Ao chegar à sua sexta edição, o já tradicional Extreme Hate Fest veio com um ‘cast’ poderoso, realmente escolhido para manter este festival no pódio das melhores opções para quem é fã de metal extremo no Brasil. Mesclando atrações inéditas e muito esperadas com outras que são já tradicionalmente bem recebidas por aqui, o domingo (9 de dezembro) prometia grande agitação aos fãs de música pesada, que, como costumeiramente, também tinham outras opções espalhadas pela cidade.
Para começar a celebração extrema, duas atrações nacionais que vivem ‘momentos discográficos’ diferentes: Primeiro, o GUTTED SOULS, que conta ainda com apenas um único ‘full-length’, o poderoso The Illusion of Freedom. Mostrando uma sonoridade firmemente calcada ao chamado death metal old-school, os cariocas detonaram em uma apresentação curta e maldita, um belo aquecimento para a maratona que viria em seguida.
O NERVOCHAOS, segunda e última atração nacional do dia, tem uma discografia sólida e extensa, cuja peça mais recente, o álbum completo Nyctophilia, foi lançado em 2017. Já sem a saudosa baixista Cherry Taketani (falecida em dezembro do ano passado), o Nervochaos conta novamente com uma formação diferente, mas ainda é a poderosa e destrutiva banda de outrora. Sempre liderada pelo baterista Edu Lane, esta entidade extrema nacional mais uma vez fez uma ótima apresentação, destacou o valor de sua nova formação, e desfilou músicas que transitam entre todos os caminhos musicais extremos, algo já tradicional em seus sete álbuns completos de estúdio.
Quase que exercendo uma espécie de ‘justiça poética’, coube ao lendário MASTER iniciar a jornada internacional desta edição do festival. Assim, uma das bandas pioneiras do death metal subiu aos palcos para reafirmar seu legado de mais de trinta anos de trajetória, hoje representado pelo trio Zdeněk Pradlovský (bateria), Alex “93” Nejezchleba (guitarra) e o icônico ‘frontman’ Paul Speckmann (baixo e voz). Com um novo álbum, Vindictive Miscreant, lançado no fim de novembro, seria até natural que o grupo fizesse uma apresentação protocolar e focada em seu álbum mais recente, mas não foi isso o que vimos. Clássicos eternos do gênero, como Master, Terrorizer, Pledge of Allegiance, Collection of Souls, Unknown Soldier e Subdue the Politician caíram como uma enorme ceifadeira sobre o público, que também soube louvar o novo trabalho, muito bem representado com The Inner Strength of the Demon e a faixa-título, Vindictive Miscreant.
Se o Master foi o representante do death metal old school dos Estados Unidos, o ABYSMAL DAWN era o representante da nova geração de bandas norte-americanas, e chegou para acrescentar uma dose extra de técnica e perícia musical a esta edição do nosso festival favorito. Com quatro álbuns completos na bagagem (o mais recente deles, Obsolescence, saiu em 2014), eles apresentam um som extremamente denso e rápido, uma mistura do tecnicismo de bandas como Origin e Obscura com a brutalidade de Suffocation e seus pares, algo que caiu muito bem naquele início de noite de domingo. Evidenciando os álbuns Obsolescence e Leveling the Plane of Existence (2011), o quarteto apresentou momentos fulminantes em Perfecting Slavery, Inanimate, Human Obsolescence, Rapture Renowned e principalmente na antiga Servants to Their Knees, faixa do debut From Ashes, de 2006.
Com seu álbum mais recente, Dance and Laugh Amongst the Rotten, lançado em 2017, o CARACH ANGREN era a próxima atração, e logo de cara mostrou que tinha arrastado um bom público até o Carioca Club. Comumente considerados como uma banda de symphonic black metal, os holandeses oferecem um dos melhores espetáculos visuais do metal extremo na atualidade, e, principalmente neste quesito, não decepcionou quem esteve no festival para acompanhar o grupo. Blood Queen, Charlie, In de Naam van de Duivel, e Pitch Black Box, do novo álbum, se fizeram ouvir ao lado de alguns velhos clássicos, como Spectral Infantry Battalions e The Funerary Dirge of a Violinist, ambas de Where the Corpses Sink Forever (2012), e que contaram com excelentes performances do vocalista Seregor, e do tecladista, Ardek. Pena mesmo, apenas a inclusão de uma única música de Death Came Through a Phantom Ship (2010), álbum que apresentou o Carach Angren para boa parte de seus fãs.
Era então chegado o momento mais esperado, e digamos que um momento esperado a quase trinta anos. Finalmente o UNLEASHED, nome primordial da lendária cena ‘noventista’ do death metal sueco estrearia em solo nacional, uma honra que todos tivemos a chance de acompanhar. Para começar, basta dizer que o clima se tornou outro tão logo o horário para o início da apresentação se aproximou. Um volume bem maior de pessoas começou a se aglomerar por todos os lados do clube, e via-se muitas faces marcadas por sorrisos, uma visão que teríamos repetida a cada nova música que ia sendo apresentada ao longo da noite. Dito isto, Anders Schultz (bateria), Fredrik Folkare (guitarra), Tomas Olsson (guitarra) e Johnny Hedlund (baixo e voz) chegaram detonando com um clássico recente, Blood Of Lies (Midvinterblot, 2006), o que bastou para incendiar as rodinhas que iam se formando na pista.
Para os muitos que esperavam pelas músicas ancestrais, a espera foi de quase trinta anos, mas, pelo menos nesta noite, não haveria de ser longa: Dead Forever tratou de colocar o debut Where No Life Dwells (1991) no jogo, e agora as rodas ferviam em fúria, um deleite para os olhos e para os ouvidos. Muito simpáticos, os músicos não paravam de acenar para o público, e, aparentando muita satisfação, Johnny afirmou: “esta é a primeira vez do Unleashed aqui, mas, tenham certeza, não será a última”. Don’t Want To Be Born (Hell’s Unleashed, 2002) e a nova Lead Us Into War, faixa de abertura do recém-lançado The Hunt For White Christ vieram na sequência, e é desnecessário comentar o quão bem a nova composição foi recebida por aqui.
Alternando entre momentos de toda a sua gloriosa jornada, os guerreiros suecos conquistaram um louvor muito além daquele que poderíamos esperar com faixas como I Have Sworn Allegiance (Midvinterblot, 2006), They Came To Die (Dawn of the Nine, 2015) ou Black Horizon (Hammer Battalion, 2008), que não costumam aparecer na lista das ’20 mais’ dos fãs. Mas, você sabe, foi com clássicos eternos como The Longships Are Coming (Sworn Allegiance, 2004), Death Metal Victory (Warrior, 1997), Execute Them All (Across The Open Sea, 1993) e The Immortals (Shadows In The Deep, 1992) que eles transformaram este no melhor show do ano, sem comparação possível.
E, se até aqui você já está embasbacado, saiba que para encerrar, eles ainda vieram com aquela sequência que todo mundo esperava, mas ninguém acreditava que ouviria: Shadows In The Deep (faixa-título do segundo álbum, de 1992) e Before The Creation of Time (do debut, Where No Life Dwells, 1991), duas das canções que definiram não apenas o que o death metal é, mas tudo aquilo que ele poderia se tornar.
Com orgulho, saímos do Carioca Club com o coração transbordando de alegria, por finalmente termos visto os nossos grandes ídolos, mas também por percebermos que eles realmente são os guerreiros que sempre pensamos que eles eram. Nem uma brusca queda de energia que durou apenas um instante, nem algumas ocasionais microfonias, nada foi capaz de diminuir o brilho desta apresentação, onde todos puderam aproveitar e curtir. Que o Extreme Hate Fest volte, e ainda mais furioso em 2019. Que bom que existe um festival assim!