Por Daniel Agapito
Fotos: André Santos
O dia 24 de novembro de 2023, querendo ou não, acabou sendo marcado pelo primeiro show da Eras Tour da Taylor Swift em São Paulo. Simultaneamente, acontecia o Odin’s Krieger Fest, ainda em São Paulo, porém mais longe dos holofotes. Há mais de 10 anos, o festival vem se consagrando como um dos maiores eventos musicais para a cena musical. Em suas mais de 14 edições, tem trazido grandes bandas do cenário nacional e internacional como Corvus Corax (ALE), Faun (ALE), Metsatöll (EST), Alestorm (ESC), Rapalje (HOL), Heidevolk (HOL), Tuatha de Danann, Terra Celta, Hugin Munin, entre outros. Este ano, direto da Finlândia, a grande atração eram os titãs do folk metal, Korpiklaani, além de nomes conhecidos do festival, como Terra Celta, Taberna Folk e Eldhriminir, e também a Tunas Celtic Band.
Dentro do Carioca Club era possível ver logo de cara diversos estandes de diferentes lojas com temáticas folk e viking. Tirando os de merchandising das bandas, havia estandes vendendo hidromel, artefatos de couro, artesanatos de temática celta e muitos outros. Havia também muitas pessoas caracterizadas com vestimentas seguindo as mesmas temáticas dos estandes, evidenciando desde o começo o engajamento dos fãs com o festival e seus temas abordados.
A performance da Tunas Celtic Band começou pontualmente às 19h, exatamente no horário marcado, mas com poucas pessoas no local. O repertório foi recheado de músicas clássicas irlandesas, escocesas e celtas no geral. Quando tocaram “Silver Spear”, pediram para que o público se animasse, dançasse, e os que estavam presentes responderam de maneira calorosa, mostrando bastante entusiasmo.
Um dos pontos altos foi quando tocaram “Whisky in the Jar”, um clássico celta do século XVII popularizado no mundo do metal pelo Thin Lizzy e, posteriormente, Metallica. Durante esta música, era realmente difícil ver alguém que não estivesse visivelmente interessado, seja batendo palmas, pulando, dançando e sorrindo. Este clima continuou com seu cover de “I’m Shipping Up to Boston”, dos Dropkick Murphys. No geral, a banda conseguiu criar um grande ar de festa e animar o público rapidamente crescente para a longa noite de folk que viria pela frente.
A segunda a subir ao palco foi a Eldhriminir, descrita pelo vocalista Marcos Maschio como uma “banda de pagode que canta sobre os malefícios do álcool”. Na realidade, o quarteto natural do interior paulista esbanja uma sonoridade atrelada ao “folk alcoólico”. Quando começaram, o Carioca já estava bem mais cheio e mais animado; logo em sua segunda música, “Nós Nascemos Para Beber”, já havia um grande mosh sendo formado na pista.
O show foi marcado por um grande sentimento de sintonia, uma conexão entre os fãs; todos cantavam as músicas junto com a banda, moshavam, pulavam, dançavam. Na maioria das vezes, o público agia como uma entidade singular ao invés de um grupo de indivíduos. No início da “Luta de Convés”, pediram para que fosse aberta uma roda, com o intuito de fazer exatamente o que o título da canção denominava. As regras da luta eram, só jogo de corpo (sem socos, chutes e afins), sempre um contra um e quem caísse primeiro perdia. Eventualmente, quando a roda foi aberta, todos da pista viraram para que conseguissem ver claramente o que acontecia no meio. Após esta música, anunciaram a gravação de um novo álbum.
As rodas punks e moshes permaneceram fervorosos durante o show inteiro, não só a “Luta de Convés”. Antes de iniciarem sua sexta música (“Bar do Fim”), o Carioca Club foi declarado como sede do próprio Bar do Fim, onde haveriam “brigas, cadeiras e copos voando e insanidade”. Com a conclusão desta música, Maschio, o vocalista, comunicou que a produção do festival havia solicitado o encerramento de sua performance. Após gritos de indignação vindos do público e a recusa do próprio Maschio, fecharam sua performance com uma versão Eldhriminirizada de “Bella Ciao”.
Já a Taberna Folk, banda que sucedeu ao Eldhriminir, tinha uma abordagem mais tradicional, tocando apenas com instrumentos remetentes à época das músicas. Em relação às músicas, as executadas eram majoritariamente medievais e renascentistas, mas com alguns covers de músicas modernas no meio. Mesmo com esta abordagem discrepante das outras bandas, o público conseguiu ficar bastante animado com a performance da Taberna Folk, gritando, pulando e aplaudindo depois de cada música. Uma das músicas que mais chegou a animar os que estavam presentes foi seu cover com roupagem folk de “House of the King” e “Hocus Pocus”, ambas do grupo holandês de rock progressivo Focus. De acordo com o vocalista do grupo, tanto este medley quanto a autoral “Under the Hammer” seriam tocadas pela primeira vez ao vivo naquela noite.
Este clima inegável de animação permaneceu de pé pela duração completa do show – por volta de uma hora. Tal ânimo dos fãs era tanto que mal deu tempo de o grupo levantar seus canecos uma última vez que já foram à loucura clamando por mais uma música. Infelizmente, por conta do cronograma do evento, o grupo teve mesmo que encerrar seu show após finalizarem “Sieben Tage Lang”, para que os outros shows não tivessem seus horários comprometidos.
À medida que a noite avançava e o horário se aproximava das 21h, marcado para a subida da Terra Celta ao palco, o local do evento ia enchendo rapidamente, ficando quase intransitável. Quando realmente subiram ao palco (próximo ao horário marcado), era possível ver que havia uma grande quantidade de pessoas que vieram ao evento realmente para ver o show da banda; muitos cantavam junto, interagiam, dançavam. Este show realmente serviu para provar porque são considerados um dos maiores nomes do cenário folk nacional e justificar sua inclusão em 9 edições do festival.
O público estava tão envolvido no show que havia horas que o vocalista, Elcio Oliveira, tinha dificuldades para cantar por conta do barulho que os fãs faziam em suas músicas. Elcio também chegou a pedir para que o público fizesse uma dança circular, mas não qualquer dança circular. Oliveira pediu para que fosse formada duas rodas ao centro da pista, uma maior, externa, que ia à esquerda, e uma menor, interna, indo à direita. Quando Oliveira gritasse “ao centro”, os envolvidos de ambas as rodas desconstituiriam as rodas e iriam correndo ao centro da pista, porém, voltariam às rodas gradualmente, só que desta vez com seus sentidos invertidos. “Não entendeu? Procure um neurologista” – disse o vocalista.
Outro destaque do show foi o “ritual de purificação” que aconteceu algumas músicas após a já citada dança circular, onde quem fosse participar tinha de pensar em tudo que tinha na vida que não queria mais (seja material ou não) e levar para baixo (agachar). Em determinado momento, todos pulariam, “renascendo como uma fênix amorosa”. Diferente da dança circular, o “ritual” funcionou com êxito. O público estava tão plenamente envolvido que, quando tocaram a instrumental “Heading East”, Oliveira impressionantemente conseguiu fazer com que batessem palmas em um ritmo em 7/8.
Em seu setlist, havia uma grande variedade de músicas; algumas mais rápidas, outras mais vagarosas, pequenos pedaços de covers. Com o término de sua performance, Oliveira disse que uma festa daquele estilo tinha de acabar de maneira mais animada, então voltaram brevemente a tocar. O público respondeu a este retorno exatamente da maneira que a banda queria, com muito entusiasmo.
De forma preocupante, o sistema de PA teve uma falha fatal logo antes do Korpiklaani subir ao palco. Até os últimos testes do baixo e da guitarra, tudo aparentava estar funcionando corretamente, mas poucos momentos antes das cortinas do Carioca Club se abrirem, os PAs simplesmente desligaram. Mesmo só com a bateria audível, o público se mostrou animadíssimo e cantou “A Man With a Plan” como se não houvesse amanhã. Tamanha era a cantoria dos fãs que nos refrões era realmente difícil notar os erros sonoros. Este episódio, mesmo que fora do controle da produção do evento, serviu para mostrar a lealdade real da base de fãs do Korpiklaani e a real adoração em relação à banda; mesmo sem som, continuaram cantando, dançando, pulando, batendo palmas, batendo cabeça e fazendo altas rodas punk.
Quando começou a discutivelmente icônica marcha de caixa da “Jägermeister”, pequenas melhorias sonoras eram perceptíveis, mas continuavam sendo poucas. Apesar de tudo isso, o público se mantinha absolutamente fervoroso e ativo, notavelmente chegando a dar uma garrafa de Jägermeister ao vocalista Jonne Järvelä, da qual ele deu um gole. Após o fim desta música, o público se frustrou e gritou pelo aumento do som (dentre diversos gritos de “vai Corinthians”).
Tendo passado aproximadamente 45 minutos desde o início do show (por volta das 00h45), um membro da equipe da banda foi ao palco, aumentou o som de todos os monitores de retorno e virou dois dos 5 para a pista. Isto acabou ajudando a trazer som ao show, mas apenas para quem estava do lado direito do palco. As pessoas que estavam do lado esquerdo do palco acabaram ouvindo apenas o que saía dos monitores de resposta que ainda estavam virados para a banda.
Mesmo com estas lacunas em relação ao som, o clima continuava lá no alto. O público realmente não parou de fazer rodas, cantar, bater palma. A performance da banda durou aproximadamente uma hora e quarenta e cinco minutos, e por uma hora e quarenta e cinco minutos, o público fervia com ânimo. Para melhor ou pior, Järvelä aparentava estar um tanto embriagado, vagando pelo palco de maneira aleatória, sorrindo sem parar e também mostrando algumas inconsistências na maneira em que cantava. Levando em conta que este fato não detraiu de maneira alguma da qualidade do show (na realidade só reforçou o clima já muito aparente de festa) e os temas abordados pela banda, isto foi longe de ser um problema. Mesmo com isso, Jonne interagia bastante, descendo à parte inferior do palco para bater nas mãos dos fãs, colocava o microfone na frente do público para cantarem, aceitou bebidas dos que estavam presentes.
Um momento que acabou marcando sua performance foi quando sentou em um dos monitores virados ao público, pegou uma cerveja de um dos membros do público e brindou com outro – tudo enquanto ainda cantava. Tocaram pela primeira vez a música “Saunaan” que, de acordo com a banda, sairá apenas do dia 5 de abril do ano que vem. Após isso veio a clássica “Tequila”, que fez o público ir à loucura. Após uma hora e meia, saíram do palco para criar antecipação para um possível bis. Logo que saíram, gritos de “vodka, vodka” dominaram o Carioca Club. Voltaram ao palco após poucos minutos e, para surpresa de alguns, fecharam a noite com “Vodka”.
A edição de 2023 do Odin’s Krieger Fest mostrou por que este evento é, ao lado do não menos tradicional Thorhammerfest, uma grande reunião da cena folk. Os primeiros shows mostraram a força do cenário folk nacional, trazendo nomes estabelecidos como Terra Celta e Taberna Folk, mas ao mesmo tempo apresentando grupos mais novos, como a Tunas Celtic Band e o Eldhriminir.
Setlist – Eldhriminir:
- Caldeirão
- Nós Nascemos Para Beber
- Capitão
- Luta de Convés
- Mapa dos Bebuns
- Bar do Fim
- Bella Ciao
Setlist – Taberna Folk:
- Štrum ШТУpm
- In Taberna
- Jeg Sa Ein Ulf
- Trotto/A Que Por
- Da Que Deus
- After a Hard Day?
- Tordion
- Fee Ra Huri
- The House of the King/Hocus Pocus
- Under the Hammer
- Hot Asphault
- Lannigan’s Ball
- Drunken Lullabies
- I’se the B’y
- Sieben Tage Lang
Setlist – Terra Celta:
- Outro Lugar
- Gaia
- Bruxaria
- Até o Último Gole
- Heading East
- Mulher Maravilha
- Terra Celta
- Canção da Meia Noite e Meia
- Ressaca
Setlist – Korpiklaani:
- A Man With A Plan
- Wooden Pints
- Happy Little Boozer
- Journey Man
- Pilli On Pajusta Tehty
- Sanaton Maa
- Ievan Polkka
- Jägermeister
- Gotta Go Home
- Tuli Kokko
- Pixies Dance
- Hummani Hei
- Pidot
- Viima
- Kipumylly
- Leväluhta
- Niemi
- Kotikonnut
- Metsämies
- Ämmänhauta
- Saunaan
- Tequila
- Huolettomat
- Ennen
- Beer
- Vodka