Das bandas que transformaram a Escandinávia na região mais fértil do mundo para o black metal, o sueco Dark Funeral sempre foi uma das mais célebres. Fundada em Estocolmo em 1993 pelo guitarrista que se tornou mundialmente conhecido como “Lord Ahriman”, o Dark Funeral estreou oficialmente no ano seguinte com o EP Dark Funeral, e desde então sofreu constantes transformações na formação, o que manteria apenas Ahriman da formação inicial até os dias de hoje. Com vocais que já pertenceram a nomes como Themgoroth (ex-Bloodshed e Infernal), Emperor Magus Caligula (ex-Hypocrisy) e Nachtgarm (Negator, King Fear), o Dark Funeral gravou seu mais novo álbum, Where Shadows Forever Reign (2016) com o excelente vocalista Heljarmadr (Domgård, Grá, Cursed 13). Foi para representar com violência sonora toda essa história e esse legado que Dark Funeral voltou ao Brasil em 2018, em um show imperdível em São Paulo.
Agendado para o Manifesto Bar, que tem se tornado casa cada vez mais frequente para os fãs de metal extremo (fãs de Vader, Suffocation, Nile, Belphegor e Marduk poderiam atestar a veracidade dessas palavras), o Dark Funeral veio com sua formação atual intacta, com as guitarras de Lord Ahriman e Chaq Mol, o baixo de Adra-Melek, bateria de Jalomaah e o citado vocalista Heljarmadr, que foi logo dando o seu cartão de visitas com Unchain My Soul, uma das mais célebres faixas do novo álbum. Sem demora ou qualquer tipo de enrolação, os suecos continuaram amaldiçoando os presentes com 666 Voices Inside, primeira de Attera Totus Sanctus (2005) da noite, e que foi recebida com muita empolgação pelos fãs que tomavam o recinto.
Embora ainda fosse cedo, a banda decidiu que era hora de atolar os fãs em clássicos do metal negro, e a sequência foi assassina: The Arrival Of Satan’s Empire (Diabolis Interium, 2001), Ravenna Strigoi Mortii (Vobiscum Satanas, 1998) e Atrum Regina (Attera Totus Sanctus, 2005) vieram em sequência, mostrando a potência dos vocais de Heljarmadr, e todo o leque de recursos do baterista, que parecia possesso atrás do seu kit. Pouco precisa ser falado sobre a presença silenciosa e discreta do líder, Lord Ahriman, sempre focado no seu instrumento, mas com um comando absurdo sobre a banda, o que garantia uma apresentação sem erros de execução.
Destacando o belíssimo trabalho das guitarras de Mol e Ahriman, o hino antigo The Secrets of the Black Arts (Idem, 1996) contrastou com o ritmo mais cadenciado de Goddess of Sodomy, outra das faixas de Diabolis Interium que resistiram ao teste do tempo e permanece no setlist regular de turnê do Dark Funeral. Após My Funeral (única nesta noite que vinha de Angelus Exuro Pro Eternus, 2009), um dos momentos mais esperados da apresentação: puxando o coro de vozes infernais, Heljarmadr anunciou a música que dá nome ao segundo ‘full-length’ dos suecos, Vobiscum Satanas, um dos maiores clássicos do gênero. Desnecessário dizer que o Manifesto fervia com almas malditas em êxtase, um espetáculo de fúria como poucos vistos antes em São Paulo.
Mas, dona de toda a história que abordamos na introdução deste artigo, o Dark Funeral ainda tinha boa lenha para queimar na fogueira de Satã. Para encerrar a apresentação, mais uma tríade com duas novas composições, e o maior clássico da carreira da banda, reverenciado pelo tempo e pelo mundo: Nail Them To The Cross e Where Shadows Forever Reign (do novo Where Shadows Forever Reign) foram entremeadas pela clássica Open The Gates (do EP de estreia, de 1994), que conta com uma das melhores letras de todo o black metal, e que foi berrada em uníssono por um Manifesto Bar quase que já reduzido ao pó.
Após mais de três décadas, de transformações gigantes no mundo e na forma como consumimos informação, o black metal continua como o gênero musical mais agressivo de que se tem notícia. Muito disso se deve a bandas como o Dark Funeral, que sempre primaram por transformar sua música numa fonte pura de ódio e temor, que se orgulha em se manter distante dos olhos do mainstream. Mais uma vez, nós tivemos a chance de conferir tudo isso ao vivo.