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IOTUNN: DO PROG AO DEATH, CRUZANDO UNIVERSOS

Por Valtemir Amler

Se você parar para pensar por um minuto, perceberá que existe algo muito característico e único no cenário dinamarquês do metal, e isso desde os primeiros dias da cena, nos anos 80: as bandas de lá simplesmente não parecem estar dispostas a trabalhar com segurança, construindo sua sonoridade rigidamente dentro dos moldes de um único gênero musical. Foi assim com o Mercyful Fate, que ganhou tanto os ouvintes de metal extremo quanto tradicional com sua fórmula única, e também com o Artillery, que ousou mesclar com habilidade ímpar as guitarras melódicas tradicionais da NWOBHM com o som thrash que vinha da Bay Area. Uma década mais tarde, foi essa mesma postura pluralista que garantiu bom nome para atos como Mercenary, Konkhra e Illdisposed, e então se renovando novamente com Volbeat e toda uma nova geração. Essa tendência a unir diferentes mundos ainda é algo forte por lá, e não é surpresa que seja ela a principal característica do Iotunn, um dos fortíssimos novos nomes que agita a atual cena de Copenhagen. Jens Nicolai Gräs (guitarra), Bjørn Wind Andersen (bateria), Jón Aldará (vocal), Jesper Gräs (guitarra) e Eskil Rask (baixo) estrearam com o EP The Wizard Falls em 2016, mas alcançaram um novo nível de excelência em 2021, com o lançamento de seu primeiro álbum completo, Access All Worlds, já com contrato assinado com a tradicionalíssima Metal Blade. A fórmula inegavelmente progressiva, mergulhada em doses caudalosas de melodic death metal são um convite inequívoco para que o ouvinte abandone a segurança e o conforto do seu gênero favorito e ‘acesse todos os mundos’ da música, como o título sugere.

Qual é a sua lembrança mais antiga com música pesada?

Jens Nicolai Gräs: Ah, ainda lembro muito claramente disso, foi em 1992 que ouvi uma canção heavy metal pela primeira vez. Eu tinha oito anos de idade, e eu, meu irmão (Jesper, também guitarrista do Iotunn) e nossos pais tínhamos acabado de nos mudar para uma outra vizinhança, então basicamente precisava fazer novos amigos. Lembro desse garoto, ele tinha a mesma idade que eu e era bem descolado, comunicativo. Ele viu que eu era novato por ali e que estava meio deslocado, e rapidamente veio falar comigo, tipo ‘e aí, novato, vamos ser amigos ou o que?’. E eu pensei, ‘claro, vamos ser amigos’. Não quis saber qual era a outra opção (risos). Ainda éramos crianças, e ficamos bastante amigos, lembro que o quarto dele era totalmente decorado com pôsteres de rock nas paredes, na verdade, pôsteres de três bandas: Metallica, AC/DC e Guns’N’Roses. Era começo dos anos 90, você simplesmente não tinha como fugir dessa tríade, eles estavam em todos os lugares, ainda estão, mas naquela época chegava a ser desesperador (risos). Bem, ele tocou a Sad But True, do Black Album (Metallica, 1991).

Ah, um bom riff para te apresentar ao mundo das guitarras.

Jens: Sim, exatamente! Naquela época eu não sabia absolutamente nada sobre música, tinha apenas oito anos e nunca fui do tipo ‘gênio’, eu era só um garoto normal que não sabia de nada, mas tinha algo ali que me cativava. Não era nada técnico ou rítmico, nada disso, eu nem sabia que essas coisas existiam (risos). Mas existia um sentimento naquilo, é difícil explicar. Ouvi uma única vez, e estava apaixonado por aquela música. Foi realmente marcante para mim, eu me sentia levitando, aquilo tinha tirado o chão debaixo dos meus pés.

Sei exatamente como é isso.

Jens: Sim, acho que todo mundo que ama música pesada vive algo parecido no início. O engraçado é que meu amigo ficou empolgado por eu ter gostado daquilo, acho que ele não conhecia muitas pessoas que curtissem (risos), então ele rapidamente fez uma daquelas velhas coletâneas em fita cassete para mim, apenas Metallica, AC/DC e Guns’N’Roses. E eu nunca ouvir a Sad But True inteira, apenas tocava aquela intro, a parte antes da pausa, sabe? Era apenas um pequeno verso, uma parte muito específica e ínfima do extenso universo do metal, mas aquilo tinha sido o suficiente para mim, eu tocava aquela parte, voltava a fita, tocava de novo, vezes e vezes seguidas.

Imagino que essas três tenham se tornado as suas três primeiras bandas favoritas.

Jens: Sim, com certeza. Ainda amo essas bandas, ouço sempre, mesmo sabendo todas as músicas de cor. Na época, eu costumava pegar um boné, um paletó bonito e uma bermuda, e então ficava imitando o Angus Young (risos). Como disse, eu era uma criança, estava me divertindo com algo novo que eu amava, e Angus foi o meu primeiro herói da guitarra, ele é o grande influenciador de eu ter me tornado guitarrista, sem sombra de dúvida.

Imagino a razão, ele é um ótimo guitarrista e tinha uma performance muito marcante.

Jens: Sim, e isso era muito legal para alguém que estava começando a curtir esse mundo. Ele não era só um cara de jeans e camiseta tocando guitarra no palco com a mesma postura que estaria no bar bebendo com os amigos, ele tinha uma vestimenta específica para as apresentações, tocava como o diabo, e tinha todos aqueles trejeitos, aqueles movimentos que se tornaram uma marca, era algo incrível. Existiam poucas coisas tão legais para um garoto ver quanto um show do AC/DC, com todas aquelas luzes, o sino do inferno, os canhões disparando e a ótima música, era tudo incrível.

Bom, como você já imitava o Angus Young, imagino que na época já pensava em ser músico.

Jens: Sim, eu queria ser como o Angus, mas no início eu ainda nem sabia que era preciso ter uma banda para isso (risos). Eu só queria ser como ele, e aos poucos fui entendendo que era preciso ter um instrumento de verdade, aprender a tocar, montar uma banda, escrever suas próprias músicas, e assim por diante. Quando aprendi o que de fato era uma guitarra, comecei a desejar uma. Eu tinha um tio que gostava muito de música, e tudo o que ele ouvia era basicamente orientado por guitarras, então ele me foi de grande ajuda, na época (risos). Minha primeira guitarra foi presente de Natal, e eu ganhei em 1996.

Você progrediu rápido, como guitarrista?

Jens: Bem, eu não era nenhum prodígio, por assim dizer. Comecei relativamente tarde, aos doze anos, e dali em diante foi uma mistura de começar a decifrar por mim mesmo os primeiros acordes e assim poder tocar ao menos algumas canções mais fáceis, e entrar para uma escola de música e aprender a tocar guitarra clássica e o lado mais teórico da atividade musical. Eu não era rápido, mas era insistente, e no fim das contas me tornei um guitarrista bastante razoável, ao menos ao ponto de conseguir tocar na prática as ideias musicais que nasciam na minha cabeça, e acho que esse é realmente o quão bom você tem que ser (risos).

Bem, quando ouvimos o Iotunn, percebemos uma trama musical muito rica, onde se destacam os elementos de rock progressivo e death metal. Porém, até agora, não falamos de nada que remetesse a esses estilos. Quando eles realmente ganharam espaço na sua coleção de discos?

Jens: Bom, durante todos os anos 90, o meu negócio acabou sendo o metal mais ‘mainstream’ mesmo, pois eram as coisas que tinham um acesso mais fácil, todas as lojas tinham os discos, enfim, eram bandas que estavam mais à mão, por assim dizer. Eu me apaixonei por Iron Maiden, Pantera e Slayer, e basicamente por conta dos discos ao vivo deles. Eram Live At Donington (Iron Maiden, 1993), Official Live: 101 Proof (Pantera, 1997) e Decade of Aggression (Slayer, 1991), eu adorava isso! Sei que algumas pessoas odeiam discos ao vivo, dizem que é trapaça e tudo o mais, mas eu amava aquilo, o repertório era sensacional, tinha uma energia incrível, eu comprava todos os que encontrava.

Sempre fiz isso também. Tenho álbuns ao vivo até de bandas que não curto.

Jens: Pois é, são discos que tem uma energia única, e eu amo ouvir música com o barulho de uma plateia realmente empolgada, mesmo que em alguns discos seja uma plateia inserida posteriormente (risos). Quanto ao prog, foi algo que entrou na minha vida por volta do ano 2000, com Genesis, Pink Floyd, King Crimson e tal. E aí foi engraçado, porque foi com o progressivo que criei a casca grossa necessária para ouvir bandas mais extremas, o que soa estranho até para mim (risos gerais). Comecei a ouvir Arcturus, Morbid Angel, Carcass, Dissection, Emperor. Daí em diante, a lista nunca mais parou de crescer, pois eu já tinha maturidade o suficiente para absorver músicas que não fossem mais tão ‘populares’, se é que estou empregando bem a palavra.

E como todo esse background foi desenvolvido na música do Iotunn?

Jens: Bem, eu e meu irmão começamos a banda por volta de 2009, mas nunca consideramos essa data como a fundação do Iotunn, pois de 2009 a 2015 tudo o que queríamos era estudar as mais diferentes expressões musicais possíveis dentro do rock e do metal. Nós estabelecemos que seríamos pacientes, pois acreditávamos que com paciência e mantendo uma curiosidade constante, nós simplesmente encontraríamos o caminho para escrever canções que fossem equilibradas, e que fizessem sentido para fãs de qualquer sonoridade dentro do rock, do prog ao extremo. Levou bastante tempo, e até hoje tem muita gente que não entende o nosso som, mas percebo que conseguimos encontrar o nosso caminho. Tenho orgulho do que conquistamos até agora, e mal posso esperar para ver os próximos passos.

 

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