Por Valtemir Amler
No mundo da música, às vezes as tendências parecem vir em círculos. Veja o caso da Alemanha, por exemplo: para começar, os teutônicos deram uma nova cara à música progressiva com o chamado krautrock, depois caíram de cabeça no hard rock, dali para o heavy metal e dele para o power e o speed metal. Mas, o quanto precisaríamos estar com os olhos e ouvidos vedados pelas últimas quatro décadas para deixar de reconhecer o papel gigantesco que eles tiveram na popularização do thrash pela Europa, além do caráter mais extremo que imprimiram ao jogo desde que deram sua digital própria para o estilo? Se o krautrock nunca mais deu as caras naquele mesmo nível por ser um fenômeno muito precisamente vinculado com uma época (como aconteceu com o psicodélico nos anos 60), hard, heavy e speed tiveram novas gerações germânicas nas duas últimas décadas, então talvez esse seja o novo momento glorioso para o thrash alemão. Ao menos, é com isso que sonha o Space Chaser, um dos melhores nomes surgidos por lá desde 2010. Surgido em 2011 em Berlin, o quinteto formado por Siegfried Rudzynski (vocal), Martin Hochsattel (guitarra), Matthias Scheuerer (bateria), Sebastian Kerlikowski (baixo) e Leo Schacht (guitarra) aposta em uma sonoridade que faz sim lembrar algo da velha escola alemã, mas que se aproxima muito mais do thrash moderno do que os seus ancestrais poderiam supor. Muito disso vem por conta das letras, profundamente ambientadas na ficção-científica de distopia, baseada em mundos onde a tecnologia guiou o homem a caminhos de quase extinção. Para nos falar mais sobre isso, conversamos com Matthias Scheuerer.
Olá Matthias, é um prazer falar com você. Recentemente o Space Chaser assinou com a Metal Blade, uma gravadora bastante tradicional no cenário mundial. Já deu para sentir alguma diferença?
Matthias Scheuerer: Olá Valtemir, bom falar com você, obrigado pelo interesse! Cara, sim, já deu para sentir uma boa diferença naquilo que se refere a quantidade de pessoas que tiveram acesso a nossa música. Quer dizer, já estamos ativos a algum tempo, construímos um bom nome na Alemanha, mas pouquíssimas pessoas nos conheciam além das nossas fronteiras, e sinto que isso está mudando muito rapidamente. Tenho falado com muitas pessoas como você, pessoas que antes não haviam ouvido sequer o nosso nome, mas que viram um dos vídeos desse álbum mais novo, e que ficaram interessadas no que fazemos, e isso é sensacional!
Isso é ótimo, e chega no momento perfeito, já que a banda há pouco celebrou os primeiros dez anos de carreira.
Matthias: Pois é, cara, isso é incrível! E acho que até o momento tivemos uma carreira bem interessante, quer dizer, não somos o tipo de banda que tomou o caminho mais fácil, nunca caminhamos por atalhos para apressar a nossa chegada em um certo lugar, isso nunca foi a nossa intenção. Sempre quisemos viver a vida de uma banda de thrash metal, cada etapa delas, sem pular nada. Fosse bom ou ruim, queríamos experimentar as sensações que nossos ídolos tiveram quando estavam trabalhando na música que amamos, e não se faz isso bancando o esperto e pulando etapas. Começamos com a tradicionalíssima demo, passamos para um EP, e fomos seguindo daí em diante, por selos pequenos, clubes pequenos, turnês pequenas, e crescendo na estrada, até chegar nesse ponto. Então, acho que é uma sensação boa essa que estamos vivendo, pois sabemos exatamente de onde vem os frutos que estamos colhendo agora.
Vocês estão há um bom tempo juntos, mas você não foi um dos fundadores da banda, correto?
Matthias: Sim, na verdade eu fui o último desses caras a entrar para a banda (risos). Mas a verdade é que isso não fez muita diferença na prática, já que a banda nasceu em 2011, e em 2012 eu já estava assumindo a bateria. Porém, o Space Chaser teve dois bateristas antes (N.R: Michael Schilling e Oliver Zibell, este último também do Adrenicide, tiveram passagem relâmpago pelas baquetas). Com isso, o único material do Space Chaser que não gravei foi a demo, e estou presente em tudo desde então.
Certo, seu primeiro registro foi o EP Decapitron.
Matthias: Sim, e aquele foi um tempo interessante, pois estávamos começando e existia toda uma aura de novidade para todos nós, aquilo era, de repente, a coisa mais importante que já havíamos feito em nossas vidas! Para uma banda iniciante, gravar aquele EP era como ser uma estrela do rock, pois eram as nossas músicas ali, as nossas ideias colocadas em prática e expostas para todos que quisessem ouvir. Era 2013 quando gravamos aquelas músicas, e foi tudo pela nossa própria conta, sem o apoio de ninguém, totalmente independente. Gravamos, mandamos prensar as primeiras quinhentas cópias, e vendemos tudo nós mesmos nas nossas apresentações ao vivo. Foi algo bem pessoal e trabalhamos de forma tão profissional quanto podíamos, mas com muita paixão, toda a emoção ali era pura e genuína. Eu não sei dizer se conseguimos alguns fãs naquela época, afinal éramos apenas uma banda novata que mal tinha lançado um EP, mas é certo que impressionamos positivamente algumas pessoas. Uma dessas pessoas que impressionamos era o dono do selo This Charming Man, um pequeno selo de Münster que revelou muitas bandas legais para o mundo, incluindo aí o Kadavar, que talvez vocês conheçam no Brasil.
Sim, o Kadavar é relativamente bem conhecido por aqui, eles fazem um ótimo rock’n’roll.
Matthias: Sim, eles são ótimos, e os caras da This Charming Man foram os primeiros a dar uma chance a eles. Foi a mesma coisa conosco, foi com eles que conseguimos o nosso primeiro acordo.
Certo, então foi com eles que vocês partiram para o seu primeiro full-length, Watch The Skies!.
Matthias: Sim, e foi engraçado, porque eles não eram de maneira nenhuma um selo de metal naquela época. Estamos falando de 2014, e eles ainda eram um selo independente especialmente devotado ao punk, mas acontece que um amigo do dono do selo viu uma de nossas apresentações e fez uma ótima propaganda nossa, então conseguimos um acordo com a This Charming Man. E aquilo foi ótimo para nós, pois além de termos um contrato, também tornou possível que um público diferente começasse a se interessar por nossa música, já que na época éramos a primeira banda de metal do selo.
Já era uma expansão, logo de cara.
Matthias: Sim, mas nós sempre tivemos muito claro que a principal parte, a parte mais importante da nossa carreira tinha a ver com a cena metal, era ali que as coisas realmente tinham que acontecer para que fôssemos para frente. Abrir um pouco mais as coisas e conquistar um público diferente foi crucial no sentido que tínhamos muito mais shows a fazer, pois o nosso circuito era mais amplo. Tocávamos nos tradicionais eventos de metal, mas também nos eventos punk, em competições de skate, e toda essa exposição acabou fazendo com que muitos metalheads começassem a ver nossa banda com mais interesse. Sei que é um processo meio indireto, mas é como eu disse, não queríamos nenhum atalho.
Bem, o que você acha que fez os punks se interessarem tanto pelo Space Chaser?
Matthias: Inicialmente, acho que foi essa aura meio ‘old school’ que temos com essa banda. Nosso som não é tão tradicional assim, tem vários elementos mais modernos, mas a nossa postura sempre foi de uma banda da velha escola. Veja, nós não gravamos em computadores e cheios de plugins, nós fomos para o estúdio e ralamos a bunda trabalhando (risos). Fizemos uma demo tosca, e investimos do nosso próprio bolso para gravar um EP, que nós mesmos nos esforçamos para vender. Os punks não são garotos mimados criados com tudo na mão, eles sabem dar valor ao trabalho duro, e acho que se identificaram com a nossa postura, pois de certa forma estávamos agindo como as bandas punk sempre agiram. Depois disso, acredito que eles foram conferir algumas de nossas apresentações, e aqui vai uma coisa importante: Siegfried Rudzynski, nosso vocalista, é absolutamente insano, ele é um daqueles ‘frontman’ que fazem qualquer show ser algo especial, ele é absolutamente maluco no palco, todas as noites! Acho que os punks também se identificaram com isso.
Sim, com certeza. Bem, imagino que tenha sido por isso que logo em seguida lançaram o EP Skate Metal Punks (2014).
Matthias: Sim, foi a nossa forma de deixar claro que não eram apenas eles nos abraçando, nós também estávamos abraçando-os. Foi como dizer ‘ei, somos parte dessa cena também, obrigado por nos receberem’.
E então veio o segundo álbum, Dead Sun Rising (2016).
Matthias: Sim, e para nós foi como uma continuação natural daquilo que vínhamos fazendo até então. Continuamos no mesmo selo, trabalhamos com o mesmo time, e trabalhamos com a música que amamos da mesma maneira. À partir do momento que aprendemos o que fazer, não havia razão para colocar tudo a perder, então simplesmente fomos em frente.
Sim, e isso é algo interessante. Desde a primeira demo até o mais novo álbum, Give Us Life (2021), suas letras sempre giraram em torno do universo da ficção-científica.
Matthias: Sim. O fato é que realmente gostamos das letras, nunca acreditamos que ela ocupava um papel secundário em relação à música, então nos dedicamos a elas também. Uma vez que todos amamos coisas como Star Wars e Star Trek, foi questão de mergulhar mais fundo e criar nosso próprio enredo. Acho que as pessoas têm gostado disso, então é algo que devemos manter em nossos álbuns.
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