Não tinha como dar errado. Formado em 2015, o Venom Inc. trazia em sua bagagem os anos de história que Tony “Demolition Man” Dolan (vocal e baixo), Mantas (guitarra) e Abaddon (bateria) tinham construído com o Venom, e que durara três álbuns, Prime Evil (1989), Temples of Ice (1991) e The Waste Lands (1992). Porém, diferentemente do que aconteceu com o Venom no final da década de 80 e início da década de 90, essa nova união do trio acabou não sendo tão frutífera, e logo após lançarem o seu primeiro álbum, o ótimo Avé (2017), o baterista acabou deixando o posto vago. Com o posto de baterista ocupado pelo experiente Jeramie Kling (alguém aí é fã de The Absence?), era hora do grupo apresentar a nova formação para os brasileiros, e foi justamente isso que fomos conferir no primeiro dia de fevereiro, em São Paulo.
Sem nos fazer esperar muito, foi justamente Kling quem puxou a fila e trouxe o Venom Inc. para o palco, sob ainda tímida ovação dos fãs. Claro que isso mudou radicalmente com a entrada de Tony e Mantas, que foram saudados como heróis por um público que sabia de cor cada verso de cada um dos antigos clássicos do Venom, e que estava ansioso para conferir mais uma vez a força deles ao vivo. Para começar, uma música de Avé, muito bem recebida: Metal We Bleed. Certo, com um título como esse, como essa canção poderia ser mal recebida por um público fanático por metal, que estava cantando até as faixas que rolavam no som mecânico antes do show?
Mas, para mostrar que não estavam para brincadeira, que tal logo de cara tocar um clássico primordial, algo como Die Hard? Pois foi exatamente isso que veio em seguida, e foi ótimo perceber que Mantas mantém a sua velha postura ao executar os riffs, certas coisas o tempo nunca consegue apagar. Com um Jeramie Kling cada vez mais roubando a cena (sério, quanta energia esse cara tem?), outro clássico mastodôntico do metal, Welcome To Hell, faixa que deu nome ao álbum que apresentou o Venom ao mundo em 1981. Sim, o baixo de Tony Dolan estava apresentando alguns problemas técnicos, mas ninguém estava em clima para reclamar. Melhor ainda ver que o problema foi rapidamente sanado, e o show pode continuar em toda a sua fúria.
Live like an Angel (Die like a Devil) deu sequência à tempestade de 1981, enquanto Blackened Are The Priests foi a primeira de Prime Evil (1989), primeiro disco de Dolan no posto de vocalista e baixista do Venom. Seguindo essa mesma pegada, outras duas músicas daquele álbum vieram na sequência, Carnivorous e Parasite. Para aqueles que tem alguma dúvida quanto ao talento de Tony Dolan, vale destacar sua boa performance ao vivo, além da grande simpatia que ele demonstra a todo momento para o seu público. Aliás, simpatia é exatamente o que emanava de Kling e Mantas, esse último, aproveitou para falar algumas palavras em português com os fãs enquanto a equipe trabalhava para sanar os problemas no baixo de Dolan. “Vocês devem ter visto em sites ou revistas, eu morri no ano passado”, Mantas declarou em inglês, referindo-se ao ataque cardíaco que quase lhe tirou a vida em 30 de abril do ano passado. “Agora, eu tenho essa bela cicatriz no peito”, disse ele, apontando para o local da cirurgia, aos risos.
Como que para celebrar o triunfo na maior das batalhas, a próxima da noite foi Warhead, que Tony Dolan dedicou para alguns dos célebres governantes da atualidade, que parecem não estar poupando esforços para colocar o mundo em um novo confronto armado. O ritmo pungente, arrastado do início quase esmagava o público no chão sob o peso do riff, um espetáculo digno da banda que iniciou o caminho para tudo o que existe de extremo na música pesada. Don’t Burn The Witch, clássico de Black Metal (1982) veio na sequência, arrancando gritos eufóricos dos presentes.
Outro momento de destaque nessa apresentação foi a inclusão de Temples of Ice, faixa-título do segundo disco do Venom com Tony Dolan (1991), um disco que talvez nunca tenha recebido o devido valor, mas que agradou muito os fãs mais dedicados. Com muitos cantando junto e cópias em CD sendo erguidas em direção ao palco, Temples of Ice acabou se transformando em um dos momentos mais icônicos da noite. Mas, claro, é praticamente impossível competir com a euforia causada pelo clássico Black Metal. Banda, fãs, todos literalmente ‘entregaram suas almas para os deuses do rock n’ roll’, e, para muitos, o show poderia ter terminado ali.
Felizmente, este não foi o caso, embora o momento se aproximasse. Após uma performance incrível de Witching Hour, a banda abandonou o palco por um breve momento, apenas para voltar para o esperado ‘bis’. Muito animado – Tony Dolan, que agora tem São Paulo tatuado no seu braço esquerdo – não parava de saudar o público, o que de fato só fez quando a banda já estava iniciando os primeiros versos de Bloodlust. Para encerrar, uma dobradinha clássica, que restará eternamente na nossa memória: In League With Satan e Countess Bathory. Restou no fim a impressão de uma banda afiada e firme, que valoriza seus fãs, e que de fato sabe promover um ótimo show. Que Kling, Dolan e Mantas não demorem para voltar. Eles sabem que aqui sempre serão muito bem recebidos.