Fidelidade ao que acredita, esse é tradução mais adequada quando proferimos o nome Crucificator. Uma banda que ainda preserva a essência do verdadeiro underground nos dias de hoje. Convidamos o fundador e guitarrista Hategun para uma conversa para falarmos dos 31 anos de luta e resistência. E em nossa conversa o mesmo nos revelou que a banda já está trabalhando em um novo lançamento que ainda está sem título e que será lançado em breve pela gravadora Voz Da Morte.
O obscuro Crucificator foi formado em 1987 por você. Como surgiu a ideia de montar essa máquina de guerra?
Hategun – Bem, acredito que a idéia de uma banda naquela época fluiu naturalmente, pois eram outros tempos, não existia os acessos e facilidades de hoje. Montar uma banda naquele tempo era por verdadeira paixão ao metal, ainda mais se tratando de suburbanos e, um Estado como a Bahia.
Seu primeiro registro veio em 1991 quando foi lançado a demo “The Evilness” onde a banda contava com você gravando a guitarra, baixo e voz. Houve na época alguma dificuldade para encontrar membros adequados à ideologia da banda? Como foi a receptividade por parte do público a este primeiro registro divulgado?
Hategun – Dificuldade em encontrar componentes para o CRUCIFICATOR parece ser cultural, temos princípios de lealdade bastante firmes, logo não nos consideramos uma simples banda, mas sim uma família onde o convívio não se limita a simplesmente som. Acredito que o compromisso e seriedade assusta as pessoas que preferem se ater a folclore, que a realidade. A receptividade do publico ao nosso primeiro registro na época acredito q tenha sido boa, até porque não era uma coisa que nos importasse, acredito que o importante era alcançar o publico correto.
Dois anos após o primeiro material lançado vocês atacam novamente e lançam a demo “Diabolism”. Houve uma boa divulgação deste material na época? Quais foram as maiores dificuldades encontradas na época para que essa demo fosse materializada?
Hategun – Como havia citado, a nossa preocupação na época era mais a quem divulgar o som, mas acredito que alcançamos o publico desejado. Eram tempos difíceis, éramos jovens e fazendo uma coisa nova aos olhos da sociedade em que vivíamos. As nossas dificuldades eram diversas, aceitação de estúdios para ensaiar, equipamentos, grana, e tantas outras na época…
Confesso que conheci de fato o Crucificator em 1993 com a Reh tape “Eyes Of Pandemonium” que apesar de ser a gravação de um ensaio de forma rudimentar, teve uma grande aceitação por parte de todos que inclusive ostentavam uma belíssima camiseta com a capa dessa tape estampada. Partiu de você a ideia de gravar este ensaio e divulgar?
Hategun – Eu era bastante resistente a essa ideia de gravação na época, acredito que a partir do momento que você comercializa e populariza, você não mais pertence ao underground e isto é fato. Na época então entramos em um consenso de gravar um ensaio a fins de registro, só que a gravação vazou, e apesar de bastante rudimentar houve uma boa aceitação do pessoal mais próximo. A camisa já existia antes dessa gravação, alias foi o que deu o titulo à fita.
Como falei acima “Eyes Of Pandemonium” é um tape que foi muito aceito e muito divulgado. Você considera este trabalho como o material que difundiu completamente o nome do Crucificator na cena extrema no Brasil?
Hategun – Com certeza não! A cena underground era pequena na época em que começamos, nos contatávamos com o mundo todo por cartas (saudades do meu mundo…), existia uma verdadeira rede de comunicação no metal através desse recurso, logo o nosso nome foi inserido na cena nacional. Aquilo era mágico, era o underground puro, uma sensação foda de ter amigos que você nem sabia como era, mas estava contigo no front. Essa geração web nunca saberá o que é underground infelizmente…
Foi a partir deste material que o Crucificator teve a inserção de outros membros em seu line-up? Quem eram eles e qual foi o ganho musical e ideológico que estes membros trouxeram à banda?
Hategun – Caralhoooo… Se for enumerar cada membro que já passou por aqui, se assimilaria a uma lista telefônica!!!kkkkkk brincadeira! Na verdade os ex-“MEMBROS” foram poucos mas acrescentaram muito não só musicalmente, como em lições de irmandade, lealdade e coragem. Costumamos dizer que uma vez CRUCIFICATOR, você será CRUCIFICATOR por toda a vida. Vou citar alguns pilares em nossa jornada: Eden hangman (baixo), Diabolical Butcher (bateria), Agnostic (baixo), Leonardo Ballerith (guitarra) e Junior Lost Soul (baixo), esses são os verdadeiros imortais em nossa história. Agora tiveram participantes que também nada acrescentaram, por não se adequarem às nossas regras, à NOSSA LEI.
Entre 1994 e 2004 a banda passou por longo hiato sem gravar, quais foram os motivos para que ao longo destes longos 10 anos a banda não registrasse mais nenhum trabalho?
Hategun – Na real irmão, além desse lance de gravar ser um saco, eu realmente não curtia essa de divulgação em massa. Após muitas e muitas conversas, fui convencido que os tempos haviam mudado, que independente de qualquer que fosse a condição o que deveríamos manter era a nossa lei. Foi a partir daí que começamos a abrir mais a mente.
Em meados de 1994 integrei ao Mortius e dividimos os palcos por duas vezes, e nessas apresentações sempre notei um lado bem radical adotado como postura da banda. Qual a ideologia adotada pela banda na época? Essa postura ainda mantém vivo até hoje?
Hategun – Sim velho Eden, lembro daquela memorável noite!!! Inclusive após sua saída cheguei a tocar teclados no Mortius Também!!! Mas voltando à pergunta! O que viria a ser radicalismo? Uma maneira diferente de pensar? Nunca acreditamos neste termo dentro do underground, cada um faz a sua lei, a sua verdade, e aquela é a nossa! Sempre acreditei que a nossa música é um reflexo do que somos (sem receita de bolo, claro!), somos firmes em nossas ideias e talvez isso seja encarado como radicalismo por algumas pessoas, mas para nós não, por ser a nossa VERDADE. As décadas se passaram meu irmão, mas não nos esquecemos quem somos e de onde viemos. STAY IN WAR!!
Quais as principais influencias musicais e líricas do Crucificator hoje em dia?
Hategun – Liricamente nos influenciamos na segunda grande guerra, conflitos militares da antiguidade, grandes lideres e estratégias históricas. Eu, o Malignum e o Hammer somos fascinados pela FEB*, a história daqueles caras, a coragem e honra não tiveram o devido reconhecimento. Quanto à inspiração musical é variada. Não posso negar ícones como Slayer, Possessed, Morbid Angel, Terrorizer, Carcass(old) e Dying Fettus.
Notei que os materiais mais antigos da banda tinham uma veia puramente diabólica e hoje em você estão mais focados em temas como destruição e guerras. É impressão minha ou de fato houve essa mudança na temática da banda?
Hategun – Já versávamos sobre guerras bem no início da banda, lembro-me da primeira música da banda que se chamava “WAR”, porém quando começamos, não existia divisões como hoje, ou seja, TUDO ERA DEATH METAL, e tínhamos realmente um viés diabólico bem explicito, mas optamos pelo lado WAR DEATH. Como disse, a música é um reflexo do que somos, e chegamos à conclusão que o satanismo dentro do metal é só um cristianismo inverso. Deixo claro que respeito a todos, mas tenho minhas ideias quanto a religião dentro do metal.
Eis que depois do hiato que já falamos aqui, em 2005 a banda contra-ataca com a poderosa Demo “No Trono Da Guerra” trazendo aos seus seguidores um Crucificator revigorado e com muita sede de sangue. Conte-nos como foi todo processo de composição deste material… e você acha que esse material é de fato um divisor de águas na carreira da banda?
Hategun – A “No Trono da Guerra” foi uma homenagem que fizemos à FEB*, na época muito criticada, até de nazistas nos titularam por conta da temática. Mais uma vez não foi uma demo muito divulgada, foram 100 cópias, e não foi uma gravação tão boa, ainda assim assinalou com certeza um novo rumo musical à banda.
Também notei uma mudança radical na formação que conheci em Salvador na época, você deixou os vocais a cargo do meu amigo de longas datas, o Malignum. Como foi essa integração dele ao line-up? E você se sentiu mais à vontade deixando os vocais para se dedicar por completo a guitarra?
Hategun – A verdade é que meu vocal é uma merda!! O Malignum foi uma aquisição fundamental em nossa linha de combate, um guerreiro com senso de liderança e com os mesmos princípios adotadas pelo nosso clã. Me livrando dos vocais com certeza me senti bem mais à vontade na guitarra!
Como foi a saída dos antigos membros? Tudo aconteceu de forma amigável?
Hategun – Uma vez Crucificator, Crucificator até à morte! São todos irmãos e nos ajudam até hoje! Esta é a diferença de tocar em família.
Em 2016 eu já estabelecido em São Paulo por anos, fiz uma visita a Hammer Of Damnation na cidade Santo André me deparei com o debut “Sunrise In The Suicide Front” que me deixou muito impressionado pela qualidade técnica e pelo ótimo álbum produzido por vocês. Como surgiu essa parceria com a Hammer Of Damnation para o lançamento deste grande material?
Hategun – Tudo partiu da indicação de dois grandes amigos de São Paulo, a Faby Cannibal e o Luciano. Já estávamos gravando, mas não tínhamos um selo para distribuição, foi quando entrei em contato com o Luiz da HOD que nos abraçou. O cara fez um trampo foda, mesmo numa fase corrida da HOD, um ótimo profissional.
Neste álbum você escreveu todas letras, quais as principais inspirações para escrever estas letras tão caóticas e brutais?
Hategun– Neste álbum tem alguns sons bem antigos que resolvemos lançar, as letras versam o caos da guerra em todos os seus sentidos.
Neste material vi que meu xará, Eden Hangman fez um trabalho excepcional assumindo o baixo neste disco, pois conseguimos ouvir de forma clara sua ótima execução assim como todos os membros da banda executaram com extrema competência suas funções. A banda hoje não conta mais com o Eden, o que houve para que ele depois de tantos anos não estivesse mais na banda?
Hategun – O Eden além de componente é meu primo, começou no CRUCIFICATOR com 16 anos numa fase em que para ser headbanger em Salvador, tinha de ter culhão e sangue no olho (vc lembra né!?!). O afastamento dele foi por conta de trabalho, ele além de professor , é também treinador de artes marciais (Muay Thai), a rotina de trampo dele o impossibilitou de nos acompanhar, as palestras por todo o País, aulas, acompanhamento de atletas, enfim… ainda assim ele ainda é um CRUCIFICATOR, opinando e participando de nossas reuniões quando possível.
A banda hoje conta com um novo baixista? Nos apresente este novo combatente…
Hategun – É o grande Lord Stabber! Um velho amigo que já nos acompanha a um tempo e acrescentou demais à nossa família! Um cara fechado e meio sisudo, mas um homem de honra e palavra, requisitos imprescindíveis para nós. Quanto ao lado musical?!? Aguardem e verão!!! kkkkkkkkkkkkkk….
Para divulgação deste primeiro álbum vocês fizeram muitos shows?
Hategun – Fizemos o show de lançamento aqui e mais um, desde então não surgiram propostas.
Atualmente a banda está trabalhando em um novo artefato, essa obra já tem nome para nos revelar?
Hategun – Sim, estamos em fase de composição do novo álbum! Ainda não temos um título.
Desta vez vocês contarão com a parceria para seu lançamento o selo Voz Da Morte Records. Como está sendo essa nova parceria? A parceria com a HOD foi mesmo finalizada?
Hategun – Sim, o Kito é um cara foda e bastante competente! A Voz da Morte é um selo que volta suas atenções para uma época de ouro no verdadeiro underground, simplicidade e um profissionalismo acima da media nos chamou a atenção!
Não, de forma alguma! Temos um extremo respeito pelo Luiz e a grande Hammer of Damnation, a parceria continua, afinal estamos do mesmo lado da guerra!!!
O que podemos esperar do Crucificator para este novo material?
Hategun – Ódio.
Mudando um pouco de assunto, eu sempre faço uma pergunta a todos que entrevisto aqui. Farei a mesma pergunta para você: Como você enxerga a atual cena underground no Brasil e no Mundo?
Hategun – Não existe mais underground. O que existe é um cenário hoje em dia. Eu sou um cara velho que ainda conserva algumas ideias do meu tempo. As coisas realmente mudaram, e não me vejo inserido no atual contexto. Costumo falar que o metal tem de ter sentimento, que a essência não está no que você quer mostrar e sim no que te completa. É muito triste ver e admitir que aquilo que vivemos não existe mais, que hoje vale muito mais a aparência que a essência. Que a verdade e franqueza hoje em dia, são os pregos que irão te crucificar em meio a uma multidão de zumbis. Enfim, é uma pena.
Existe a possibilidade de o Crucificator vir ao sudeste para divulgação do próximo material?
Hategun – Sim irmão, claro! Se acontecerem os convites, estaremos lá espalhando a praga!!!
Meu amigo Alex Hategun saiba que é um imenso prazer realizar esta entrevista com você e poder conversar contigo depois de todos esses anos. Transmita as minhas congratulações ao meu velho amigo Malignum o qual tive o imenso prazer de conhecer, não só ele como toda família dele que sempre me receberam com muita estima. As últimas palavras desta entrevista são suas… um forte abraço e espero vê-los aqui em São Paulo em breve.
Hategun – Velho Eden a honra é toda minha em reencontrá-lo, agradecemos a oportunidade desse bate papo na grande Roadie Crew. Que possamos celebrar em muito breve os dias vividos e a honra do nosso inviolável estandarte, o metal!!!! STAY IN WAR!!!!!
Obs.: O Hategun menciona nesta entrevista por duas vezes a sigla FEB, ele se refere a Força Expedicionária Brasileira, força militar brasileira participante da Segunda Guerra Mundial.
Abaixo segue a lyric video da música Tales Of War, faixa pertencente ao seu primeiro álbum Sunrise In The Suicide Front: