Uma história repleta de reviravoltas, separações, discos e apresentações memoráveis. Assim, resumidamente foi o ciclo da banda Shaman, que no ano de 2018, realizou o sonho de muitos fãs, anunciando a sua reunião com sua formação original, que proporcionou aos brasileiros a oportunidade de conferir como os álbuns Ritual (2002) e Reason (2005) continuam fortes nos corações dos fãs. Uma celebração que foi interrompida em junho de 2019, quando fomos pegos com a ida repentina do vocalista André Matos para outro plano, o que gerou além do luto, uma tremenda interrogação na cabeça dos fãs.
Incerteza que acabou gerando um novo recomeço ao grupo, que agora conta com o vocalista Alírio Netto (Queen Extravaganza, Lince e Khallice) ao lado de Hugo Mariutti (guitarra), Luis Mariutti (baixo) e Ricardo Confessori (bateria). O início de um novo capítulo em sua história, com a Nagual Fly Tour, cujo pontapé inicial teve início na noite chuvosa de 9 de fevereiro, na Áudio Club. Localizada na região da Barra Funda, contou com um ótimo número de presentes, mostrando a expectativa de todos em relação ao grupo. E, após o credenciamento da imprensa, a impressão foi das melhores, rolando os sons do grupo no som mecânico, o que animou a todos.
O evento contou com a abertura da banda paulista Sioux 66, que entrou ao palco às 19h40. Esbanjando maturidade, Igor Godói (vocal), Bento Mello (guitarra), Yohan Kisser (guitarra), Fabio Bonnies (baixo) e Gabriel Haddad (bateria), demonstraram personalidade, mesmo com um som que pouco ou nada tem a ver com o da banda principal da noite. Mas isso não foi problema, pois foram bem recebidos pelos presentes. A mescla de hard rock com vocais mais ‘swingados’ do quinteto mostrou-se funcional, cujos pontos altos ficaram por conta da energética Paralisia, Aqui Estamos, ambas do mais recente trabalho de estúdio dos caras, o excelente MMXIX, lançado no ano passado. O set de quarenta minutos ainda contou com versões com a cara do grupo para Bark At the Moon (Ozzy Osbourne) e Diversão (Titãs), e Caos, do álbum homônimo de 2016. Só não foi melhor por causa do som seco e que sumia em alguns instantes.
Após o show da Sioux, as cortinas se fecharam e quem mandou as cartas foi o som mecânico, que contou com Kiss, Ozzy e Motorhead, o que empolgou a galera, mas que em seguida gerou momentos de tédio com um longo interlúdio de teclado. Às 21h, Junior Carelli (Anie, ex-Noturnall) sobe ao palco explicando que o show seria gravado e pediu encarecidamente que não filmassem na primeira música.
Recado dado e o grande momento da noite teve início às 21h05 com a banda entrando no palco um a um, Ricardo, Luis, Hugo, o tecladista e quinto membro Fabio Ribeiro e Alírio, que já entraram ovacionados e mostrando a que vieram com Turn Away, do Reason. Apesar do som muito ruim, notou-se músicos com a faca nos dentes e vontade de fazer acontecer, em especial Alírio Netto, que cantou com maestria, apesar das sutis diferenças de sua voz (timbre mais limpo e aveludado) com a do saudoso André Matos. Banda aplaudida e aprovada, a festa continuou com Distant Thunder e a emocionante Reason, em que o cantor mostrou ser a escolha certa para continuar o legado do grupo.
Como disse nas primeiras linhas, é incrível a atemporalidade que os dois primeiros trabalhos do grupo possuem. Os climas andinos de For Tomorrow continuam hipnotizantes, envolventes e atuais. Era apenas o início da celebração. Time Will Come duas do Reason, More (cover do Sisters of Mercy, que transformou o espaço numa pista de dança) e a emocional Innocence foram daqueles momentos iluminados, que mostrava a felicidade de cada um que esteve presente na casa. Após esse momento digamos, divino, Alirio toma as palavras e explica ao público que a maneira mais honrosa de continuar o legado do Shaman (e do André Matos) é criar. Nesse momento é apresentado a inédita Brand New Me, que embora conecte o ouvinte ao álbum Ritual, mostra como a voz do cantor acrescentará muito ao grupo.
E tome mais músicas. Here I Am e Iron Soul foram outros grandes momentos, com mais uma vez a banda ovacionada. E após essa hecatombe musical, foi o momento do primeiro convidado da noite subir ao palco: o violinista/multinstrumentista Marcus Viana (Sagrado Coração da Terra), que participou do álbum Ritual e de cara mandaram Fairy Tale, que figurou na novela “O Beijo do Vampiro” (2002). Um momento de comoção aos fãs ocorreu quando Alírio trouxe um poster de André e roupas do maestro, numa bela homenagem a esse ícone do heavy metal nacional.
Ainda tinha tempo pra mais comoção. A banda deixa o palco e o vocalista e Marcus fazem um medley emocionante com Living for the Night (Viper), No Need to Have a Answer (Virgo) e The Show Must go On (Queen), conectando passado e presente e mantendo o nível do espetáculo. Após Ritual, a banda deixa momentaneamente o palco e no retorno mandam as saideiras Lisbon (Angra) e Pride, com Marcus no violino e Bruno Sutter dividindo os vocais, coroando essa bela noite de metal, mostrando que o grupo ainda pode produzir muita coisa boa. Uma noite quase perfeita, pois o som deixou a desejar em alguns momentos.
Ficamos na torcida que a história do Shaman dure muitos anos, dessa vez sem turbulências e tragédias, mas com músicas poderosas e álbuns definitivos. Nós fãs, agradeceremos com toda a certeza.