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BEYOND THE BLACK: TRABALHO E MATURIDADE

Jennifer Haben fala sobre o quinto álbum da banda alemã, e também Game of Thrones, seu lado nerd, carnaval brasileiro, a paixão pela atuação e mais

Com seu novo e autointitulado álbum, o quinto numa história que começou logo ali atrás, em 2014, o Beyond the Black apresenta uma maturidade que já distancia o grupo alemão do rótulo ao qual foi colocado, o de metal sinfônico. E a responsabilidade é da vocalista, instrumentista e compositora Jennifer Haben, hoje acompanhada por Chris Hermsdörfer e Tobias Lodes (guitarras), Kai Tschierschky (bateria) e, ao vivo, Linus Klausenitzer (baixo). Com um número já considerável de mudanças na formação, a banda é o retrato da sua líder, que, nesta entrevista, mostra que tanto não perdeu a simpatia quanto, numa época de estrelas instantâneas e sazonais, sua agradável timidez.

Como você está, especialmente depois da fase mais grave da pandemia?
Jennifer Haben: Muita coisa aconteceu, muita coisa mudou, mas há sempre uma oportunidade na mudança, e eu sempre olho para isso. Então está tudo bem por aqui. Ver o copo meio cheio é o que sempre tento fazer.

A pandemia atingiu duramente a indústria musical, especialmente os artistas, que não puderam sair em turnê. Mas acredito que isso deu a você tempo para trabalhar de forma mais relaxada no novo material, certo?
Jennifer: Claro! Eu costumo dizer que é sempre bom ter um pouco mais de tempo para compor as músicas e pensar no que queremos fazer, por isso acredito que essa é uma das razões pela qual o novo disco soa tão confiante. Passamos bastante tempo pensando nas questões básicas e sabíamos exatamente o que queríamos antes de começarmos a compor e a gravar. Isso nos ajudou por um lado, ainda que tenha sido péssimo por outro.

E me parece que a letra de “Is There Anybody Out There?” está diretamente relacionada à pandemia…
Jennifer: Sim, está, mas preciso dizer que tudo no novo álbum está de alguma forma relacionado com o que sentimos durante a pandemia. Mesmo que sempre tenhamos momentos assim nas nossas vidas, creio que desta vez, com a pandemia, todos sentimos as mesmas coisas ao mesmo tempo. Foi algo singular, e acredito que é uma razão por que talvez agora você possa pegar essa música e perceber ‘Ok, eu senti exatamente isso!’, ou seja, se sentir sozinho com os seus pensamentos, pensar que está enlouquecendo e aí descobrir que todo mundo estava se sentindo exatamente assim. Você deve se lembrar de falar com amigos e familiares por videochamadas e perceber que todos estavam falando sobre as mesmas coisas, as mesmas sensações, e isso fazer você se sentir compreendido. Foi assim que eu me senti. É claro que parece fácil falar disso quando há pessoas por aí que não tinham quem os ouvisse ou com quem pudessem falar, então quis abordar esse sentimento, também.

Beyond the Black
Jennifer Habben (Foto: Heilemania/Divulgação)

Exatamente, e minha questão é exatamente nesse sentido, porque a letra se encaixa no que muitas pessoas passaram depois de ficarem confinadas por tanto tempo. Houve um problema de saúde mental…
Jennifer: Eu tive a sorte de ter mais gente perto de mim nesse período do que nos anos anteriores, então isso foi muito bom. Também foi bom ter mais tempo para estar com outras pessoas, mesmo que não fosse pessoalmente, porque todos podíamos nos conectar, afinal, todos tínhamos tempo e disposição para isso. Claro que foi tudo foi muito difícil, especialmente para as pessoas que costumam fazer muitas turnês e que estão sempre por aí. Eu tentei fazer com que esse trabalho, agora de volta ao mundo normal, pudesse ajudar também quem não teve companhia por perto naquele período.

E em que sentido a letra de “Free Me” se encaixa nesse contexto, porque ela parecer ser bastante pessoal…
Jennifer: O disco inteiro é sobre se encontrar, e isso é algo muito pessoal: encontrar o que você realmente quer, todas as coisas que podíamos pensar a respeito naquele período. Essa música teve uma sensação Shakespeariana enquanto a compusemos, mas o resultado ficou ótimo, inclusive com o videoclipe, que mostra duas Jennifers se conectando de alguma forma, no qual há dois mundos diferentes, porque, no fim das contas, você encontra as respostas sobre tudo o que você está buscando dentro de si mesmo. Foi algo que descobri sobre mim mesma durante aquele período, de uma maneira bem intensa, então tentei dar continuidade ao contar para outras pessoas.

Mas se “Winter is Coming” não for sobre “Game of Thrones”, ainda mais com aquele videoclipe, você realmente precisa me explicar o significado dela (risos)…
Jennifer: (rindo bastante) Sim, é! A música foi escrita antes de começarmos esse álbum, então não diz nada sobre autoconhecimento (risos), mas se pensarmos nela como uma metáfora, ainda assim foi perfeita para a época, porque sempre temos de encarar certas coisas. A ideia da canção foi do guitarrista, só que eu realmente adorei porque sou uma fã nerd de “Games of Thrones” (risos).

Então aqui vai a pergunta de um milhão de dólares: você gostou do desfecho da série?
Jennifer: Ah, não faça essa pergunta! (risos) É muito doloroso! (risos) Não, eu não gostei! Prefiro até pensar que não aconteceu, porque não consigo entender por que fizeram um fim como aquele. Talvez eles quisessem que ficássemos comentando a respeito o tempo todo, embora tenha sido a pior coisa que poderiam ter feito. É a única razão que vejo para terem feito aquilo envolvendo a Khaleesi.

Falamos muito breve sobre videoclipes, e o Beyond the Black você já fez seus para o novo álbum, todos muito bem produzidos. Eu costumo dizer que o YouTube é a nova MTV, mas qual a importância para a banda?
Jennifer: Boa pergunta. Eu realmente gosto de fazer vídeos incríveis, que não pareçam baratos, que pareçam caros… Bom, na verdade, eles são bem caros (risos), mas calculamos como distribuir os custos entre os clipes. Decidimos qual é o que mais vale a pena, é assim que é feito. O mais importante é que a ideia principal seja boa e que possamos fazer tudo para dar corpo a essa ideia com o orçamento que temos, mostrando para as pessoas que Beyond the Black está aqui, porque dominaremos o mundo! (risos) Usamos esses grandes efeitos, como no de “Reincarnation”, que foi algo muito divertido de fazer! Pessoalmente, também é muito importante para mim interpretar esses papéis, poder fazer um pouco de cosplay aqui e ali, porque é algo que amo fazer. Não disse a você que sou nerd? (risos) Não sei por que não tínhamos nada disso antes, mas agora senti que era a hora de fazer. É bom poder combinar tudo isso no novo disco.

Esse lado de atuação é uma novidade para mim. Você já pensou em tentar um papel num filme ou numa série?
Jennifer: Eu amo atuar, realmente, e adoraria tentar! Gosto desse elemento da atuação que é poder demonstrar diferentes sentimentos com expressões faciais. Não sei o quão boa eu sou para aprender letras sem que tenham as melodias junto (risos), mas acredito que me daria bem num papel que exigisse estar totalmente apaixonada e morrer por isso, algo bem dramático. Creio que poderia fazer isso bem! (risos)

Curiosamente, dois dos videoclipes são de duas das minhas três músicas favoritas em “Beyond the Black”, e “Dancing in the Dark”, por exemplo, ainda é a abertura perfeita para os shows. Apesar de estar no meio do setlist… (risos)
Jennifer: É muito legal você dizer isso, porque tive o mesmo pensamento enquanto estávamos terminando o disco e pensando em quais músicas tocaríamos ao vivo. Quando combinamos isso com os elementos que precisam preencher um show, como solo de bateria e efeitos visuais para o deleite da plateia, temos de imaginar de uma forma diferente. Porém, musicalmente falando, “Dancing in the Dark” é a música perfeita para abertura, de fato. Como primeira música, poderíamos bater palmas junto com o público, fazer com que ele entre no ritmo do show, então imagine a primeira música fazendo o público dançar? Seria incrível! Sempre acreditei que a canção de abertura deve ser aquela que mexa com as pessoas na plateia no sentido de colocá-las para dançar, e nunca tivemos isso. Agora eu preciso pensar a respeito, sobre onde a colocarei nos próximos shows (risos).

E como eu mencionei uma, farei o mesmo com as outras duas, a começar por “Reincarnation”. Os elementos de música celta são o molho principal da canção…
Jennifer: É como se fosse a apresentação do disco para os ouvintes, porque se eu tivesse de mostrar do que se trata o “Beyond the Music” em apenas uma música, seria “Reincarnation”. De certa forma, ela está baseada em tudo que apresentamos, e o tema também trata do que queríamos falar nas demais letras, que é se encontrar e fazer o melhor por si mesmo.

Por último, “Not in Our Name”, especialmente porque o groove e o toque de metal moderno trazem um ar de novidade ao estilo da banda. E ainda tem a letra…
Jennifer: E mais uma vez há um elemento nerd na nossa conversa (risos), porque eu estava assistindo a filmes, séries e animes, então talvez você encontre algo sobre “Demon Slayer” nela (risos) (N.R.: no Brasil, a série de anime da Netflix se chama “Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba”). Foi uma grande inspiração porque assisti a todas as temporadas direto durante a pandemia, e também teve alguns filmes com trilhas sonoras do Hans Zimmer. E como pensamos muito nos nossos fãs, criamos alguns grupos no Facebook para conhecê-los melhor, para tentar entender quem estava ouvindo nossa música, e descobrimos que o mais importante é que eles são bastante confiantes ao demonstrar suas emoções, então ter criado uma grande comunidade, onde isso pudesse ser feito, foi responsável pela sensação geral durante a composição de “Not in Our Name”. Somos essas pessoas, temos essas emoções, estamos aqui juntos.

Beyond the Black
Tobias Lodes, Kai Tschierschky, Jennifer Haben e Chris Hermsdörfer (Foto: Heilemania/Divulgação)

Uma pergunta inevitável: por que dar o nome da banda ao novo álbum?
Jennifer: Ah, isso aconteceu durante o processo de composição, e a vontade de chamá-lo simplesmente de “Beyond the Black” veio do questionamento ‘o que é o Beyond the Black?’, então a resposta é o disco, são os temas que falamos nas letras, é a música que criamos para ele. A sensação foi a de que nos encontramos, porque é o trabalho que melhor define o Beyond the Black, mais do que qualquer coisa que fizemos antes, então não poderíamos ter outro título que não fosse o nome da banda. E ele também é um novo começo para nós, porque é o primeiro álbum em nosso novo selo, temos uma nova equipe trabalhando conosco. No começo, tínhamos o pessoal da Universal nos países que falam alemão, e a Napalm cuidava do restante do mundo, sendo que nós sempre estávamos conectados com o pessoal da Universal, então o novo disco foi uma mudança completa de time. Eu tinha 18 anos quando começamos a reunir a equipe original, não sabia nada sobre a parte de negócios e fui descobrindo quais são as minhas forças, o que eu realmente não entendo, coisas assim, e era difícil encontrar o meu lugar numa equipe que crescia tanto. Agora, com essa nova equipe da Nuclear Blast eu senti um ‘Ok, este é o meu espaço. Eu faço isso, e você faz aquilo!’ (risos), e isso é libertador! Não que o time antigo fosse ruim ou algo assim, nada disso, é só que agora há algo novo até mesmo para mim. Essa é outra razão por que o disco soa tão bem, porque se trata de um novo começo.

Depois do lançamento de “Heart of the Hurricane” (2018), eu perguntei a você sobre as mudanças na formação. Quase seis anos depois, você provou que o Beyond the Black é mesmo uma banda, certo?
Jennifer: Definitivamente! E é como a minha família. Não poderia imaginar fazer isso sozinha, porque sempre quis ter comigo pessoas que tivessem os mesmos objetivos, então sinto que nós quatro agora estamos olhando para a mesma direção, e essa é uma ótima sensação!

E considerando que Chris, Tobias e Kai continuam ao seu lado, é a prova de que não é difícil trabalhar com você (risos)…
Jennifer: (rindo) Eu não sei se é difícil trabalhar comigo, mas sempre penso em todo mundo. O que mais aprendi durante o período de mudanças é que a comunicação é a coisa mais importante, e essa é uma das razões de a primeira formação não existir mais. Para completar, eu tinha 18 anos à época. Não sabia de absolutamente nada, mas aprendi muita coisa ao longo desses anos, o que foi muito bom para mim.

E quando falamos sobre o Brasil, você me disse que adoraria vir ao país para curtir o carnaval. Ainda está na sua lista de desejos?
Jennifer: Com certeza! Isso é um desejo absolutamente pessoal! (risos) Eu adoraria ir ao Brasil no período do carnaval porque parece ser uma festa incrível, e um dia eu realmente estarei. Depois da pandemia, pensei que estaríamos um pouco mais seguros para dar prosseguimento a alguns rumores sobre possibilidades de tocar no seu país, mas tudo ficou ainda um pouco confuso sobre biossegurança. No momento, tudo o que posso dizer é que existem outras possibilidades, mas eu espero um dia aproveitar o carnaval no Brasil, mesmo que como turista. Sei que muitos fãs de heavy metal não curtem a música do carnaval brasileiro, mas eu também não gosto da música que toca na Alemanha durante o carnaval (risos). Então, se eu não curtir, tudo bem, porque o que gosto mesmo é de me fantasiar. É muito divertido! (risos)

O Beyond the Black ainda não chegou ao décimo aniversário, mas já acumula várias conquistas. Como você descreveria o trajeto de Songs of Love and Death (2015) até agora?
Jennifer: A jornada toda teve muitos altos e, também, muitos baixos, mas no momento parece que só vai subir, o que causa uma sensação maravilhosa. O novo disco veio acompanhado de muitos comentários positivos, e isso é o melhor de tudo, é a melhor sensação do mundo!, porque sempre penso nos haters: ‘Onde eles estão?’. Onde estão vocês, haters? (risos) Eu amo o que estamos fazendo agora, e isso é o que mais importa. Acredito que estamos no caminho certo!

Obrigado pelo papo, Jennifer, e o espaço final é todo seu.
Jennifer: Obrigada a você por me receber mais uma vez, Daniel, e espero ver todos os fãs brasileiros muito em breve. Desejo que todos se cuidem e se mantenham saudáveis e seguros!

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