Por Leandro Nogueira Coppi
Fotos: Dani Moreira
Para o público paulistano, o dia 23 de setembro de 2023 foi como uma celebração ao heavy metal. Na mesma noite, São Paulo recebeu Manowar no Espaço Unimed (leia aqui), a cantora finlandesa Tarja Turunen no Tokio Marine Hall (leia aqui) e a dobradinha Narnia + Rob Rock, com a turnê chamada “Icons of Christian Metal”, no House of Legends. No caso desses dois grandes nomes do metal cristão, foi bom rever o Narnia pela segunda vez na capital, quatro anos após sua visita anterior abrindo para o Stryper, e conferir o “The Voice of Melodic Metal” Rob Rock finalmente fazer sua estreia na Terra da Garoa.
O veterano grupo goiano Sunroad estava escalado para fazer a abertura para Narnia e Rob Rock, porém um problema com a van que o trazia e que não daria tempo de consertar lhe impossibilitou de vir para o show. Quanto as apresentações da banda sueca e do cantor americano, que na noite anterior tocaram em Belo Horizonte (MG), rolaram em um esquema bem dinâmico: não teve essa de um abrir para o outro, foi tudo junto e misturado em um set em que ora o Narnia tocava suas músicas, ora o vocalista Christian Liljegren deixava o palco e “emprestava” seus parceiros como banda de apoio para Rob Rock.
E a noite começou justamente com Rob Rock acompanhado dos outros quatro “Narnias”, CJ Grimmark (guitarra), Martin Härenstam (teclado), Jonatan Samuelsson (baixo) e o baterista contratado para essa turnê, Anders Köllerfors (bateria). A estreia de Rob em São Paulo já era para ter acontecido em setembro de 2016, pelo evento “Metal Voices”, junto com os colegas vocalistas Leather Leone e Tim “Ripper” Owens, porém por uma burocracia para conseguir o visto de trabalho para continuar no Brasil, já que no meio das datas marcadas no país havia uma mini turnê a ser feita no continente asiático, ele só conseguiu tocar no Rio de Janeiro. Conhecido principalmente como frontman do Impellitteri e como artista solo, mas também por seus trabalhos com Drive, Axel Rudi Pell, Joshua, com o supergrupo M.A.R.S. e outros, além de participações em muitos álbuns, entre eles de Avantasia, Edguy, Vivaldi Metal Project, Timo Tolkki’s Avalon e recentemente para Martin Simson’s Destroyer of Death, Rob Rock foi muito bem recebido pelo bom público que compareceu ao House of Legends.
Após a introdução In the Beginning no som ambiente, Rob entrou detonando com a acelerada The Sun Will Rise Again, música de seu primeiro álbum solo, Rage of Creation, lançado no ano de 2000 e que contou com a participação do lendário guitarrista Jake E. Lee (Ozzy Osbourne, Badlands, Ratt, Rough Cutt, Red Dragon Cartel). Apesar de essa ser um heavy/power metal que exige bastante de sua voz, o “The Voice of Melodic Metal” mostrou ao público que seu talento vocal não foi afetado pelos problemas pulmonares que enfrentou quando acometido pela COVID-19. E ele brilhou também na trinca sequente, formada por outras músicas de seu próprio catálogo, sendo elas First Winds of the End of Time, de Holy Hell (2005), Savior’s Call, de seu trabalho solo mais “recente”, Garden of Chaos (2007), e Judgement Day, outra do debut. Não é à toa que em 2023 Rob Rock foi aceito no Metal Hall of Fame.
Depois desse início arrebatador, Rob foi descansar um pouco a garganta e cedeu o palco para Christian Liljegren se juntar aos seus parceiros e assumir o microfone. Automaticamente, o público começou a fazer o famoso “olê, olê, olê, olá”, completando com “Narnia, Narnia”. E foi nesse clima festivo que o Narnia deu início ao seu repertório, começando pela pesada Crack in the Sky, de seu penúltimo álbum, From Darkness to Light, de 2019. Antes da próxima, Christian comemorou o fato de seu grupo estar de volta ao Brasil e disse que a turnê pela América Latina estava sendo ótima. Aliás, a relação da banda com o público latino é bem estreita, tanto que recentemente foi lançado, via En Hakkore Records – produtora responsável pela turnê – um tributo latino-americano ao Narnia, intitulado Show All the World – A Latin American Tribute to Narnia, que inclui bandas do Brasil, México, Chile, Argentina e Peru.
Prosseguindo, Christian perguntou aos fãs se São Paulo estava pronta para detonar junto com o Narnia e afirmou que sua banda, assim como Rob Rock, junto ao público, iriam agitar a noite. O cantor também ressaltou que ele e seus amigos estavam felizes por compartilharem o amor e a paixão de Jesus Cristo. Aproveitando o ensejo, ele apresentou os demais membros da banda e saudou Anders Köllerfors, explicando à plateia que o baterista oficial do grupo, Andreas Johansson, não pôde acompanhá-los nesta turnê.
Apesar de a banda navegar por um metal melódico com influências neoclássicas (muitas vezes lembrando bastante a sonoridade do guitarrista e compatriota sueco Yngwie Malmsteen), na sequência atacou com um ‘hardão’ de refrão grudento, You Are the Air that I Breath, música que também faz parte do penúltimo álbum.
Na sequência, foi a vez de a banda apresentar algumas músicas de seu novo álbum, Ghost Town, então mandou logo uma trinca formada pelas pesadas Rebel e Thief e pela climática Descension. Não posso deixar de mencionar neste texto o talento do guitarrista CJ Grimmark, o Bruce Willis do metal cristão, pois sua aptidão para imprimir grandes riffs e solos, para balancear peso e melodia e também para a escolha de belos timbres, é qualquer coisa de assombrosa. Aliás, Grimmark, que além do Narnia colaborou com o próprio Rob Rock em alguns dos álbuns solo do cantor, merecia ser bem mais reconhecido, já que se trata de um dos grandes guitarristas e compositores do heavy metal contemporâneo.
Notar os timbres de Grimmark, assim como cada detalhe das músicas e das vozes executadas por Narnia e Rob Rock, foi nítido para quem presta atenção nesses aspectos, dada a soberba qualidade de som da casa. Falando ainda no House of Legends, a única questão é a estrutura pequena do palco, para qualquer banda em formato quinteto, por exemplo, ainda mais portando teclado, o jeito é se espremer ali. Apesar disso, a experiência de 27 anos de carreira fez como que os músicos do Narnia tirassem o aperto de letra, sempre em alto astral e demonstrando simpatia distribuindo sorrisos.
Prosseguindo, era hora de nova substituição “vocalística”, então Christian pediu ao público que gritasse por Rob Rock, que retornou cantando a veloz Rock the Earth, faixa de seu segundo álbum solo, Eyes of Eternity, lançado há exatos 20 anos. Ao final, o cantor disse que São Paulo parecia bem naquela noite, perguntou aos fãs se eles realmente estavam se sentindo bem e afirmou que estava sendo ótimo estar na cidade. Aí foi a vez de um presente para o público paulistano, outra do mesmo álbum, a contagiante Fields of Fire, que não havia sido inclusa em outros shows da turnê.
Na sequência, a bela balada In the Night, do mencionado debut Rage of Creation, proporcionou um momento de calmaria, antes de Rob voltar a inflamar o público com dois covers da banda principal pela qual ficou conhecido, o Impellitteri, do guitarrista Chris Impellitteri. Primeiro veio a pesadíssima Father Forgive Them, do álbum Screaming Symphony, de 1996, e depois I’m A Warrior, de Answer to the Master (particularmente, meu álbum favorito da carreira de Rob Rock), de 1994, e que foi regravada pelo cantor em seu 3° álbum solo, Holy Hell (2005). E por falar em Impellitteri, em recente entrevista para a ROADIE CREW (leia aqui), Rob Rock confirmou que os oito primeiros álbuns da banda serão, enfim, lançados no Brasil. Ele disse ainda que assim que retornasse da atual turnê com o Narnia, iria começar a gravar os vocais do novo álbum do Impellitteri, sucessor de The Nature of the Beast (2018).
Antes de deixar o palco mais uma vez, Rob brincou com o calor absurdo que fazia em São Paulo naquela noite e viu seu nome ser gritado em uníssono pelos fãs. Emocionado, ele pediu a todos que fizesse o mesmo por Christian Liljegren e pelo “poderoso Narnia”. O pedido foi correspondido, principalmente quando o público viu Christian ressurgir no palco vestindo uma camisa da Seleção Brasileira de Futebol. Com esse clima literalmente mais acalorado, Christian e seus asseclas mandaram The Lost Son, do segundo álbum, Long Live the King, lançado no distante ano de 1998. Depois dessa, a banda foi mais longe ainda em seu passado e revisitou seu álbum de estreia, Awakening (1997), com No More Shadows from the Past. O quinto álbum de estúdio do Narnia, Enter the Gate (2006), também foi lembrado com uma que remete aos patrícios suecos do Europe, Into this Game, que foi cantada e aplaudida pelo público durante a execução. Uma das mais comemoradas da noite, foi a música que dá nome ao citado Long Live the King. Essa é hino ao vivo!
Como desde sempre é hábito em shows de várias bandas cristãs ao redor do mundo, há momentos de discursos e reflexões sobre a fé, propostos pelos músicos em questão, e antes da próxima, Christian discursou. Ele ressaltou que há 27 anos ele e o Narnia estão em uma missão, espalhando pelo mundo o rock and roll de Jesus Cristo. Falou também que vivemos em um mundo com muitas turbulências, as quais assolam o povo de países como, por exemplo, Suécia, Estados Unidos, Rússia e do próprio Brasil, e passou sua visão de que nenhum presidente, rei ou político tem o poder de administrar tais problemas (em minha opinião, muitos desses problemas são sempre causados justamente por essa corja citada), apenas Jesus. E assim, Christian anunciou The War That Tore the Land, a última de From Darkness to Light, e convidou Rob Rock para cantar com ele. E aqui cabe uma reclamaçãozinha… Na citada entrevista à ROADIE CREW, Rob Rock prometeu cantar com Liljegren a música Eagle, de Rage of Creation, porém não rolou. Como dizem, “nunca prometa o que não irá cumprir!”.
O evento já caminhava para o final, mas ainda havia tempo para mais do Narnia. Então, a banda recordou seu homônimo álbum, lançado em 2016, com I Still Believe, e se retirou do palco. Mas é claro que rolaria um bis, e ele veio com Living Water, de Long Live the King, com o Narnia novamente acompanhado de Rob Rock. Que noite, caro leitor! Como dito no início, o dia 23 de setembro foi um prato cheio para o paulistano fã de heavy metal. E quem, assim como eu, optou por marcar presença no evento promovido por Narnia e Rob Rock, certamente se divertiu e saiu feliz em rever o quinteto sueco que deixou boa impressão quando estreou em 2019 na cidade abrindo para os colegas cristãos do Stryper, e por finalmente conhecer de perto Rob Rock, que torço para retornar ao país com o Impellitteri, que, inexplicavelmente, até hoje ainda não deu o ar de sua graça em território tupiniquim. Cruze os dedos para que isso ainda aconteça! Ou reze…
Narnia e Rob Rock – setlist
- The Sun Will Rise Again (Rob Rock)
- First Winds of the End of Time (Rob Rock)
- Savior’s Call (Rob Rock)
- Judgement Day (Rob Rock)
- Crack in the Sky (Narnia)
- You Are the Air That I Breath (Narnia)
- Rebel (Narnia)
- Thief (Narnia)
- Descension (Narnia)
- Rock the Earth (Rob Rock)
- Fields of Fire (Rob Rock)
- In the Night (Rob Rock)
- Father Forgive Them (Rob Rock)
- I’m A Warrior (Rob Rock)
- The Lost Son (Narnia)
- No More Shadows From the Past (Narnia)
- Into This Game (Narnia)
- Long Live the King (Narnia)
- The War That Tore the Land (Narnia com Rob Rock)
- I Still Believe (Narnia)
- Living Water (Narnia com Rob Rock)