Por Jayme Alexandre de Lima
Fotos: Heloisa Vidal
O Sweden Rock Festival celebrou sua 30ª edição entre os dias 7 e 10 de junho, marcando um acontecimento significativo em sua história. Com a presença de grandes atrações como Iron Maiden, Deep Purple, Mötley Crüe, Def Leppard, Pantera e Europe, o festival proporcionou quatro dias de muita música, sol e celebração.
A história do Sweden Rock teve início em 1992, quando o evento foi originalmente batizado de “Sommarfestivalen i Olofström”. Os organizadores tinham a intenção de trazer estilos musicais pouco comuns em festivais suecos, como classic rock, hard rock, folk e blues. Os dois headliners da primeira edição foram Nazareth e Wishbone Ash. Ao longo dos anos, o festival passou a focar cada vez mais em diferentes vertentes do rock, atraindo artistas renomados como Lynyrd Skynyrd, Fleetwood Mac e Black Sabbath. Em 1998, ocorreu a primeira edição do festival na cidade de Sölvesborg, no mesmo local onde é realizado até os dias atuais.
Em 1999, o evento adotou o nome “Sweden Rock Festival” e o line-up contou com bandas de renome, como Motörhead, Manowar e Mercyful Fate. O SRF continuou a crescer ano após ano, até que, em 2017, foi adquirido pela Live Nation, uma gigante do entretenimento, consolidando-se como um dos festivais de música mais importantes do mundo.
O Sweden Rock Festival tem a capacidade única de sempre resgatar bandas pouco conhecidas das décadas de 70, 80 e 90, que são fantásticas, como AXE, GREAT KING RAT, Q5 e ARTCH, para citar apenas algumas das quais tivemos o privilégio de presenciar. No entanto, outra característica impressionante que torna a experiência tão especial é a cultura de diversidade e inclusão que é vivenciada de forma natural durante o festival. É comum encontrar famílias completas, incluindo crianças e até mesmo bebês de colo, juntamente com pessoas em seus vinte e poucos anos e outras com mais de setenta anos! Além disso, é notável a participação de pessoas com deficiência física que aproveitam intensamente os quatro dias de festival, graças à excelente infraestrutura que permite sua locomoção e conforto durante os shows. Todos convivem de maneira calorosa e harmoniosa, unidos pela paixão pela música. Essa atmosfera é uma verdadeira lição de civilidade e educação.
DIA 1 – quarta-feira, 7 de junho
Como parte das comemorações da trigésima edição, este ano o primeiro dia, que costumava ser um aquecimento com horário reduzido e sem shows no palco principal, tornou-se um dia completo com apresentações em todos os cinco palcos.
Com temperaturas elevadas e céu sem nuvens, nos aproximamos dos portões aguardando a abertura oficial. De repente, os integrantes do AIRBOURNE surgem no topo da estrutura e, ao som de “Live It Up”, exclamam “open the gates”, enquanto bombas de fumaça colorida explodem no céu!
Logo de início, ficou evidente que este ano o festival estava mais lotado do que o normal. Estimou-se a presença de 45 mil pessoas por dia, porém isso não comprometeu significativamente a experiência, especialmente devido à boa disponibilidade de banheiros e opções para alimentação e bebidas.
O primeiro show ficou por conta dos suecos do ERADIKATED, que estão prestes a lançar seu álbum de estreia, intitulado “Descendants”, em 6 de outubro. Foi um excelente começo para a maratona de rock’n’roll com um thrash metal oitentista muito bem executado. Destaque para a pesadas “Faced” e “Exhale”, que traz claras influências de Testament e Slayer.
Em seguida, dirigimo-nos ao Sweden Stage para assistir ao DYNAZTY, que teve um crescimento significativo desde sua última apresentação no festival em 2019. A banda iniciou suas atividades em 2008, fazendo um hard rock mais melódico e acessível na pegada dos conterrâneos do H.E.A.T., mas a partir de 2014, incorporou elementos de power metal moderno, mantendo essa abordagem até hoje. O set foi baseado nos últimos quatro discos e o encerramento veio com “The Human Paradox”, do álbum “Titanic Mass”, e “Heartless Madness”, acompanhados por uma chuva de papéis coloridos e fogos de artifício.
Estava na expectativa para assistir ao SPIDERGAWD, da Noruega. A banda traz uma mistura que combina o swing do Thin Lizzy, a intensidade do MC5, a veia melódica do Grand Funk Railroad, a psicodelia do The Stooges e a potência do hard rock e heavy metal do final da década de 70. Adicione a tudo isso uma dose cavalar de saxofone (!) e terá um vislumbre do que é o som desses caras, cujo estilo os fundadores Per Borten (guitarra e vocal) e Kenneth Kapstd (bateria) preferem chamar simplesmente de rock’n’roll.
A banda iniciou sua performance com os dois novos singles, “The Tower” e “Your Heritage”, fazendo com que todos se movessem ao ritmo contagiante. A sequência com “At Rainbows End”, “What You Have Become”, “Stranglehold” e “LouCille” manteve a energia em alta. As excelentes “Into The Deep Serene” e “Oceanchild”, do álbum “Spidergawd VI” (2021), proporcionaram grande satisfação aos fãs do estilo, enquanto o gran finale ficou por conta dos sucessos “Is This Love?” (qualquer semelhança com o clássico “Bad Reputation” do Thin Lizzy provavelmente não é mera coincidência) e “All and Everything”. Foi um show espetacular, com músicas repletas de criatividade e personalidade. Agora resta aguardar ansiosamente por uma turnê por aqui.
O ENFORCER, um dos representantes da New Wave of Traditional Heavy Metal, realizou sua apresentação na tenda (Pistonhead Stage), trazendo o metal oitentista em todos os detalhes, desde as roupas até os temas das músicas, incluindo o distintivo bigode do guitarrista Jonathan Nordwall. De acordo com os membros da banda, o heavy metal não é retrô, mas sim atemporal (assino embaixo!). O show foi excelente, com destaque para a incrível performance de “Undying Evil”.
Até então, todos os shows haviam sido de bandas nórdicas, mas era chegada a hora de vermos os brasileiros do ANGRA no Sweden Stage. A abertura foi com “Newborn Me”, seguida pela espetacular “Nothing to Say” e sua mistura inusitada de baião com power metal. O setlist continuou com uma retrospectiva de seus álbuns, principalmente os mais antigos, desde o impecável debut “Angels Cry” (1993), até “Temple of Shadows” (2004).
Clássicos que deixaram sua marca em uma geração de fãs e ajudaram a definir o estilo foram apresentados, como a emocionante “Carry On” e “Nova Era”, que dividiram o palco com as inspiradas “Lisbon” e “Travelers of Time”, de “Ømni”. A banda, cuja formação atual conta com o membro fundador Rafael Bittencourt (guitarra, teclado e vocais), Felipe Andreoli (baixo), Bruno Valverde (bateria), Marcelo Barbosa (guitarra) e o carismático vocalista Fabio Lione, demonstrou estar em seu auge e, com certeza, ainda tem muito a oferecer. Um orgulho nacional!
Um dos muitos filhos bastardos do AC/DC, o AIRBOURNE deu início à sua apresentação no palco principal com “Ready to Rock” e sua energia incendiária característica. Em seguida, veio a espetacular “Too Much, Too Young, Too Fast” do álbum de estreia, “Runnin’ Wild” (2007). Era impossível ficar parado com faixas como “Girls In Black” e “Stand Up For Rock’n’Roll”, esta última com uma introdução que cresce até explodir em um riff que deixaria o senhor Angus Young orgulhoso de seu legado para a humanidade.
A intensidade e energia do show não diminuíram nem por um segundo, e fiquei curioso para saber o que o vocalista e guitarrista Joel O’Keefe aprontaria desta vez, já que fazer a tradicional escalada nos andaimes seria complicado e arriscado neste palco. Para minha surpresa, o cara decidiu literalmente ir para o meio do público! Com sua guitarra e uma lata de cerveja na mão, Joel pulou entre os fãs, subiu nos ombros de alguém da equipe e percorreu a multidão, enquanto o guitarrista continuava a fazer um solo empolgante que incluía até um trecho de “Satisfaction” dos Rolling Stones! A saideira, como de costume, veio com “Runnin’ Wild”, que contou com uma palhinha do hino “Let There Be Rock” dos seus conterrâneos do AC/DC.
Chegava a hora dos principais representantes do thrash metal neste ano invadirem o Rock Stage. Com um cenário totalmente diferente do que trouxeram recentemente ao Brasil, com imagens que remetem às capas do álbum de estreia “The Legacy”, de “Souls of Black” (1990) e do mais recente, “Titans of Creation”, os veteranos do TESTAMENT começaram com o pé direito ao incendiar o público com o petardo “Rise Up”, que funciona muito bem como música de abertura.
Sem dar tempo para respirar, eles já emendaram com o clássico “The New Order”. Além do peso absurdo, os americanos se destacam pela técnica apurada presente em toda sua discografia e executada à perfeição ao vivo. Para a satisfação dos bangers ali presentes, o virtuoso guitarrista Alex Skolnick havia retornado aos palcos há cerca de apenas uma semana antes desse show. Ele esteve afastado por um curto período por conta da saúde de sua mãe e nesse tempo foi substituído pelo experiente Phill Demmel (Vio-lence, Metal Allegiance e ex-Machine Head).
Para conquistar de vez o público, eles seguiram com mais um clássico absoluto do thrash metal, a poderosa “The Preacher”, que fez os vikings se jogarem no mosh pit que levantou uma nuvem gigante de poeira! Em seguida, apresentaram seu novo hit “Children Of The Next Level” e a excelente “Pale King”, na qual o jovem baterista Chris Dovas, com apenas 24 anos, provou ser uma ótima escolha para substituir ninguém menos que “The Atomic Clock” Gene Hoglan.
O show continuou com o carismático Chuck Billy mantendo a energia lá em cima. Ele anunciou “More Than Meets The Eye” como mais uma música para cantar junto, e assim milhares de fãs o acompanharam. O encerramento veio com duas músicas obrigatórias: “Over The Wall” e “Into The Pit”. Uma verdadeira aula de thrash metal.
Com uma produção fantástica, trazendo um gigantesco parque de diversões como cenário, o DEF LEPPARD deu início ao seu show no palco Festival Stage com a nova “Take What You Want”, do ótimo “Diamond Star Halos”. Em seguida, presentearam o público com uma enxurrada de hits que marcaram gerações, como “Let’s Get Rocked”, “Animal” e a maravilhosa “Foolin'”, cujo videoclipe estourou no Brasil na década de 80, e “Armageddon It”.
Joe Elliott estava com a voz em excelente forma e, após a música “Kick”, do último álbum, apresentaram a emocionante power ballad “Love Bites” e surpreenderam com “Promises”, de “Euphoria” (1999). Phil Collen (guitarra) interagiu bastante com o público, como de costume, enquanto Vivan Campbell (guitarra), Rick Savage (baixo) e Rick Allen (bateria) demonstravam claramente sua alegria por se apresentarem para 40 mil pessoas em uma bela noite ensolarada na Suécia. Vale destacar que, mesmo por volta das 21 horas, o sol ainda brilhava.
A intensa “Bringin’ On The Heartbreak” levou alguns fãs às lágrimas e a saideira veio com os sucessos atemporais “Hysteria”, “Pour Some Sugar On Me”, “Rock of Ages” e a cativante “Photograph”.
Enquanto o palco principal era preparado para a última atração do dia, fomos conferir o CLUTCH no Rock Stage. Com um stoner muito original e que, segundo a própria banda, mistura Grateful Dead, Rush e The Allman Brothers, Neil Fallon e companhia fizeram um set que explorou muito bem sua ampla discografia, com destaque para a empolgante “Electric Worry” e a divertida “Earth Rocker”, que fizeram toda a galera pular e cantar.
É interessante observar o crescimento do público dos caras desde sua última apresentação no festival em 2017, e mesmo tendo a difícil tarefa de tocar entre Def Leppard e Mötley Crüe, eles entregaram um ótimo show.
O encerramento do primeiro dia com os bad boys do MÖTLEY CRÜE, que haviam anunciado o fim da banda em 2015, mas felizmente decidiram voltar para uma turnê mundial com o Def Leppard, que inclusive passou por terras brasileiras.
As luzes se apagaram e uma nuvem de fumaça tomou conta do palco, enquanto começava a ecoar nos PAs “Requiem in D minor, K. 626” de Mozart, que durou cinco minutos, chegando a deixar alguns fãs impacientes. Em seguida, após um vídeo que simula uma transmissão urgente de um programa de notícias, a banda entra já mandando a grooveada “Wild Side” com uma performance hipnotizante das belas dançarinas e cantoras, as “Nasty Habits”, Hannah Sutton e Ariana Rosado.
Juntamente com o anúncio da aposentadoria de Mick Mars, que há anos lida com espondilite anquilosante, o guitarrista, em outubro do ano passado, também foi divulgado que o experiente John 5 seria seu substituto. E logo nos primeiros minutos, deu para ver que o cara se encaixou como uma luva tanto no som quanto no visual do Mötley! A sequência veio com “Shout At The Devil” e “Too Fast For Love”, em que Nikki Sixx e John 5 fazem os backing vocals, cantando em pedestais de microfone pendurados na estrutura acima do palco. Como sempre, a produção é um show à parte.
Vince Neil pegou um violão e perguntou quem gostaria de cantar com ele ao começar os acordes da irônica “Don’t Go Away Mad (Just Go Away)”. Depois, a ótima “Saints of Los Angeles” animou a galera antes de Vince perguntar “who likes the old shit”, introduzindo a pesada e acelerada “Live Wire” que incendiou de vez a galera e preparou o terreno para “Looks That Kill”, em que Tommy Lee mostra sua habilidade na bateria, e a trilha sonora homônima do documentário “The Dirt” (Est. 1981). Nessa parte, a banda utilizou vocais pré-gravados, infelizmente.
Com uma bandeira da Suécia em mãos, Nikki Sixx saúda a galera agradecendo pelo tempo que esperaram para o retorno da banda ao país e apresenta John 5, que executa seu solo de guitarra e abre o medley de covers com “Rock’n’Roll Part 2”, “Smokin’ In The Boys Room”, “Helter Skelter”, “Anarchy In The UK” e o clássico dos Ramones “Blitzkrieg Bop”. Tommy Lee se aproximou da frente do palco e, como é comum nos shows do Mötley, dirigiu-se às fãs com o pedido “moças, mostrem seus seios”, ao qual algumas responderam prontamente, antes de dar início à bela “Home Sweet Home”, que foi entoada em alto e bom som pelas 45 mil pessoas presentes.
Já se aproximando do final, vieram “Dr. Feelgood” e “Same Ol’ Situation”, com uma performance impressionante de Hannah e Ariana. O bis foi composto por “Girls, Girls, Girls”, que contou com duas gigantes mulheres-robô no palco, seguida por “Primal Scream” e a empolgante “Kickstart My Heart”, encerrando o primeiro dia do festival de forma brilhante.
DIA 2 – quinta-feira, 8 de junho
Iniciamos o segundo dia com a apresentação dos suecos do SELF DECEPTION, cujo estilo moderno com elementos eletrônicos flerta com o nu metal. O baterista vestia uma roupa preta que cobria todo o seu corpo, inclusive mãos e rosto, e possuía uma luz na testa que mudava de cor conforme o ritmo variava.
Chegamos à tenda a tempo de assistir algumas músicas da jovem banda RUNNING COOPER, com seu rock’n’roll dos anos 70 sem firulas. Destaque para a talentosa baixista e vocalista Anna Hallberg.
O primeiro show do dia no palco principal foi da veterana LITA FORD, que entrou com cabelo rosa, vestindo um macacão branco decotado e segurando sua guitarra vermelha para tocar “Gotta Let Go”, seguida pela ótima “Larger Than Life”. Foi uma verdadeira celebração do rock’n’roll em mais um belo dia de sol!
A energia diminuiu um pouco durante a execução de “Back To The Cave”, com solos de guitarra desnecessariamente longos e cansativos por parte dos membros da banda, que inclui o experiente Bob Rock, ex-integrante do Vinnie Vincent Invasion, na bateria. A animação retornou com “Can’t Catch Me”, mas para a indignação de alguns, mais um solo de bateria foi executado. Em seguida, Lita pegou uma guitarra que afirmou ser a mesma que usou na Suécia em 1977 com o The Runaways, banda que formou aos impressionantes 16 anos de idade junto com Joan Jett, e anunciou o sucesso “Cherry Bomb”. O show seguiu com “Black Leather”, “Close My Eyes Forever” e “Kiss Me Deadly”, deixando alguns fãs decepcionados pela ausência de algumas músicas no set.
Os suecos do KATATONIA apresentaram seu som denso de prog-doom-gótico, que conta com um público fiel. O show teve início com “Austerity” e “Colossal Shade”, faixas de seu mais recente trabalho, “Sky Void Stars”. Assim como ocorreu em sua turnê pelo Brasil no início do ano, a banda não contou com a presença do guitarrista Anders Nyström, sendo necessário utilizar passagens pré-gravadas para suprir sua ausência. No geral, o show agradou aos fãs, com destaque para “Lethean”, do álbum “Dead End Kings”, e a empolgante “Behind The Blood”.
Uma grande expectativa surgiu quando foi divulgada a notícia de que o baixista do Europe, Jon Levén, estava envolvido em um novo projeto de melodic hard rock ao lado de outros nomes conhecidos da cena sueca. O resultado é o CROWNE, que conta também com Alexander Strandell (Art Nation) nos vocais, Jona Tee (H.E.A.T.) nos teclados e guitarra, Christian ‘Kicken’ Lundqvist (The Poodles) na bateria e Love Magnusson (Dynazty) na guitarra. O grupo já lançou dois aclamados álbuns.
O grupo se apresentou no palco menor com Jonathan Olsson, baixista do Dynazty, substituindo Jon Levén, que também se apresentaria no mesmo dia mais tarde com o Europe. Com um vocal excelente e composições de alta qualidade, a banda entregou um show que foi considerado por alguns como um dos melhores do festival. Eles transmitiram uma energia contagiante e era visível a felicidade em estar ali. Destaque para a excelente “Operation Phoenix”, que dá nome ao mais novo álbum do grupo.
Corri para conferir uma parte do surpreendente CHILDREN OF THE SÜN, uma das bandas selecionadas no concurso NEMIS (New Music In Sweden), que ocorre há 16 anos para promover as novas promessas da cena musical local. É impressionante a quantidade de bandas novas e talentosas que surgem na Suécia ano após ano. Realmente, não sei o que há na água de lá.
Formada pela espetacular Josefina Berglund Ekholm nos vocais, Ottilia Berglund Ekholm nos backing vocals, Wilma Ås (teclado), Jacob Hellenrud (guitarra), Ida Wahl (baixo) e Johan Lööf (bateria, que neste show foi substituído por Christoffer Eriksson), todos na faixa dos 20 anos, a banda apresenta um estilo de rock clássico com influências da era flower power do final dos anos 60. Com uma abordagem repleta de feeling, originalidade e melodias cativantes, eles conquistam o público logo nos primeiros acordes.
Com músicas dos seus dois álbuns – “Flowers” (2019) e “Roots” (2022) e o novo e espetacular single, “Come With Us” –, todas executadas com uma energia incrível, o Children of the Sün conquistou novos fãs, assim como este que vos escreve. O encerramento com “Gaslighting” foi triunfante e deixou o público, que lotou a tenda, completamente extasiado, clamando incessantemente por mais uma música. Agradecemos por manter a boa música mais viva do que nunca, Sweden Rock!
Um dos grandes nomes do power/symphonic metal dos anos 90, o KAMELOT trouxe para o SRF a sua nova turnê do álbum “The Awakening”. Com uma bela produção de palco e contando com um dos melhores vocalistas dessa nova geração, o sueco Tommy Karevik (ex-Seventh Wonder), o show agradou os fãs. Destaque para “Karma” e “March of Mephisto”, que, apesar de todo o talento do vocalista Roy Khan (Conception), que as gravou originalmente, ganharam ainda mais pegada na interpretação de Karevik.
Deu tempo de ver o finalzinho de mais uma revelação do NEMIS, o power trio LIAR THIEF BANDIT, com seu vigoroso rock de garagem. Ouça “Good Enough” com sua pegada punk rock e tente ficar parado. Nós, ali no show, não conseguimos! Já os britânicos do GREEN LUNG trouxeram pela primeira vez à Suécia o seu mix de occult hard rock, doom, stoner e punk e o ponto alto da apresentação veio com a pesada e super Black Sabbath, “Reaper’s Scythe”, de “Black Harvest” (2021).
Como já era de se esperar, o MYRATH, da Tunísia, nos brindou com mais um grande espetáculo este ano. Em 2019, eles haviam feito uma ótima apresentação na tenda e ainda aceitaram o desafio de substituir o Behemoth de última hora, deixando todos boquiabertos com sua performance no palco Rock no último show daquela edição. Fazendo uma mistura inusitada, mas de muito bom gosto, de prog metal com música oriental e muitos elementos da cultura árabe, a banda também conta com bailarinas, coreógrafos e muita pirotecnia para nos transportar para a atmosfera do deserto do Saara.
Com um backdrop que traz as portas de um palácio e a arte da capa do álbum “Shehili” (2019) ocupando todo o fundo do palco, cinco bailarinas entraram usando mantos pretos e vermelhos ao som de um tema que remete a filmes épicos (diferentemente de todos os outros shows da turnê, em que eles abrem com “Asl”). Enquanto os músicos foram assumindo suas posições, dois atores entraram com tochas e o carismático vocalista Zaher Zorgati apresentou a nova “Into The Night”, já mostrando que seria um set muito especial. E daí em diante, foram 60 minutos de uma mistura espetacular de teatro, dança e principalmente música. Zorgati disse que aprendeu a falar sueco por causa deste show, que teve como destaque a sensual “Dance” e o hit “Believer”, acompanhado por um balé de chamas que adicionou um toque único e empolgante.
Era um momento único, talvez até mesmo uma oportunidade derradeira, de presenciar as lendas Ian Gillan, Ian Paice, Roger Glover e Don Airey, que ao longo de gerações têm embalado a vida de milhares de fãs com sua música, compartilhando o mesmo palco. No entanto, espero que não tenha sido a última. O DEEP PURPLE, que desde o ano passado conta com o competente guitarrista Simon McBride substituindo Steve Morse, iniciou sua performance com grande energia, começando com o megahit “Highway Star”, seguida pela maravilhosa “Pictures of Home” e sua incrível introdução de bateria. McBride mostrou personalidade em seu solo, incluindo uma breve passagem de “Child In Time”.
Após a execução de “No Need to Shout”, faixa de “Whoosh!” (2020), a banda retornou aos clássicos com a poderosa “Into The Fire”, presente na eterna obra-prima “In Rock” (1970). Gillan, aos 77 anos, demonstrou que ainda tem um rugido poderoso e foi ovacionado pelo público. Em seguida, após a performance de “Uncommon Man”, em que Don Airey abriu um sorrisão de pura alegria ao tocar os acordes iniciais, a sequência composta por “Lazy”, a belíssima “When A Blind Man Cries” e a empolgante “Anya” – sucesso dos anos 90 resgatado para essa turnê – deixou os fãs em êxtase.
Logo após, Airey apresentou seu divertido solo, no qual toca a icônica introdução de “Mr. Crowley”, música imortalizada por Ozzy Osbourne, além de homenagear o público local. Nessa ocasião, a homenagem no Sweden Rock Festival foi feita com a canção “Dancing Queen” do ABBA (na recente passagem pelo Brasil, tocou “Sampa”, “Brasileirinho”, “Tico Tico no Fubá” e “Aquarela do Brasil”). Depois veio a épica “Perfect Strangers”. Então, em “Space Truckin'”, foi a vez de Paice mostrar por que é considerado um dos maiores bateristas do mundo.
O gran finale veio com a aguardada “Smoke on the Water”, simplesmente e o riff mais famoso da história do rock, “Hush” e “Black Night”. É inspirador ver o quanto esses caras se divertem no palco, mesmo com mais de 50 anos de estrada. Uma verdadeira aula desses jovens senhores.
Em seguida corremos para o Rock Stage para conferir o EUROPE, que alguns dias antes havia realizado um show gratuito para milhares de pessoas em comemoração ao aniversário da cidade de Gotemburgo. Jogando em casa, entraram com “Walk The Earth”, título de seu álbum mais recente lançado em 2017, seguida por “Seven Doors Hotel” do álbum de estreia.
Com o público na mão, Joey Tempest e companhia fizeram com que os fãs cantassem e dançassem ao som de “Rock The Night”, enquanto a balada “Carrie” trouxe uma sensação nostálgica. Houve duas grandes surpresas no repertório: a primeira foi “Heart of Stone”, presente em “The Final Countdown”, que raramente é tocada ao vivo, e a segunda, que ninguém ali esperava, foi “Stormwind”, de “Wings of Tomorrow”. É muito gratificante quando bandas veteranas incluem músicas “esquecidas” em seus shows – quem me dera o KISS fizesse isso…
Os clássicos da fase em que Kee Marcello comandava as seis cordas no lugar de John Norum também marcaram presença, com as incríveis “Sign of The Times”, “Ready Or Not” e “Superstitious” (na qual a banda fez um medley com “Here I Go Again” do Whitesnake), todas do excelente álbum “Out Of This World” (1988), que está para mim no Top 5 da história! O encerramento foi com “Cherokee” e, mesmo após a banda ter se despedido, por volta da 1h daquela fria madrugada sueca, o público não arredou o pé por aproximadamente cinco minutos, pedindo por mais uma música. Que energia boa!
DIA 3 – sexta-feira, 9 de junho
Em mais um dia de muito sol e poeira, começamos as atividades com um daqueles nomes que tornam o Sweden Rock tão especial. Diretamente do Canadá, o CONEY HATCH fez um excelente show. Durante a metade da apresentação, Carl Dixon (vocal e guitarra), que, aliás, continua cantando muito bem, mencionou que abriram os shows para o Iron Maiden na “World Piece Tour”, promovendo “Piece of Mind” (1983), e dedicou “Fallen Angel” à banda. Os destaques vieram com as quatro últimas músicas: a nova e cativante “It’s About a Girl” e os hits de seu debut homônimo de 1982, “Hey Operator”, “Devil’s Deck” e “Monkey Bars”.
O H.E.A.T fez um show impecável no Festival Stage. A banda, que pode ser considerada o novo Europe, conta novamente com o vocalista original Kenny Leckremo, que saiu da banda em 2010 para investir em carreira solo e foi substituído por Erik Grönwall (atualmente no Skid Row) até 2020. Após a animada “The Heat Is On”, que ficou conhecida mundialmente por ser a trilha sonora da trilogia “Um Tira da Pesada” com Eddie Murphy, a banda entrou com três faixas de seus lançamentos mais recentes: “Back to The Rhythm”, “Dangerous Ground” e “Rock Your Body”.
É muito legal ver o quanto a banda vem crescendo ano após ano e angariando uma nova geração de fãs não apenas na Suécia, sua terra natal, mas ao redor do mundo. Prova disso é a quantidade de brasileiros que estavam colados na grade, incluindo a fundadora da página H.E.A.T Brazil, Mari Goulart. O ponto alto do show foi a excelente “Living On The Run”, que fez todos pularem de ponta a ponta!
Outro anúncio muito celebrado para esta edição foi a presença dos noruegueses do TNT, que se apresentaram no palco Rock com o americano Tony Harnell de volta ao posto de vocalista principal. Harnell, que ainda possui uma incrível extensão vocal, contou com duas talentosas vocalistas de apoio nesta apresentação.
O show começou com a melódica “As Far As The Eye Can See” e “She Needs Me”, e em “Tonight I’m Falling”, Harnell mostrou ser um vocalista excepcionalmente talentoso. O virtuoso guitarrista Ronni Le Tekrø demonstrou toda a sua versatilidade e estilo único em “My Religion”, e no final da balada “Northern Lights”, realizou um solo emocionante. A banda reservou o melhor para o final, com “Forever Shine On”, “Intuition”, “10,000 Lovers (In One)” e “Seven Seas”, cantada a plenos pulmões pela galera.
Há alguns anos o Sweden Rock vem trazendo bandas de punk rock e quem representou o estilo este ano foram os californianos do RANCID que fizeram um show que agradou os fãs com destaque para o megahit “Time Bomb”, que com seu tempero carregado no gênero ska, estourou nos anos 90.
MIKE TRAMP fez um set inteiramente baseado em sua banda White Lion, e logo na abertura com “Lonely Nights” e “Hungry”, ficou evidente que traria uma abordagem mais lenta e “para trás” para os sucessos que brilharam nos anos 80. Apesar do ritmo mais cadenciado e de algumas falhas no microfone, o público seguiu muito empolgado, principalmente porque para muitos ali era a primeira vez que estavam ouvindo as músicas do White Lion ao vivo.
Como tem sido ao longo dos anos, Mike Tramp fez discursos nostálgicos, exaltando os anos 80, e antes de anunciar “Cry For Freedom”, comentou que quando compôs essa música em 1989, jamais imaginou que ainda estaria no palco cantando uma canção sobre liberdade. Brincou dizendo que por um instante se sentiu como Bono ao transmitir essa mensagem. Em determinado momento, Tramp mencionou que há 40 anos atrás desembarcou seu navio viking em Nova Iorque e foi acolhido pelo guitarrista Vito Bratta, seu parceiro no White Lion. Eles se sentaram na primeira noite e compuseram uma música, e então a banda iniciou a performance de “Little Fighter”, com algumas pequenas falhas na entrada. Em seguida, corrigiu, afirmando que na verdade essa história se referia a outra música: “Broken Heart”. No final, ressaltou que o show era realmente sobre manter as canções vivas e encerrou com a excelente “Lady of The Valley”.
Recentemente, Tramp lançou o álbum “Songs of White Lion” e em seu material de divulgação, afirma: “Não tenho mais 26 anos, não canto como se tivesse, e não estaria sendo justo com as músicas nem comigo mesmo se tentasse. Hoje, interpreto as músicas que escrevi com Vito Bratta há mais de 40 anos exatamente como sou atualmente. Essa é a única maneira de abraçá-las, sentir-me em casa e ser honesto comigo e com elas”. Sem dúvida, “honesto” é um bom adjetivo para descrever esse show.
Uma das bandas mais clássicas do hard rock americano, o BLUE ÖYSTER CULT, se apresentou no Festival Stage. Após a execução do tema da série “Game of Thrones” nos PAs, entraram com “Transmaniacon MC”, seguida da nova e pesada “That Was Me”, com um som de baixo marcante de Danny Miranda, e a clássica “Golden Age of Leather”.
A sensacional “Burnin’ For You” sendo tocada naquela bela tarde de sol é algo que muitos ali presentes não vão esquecer tão cedo. Os sucessos “Godzilla” e “(Don’t Fear) The Reaper” ficaram para o final da apresentação, que fechou com a ‘sabbazística’ “Cities On Flame With Rock’n’Roll”. Só faltou mesmo “Joan Crawford”.
Por uma razão desconhecida, duas horas antes do show do IRON MAIDEN, foi comunicado que a imprensa internacional não poderia acessar o pit para tirar fotos. Quando “Doctor Doctor” (UFO) começou a tocar nos PAs do Festival Stage, o público já sabia que o show mais aguardado para a maioria dos presentes estava para começar. Com a nova turnê intitulada “The Future Past”, além de um palco totalmente novo, a banda traz alguns lados B do álbum “Somewhere In Time”, o que deixou tudo ainda mais especial para os fãs.
Após a trilha sonora do filme “Blade Runner” e com boa parte do palco ainda coberta, a introdução de “Caught Somewhere In Time” começa a ser tocada no som mecânico e surge a mascote Eddie do álbum “Somewhere In Time” no canto esquerdo do telão e a do álbum “Senjutsu” no canto direito. Neste momento, Nicko McBrain é o primeiro a entrar no palco e ocupa seu posto atrás da bateria, até que entra um pano de fundo com uma cidade futurista e os demais integrantes entram no palco tocando a partir do primeiro solo da música. A sequência vem com outra faixa de “Somewhere In Time”, a excelente “Stranger In A Strange Land”, quando aconteceu a primeira aparição do Eddie como um pistoleiro futurista, sua versão da capa do single da música. Não importa sua idade ou quantos shows do Iron você já tenha visto, é sempre muito legal ver o Eddie no palco!
O show estava bem lotado e era difícil de se locomover, algo que não era muito comum no festival, mas que tem ocorrido com alguma frequência nas apresentações dos maiores headliners nos últimos anos. Bruce Dickinson brinca com a galera perguntando se alguém sabe qual será a próxima música e diz que “porque vocês são o Sweden Rock, vamos fazer algo completamente diferente. Não, é brincadeira!” e a sequência vem com três músicas do álbum “Senjutsu”: “The Writing On The Wall”, “Days Of Future Past” e “The Time Machine”.
Outro Lado B que foi resgatado para essa turnê foi “The Prisoner”, de “The Number of the Beast” (1982), e empolgou o público (seria ótimo se Gene Simmons e Paul Stanley aprendessem essa lição e incluíssem “Magic Touch”, “Mr. Speed” ou “Ladies In Waiting” nos últimos shows). A longa “Death of the Celts” acalma um pouco os ânimos, mas logo a energia volta com “Can I Play With Madness”, na qual todos os membros, liderados por Steve Harris, demonstram uma vitalidade e energia impressionantes.
Durante “Heaven Can Wait”, Eddie da capa de “Somewhere In Time” aparece e tem um duelo com Dickinson, que usa um canhão que estava coberto em um dos cantos do palco. Em seguida, para alegria dos fãs, eles executam “Alexander The Great”, que nunca havia sido tocada ao vivo antes desta turnê! Após “Fear of The Dark” e “Iron Maiden”, a banda deixa o palco para minutos depois retornar para o bis, que contou com “Hell On Earth”, “The Trooper” e “Wasted Years”. Impecável!
De lá, fomos para a tenda para assistir a uma banda nova que vem chamando a atenção dos fãs de rock melódico e AOR desde o lançamento do seu debut, “All Rise” (2018): PERFECT PLAN. Com o excepcional vocalista Kent Hilli comandando o show, testemunhamos uma celebração da boa música, com canções inspiradas e refrãos cativantes que ficam na mente. Destaques para “Time For A Miracle”, “What About Love” com seu baixão bem marcado e aquele teclado típicos do estilo, e a fantástica “In And Out of Love”. Se você gosta de Survivor, Foreigner, Hurricane e afins, se jogue! Aliás, há quem diga que Hilli deveria substituir o saudoso Jimi Jamison em um possível retorno do Survivor. Se isso acontecer, eu farei questão de estar lá para testemunhar.
E ainda tinha o prog metal do THRESHOLD, que fez um baita show empolgante promovendo “Dividing Lines” (2022), seu 12º álbum de estúdio. Com um som irretocável e músicos extremamente técnicos, ao mesmo tempo em que esbanjam feeling, apresentaram quatro músicas do mais recente trabalho. Com 30 anos de carreira, os ingleses são considerados “a resposta europeia ao Dream Theater”, mas, em termos de musicalidade, pessoalmente, hoje fico com o Threshold, que continua ganhando popularidade a cada novo lançamento. Foi muito gratificante presenciar a alegria contagiante do baterista Johanne James, que animava e interagia com o público constantemente. Encerraram o terceiro dia de forma brilhante.
DIA 4 – sábado, 10 de junho
O último dia começou com o MAMMOTH WVH, liderado por Wolfgang Van Halen, filho da saudosa lenda Eddie Van Halen, que apresenta um estilo de rock moderno com influências do Foo Fighters. O nome Mammoth foi utilizado pela banda de seu pai e tio antes de se tornarem Van Halen, e Wolfgang tocou todos os instrumentos e cantou todas as faixas em seu álbum de estreia, lançado em 2021. Com três guitarristas, a banda demonstra um som ao vivo ainda mais poderoso do que em suas gravações de estúdio. A sonoridade é mais pesada e coesa.
Wolfgang mencionou que “Think It Over” era a favorita de seu pai, e que ele costumava socar o ar quando a ouvia, expressando sua emoção ao ver o público fazendo o mesmo durante a apresentação. A banda também prestou homenagem a Taylor Hawkins, baterista do Foo Fighters que faleceu no ano passado, tocando a música “Hero”. No geral, foi um bom aquecimento para o encerramento do SRF.
Direto de Nova Jersey, o MONSTER MAGNET trouxe seu estilo de rock’n’roll/stoner/psicodélico para o palco do Festival. Com três guitarristas, eles apresentaram um show energético, tendo o ponto alto em “Powertrip”, seu maior sucesso.
Chegava a hora de tomar uma decisão difícil: assistir Blues Pills, que nunca tinha visto ao vivo, ou SYMPHONY X, uma das minhas bandas favoritas que já vi dezenas de vezes? Felizmente, escolhi a segunda opção e fui recompensado com um dos melhores shows da banda americana (também de Nova Jersey, coincidentemente) que já presenciei. Com um pano de fundo exibindo o logo da banda, composto por imagens das capas dos álbuns, eles entraram quebrando tudo com “Nevermore”, na qual Jason Rullo parecia um verdadeiro rolo compressor escondido atrás de sua bateria. A avalanche sonora continuou com “Sea of Lies”, do excelente “The Divine Wings of Tragedy”. Em “Dehumanized”, executada com uma precisão absurda, o carismático Russell Allen mostrou por que é considerado o vocalista mais versátil e talentoso do heavy metal na atualidade.
Allen, como sempre, parecia se divertir muito no palco e disse: “Eu imploro que todos vocês curtam esse lindo dia neste maravilhoso festival!” antes do início destruidor de “Evolution (The Grand Design)”, faixa de abertura de “V: The New Mythology Suite”, que foi um divisor de águas na carreira da banda. Após essa explosão, Allen afirmou que estava com sede e esperava que a plateia não se importasse, enquanto dava alguns goles em uma garrafa de Jack Daniels. Ele, que já enfrentou um grave acidente de carro durante uma turnê com o Adrenaline Mob, pediu ao público para não dar nada como certo ou imutável, lembrando dos desafios que nossa sociedade enfrenta atualmente. Allen afirmou que a música é a chave para a vida, para a alma e para o coração, destacando a importância desse elemento. Antes de iniciar a belíssima “Without You”, que levou muitas pessoas às lágrimas devido à intensidade do momento, ele afirmou que eles não poderiam estar ali sem o apoio dos fãs.
Sem dar tempo para descanso, a banda executou as poderosas “Kiss of Fire” e “Run With The Devil”, ambas do aclamado “Underworld” (2015), que até agora é seu último lançamento. Assistir Michael Romeo tocar guitarra é uma experiência hipnotizante. Parece que o instrumento é uma extensão de si mesmo, dada a facilidade e naturalidade com que ele executa arranjos e solos extremamente técnicos e complexos. Allen sorveu mais um generoso gole de Jack após “Serpent Kiss”, e a pesada “Set The World On Fire (The Lie of Lies)” com uma interpretação teatral de Russel Allen, encerrou o que foi um dos melhores shows deste ano.
O SKID ROW fez uma apresentação memorável no palco principal, demonstrando que não poderia ter escolhido um vocalista melhor do que o sueco Erik Grönwall (ex-H.E.A.T), que trouxe uma nova energia à banda americana. A abertura, após a execução de “Blitzkrieg Bop” nos PAs, foi com a vigorosa “Slave to the Grind”, seguida por “The Threat”, “Big Guns” e “18 and Life”, que marcou toda uma geração. Essas músicas foram o suficiente para conquistar o público. No entanto, a nova “Not Dead Yet” foi muito bem recebida, juntamente com os diversos sucessos dos primeiros álbuns. Vale ressaltar que “Slave to the Grind” foi tocado quase na íntegra, com exceção apenas de “Beggar’s Day”, “Mudkicker” e “Wasted Time”.
O baixista Rachel Bolan não pôde participar dos shows na Europa devido a uma emergência familiar e foi substituído pelo empolgado roadie Casey Sproat, que não decepcionou. Em “Livin’ On A Chain Gang”, sentiu-se falta do inigualável drive vocal de Sebastian Bach, mas isso foi compensado pela energia de Erik, que não para de correr, agitar e interagir com o público (nesse caso, em sueco) um segundo sequer. A power ballad “In a Darkened Room” foi arrepiante, seguida pela nova “Time Bomb”, “Rattlesnake Shake” e outra que conquistou os primeiros lugares das paradas na década de 90, “I Remember You”.
Erik apresentou a banda antes de “Monkey Business” e o guitarrista Dave “Snake” Sabo até arriscou algumas frases em sueco. “Creepshow”, “The Gang’s All Here” e o clássico “Youth Gone Wild” encerraram esse incrível show, que consagrou Grönwall como um excelente frontman em sua terra natal!
O icônico líder do ZZ Top, o barbudo Billy Gibbons, se apresentou com seu projeto solo, o BILLY GIBBONS AND THE BFGs, contando com Austin Hanks na guitarra e John Douglas na bateria, substituindo Matt Sorum que não pôde participar dessa turnê europeia por questões familiares. Gibbons e Hanks vestiam macacões de mecânico bege, chapéus e óculos escuros, e ambos portavam guitarras azuis claras – um figurino no mínimo inusitado. Também é curioso notar a ausência de um baixista na banda, mas o estilo de Hanks, que toca sua guitarra como canhoto e com as cordas invertidas, surpreendentemente preenche bem a marcação e o groove tão presentes nas músicas do repertório.
Começaram o show com “More-More-More”, de “Hardware” (2021), seguida por “Got Me Under Pressure”, que agitou o público no palco Rock. O set seguiu alternando músicas da carreira solo do guitarrista com músicas do ZZ Top, e na espetacular “Beer Drinkers and Hell Raisers”, a lembrança do saudoso baixista e membro fundador do ZZ Top, Dusty Hill, falecido em 2021 aos 72 anos, foi intensa. Apesar das músicas solo de Gibbons serem excelentes, foram os clássicos do ZZ Top, como “Gimme All Your Lovin'”, “Sharp Dressed Man” e “La Grange”, que encerrou o show, que realmente fizeram a alegria dos fãs.
Depois da festa de blues rock, fomos conferir o ALTER BRIDGE no palco principal, que, como sempre, fez um excelente show. A banda é capitaneada por Mark Tremonti (guitarra e vocal) e Myles Kennedy (vocal e guitarra). O show faz parte da turnê de promoção do álbum “Pawns & Kings”, lançado no ano passado, e contou com um backdrop com a capa do disco. A abertura veio com “Silver Tongue”, seguida do hit “Addicted to Pain”. O lado mais melódico, com refrãos cativantes, veio com a bela “Ghost of Days Gone By”, mas o peso retornou com tudo em “Cry of Achilles”, a nova “This Is War” e a contagiante “Come to Life”. A interpretação intensa de “Blackbird” foi de arrepiar, e o hit “Metalingus”, que fica ainda mais poderoso ao vivo, fez todo mundo pular! É difícil não sair com um sorriso estampado no rosto depois de um show como esse.
De lá fomos direto para ver o PANTERA. Foi exibido um vídeo com passagens históricas da banda, e foi impossível não se emocionar ao ver os irmãos Dimebag Darrell e Vinnie Paul, que partiram cedo demais. Em seguida, surgiu uma imagem com as silhuetas dos dois, e os músicos entraram quebrando tudo com “A New Level”. Para aqueles que pudessem ter qualquer dúvida sobre a escolha de Zakk Wylde (guitarra) e Charlie Benante (bateria), ali ficou evidente que não havia nomes melhores para a função. E, sem dar tempo para retomar o fôlego, já emendaram as pauladas “Mouth of War” e “Strength Beyond Strength”.
Phil Anselmo, que estava descalço, perguntou quantos ali tinham visto o Pantera na década de 90 e, em seguida, quantos estavam assistindo à banda pela primeira vez. Ao ver a enorme quantidade de pessoas que nunca tinham visto a banda antes, Phil disse que aquilo era “good parenting”, ou seja, que aquelas pessoas foram bem criadas. O peso do baixo de Rex Brown, que infelizmente não pôde comparecer na recente apresentação da banda no Brasil, em “Becoming” é algo impressionante. E o set seguiu trazendo os maiores sucessos, cobrindo toda a sua discografia a partir de “Cowboys From Hell”, quando a banda adotou o estilo que a consagrou como um dos maiores nomes do metal.
“Cemetery Gates” foi tocada apenas no som mecânico, enquanto outro vídeo de vários momentos dos irmãos Abbott era exibido no telão. Em seguida, a banda retornou com uma bela versão de “Planet Caravan” do Black Sabbath. Um momento bastante emocionante para os fãs. O final veio com “Walk”, com o refrão sendo cantado em uníssono pelo público, “Domination” / “Hollow” e a obrigatória “Cowboys From Hell”. Que este tributo ao Pantera siga excursionando pelo mundo e, quem sabe, produza novas músicas. Afinal, talento ali tem de sobra.
O encerramento do festival foi com o fenômeno sueco GHOST. Liderado pelo criativo vocalista Tobias Forge, que atualmente interpreta o personagem Papa Emeritus IV, o grupo é composto por outros sete membros que mantêm o anonimato, chamados apenas de Nameless Ghouls, e tem lotado arenas ao redor do mundo todo. O mais recente álbum, “Impera”, esteve no topo das principais paradas mundiais, prova de que o rock’n’roll está mais vivo do que nunca.
Antes do show, cânticos gregorianos ecoavam das caixas do palco principal, criando o clima para o que estava por vir. O palco contava com uma bela produção, com ilustrações que remetiam a uma catedral e imagens dos Papas Emeritus anteriores em vitrais. Durante a execução do tema “Imperium”, os Nameless Ghouls, todos vestidos com trajes pretos inspirados na saga Star Wars e com máscaras que lembravam pilotos de caça, como na capa de “Never Say Die” do Black Sabbath, assumiram suas posições um a um, enquanto Forge surgia de trás da bateria para cantar “Kaisarion”, seguida da espetacular “Rats”. Sem dúvida, o contraste entre a imagem da banda e seu som é algo único e que fascina os fãs. As músicas têm fortes referências do rock clássico, hard rock dos anos 70 e heavy metal tradicional, sendo cheias de melodias e refrãos acessíveis, com alguns toques de pop music.
Forge permaneceu o show todo interpretando seu personagem, que tem uma personalidade carrancuda, mas ao mesmo tempo divertida. Após a primeira música, perguntou se estava frio o suficiente e brincou que todos deveriam estar acostumados, mas que não estavam. Na instrumental “Miasma”, uma caixa de acrílico com o Papa Nihil adormecido foi colocada no centro do palco, e um membro da produção encenou dar um choque em seu peito, fazendo-o despertar. Ele então pegou um saxofone e fez um solo final. Foi um espetáculo teatral, com muita música boa, e a sequência de encerramento com “Kiss The Go-Goat”, “Dance Macabre” e “Square Hammer” fez a galera pular, dançar e cantar, encerrando a edição de 2023 do festival com a alma lavada!
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