MARTY FRIEDMAN: CONEXÕES ÉTNICAS E MUSICAIS AO LADO DE KIKO LOUREIRO NO BRASIL


Por Leandro Nogueira Coppi

Marty Friedman, um dos guitarristas mais expressivos e inovadores de sua geração, se prepara para se juntar a Kiko Loureiro na turnê “Theory of Mind Tour 2025”, que passará por oito cidades no Brasil a partir do próximo dia 30 de maio. Em uma conversa profunda e reveladora, ele compartilha suas influências musicais, destacando como a forte presença de sons étnicos em sua obra estabelece uma conexão especial com o trabalho de Kiko, que também incorpora esses elementos em suas composições. Além de falar sobre o processo por trás de seu mais recente álbum, Drama, Marty reflete sobre a introspecção que o guia em sua música e o carinho que sente pelos fãs latino-americanos, que sempre foram parte essencial de sua jornada musical.

Você foi convidado por Kiko Loureiro para participar de sua próxima turnê pelo Brasil. Vocês dois já passaram pelo Megadeth, e é ótimo ver que não há choque de egos entre vocês. Como foi receber o convite para a “Theory of Mind Tour 2025”, que começa no próximo dia 30 de maio?
Marty Friedman: Kiko e eu somos bons amigos, e eu sou um grande admirador dele – tanto como músico quanto como pessoa. Ele é inteligente, amável, e eu adoro tocar com ele. Ao mesmo tempo, estou em turnê solo com minha própria banda pela América Latina e, por alguma razão, não conseguimos datas no Brasil, não funcionou uma turnê por aí. Eu ia fazer uma turnê inteira na América Latina sem passar pelo Brasil. Mas, depois que finalizamos nossa turnê na América Latina, recebi um telefonema do Kiko dizendo que queria fazer série de shows no Brasil. Como eu já estava tentando muito ir com minha banda e não deu certo, agora faremos oito shows juntos no Brasil. Às vezes, coisas boas acontecem, então fiquei realmente feliz por conseguir incluir o Brasil nessa viagem pela América do Sul. Tenho muito boas lembranças do Brasil, e essa será a primeira vez que toco junto com Kiko. Nunca, de fato, tocamos guitarra juntos, então muitas coisas emocionantes irão acontecer.

Assim como você incorpora elementos exóticos e culturais em sua música, Kiko traz muitas referências da música brasileira em suas composições. Qual sua percepção sobre ele como músico?
Marty: 
Esse é um bom ponto que você levantou, Leandro, porque eu acho que uma das razões pelas quais nos juntamos é por causa desse elemento étnico presente em nossa musicalidade. Uma vez estávamos falando sobre algo e Kiko trouxe um ponto muito interessante. Ele diz que quando você ouve qualquer artista, em nosso caso um guitarrista, você ouve a vida dessa pessoa, você imagina, tem essas imagens da sua vida e ele disse que quando ele ouviu minha música, minha guitarra, ele ouvia um dançarino japonês dançando graciosamente em roupas tradicionais japonesas e eu achei isso muito interessante. Eu disse que isso faz muito sentido porque quando eu ouço a guitarra de Kiko, eu ouço esses ritmos que não são os ritmos com os quais eu cresci, eu sinto como se fossem os ritmos com os quais ele cresceu e não são apenas as batidas, os tambores, são as subdivisões em sua guitarra, a forma como seus acentos são, é muito único para ele e eu acho que é muito brasileiro. Então, nós dois temos esse elemento étnico em nosso jeito de tocar, e acho que muitos guitarristas, em particular, perdem uma grande oportunidade de se expressar, porque cada pessoa tem um país que cresceu ou mora ou admira, então há música étnica. A música tem uma fonte muito profunda de informações, e eu acho que Kiko e eu usamos muito essas informações.

Faz dez anos desde que você veio ao Brasil para promover seu álbum Inferno (2015). Você se lembra daquela ‘clinic tour’? Como você se sente sobre sua conexão com os fãs sul-americanos, que te admiram não apenas por sua passagem no Megadeth, mas também por seu trabalho solo e com o Cacophony?
Marty: 
Sim, isso significa o mundo para mim, porque meu novo álbum, Drama, é o meu 16° trabalho solo. E os fãs são muito dedicados, mas a base continua crescendo e crescendo, e eles vão se renovando. É uma coisa maravilhosa, e eu acho que é algo que eu levo muito a sério, especialmente na América do Sul, principalmente do Brasil. Desta vez, eu não estou indo ao Brasil com minha banda, mas o apoio significa tudo para mim, e eu acho que ir para o Brasil e para a América do Sul em geral é algo que eu fiz muitas vezes na minha carreira, e sempre tentei absorver o máximo que eu posso da música e da cultura. E os fãs sabem disso; eles me dão CDs, me dão álbuns e livros de música, e eu não jogo essas coisas fora. Eu ouço eles, aprendo com eles, então eu acho que muita dessa influência está em minha música, e talvez seja por isso que eles me apoiam. Eu acho que o maior exemplo é, obviamente, o Astor Piazzolla da Argentina. Tenho tantas conexões com essa música, que, inclusive, faço concertos de Piazzolla no Japão. Há muitas conexões musicais, e o fato de pessoas de toda a América do Sul acompanharem meu trabalho solo é algo muito importante para mim.

Falando sobre Drama, esse é um álbum muito emocional para mim, porque me remete a dois trabalhos que simplesmente curto muito em sua carreira com artista solo: Scenes (1992) e Introduction (1994). Digo isso por Drama trazer de volta o clima suave e introspectivo daqueles álbuns. Scenes Introduction lhe serviram de inspiração para você compor Drama?
Marty: Obrigado! Sim, de certa forma me inspiraram. Eu não gosto de me repetir, sabe? Já fiz Scenes Introduction há muito tempo, então não preciso fazê-los novamente. Mas tantas pessoas me perguntam: “Quando você vai fazer outro álbum como Scenes?. Acho que as pessoas estão respondendo muito bem a esse novo álbum. Scenes Introduction, mas principalmente Scenes. Então, pensei: “Bem, se eu fosse fazer um álbum como aquele em 2025, como seria?” Então, comecei a pensar sobre isso. É meio que uma evolução. Talvez seja o mesmo tipo de conceito de Scenes, mas eu evoluí muito desde então. Muitas coisas malucas aconteceram, muitas influências. Uma grande influência, como eu disse, foi a música de Piazzolla e vir tantas vezes à América Latina e absorver todos esses sentimentos. Muito da imagem latino-americana está em Drama. Mas sim, tudo começou meio que com a reação a Scenes, porque Scenes tem quase 30 anos, mas as pessoas ainda falam sobre ele. Então talvez haja alguma magia nele da qual nem eu mesmo sei. Estou muito feliz por ter recebido tantas palavras gentis a respeito. Começou como uma tentativa não de recriar, mas de interpretar Scenes como eu o faria hoje.

Além do título Drama, a capa com uma foto sua em preto e branco e alguns dos títulos das faixas me sugerem um senso de introspecção. Que tipo de emoção ou estado de espírito você carregava ao compor esse álbum?
Marty: 
Definitivamente, introspecção. E essa é uma boa palavra que você usou. Mas o que isso realmente significa? Quando você realmente é instrospectivo e coloca isso na música, você tem que fazer muitas coisas que podem ser meio constrangedoras. Algumas pessoas podem pensar: “Isso é brega!” ou “Isso é muito cafona”, porque nós, seres humanos, temos muita coisa brega dentro da gente (risos). E você não pode ter vergonha de colocar isso na sua música. Então, acho que isso é o que eu quero dizer com introspectivo. É algo muito profundo e muito triste, mas ao mesmo tempo há muitas melodias que muitas pessoas não fariam, porque são muito… Não sei… É quase como música da Disney às vezes. Sem vergonha. É algo muito edificante quando você ouve. Você quase se sente culpado por ouvir, porque é muito edificante. E eu tenho que jogar fora qualquer constrangimento. Não posso agir como se fosse “o cara do metal”. Só tenho que ser introspectivo e tocar como eu sinto. É por isso que Drama saiu assim.

Eu adorei a nova versão de Triumph, música originalmente lançada em Scenes. Por que você decidiu gravar uma nova versão para ela em Drama?
Marty: 
Porque eu nunca tinha acertado ela antes. Gravei tantas versões diferentes ao longo da minha carreira. Eu pensava: “Sim, a música é boa, mas a introdução, a interpretação nunca foi perfeita”. Por exemplo, Scenes foi um álbum de orçamento muito baixo, então Triumph foi feita em um sintetizador e tinha muito pouca expressão humana. Era só um teclado tocando, e isso não soava grandioso para mim. E quando fiz no (meu primeiro álbum) Dragon’s Kiss, ela se chamava Thunder March. Essa também… eu não tinha maturidade para arranjar uma música direito. Então, era só um monte de guitarras rápidas e distorção. Era boa, foi o melhor que eu podia fazer na época. Mas agora eu cresci e tenho acesso a orquestras. Tenho muita experiência com arranjos, produção, e minha guitarra está muito melhor. Agora é a chance de fazer essa música do jeito certo. E foi por isso que eu a refiz.

Olhando para o passado, como foi para você trabalhar em Scenes com um músico excepcional como o mestre da New Age, Kitaro?
Marty: 
Eu já era fã dele quando eu estava no Cacophony porque, como você sabe, o Cacophony era só música insana o tempo todo. Gravar aquilo era bem… estressante. Milhões de notas por dia. E eu nunca conseguia dormir. Nunca dormia depois de gravar. Então eu ouvia a música do Kitaro para conseguir dormir. Era a única coisa que me fazia dormir. Eram lindas canções de ninar feitas por um mestre da produção. Então, quando trabalhei com ele em Scenes, foi uma honra, porque ele sabe fazer música ‘soft’. E eu não sabia fazer música ‘soft’ naquela época. 

Antes de encerrarmos, quero lhe agradecer por um momento especial. Em 1997, quando você veio para São Paulo com o Megadeth durante a turnê do álbum Cryptic Writings, sabendo que você sempre foi fã e colecionador de Elvis Presley, lhe dei de presente dois vinis dele lançados somente no Brasil. Um mês depois, você me enviou um cartão postal agradecendo pelos discos. Foi um gesto muito bacana e atencioso. Muito obrigado por este cartão postal, o qual estou lhe mostrando!
Marty: Uau, cara, eu lembro disso! Lembro totalmente. Ainda tenho aqueles discos do Brasil, sim. Muito obrigado, esse é o caminho para o meu coração, Leandro, e você está nele para sempre. Muito obrigado. Eles ainda estão aqui em casa e em boas condições!

Que legal, Marty. Fico feliz em saber que você ainda os tem. Espero vê-lo na turnê com Kiko Loureiro.
Marty: Legal. Muito obrigado! Até lá!

Veja as datas da “Theory of Mind Tour 2025” de Kiko Loureiro no Brasil tendo Marty Friedman como convidado, e confira também os videoclipes dos singles do álbum Drama, do guitarrista norte-americano.

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