Assistir a franquia Os Mercenários (The Expendables) é sempre uma tarefa estonteante, pois é difícil saber pra qual personagem olhar quando você se depara com uma constelação de tarimbados talentos ‘hollywoodianos’, que reúne nomes como Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger, Terry Crews, Dolph Lundgren, Jason Statham, Steve Austin, Jet Li, Mickey Rourke, Bruce Willis, Eric Roberts, David Zayas, Chuck Norris, Jean-Claude Van Damme, Antonio Banderas, Wesley Snipes, Robert Davi, Mel Gibson, Harrison Ford e, entre outros, a ex-campeã peso-galo do UFC e recém contratada da WWE, Ronda Rousey. Seguindo tal analogia, foi exatamente essa a sensação que o público que esteve na Tropical Butantã no último sábado sentiu ao ver pela primeira vez o Sons of Apollo, que trazia em seu line up ninguém menos do que os incontestáveis Jeff Scott Soto (vocal), Ron “Bumblefoot” Thal (guitarra), Billy Sheehan (baixo) e os “The Del Fuvio Brothers” Derek Sherinian (teclado) e Mike Portnoy (bateria). O grupo formado em 2017 veio promover seu álbum de estreia, “Psychotic Symphony”, que foi lançado no mesmo ano.
Antes de os americanos darem as caras, o Republica se incumbiu de aquecer o público. O veterano grupo paulistano segue divulgando seu quarto álbum, “Brutal & Beautiful” (2017), que já havia sido apresentado em outras brilhantes oportunidades, quando Leo Belling (vocal), LF Vieira e Jorge Marinhas (guitarras), Marco Vieira (baixo) e Mike Maeda (bateria) tocaram no palco Sunset do festival “Rock in Rio”, na Europa abrindo para Alice Cooper e para o Scorpions na Suécia. Baseando seu setlist quase que inteiramente em “Brutal & Beautiful”, álbum pesado e com uma roupagem ainda mais próxima do grunge, ainda que mantendo as referências de metal e de hard rock, observadas no antecessor “Point of No Return” (2014), o quinteto aproveitou bem os cinquenta minutos de palco e fez uma apresentação convincente, apesar de um pouco prejudicada pela fraca iluminação e pelo som que estava um tanto quanto baixo.
No repertório não faltaram “Stand Your Ground”, que foi tema da novela Rock Story (2016/2017), e nem “Beautiful Lie”, conhecida por seu videoclipe estrelado pela atriz Isis Valverde. Entre as demais, as que mais chamaram atenção foram as pesadas “Black Wings”, “Death for Life”, “Endless Pain”, que é um pouco mais arrastada, a acelerada “Broken”, em que o comunicativo Belling cantou com um vocal ainda mais agressivo, a balada “Tears Will Shine”, que segundo o frontman foi composta no dia seguinte à morte de David Bowie e é uma homenagem não só à ele como também aos ídolos, amigos e familiares que costumamos perder, “El Diablo”, única representante de “Point of No Return”, que foi dedicada ao saudoso baixinho Ronnie James Dio, além do cover de “Head Like A Hole”, do Nine Inch Nails. No início do show a recepção do público foi
um pouco fria, mas foi melhorando no decorrer. No final, o Republica se despediu sob aplausos.
Levou exatos quarenta minutos de espera até que, as 22h30, começasse a rolar no som mecânico a curta instrumental “Intruder” do álbum “Diver Down” (1982) do Van Halen, como introdução para o aguardado quinteto que atende por Sons of Apollo. Sob uma das melhores iluminações já vistas na Tropical Butantã, a cama de teclados de Derek Sherinian, fazendo base em clima mitológico, revelava a longa “God of the Sun”. Ron “Bumblefoot” Thal entrou em cena ovacionado com sua guitarra estilo double neck e cheia de luzes, sendo logo acompanhado pela potente cozinha formada por Billy Sheehan, que empunhava um baixo Yamaha também de dois braços, e Mike Portnoy. Após pouco mais de dois minutos de viagem instrumental, Jeff Scott Soto soltou suas primeiras linhas vocais e o público teve a certeza de que a qualidade de som era realmente de primeira, pois o técnico que comandava a mesa de botões dos ‘filhos de Apolo’ – tido na Ilíada como deus da música – deixava tudo muito bem equalizado. Depois dos onze minutos em que o público se viu extasiado com as várias atmosferas da música de abertura, o sempre animado e falante Soto vibrou pelo fato de estar tocando em São Paulo e anunciou a pesada “Signs of the Time”.
Falando em sinais do tempo, nessa época que estamos vivendo em que quase todo fã dá uma conferida nos setlist.fm’s da vida, pra conferir de antemão o possível repertório que suas bandas favoritas irão apresentar no show, esperava-se que viesse a seguir a curta instrumental “Figaro’s Whore”, repetindo a sequência mostrada dois dias antes em Porto Alegre (RS). Porém, o Sons of Apollo pulou para “Divine Addiction”, música que remete ao Deep Purple. Ela foi emendada com o cover do Dream Theater para “Just Let Me Breathe”, que, por sinal, ficou muito legal com a divisão de vocais entre Soto, que no decorrer empunhou uma bandeira do Brasil que ganhou de uma fã, Portnoy e Bumblefoot. Ao final dessa dobradinha Portnoy teve que sair de seu kit e aproveitou para falar com o público, enquanto o roadie trocava sua caixa por outra. Houve tempo de Bumblefoot tocar trecho do hino nacional brasileiro e Soto puxar o tradicional ‘Vira, Vira, Virou’, para tomar sua apreciada caipirinha antes de anunciar “Labyrinth”, sua música favorita do Sons of Apollo.
Seguindo, os holofotes se viraram para Billy Sheehan, enquanto o restante da banda se retirava para dar uma descansada. Confesso que já presenciei solos bem mais instigantes dele, mas o bom é que ele não se prolongou como nas últimas duas últimas vezes em que esteve em São Paulo com o Mr. Big. Ainda sobre Sheehan, que como de costume ia esmerilhando seu instrumento no show, tanto eu quanto alguns amigos que conversei, sentimos que sua performance não estava lá tão solta e descontraída quanto estamos acostumados ver no Mr. Big e no The Winery Dogs. Isso porque Sheehan tocou boa parte do tempo visivelmente concentrado e virado de lado pra plateia, olhando mais para seus companheiros, e também por não ter se comunicado e nem feito tantos malabarismos com seu instrumento, como era esperado.
Após a banda toda retomar o palco e executar a intrincada “Lost in Oblivion”, Portnoy brincou com a similaridade entre a pronúncia dos nomes “São Paulo” e “Sons of Apollo”. Emocionado, comemorou: “É bom estar de volta, pela primeira vez com essa banda maravilhosa, em um dos meus lugares favoritos no mundo para tocar.” E ele prestou homenagem ao seu vocalista: “Na última vez em que Billy e eu estivemos neste palco, a banda de Soto estava abrindo” – ele se refere ao show do The Winery Dogs, realizado no dia 18 de maio de 2016, que teve a banda SOTO fazendo o ‘opening act’. E continuou: “Me lembro de pegar meu lugar lá em cima (apontando para o camarote) para assisti-lo. E eu disse à mim mesmo: ‘eu já sei quem é o vocalista que essa banda tem que ter e nós teremos este cara!’”. Empolgado, Mike se disse orgulhoso de ter Jeff na banda e lhe ofereceu os aplausos da plateia. Os fãs gritaram o nome de Soto, que por sua vez puxou o “olê, olê, olê, olá” e regeu o público, ensinando-lhe alguns coros. Uma mostra que comprovou a afirmação de Portnoy de que Soto é um de seus vocalistas favoritos foi dada quando o cantor puxou um curto medley do Queen, que começou com ele executando o trecho à capela de “The Prophet’s Song”. E Soto deu um show ao recriar na hora as linhas vocais da música fazendo uso de loop com uma pedaleira que ele tinha disponível à sua frente. Na sequência, ele revelou que Freddie Mercury é uma de suas principais influências e dedicou a próxima para seu amigo, o vocalista Joe Lynn Turner, o qual soube que no mesmo dia sofrera um ataque cardíaco. A execução da belíssima “Save Me”, tocada somente por Bumblefoot e com os vocais divididos entre Jeff Scott Soto e a plateia foi de chorar. A bonita “Alive” se encaixou bem nessa parte mais emocional do set.
Para a sequência seguinte Jeff se retirou do palco por um longo tempo. Enquanto o vocalista descansava, o restante da banda tocou uma inusitada versão para “The Pink Panther Theme” (famoso tema de A Pantera Cor de Rosa) e apresentou a longa instrumental “Opus Maximus”, que culminou com um solo de Sherinian, que usou e abusou das plataformas de teclado que o cercavam, tocando, inclusive, trechos da ausente “Figaro’s Whore” e também de “Eruption” (Van Halen). O fim da primeira parte do show, com Soto de volta, veio com outro cover do Dream Theater, dessa vez para “Lines in the Sand”, também do álbum “Falling Into Infinite” (1997), que foi o único de estúdio da banda a contar com Derek Sherinian.
Bumblefoot voltou solando para o bis, até que a banda deu conta de que faltava alguém no palco. Era Jeff, que levando o microfone, já havia descido pelo camarote até o bar que fica na entrada da pista. De lá ele avisou seus companheiros que precisava pegar outra “caipirosca”. Quando os fãs o notaram, foram pra cima para abraçá-lo e tirar selfies. A banda lhe pediu que retornasse ao palco, e decidiu tocar mais um cover. Deram início então à “And the Cradle Will Rock…” (quanta homenagem pro Van Halen, heim?) e Soto saiu cantando em meio à multidão, com copo na mão e enfrentando mais abraços e selfies. Um membro da equipe o buscou e lhe levou pela pista de volta ao seu posto. Foi o momento mais hilário do show. O desfecho se deu em alta energia com “Coming Home”, música que tem uma pegada hard contagiante. No meio dessa Soto pediu que a banda fosse diminuindo o volume. Foi engraçado quando ele tentou chamar a atenção de Sheehan, que lhe mostrou que já havia até desplugado o cabo do baixo. Nesse ‘break’, o vocalista dividiu o refrão sozinho com a plateia, sendo que ele cantava a parte dele sem usar microfone, e mesmo assim se fazendo ouvir. Impressionante o talento desse cara, tanto como cantor quanto como entertainer. Outra coisa que impressionou foi o fato de que Bumblefoot e Sheehan passaram o show inteiro tocando com seus pesados instrumentos double neck. Ao som mecânico de “Happy Trails” (Roy Rogers) – conhecida pela versão de quem? Sim, do Van Halen (de novo?)! – o Sons of Apollo saiu ovacionado pela plateia após a aula que deu de metal progressivo com toques de hard rock e referências de AOR. E dava pra esperar menos de Soto, Bumblefoot, Sheehan, Sherinian e Portnoy? É claro que não!
SONS OF APOLLO – Setlist:
Intruder (Van Halen – Intro)
God of the Sun
Signs of the Time
Figaro’s Whore
Divine Addiction
Just Let Me Breathe (cover do Dream Theater)
Labyrinth
- solo de baixo
Lost in Oblivion
The Prophet’s Song / Save Me (cover do Queen)
Alive
The Pink Panther Theme (cover de Henry Mancini)
Opus Maximus
- solo de teclado
Lines in the Sand (cover do Dream Theater)
BIS:
And the Cradle Will Rock (cover do Van Halen)
Coming Home
Outro : Happy Trails (Roy Rogers)
REPÚBLICA – Setlist:
Intro
Black Wings
Death For Life
Endless Pain
Head Like A Hole (cover do Nine Inch Nails)
Stand Your Ground
Beautiful Lie
Tears Will Shine
The Maze
Broken
El Diablo