Por Valtemir Amler
Nascida em 2004 em Montreal, a The Agonist bebeu da riquíssima fonte da criatividade que parece alimentar os artistas de música pesada do Canadá, e não foi surpreendente que já em seu primeiro esforço, Once Only Imagined (2007), já conseguissem uma boa reputação em todo o mundo, inclusive conseguindo lançar esse primeiro disco através da tradicionalíssima Century Media Records. O caminho do sucesso foi pavimentado com Lullabies for the Dormant Mind (2009), e quando o terceiro álbum, Prisoners, foi lançado em 2012, parecia que nada poderia dar errado, e nada poderia parar o avanço indelével daquele quinteto rumo ao topo do cenário da música pesada. Porém, apenas dois anos mais tarde, ventos muito fortes começaram a balançar as estruturas da banda, que viu sua carismática vocalista Alissa White-Gluz partir para o Arch Enemy. O baque foi imenso entre os fãs, e de repente os fundadores Danny Marino (guitarra) e Chris Kells (baixo) precisaram encontrar uma substituta a altura, reorganizar a banda e basicamente voltar a caminhar, já que a ‘escorregadela’ havia custado muito mais do que a perda de apenas uns poucos passos na sua até então contínua trajetória em ascensão. A escolhida, Vicky Christine Psarakis, assumiu a dura missão com coragem, e em 2015 a banda lançou Eye of Providence, o primeiro álbum com seus vocais. Encarado com um típico álbum de transição, ele foi sucedido por Five (2016), mas foi com Orphans (2019) que a banda voltou a crescer no cenário. Para comentar todos os seus capítulos nessa história, conversamos com Vicky Psarakis.
Olá Vicky, é um prazer falar com você! Como tem sido essa quase uma década à frente do The Agonist?
Vicky Psarakis: Olá todos, é bom estar aqui falando com vocês, é um prazer de verdade, obrigada pelo convite! Bem, tem sido uma experiência incrível até agora, e sei que é meio clichê dizer isso, mas estou sendo sincera quando digo que não parece que faz tanto tempo assim. Eu sempre amei música e obviamente me dediquei para ter uma carreira nesse mundo, mas acho que no fundo sempre tive uma certa dúvida se tudo daria certo, se conseguiria a banda certa, como seria vista pelas pessoas da banda e pelos fãs, enfim, existem tantas possibilidades, e estou muito feliz por estar aqui! Quer dizer, ter uma carreira no rock é o sonho de tantas pessoas, tem sido o sonho de milhares de pessoas há décadas, então definitivamente me sinto afortunada por ter uma carreira e viver esse sonho, tem sido incrível.
Bem, sabemos que o The Agonist viveu um momento intenso quando você se uniu a banda, e havia motivos para isso. Afinal, eles tinham uma carreira construída, e tinham uma vocalista amada pelos fãs, a quem você acabou substituindo. Era uma situação bem intimidadora, mas você sempre transpareceu muita tranquilidade. Você estava mesmo tão tranquila assim?
Vicky: Nem um pouco (risos gerais). Eu estava roendo as unhas, mas sabia que tinha que manter o controle e dar o meu melhor para cumprir aquilo que esperavam de mim, eu tinha ganhado uma chance, a banda havia confiado em mim, então eu sentia como se tivesse uma missão a cumprir, entende? Claro que é difícil olhar para trás e recordar tudo com exatidão, pois já se passaram quase dez anos, e então quando tento recordar de algumas coisas é como se estivesse contando a história de uma outra pessoa, e não a de mim mesma, sabe? Algumas coisas meio que se perdem no tempo, mas ainda lembro da sensação que tinha naqueles dias. Não direi que eu era uma outra pessoa naquele tempo, pois definitivamente era a mesma pessoa, eu já tinha as minhas convicções e caráter e isso não mudou com o tempo, mas era bem mais nova, menos experiente, e isso faz com que você encare as coisas de uma maneira bem diferente. Eu não diria que era exatamente tímida na época, mas definitivamente não era a ‘alma da festa’, se é que me entende.
Entendo melhor do que imagina, é mais uma atitude reservada do que propriamente tímida.
Vicky: É, eu era tímida o suficiente para não querer chamar toda a atenção para mim, mas atirada o suficiente para aceitar ser vocalista de uma banda de rock com projeção internacional, então acho que é exatamente isso que você falou (risos). Eu era bem reservada, e isso meio que afastou algumas pessoas, acho que algumas pessoas acharam que eu fosse meio inacessível ou ranzinza, mas nunca foi o caso (risos). E era um pouco assustada, eu tinha um certo medo de me impor diante das pessoas e mostrar quem eu era de verdade, mas de certa forma, consegui fazer isso. Só consegui me colocar em um lugar e mostrar que tenho valor quando subi num palco, empunhei um microfone e mostrei a minha voz, foi através dela que provei quem sou. Foi através da música e da minha voz que encontrei o lugar que pertencia no mundo, e que merecia estar ali. Então, sempre fui grata e sempre tentei fazer o meu melhor em tudo o que estivesse relacionado a música, mas me senti um pouco insegura quando entrei no The Agonist, não me senti instantaneamente em casa, pois estava entrando em uma banda que existia antes da minha chegada, que havia construído uma toda uma história e uma base de fãs muito sólida antes de mim. Claro que todos na banda foram muito gentis e me acolheram muito bem, claro que tentaram manter um ambiente muito leve para que me sentisse o mais confortável possível ali, e sou extremamente grata por isso, mas é diferente de quando você está com a banda desde o primeiro dia. Então, eu tive que ir construindo uma confiança maior em mim mesma e no que estava fazendo ao longo do tempo, enquanto fazia os shows, gravava novas músicas. Tentava me mostrar firme diante dos fãs, pois eles mereciam isso, e acho que com o tempo conquistei essa firmeza. No fim, não me arrependo de nenhuma decisão que tomei e de nada que fiz, acho que tudo o que somos hoje é resultado do que fizemos ontem, então, só nos resta tomar as novas decisões que definirão o dia de amanhã. Nada pode ser concertado no ontem, mas tenho orgulho da postura que tive e de como me sustentei firme até aqui.
Quanto tempo você teve para se preparar para gravar Eye Of Providence?
Vicky: Ah, foi bastante rápido! Entrei em 2014, e naquele mesmo ano já gravamos o álbum, embora ele só tenha sido lançado no ano seguinte.
Aquele foi o quarto álbum da banda, e trouxe uma proposta um tanto diferente dos principais elementos pelo qual o The Agonist era conhecido, e não estou falando da sua voz. Quanto você acabou adicionando à banda naquela época?
Vicky: Bem, entrei em um momento muito incerto na história do The Agonist. Até então, eles tinham gravado três álbuns, e nenhum deles soava como o outro, eram discos bem distintos entre si, embora tivessem um fio condutor em comum. Eye Of Providence tampouco foi um álbum como os antecessores, mas lembro que os garotos não tinham uma direção definida para onde queriam chegar com aquele disco, nem eu tampouco, já que era a novata naquele trabalho (risos). E isso não foi ruim, na verdade ajudou muito, pois tínhamos uma página em branco em que poderíamos escrever qualquer coisa, sem se preocupar sem seguir um padrão ou algo assim. Lembro que eles escreviam alguma coisa, eu ouvia e então adicionava algumas linhas vocais, assim fizemos milhares de testes, e na minha opinião pessoal, todos funcionaram! Porém, a base mais dedicada dos fãs do The Agonist tem uma opinião muito precisa daquilo que eles mais gostam na banda, que é algo mais obscuro, mais visceral, que até tem certa beleza em alguns momentos, mas que segue primordialmente por um caminho mais obscuro e pesado. Considero aquele um álbum muito bom e acredito que fizemos um ótimo trabalho nele, mas não acho que ele tocou os corações dos fãs da maneira mais apropriada. Mas, tínhamos que tentar, uma banda também precisa escrever música para ela mesma, precisa testar novas coisas, novas fórmulas, e foi isso que fizemos. Experimentamos e fizemos coisas diferentes, mas sinto que estamos de volta naquilo que os fãs preferem nesses últimos lançamentos.
Sem dúvida, Orphans (2019) resgatou o lado mais sombrio do The Agonist, e o EP Days Before the World Wept (2021) vai ainda mais fundo nesse caminho.
Vicky: Sim, eu diria que Orphans foi o momento em que conscientemente decidimos parar de escrever canções apenas por escrever novas canções e focar em algo com um objetivo maior. Para nós, foi o momento de parar de ouvir o que os outros tinham a dizer e focar naquilo que fazíamos de melhor, naquilo que sempre funcionou melhor para o The Agonist, algo que talvez tivesse mais a ver com o início da jornada e que trouxe para a banda tanta atenção. Quer dizer, é legal fazer algo novo e inesperado e ver os críticos te elogiando por isso, mas é ainda mais legal fazer um disco que realmente empolga os fãs, que faz eles gritarem nos shows e terem uma noite boa de diversão conosco. Orphans foi como um dos álbuns iniciais do The Agonist, só que comigo nos vocais, e os fãs adoraram isso! E foi engraçado, pois eu não estava lá quando eles começaram, mas eu e Simon (baterista) fomos os que mais se empolgaram em puxar a banda de volta para esse lado mais obscuro, com mais canções frenéticas e nesse território mais pesado, mais caótico. Ainda sinto assim. Talvez a obscuridade seja o lugar perfeito para nós, e devemos permanecer nas sombras.