Como alguns amigos daqui de São Paulo e eu costumamos brincar: ‘Richie Kotzen já deve ter casa na Lapa!’. Nossa ‘piadoca’ não é pelo fato dele ser casado com uma brasileira, mas sim por estar sempre vindo ao Brasil. Contando a sua recente passagem em novembro passado, já são onze vezes que o guitarrista do The Winery Dogs, ex-Poison, Mr. Big e Forty Deuce nos visita como artista solo. Junto dos competentes Dylan Wilson (baixo) e Mike Bennett (bateria), que há muitos anos o acompanha, dessa vez Kotzen passou por Campinas (SP), São Paulo, Florianópolis (SC), Brasília (DF) e Goiânia (GO), respectivamente. Em São Paulo, o trio novamente se apresentou no Carioca Club, mesmo local em que tocou na vez anterior, em 2017, quando teve o The Dead Daisies como banda de abertura.
Se o show de 2017, pela “Salting Earth World Tour”, foi um tanto quanto cansativo, devido ao excesso de baladas, dessa vez Richie Kotzen fez uma apresentação bastante empolgante para seus fãs que, leais como de costume, compareceram em ótimo número para prestigiar sua música, composta sob nítidas referências de hard rock, blues, pop e soul. Desde a abertura com Riot, single lançado em 2018, os três músicos foram favorecidos por uma ótima qualidade de som. Em Bad Situation, que veio após a também ‘soft’ War Paint, rolou um ‘breakdown’ em que Kotzen foi ovacionado. E vale ressaltar seu talento não só como guitarrista (que dispensa o uso de palheta), como também como cantor. Altamente influenciado pela música negra, Richie Kotzen é dono de uma voz de características e timbres que remetem à do saudoso Prince e de Sananda Maitreya (antes conhecido como Terence Trent D’Arby).
Em Love is Blind foi a vez de Wilson e Bennett brilharem e serem aplaudidos, pelos solos que fizeram no decorrer da música, sem pausas para os mesmos. Duas das mais aguardadas pelos fãs vieram em sequência, a bela Doin’ What the Devil Says to Do (uma de minhas favoritas de Richie Kotzen) e a viciante High, que começou com a plateia cantando em uníssono. Pena que um ruído irritante surgiu no decorrer dela e se prolongou até o final da música seguinte, Peace Sign. O que aconteceu foi um problema em uma das caixas laterais do palco. Enquanto a falha técnica acontecia, teve pessoas que se dirigiram ao técnico de som para reclamar.
Antes do show prosseguir, Kotzen avisou que Mike Bennett estava fazendo aniversário, então todos cantaram o tradicional “Happy Birthday” para o baterista. O guitarrista deixou o palco e Bennett deu início a um solo de bateria, que logo ganhou o acompanhamento de Wilson. Richie Kotzen retornou com um bolo de aniversário em mãos e depois se juntou aos seus companheiros para uma breve sessão de jazz, antes de emendar com Fear, que foi ‘recheada’ de improvisações, além de um longo solo de guitarra, em que Kotzen esbanjou feeling. A primeira parte do show se encerrou com a bela Remember, na qual o público proporcionou um momento muito bonito após Kotzen solar na parte mais baixa do palco: sob a levada de Bennett, os fãs cantaram em alto e bom som o final da música, sendo regidos e acompanhados pelo guitarrista. Emocionado, Kotzen agradeceu e se despediu.
Três minutos depois, a banda estava de volta, tocando a grooveada Venom, em que Kotzen deu uma verdadeira aula de interpretação vocal. Para surpresa geral, a próxima foi uma que há muito tempo não era tocada em São Paulo. Falo de Stand, maior hit de Native Tongue (1993), que foi o único, porém marcante álbum que Richie Kotzen gravou quando esteve no Poison. Algo curioso na execução dessa música, que, como de praxe, foi cantada com os devidos retoques na letra em relação à versão original, é que somente nela Kotzen abriu mão de sua guitarra Fender modelo Stratocaster, para tocar com uma Telecaster, justamente a mesma que ele usava no Poison. Foi uma sacada muito legal para quem acompanhou a passagem de Kotzen pela banda de Bret Michaels, Rikki Rockett e Bobby Dall.
Para encerrar a noite, Help Me foi a escolhida. Uma pausa no meio dela para Richie Kotzen se hidratar foi a deixa para que Bennett e Wilson fizessem todo mundo cair no funk, remetendo aos tempos da Motown. Assim que Kotzen terminou de beber sua água, entrou no embalo dos dois. Ao final do show, Richie os apresentou ao público, se apresentou (como se precisasse!) e então o trio se despediu, sem a tradicional foto com o público ao fundo.
Foi um show incontestável, com clima em alto astral e um Richie Kotzen mais bem humorado do que em algumas outras ocasiões. À lamentar, apenas a ausência de You Can’t Save Me e da ótima e dançante Mother’s Head Family Reunion, de seu aclamado e homônimo quarto álbum. Quem sabe ele as toque em sua próxima visita ao Brasil? Porque sim, Richie Kotzen sempre volta.