináveis nos banheiros (entupidos) e bares que fizeram muitos fãs perderem parte dos shows. E para piorar, ainda durante o show do Pantera a cerveja acabou! Como diria um amigo meu: tétrico.
Completando 50 anos da sua formação, o Judas Priest tem se mantido vivo e ativo com classe e brilhantismo únicos, mesmo tendo atravessado uma série de turbulências e adversidades que vão de dramas via imprensa entre a banda e o ex-guitarrista K.K. Downing, ao afastamento do guitarrista Glenn Tipton devido a um diagnóstico de mal de Parkinson, passando por um tratamento de câncer de Rob Halford. Sem falar na ideia esdrúxula de sair em turnê com apenas um guitarrista – decisão que foi revista rapidinho, tamanha a reação negativas dos fãs.
Nessa turnê, os membros originais, Rob Halford (vocal) e Ian Hill (baixo), seguem acompanhados pelos seus fiéis escudeiros, o guitarrista Richie Faulkner e o espetacular baterista Scott Travis. O time é completado pelo produtor da banda (e de tantas outras), Andy Sneap, que dá uma força fazendo as vezes de Glenn Tipton, executando suas partes à perfeição.
Como já é tradição nas apresentações do Judas, War Pigs, clássico do Black Sabbath, avisa que o show vai começar. A abertura também é uma tradição: The Hellion (gravada) e Electric Eye, faixas de abertura de Screaming For Vengeance, de 1982 e o disco que define heavy metal para 9 em 10 fãs do gênero. O entrosamento de mais de trinta anos entre Ian Hill e Scott Travis resultou em das melhores cozinhas do heavy metal, criando a base perfeita para qualquer guitarrista brilhar. E Richie Faulkner aproveita essa oportunidade como poucos. Esse já está em casa. Mas logo na primeira música, fica claro quem é o dono da noite: que fase maravilhosa essa do Rob Halford. Aos 71 anos de idade, ele transborda confiança e consegue como poucos entender suas fortalezas e seus limites. Rob conhece todos os atalhos e recursos e técnicas e tecnologias à sua disposição para entregar uma performance impecável. Vestido com couro e lantejoulas, ele impressiona em cada detalhe. Não é à toa que ele é o Deus Metal.
O setlist foi uma ótima surpresa, bem mais voltado para as faixas “straight metal” e quase todo calcado nos anos 80. Após Electric Eye, vem a trinca Riding on the Wind, You’ve Got Another Thing Comin’ e Jawbreaker, que volta ao setlist depois de seis anos. A seguinte é Firepower, faixa-título do mais recente álbum, de 2018 – disparado, o melhor lançamento desde o retorno de Rob Halford para a banda, em 2003. Faixas menos manjadas e algumas surpresas como Devil’s Child, Steeler e Between the Hammer and the Anvil caíram muito bem ao lado de outras mais consagradas como as mid-tempo Turbo Lover e Metal Gods e as bofetadas Screaming for Vengeance e Painkiller. Ainda tivemos uma das minhas favoritas, The Green Manalishi (With the Two Prong Crown), cover do Fleetwood Mac devidamente apropriado pelo Priest ainda nos anos 70 e, no bis, as magnânimas Hell Bent for Leather, com Halford entrando com a sua moto no palco, Breaking the Law e Living After Midnight, o Rock And Roll All Nite deles.
Cada uma à sua maneira, no fim foram duas apresentações dignas dos nomes que essas duas bandas carregam. Não sabemos se esse Pantera vai durar, assim como não sabemos até quando esse Judas Priest dura, mas, se essa for a última passagem dos dois pelo Brasil, terão deixado uma ótima memória.
Pantera – Setlist:
A New Level
Mouth for War
Strength Beyond Strength
Becoming
I’m Broken
5 Minutes Alone
This Love
Yesterday Don’t Mean Shit
Fucking Hostile
Vídeo tributo a Dimebag e Vinnie com trecho de Cemetery Gates
Planet Caravan (cover de Black Sabbath)
Walk
Domination / Hollow
Cowboys From Hell
Judas Priest – Setlist:
Intro (gravada): The Hellion
Electric Eye
Riding on the Wind
You’ve Got Another Thing Comin’
Jawbreaker
Firepower
Devil’s Child
Turbo Lover
Steeler
Between the Hammer and the Anvil
Metal Gods
The Green Manalishi (With the Two Prong Crown)
Screaming for Vengeance
Painkiller
Hell Bent for Leather
Breaking the Law
Living After Midnight
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