O local: Centro Cultural São Paulo.
A data e a hora: 8 de novembro (domingo), 6 da tarde.
A frase: “Essas festas que o Oswaldo organiza são um perigo… Se um funkeiro ou pagodeiro descobrem, podem jogar uma bomba e acabar com o Rock de São Paulo…”
O autor da frase: Paulão de Carvalho, vocalista e líder do Velhas Virgens.
E a despeito de Paulão ser um daqueles que perde o amigo, mas jamais a piada, ele não estava errado. Afinal, estava todo mundo ali para comemorar os 48 anos de atividades ininterruptas do Made In Brazil – e quando eu digo “todo mundo”, era todo mundo mesmo. Só de convidados, contando ex-integrantes da banda e artistas consagrados do Rock brasileiro, a lista se aproximava de quarenta nomes – gente como Simbas (Casa das Máquinas, Tutti Frutti), Sérgio Hinds (O Terço), Rolando Castello Júnior (Patrulha do Espaço), Clemente (Inocentes, Plebe Rude), Marcello Pompeu (Korzus), o próprio Paulão de Carvalho, Tony Babalu, Theo Werneck, Ivan Busic (Dr. Sin), Johnny Boy, Franklin Paolillo, Bosco (Alta Tensão, O Bando do Velho Jack), Kim Kehl (Os Kurandeiros), Serguei, que completava 82 anos exatamente no dia do show, e muitas das backing vocals que passaram pela banda, como Ana Ares, Marcia Munhoz, Tibet, Renata Martinelli, Paula Motta e Criss Rego. Na plateia, também circulavam vários nomes conhecidos, como Paulão Thomaz (Kamboja), Deca (Baranga), Paulão Levy (Boca Roxa Blues Band) e muitos outros. Resumindo, estava todo mundo lá mesmo.
E num ambiente assim, com a plateia do Centro Cultural absolutamente lotada por fãs ensandecidos e num palco que contava com duas baterias e nada menos que nove amplificadores de guitarra, após uma breve apresentação do cartunista Marcio Baraldi, a festa começou com Uma Banda Made In Brazil, contando com Johnny Boy e o guitarrista Caio Durazzo, um dos muitos ex-Made que foram comemorar com a banda. O som alto e cristalino somado à empolgação da plateia, que cantava e se esbaldasse como se não houvesse amanhã (e olhe que o “amanhã” era uma segunda-feira!), fazia o clima de festa ficar mais evidente a cada música.
Assim, o que se viu a partir de então foi um desfile de hits do Made, músicas que quem acompanha o Rock brasileiro dos primórdios conhece (ou devia conhecer) de cor. Gasolina (homenagem a Chuck Berry, uma das grandes influências de Oswaldo e Celso Vecchione, mentores e motores do Made In Brazil), o hino à capital paulista Pauliceia Desvairada (com Ivan Busic na segunda bateria) e Rock de Verdade vieram na sequência, mostrando que os irmãos Vecchione, Guilherme “Ziggy” Mendonça (guitarra), Rick Vecchione (bateria, filho de Oswaldo), Octávio “Bangla” (sax) e Ivani Venâncio (backing vocals), a formação atual da banda, são um time pra lá de competente e entrosado.
A mais que clássica Vou Te Virar de Ponta Cabeça, gravada originalmente pelo saudoso Percy Weiss, teve presença de Paulão de Carvalho, Tony Babalu (guitarra) e Franklin Paolillo (bateria), enquanto que Rock de São Paulo recebeu Nelson Pavão, um dos primeiros bateras do Made.
Theo Werneck assumiu o lap steel em Todo Dia Rola Um Blues e na inspirada Os Bons Tempos Voltaram, uma das mais belas baladas criadas por Oswaldo. Depois do boogie Tô À Toa, com Bosco na batera e Kim Kehl na guitarra, era hora de tacar gasolina no incêndio. E isso aconteceu quando Marcello Pompeu foi chamado para cantar Menina Pare de Gritar, tema do primeiro disco da banda e que tinha o também saudoso Cornelius Lúcifer nos vocais. Marcelo não se limitou a cantar esse que é um dos temas mais pesados do repertório da banda, mas instigou a galera e mandou uns “motherfuckers!!” de brinde. Pra manter o astral lá em cima, o performático Simbas assumiu o microfone em Aquarela do Brasil (versão rockeira do clássico de Ary Barroso) e Anjo da Guarda, mais dois temas do primeiro disco. O vocalista mostrou que continua com o mesmo pique dos tempos do Casa das Máquinas e andou por todo o palco, foi pra perto da galera, subiu nos amplificadores – o pacote completo, enfim. As duas músicas contaram ainda com a participação Rolando Castello Júnior, o baterista que gravou ambas com a banda em 1974.
O maior sucesso do Made In Brazil, Jack O Estripador, veio a seguir com a marcante presença de Sérgio Hinds na guitarra. E então era chegada a hora de entrar em cena Serguei, o convidado de honra da festa. Engatou um A Whiter Shade Of Pale (Procol Harum) acompanhado apenas por Johnny Boy, mas logo a música virou Minha Vida É Rock’n’Roll, com todos os convidados em cena. Virou uma festa e logo virou zona, já que o show acabava ali e como banda e convidados não arredaram pé do palco todo mundo acabou subindo lá pra falar com os caras, abraçar, cumprimentar e tirar fotos – mas não vi ninguém com “pau de selfie”, com a graça do bom deus… Pra completar, dois bolos apareceram no palco, um para Serguei e outro para o Made, os grandes aniversariantes do dia.
E como se termina um relato como esse? Dizendo que foi uma justa celebração a uma banda que já foi “promovida” a instituição do Rock nacional? Pode ser. Ou falando do quanto é merecida essa comemoração, já que ficar na ativa por inacreditáveis 48 anos fazendo Rock e Blues no país do axé, do funk porco e do sertanejo é uma verdadeira proeza? Pode ser, também… Mas acho que o principal é lembrar que, além de toda festa, nenhum funkeiro ou pagodeiro resolveu cometer um atentado por lá. Porque, também de acordo com Paulão, eles não teriam o alcance intelectual para entender o que acabara de acontecer no Centro Cultural São Paulo. E isso é uma verdade incontestável.