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O INIMIGO – Contrariando o Conformismo

“Nossa postura vai bem ao contrário do pensamento tradicional brasileiro, que acabou de ganhar a última eleição”. Essas são as palavras iniciais do guitarrista Juninho Sangiorgio no release que explica o teor político e o título de Contrariedade, novo álbum d’O Inimigo, veterano grupo paulistano completado por Fernando Sanches (guitarra – também baixista do CPM22), Alexandre Cacciatore (baixo) e Gian Coppola (bateria). Sucessor de Cada Um em Dois (2003) e Imaginário Absoluto (2012), Contrariedade é um álbum direto de punk rock/hardcore, contestador como deve ser e o primeiro ‘full lenght’ a contar com o vocalista Wellington Marcelo. Sangiorgio, que também toca baixo no Ratos de Porão, e Cacciatore nos atenderam para falar mais sobre Contrariedade e, entre outras coisas, dão sua visão sobre a atual política do Brasil e o triste episódio ocorrido no país em 2006, que ceifou a vida dos filhos daquelas que ficaram conhecidas como “Mães de Maio”. Você pode ler a entrevista, ouvindo Contrariedade em primeira mão na ROADIE CREW.

 

De maneira literal, quem é “o inimigo”?

Alê Cacciatore: De maneira literal, O Inimigo é Wellington nos vocais, Juninho na guitarra, Fernando na outra guitarra, Alê no baixo e Gian na bateria (risos).

Juninho Sangiorgio: Essa foi boa, Alê! O inimigo é tudo aquilo que te sufoca, te prende, te faz sentir mal. Viemos desde o primeiro disco deixando essa ideia bem vaga, para cada um se aprofundar e perceber o quanto lidamos diariamente com inimigos, desses que precisamos aprender a lutar todos os dias de nossas vidas. São eles internos no seu corpo, imaginários ou mesmo totalmente físicos, com os quais cruzamos nas ruas.

 Vocês levaram dois anos trabalhando em Contrariedade. A ideia era fazer o álbum com calma, certo? De todo modo, o atual momento político do país aguçou a vontade em vocês de soltar o grito da garganta e apressar o lançamento?

Juninho: Não, o lançamento foi inicialmente pensado para o início de 2019, mas alguns imprevistos surgiram e decidimos por 17 de maio. Fazer as coisas na pressa nunca foi nossa intenção, então assim estamos bem felizes que conseguimos, com calma, soltar notícias, singles, clipe, etc.

Contrariedade é o primeiro ‘full lenght’ a ter no vocal Wellington Marcelo, que entrou n’O Inimigo em 2016, no lugar de Alexandre “Kalota” Fanucchi. Como vocês chegaram à Wellington e como alinharam com ele o direcionamento lírico do novo álbum?

Alê: O Wellington sempre foi fã da banda. Lembro-me claramente no primeiro show meu e do Fernando com a banda, no Espaço Impróprio, em 2010, o Wellington novinho, ali na “linha de frente”, cantando todas as músicas. Acho que seguimos um pouco aquele conselho do Black Flag: ‘Procurando um novo vocalista? Olhe para os seus fãs’. Foi totalmente natural e espontâneo. E como ele já sabia a grande maioria das letras, facilitou um pouco o processo, que, diga-se de passagem, não foi nada fácil, por sinal, já que o Kalota é um baita vocalista e letrista. Como o próprio Kalota sempre teve a liberdade de criar as letras e encaixá-las nas músicas, da maneira dele, a gente deu essa mesma liberdade total pro Wellington.

Juninho: Só completando o lance do direcionamento, o Wellington é um cara bem aberto a sugestões, e teve muita coisa que construímos juntos de encaixe de letra e métrica antes dos ensaios.

 Analisando os dois álbuns anteriores d’O Inimigo, além da troca de vocalista, o que de mais significativo mudou em Contrariedade, quanto a Cada Um em Dois (2003) e Imaginário Absoluto (2012)?

Alê: Eu, pessoalmente, não posso relacionar com o Cada Um em Dois, já que eu ainda não estava na banda. No caso do Imaginário Absoluto, o processo foi mais rápido, pois apesar de a formação da banda ser praticamente nova, acho que devido a esse fato, todos nós estávamos muito na pilha de gravar um álbum inteiro, algo que não era lançado desde 2003. Acho que no caso do Contrariedade, como todos da banda estavam ocupados com outras atividades, foi mais uma pilha do Juninho, carregando o resto da banda nas costas (risos). Claro que todos contribuímos na composição das músicas, mas a maioria das ideias iniciais dos sons, são do Juninho.

Juninho: Eu estava numa fase criativa boa, cabeça a milhão, pensando em muita base, então acredito que não teve algo que mudou, mas sim estava apenas dando continuidade aos trabalhos da banda, e com a entrada do Wellington sabíamos que precisávamos de um disco novo.

Houve algum motivo especial para vocês optarem em lançar as faixas Sempre Perigosa Sem Piedade (SP) e O Próprio Ar como sendo os singles do álbum?

Juninho: Sempre Perigosa Sem Piedade é uma música bem completa, acho que mostra bem como a banda está musicalmente nos dias de hoje, e O Próprio Ar por também ser uma música com vários climas e ter sido a primeira que fizemos com essa nova formação.

Ainda sobre escolhas, falando em Sempre Perigosa Sem Piedade (SP), porque optaram por ela como videoclipe? O vídeo mostra imagens da cidade de São Paulo, que foram captadas por André Calvente e editadas por Fernanda Lira. Pensam fazer mais videoclipe para outras músicas do álbum?

Alê: Sim! Estamos pensando em fazer mais clips. Aguardem!

Falemos agora sobre algumas músicas em específico. Em Apelo (Mães de Maio), achei interessante que, ao invés de a utilizarem simplesmente como uma vinheta introdutória para Relembrar é Morrer, vocês inseriram o discurso de uma das chamadas Mães de Maio em meio à uma curta música instrumental. Como surgiu a ideia de usar a fala de uma das várias mães que perderam filhos naquele fatídico dia 15 de Maio de 2006 dessa maneira? O que pensam sobre aquele triste e lamentável incidente?

Juninho: As “Mães De Maio” são uma inspiração para todos nós, a força e a energia dessa luta contra a violência, ainda mais vinda de mães que se organizaram por terem perdido os filhos, é muito intensa. Essa música, desde quanto eu fiz, estava difícil pensar numa linha de voz, e rapidamente veio à cabeça esse lance de colocar um discurso em cima, coisa que eu já fiz na minha outra banda, Discarga, onde no disco Música Pra Guerra tem uma bem parecida. O texto “Apelo” é muito pesado, representa demais toda a dor da perda dessas mães, então fizemos nossa homenagem ao movimento.

OUÇA CONTRARIEDADE, NOVO ÁLBUM D’O INIMIGO EM:

https://www.youtube.com/watch?v=vnaqS-1N1Gs&list=PLvIqEwjp3ARCESxEGkPOMy-APiYn3gaa4&index=1

Gostaria de saber também sobre a letra de Alzheimer. Eu mesmo já perdi um tio para essa triste doença degenerativa que afeta a memória e que a cada dia mais pessoas (especialmente idosos) são detectadas com ela.

Alê: A letra foi escrita pelo Wellington, em homenagem a avó dele. Minha avó faleceu no começo do ano passado, assim como o meu avô, no começo de 2002. Todos vítimas da doença. A perda da memória é apenas um dos sintomas iniciais. Em estado terminal, a pessoa não consegue mais se expressar verbalmente, apesar de manter a consciência e perceber tudo ao redor. Fica praticamente em um estado vegetativo, e passa progressivamente a depender da assistência de um cuidador. É extremamente triste. Mas acho que através da letra e da música, a gente consegue externar esses sentimentos, e aliviar um pouco o peso deles.

E o que tem a dizer sobre a capa de Contrariedade, que teve arte criada por Flávio Bá?

Alê: O Bá faz todas as artes das capas dos discos e EPs do Inimigo desde o Todos Contra Um (2006). Acho que foi um processo natural ele fazer a do Contrariedade também.

O álbum está sendo lançado pela gravadora paulista Hearts Bleed Blue nos formatos vinil, cassete e CD. Em 2018 vocês já haviam lançado o EP Inner Ear Session em vinil de 12 polegadas. Sou saudosista, apesar dos downloads e do modo como a música é consumida hoje em dia, acho que esses formatos nunca deveriam deixar de existir. Ultimamente, tem havido um aumento na procura por material físico, principalmente os mais ‘vintage’, no caso, LP e cassete. Acham ser considerável o número de adeptos a esse tipo de produto, ao ponto de vocês pensarem valer à pena lançar álbuns físicos?

Alê: Eu acho ótimo esse aumento de adeptos de discos em vinil. Na banda somos todos uns “vinyl freaks”. Colecionamos discos desde moleques e não pretendemos parar. Pessoalmente, acho a melhor forma de consumir música, não só por possuir a melhor fidelidade de som, mas creio que todo o “ritual” de colocar o disco, ouvir todas as faixas, trocar o lado, e por aí vai, é demais. Claro que os meios digitais são importantes, mas eu os vejo mais como meios de divulgação do que de consumo. O digital não é “palpável” como o vinil, por exemplo. Às vezes a pessoa baixa apenas um som de um lançamento “full”, ouve, não gosta, apaga, e acaba nem ouvindo o resto da obra. Digital é totalmente descartável, apesar de importante.

Concordo totalmente! Já que citei Inner Ear Session, esse foi um lançamento exclusivo para comemorar o Record Store Day 2018. Qual foi a sensação de gravá-lo nos Estados Unidos, no lendário estúdio Inner Ear, e ter como produtor ninguém menos do que Don Zientara, que já assinou trabalhos para bandas como Fugazi, Minor Threat, Dag Nasty, Bad Brains e The Evens?

Alê: Foi surreal. Só de estar no mesmo lugar onde essas bandas gravaram, bandas essas que influenciaram demais a gente… Ver as fotos, as relíquias, as master tapes… O Don deixou a gente bem à vontade. Estávamos no meio da turnê, já naquela febre de montar tudo e sair tocando, bem agilizado mesmo. Gravamos e mixamos três sons no mesmo dia. O Joe (Lally, do Fugazi) colou no estúdio e trombou a gente. Ou seja, a sensação foi a melhor possível, satisfação total.

Ainda sobre trabalhos no exterior, que lembranças vocês guardam da primeira turnê feita pela costa oeste americana em 2012, pela costa leste em 2014, e, entre uma e outra, pela Europa em 2013? Ouve alguma situação específica que tenha ocorrido relacionada ao fato de vocês tocarem punk rock/hardcore em português?

Juninho: Nossa primeira tour nos Estados Unidos foi uma experiência única para todos, nunca ninguém da banda havia feito uma tour naquele país, rodando toda costa oeste, conhecendo cidades que não estão na rota de turistas e também sendo uma das poucas bandas brasileiras que passaram por muitas delas. Cantar em português é a cereja do bolo, porque as pessoas ali não querem escutar mais uma banda cantando em inglês, ainda mais se for falado errado! (risos) Portanto, vir de um outro país e se expressar de forma diferente soa inédito, todos adoram isso. O contato com o público fica sempre aberto para dúvidas ou qualquer curiosidade sobre as letras.

Por fim, como vocês analisam o momento atual da política do Brasil em relação aos problemas que os inspiravam quando vocês começaram a banda no ano de 2001?

Alê: Hoje está muito pior, né? Eu acho deprimente as pessoas não enxergarem o tamanho retrocesso que representam esses ideais direitistas/militaristas. Não é coincidência o fato de o Brasil estar atrasado 20 anos em relação a outros países mais desenvolvidos. Deve-se justamente ao fato de ter ficado 21 anos afundados em uma ditadura militar. Em 2001, o país obviamente tinha problemas também, mas estava a curtos passos recuperando esse tempo perdido da ditadura. De 1985 até 2015, ou seja, em 30 anos, acho que o Brasil conseguiu recuperar pelo menos uns 10 anos. Só que é a velha história do “um passo pra frente, dois passos pra trás”, com esse governo e esse presidente assumidamente racista, machista e homofóbico. É muito triste e revoltante.

Juninho: Concordo com o Alê e vejo um futuro muito triste para todos nós, regado de injustiça e muita violência. Estamos aí para fazer a diferença e dar as mãos à todas e todos que ainda mantém a mesma postura.

 Vocês têm o espaço aberto agora para suas considerações finais.

Juninho: Primeiramente, obrigado pelo espaço e esperamos tocar bastante nesse ano de 2019, há muito o que se falar e sabemos que tem muita gente precisando compartilhar esse sentimento de manter a cena acesa com a gente. Estamos juntos nessa, valeu demais!

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