Para começar o mês de junho com muito estilo em São Paulo, tínhamos o retorno de um dos mais interessantes festivais de música e cultura folk do nosso país: o Odin’s Krieger Festival. Para aqueles que já tiveram a chance de acompanhar outras edições deste festival, o grande chamariz desta edição – nomeada Wolfenforest Edition – foi, claro, a presença dos gigantes do Faun e do Metsatöll, duas bandas que, cada uma na sua vertente, ajudaram a moldar o caráter da música folk do nosso tempo, e que possuem muitos fãs espalhados pelo nosso país. “Mas”, você pode se perguntar, “boa música todos os festivais prometem ter. O que há de especial?”. Sim, por favor, me faça essa pergunta, pois a resposta será dada, em parágrafos e mais parágrafos abaixo.
Vamos então começar pelo princípio: chegar ao local do show é muito fácil. O Tropical Butantã é realmente próximo da Estação Butantã do metrô, o que torna o acesso simples até para aqueles que não conhecem ao certo a Capital Paulista. Mas, caso ainda houvessem dúvidas quanto ao local, era muito simples: o volume de ‘drinkin’ horns’, vestimentas medievais era tão grande que bastava seguir o fluxo para chegar ao local, essa também uma bela tradição que vem sendo mantida. Ao entrar na casa, já com o rock sujo e rescendente a rum da CONFRARIA DA COSTA rolando no palco, o que vimos foi aquilo que realmente esperamos de um festival deste tipo: pessoas que realmente se identificam com a música e a cultura folk felizes, bradando canecos de cerveja e drinkin’ horns de hidromel, cantando canções que geralmente mencionavam os itens anteriormente citados, decoração condizente, e muitos ‘stands’ de venda de produtos relacionados ao tema, coisa que ia de bebidas artesanais e vestimentas típicas até bijuterias, joias e réplicas de armamento medieval. E tudo isso com o som da Confraria da Costa já rolando, com os piratas pulando pelo palco e detonando aquele show que já conhecemos de outras edições deste mesmo festival.
Após conferir todos as atrações ‘extra palco’ do festival e bater um papo com velhos conhecidos de outras edições (e esse é outro ponto a favor do Odin’s Krieger, quem vai uma vez sempre quer voltar), era hora de descansar os pés das botas, e acompanhar o show do TERRA CELTA. Ora, vamos, quem nunca viu essa banda ao vivo, não sabe qual é a sensação de dançar, beber, pular e chorar de tanto rir ao mesmo tempo, é uma das bandas mais divertidas do cenário, e sempre fazem um bom show, tanto que sempre voltam. O vocalista, um completo maluco e competente violinista que atende pelo nome Elcio Oliveira parece assumir como missão de vida tornar a noite daquelas pessoas diante do palco em algo especial, e se preciso for, estou bem certo que ele até faria chover. E literalmente rolou de tudo no show do Terra Celta. Desde os seus grandes sucessos – quem aí não conhece Gaia, O Quadrado, e Até o Último Gole? – até versões para Cowboy Fora da Lei (Raul Seixas), o tradicional cover de Cotton Eyed Joe que todos amam tocar e ouvir, e o momento mais hilário da noite, quando, basta dizer, rolou o momento ‘luz, raio, estrela e luar’ da noite. Uma apresentação irretocável, e digna como sempre.
Então, pontualmente às 18:30, era chegado o momento mais aguardado pelos metalheads ali presentes, quando os estonianos do METSATÖLL esmagariam cabeças com seu poderoso folk metal. Como se estivessem afoitos para começar logo o seu show, a banda começou a detonar a sua música intensa e pesada enquanto a ‘cortina’ ainda subia. A apresentação foi emblemática desde a primeira música, Külmking, faixa do mais recente álbum do grupo, Karjajuht (2014). Era notória a vontade de impactar o público, e o quarteto não poupou esforços. Se a faixa de abertura foi um ‘esmaga crânios’ muito bem recebido, a próxima, Metslase Veri foi ainda melhor. Muito por conta dos seus potentes riffs e de um refrão fácil de cantar junto e repleto de energia, a música foi certamente a que mais contou com a participação do público, que gritava ‘Meil’ com toda a força possível, sob o comando do vocalista.
Com apenas duas músicas tocadas, a atração mais pesada desta edição do festival mostrou logo de cara que não vinha para decepcionar. Com as guitarras pela primeira vez ‘roncando’ com toda a sua potência naquela noite, estava bastante claro que o clima havia mudado. Claro que o ambiente ainda era festivo, mas a música pesada do Metsatöll evoca a alegria dos guerreiros depois da batalha, algo que tem mais a ver com orcs bailando numa poça da lama negra de Mordor, do que com eufóricos hobbits com seus pés peludos pulando sobre alguma mesa no Condado. Agora o lance era o Metal, e para muitos ali, era exatamente essa a parte que interessava!
Assim, com o som do baixo estalando com tanta força quanto nos discos (o som da casa estava perfeito) e com a banda se mostrando genuinamente feliz e simpática (rolou até tentativas bem sucedidas de comunicação em português), uma sucessão incrível de boas músicas abalou o Tropical Butantã, que sem dúvida aguarda o retorno dos estonianos. Küü, Vaid Vaprust, Merehunt, Vimm, Lööme Mesti e Minu Kodu… quantos de nós realmente acreditavam que teriam a chance de acompanhar todas essas músicas ao vivo, no Brasil? Pois bem, tinha acontecido, e não poderíamos estar mais felizes. Para muitos, o show da noite já tinha acabado.
Porém, a sequência não era com qualquer banda. Era com o FAUN, um dos nomes mais respeitados do cenário mundial, e um sucesso em praticamente todo o mundo. E isso não é algo que se deixe de considerar. Até porque, bastou os integrantes aparecerem e Andro começar a rolar nos alto-falantes, e já estava na cara que eles seriam os donos da noite. A sequência, com Wind & Geige e Alba foi empolgante, via-se muitas pessoas fazendo danças típicas na pista, e a qualidade sonora, sempre impecável, permitia ouvir cada pequena nuance das delicadas linhas instrumentais do grupo, algo que já merece ser muitíssimo louvado.
Daí em diante, como você bem pode imaginar, a apresentação seguiu mais num clima de confraternização do que de exibição; estava na cara que o público era parte do show em Walpurgisnacht, Blaue Stunde e a emblemática Odin, que veio a calhar em um festival chamado Odin’s Krieger. Não há o que se possa reclamar na performance da banda, do envolvimento do público, da qualidade de som. Talvez, para soar como o chato casmurro das montanhas, possamos dizer que ‘o palco poderia estar com uma decoração com maiores referências à natureza’. Mas, se você quer saber, o clima estava tão legal e as lembranças são tão boas que nem aqueles que amam botar defeito em tudo irão reclamar. O Faun se mostrou digno de toda a fama que dispõe no Brasil, e o show é mais um que guardamos com carinho na cada vez maior lista dos shows inesquecíveis que vimos. E, se você quer saber, a coisa não parou por aí: A organização já confirmou uma nova edição do festival para o fim do ano, e eu só tenho um comentário sobre isso: “AHU”!