Por Luiz Tosi
Fotos: Belmilson dos Santos
Há bandas que acabam. Há bandas que somem. E há bandas que silenciam – deixando um vazio que nunca é preenchido. O Savatage é uma dessas. Desde que entrou em hiato em 2002, o grupo ganhou status de mito entre os fãs de heavy metal: marcou época, influenciou gerações e desapareceu sem se despedir de verdade.
Uma apresentação única no Wacken Open Air, em 2015, chegou a ensaiar um recomeço. Mas a morte do produtor e mentor criativo Paul O’Neill, em 2017, seguida pela pandemia, freou tudo. Para completar, Jon Oliva – último membro fundador ainda vivo – enfrentou sérios problemas de saúde: em 2023, sofreu um acidente que resultou em fraturas numa vértebra; depois disso, vieram os diagnósticos de esclerose múltipla e da síndrome de Ménière, que causa vertigens severas. A perspectiva era desanimadora.
Mas o que parecia cada vez mais distante se materializou. E foi justamente a superação desses obstáculos que deu ainda mais força ao retorno. Por isso, não é exagero dizer que este foi um dos shows mais esperados da década no meio do heavy metal. E não apenas por ser a volta de uma banda que parecia condenada à memória, mas porque São Paulo, por sorte (ou justiça), foi palco não de um, mas dos dois primeiros shows dessa turnê histórica, que ainda vai cruzar o mundo em 2025. A estreia aconteceu dois dias antes, no Monsters of Rock, que serviu apenas como um esquenta: escalá-los para tocar às 16h, sob a luz do dia e com tempo reduzido, pode figurar entre os maiores erros do icônico festival ao longo destas três décadas. O Savatage merecia mais. Merecia sua própria noite. E teve.
O Espaço Unimed foi o palco do primeiro show completo da banda fora de festivais em mais de 20 anos. O clima era de expectativa intensa, com muitos fãs vindos de outros estados e até de fora do país. Quando The Ocean começou, pouco depois das 21h, a ficha caiu: eles estavam ali, de volta. A sequência com Welcome e Jesus Saves veio direta, pesada e teatral. Em seguida, uma trinca de faixas – Sirens, Another Way e The Wake of Magellan – mostrou a força e a variedade do repertório. Um momento curioso rolou quando Sirens foi anunciada por engano como Magellan.
O Savatage trouxe o que tem de melhor para oferecer. A formação atual reúne músicos com décadas de história na banda. Zak Stevens, em plena forma, comandou os vocais com potência, segurança e entrega. Chris Caffery e Al Pitrelli dividiram as guitarras com precisão e peso, revezando-se entre riffs, solos e passagens mais melódicas. Johnny Lee Middleton, no baixo, e Jeff Plate, na bateria, sustentaram uma base firme. No lugar de Oliv, dois tecladistas completaram a sonoridade, recriando com fidelidade as camadas orquestrais dos álbuns mais elaborados. A banda soava coesa, afiada e, acima de tudo, emocionada por estar ali.
O público reagiu forte a Strange Wings e Taunting Cobras (fora do set desde 1998). Cada resgate era recebido como um presente. Turns to Me, Dead Winter Dead, Handful of Rain e Chance trouxeram o lado mais emocional e denso do Savatage, preparando o terreno para o que viria a seguir. This Is the Time e The Hourglass abriram o caminho para Believe – o ponto mais tocante da noite. Jon Oliva apareceu no telão, ao piano, cantando os versos iniciais. A banda entrou logo depois. Durante o solo, um tributo a Criss Oliva – guitarrista fundador e irmão de Jon, morto em 1993 – emocionou geral. Foi um daqueles momentos em que o show vira memória compartilhada. Silêncio, lágrimas, luzes de celular. Todo mundo entendeu.
No bis, Power of the Night – com Zak Stevens vestindo a camisa da Seleção Brasileira – deu o tom da festa, seguido por Hall of the Mountain King, encerrando tudo com o peso e a teatralidade que só o Savatage tem.
A ausência física de Jon Oliva foi sentida – mas não doeu. Porque ele estava lá: em cada verso, cada tela, cada nota, cada arranjo. E o mais importante: segundo os próprios músicos, essa volta não será breve. O grupo garante que não vai sumir de novo. Há planos de novos álbuns, novos shows, novos encontros. Que bom. Porque, depois de uma noite como essa, o que a gente quer é justamente isso: mais. Mais música. Mais emoção. Mais Savatage. Que o próximo encontro não demore tanto. Vida longa.
Setlist Savatage
The Ocean
Welcome
Jesus Saves
Sirens
Another Way
The Wake of Magellan
Strange Wings
Taunting Cobras
Turns to Me
Dead Winter Dead
The Storm
Handful of Rain
Chance
This Is the Time
Gutter Ballet
Edge of Thorns
The Hourglass
Believ
Power of the Night
Hall of the Mountain King