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SLAYER: Hoje ‘South of Heaven’ completa 32 anos; Conheça a história e curiosidades desta obra do thrash metal

Seria confortável manter a fórmula de sucesso do estrondoso Reign in Blood em um álbum seguinte, correto? Tendo em vista o impacto que esse clássico causou no thrash metal, qualquer banda que o tivesse composto lógicamente optaria por tal estratégia. Menos uma: o Slayer, seu criador. Se o terceiro álbum da carreira do grupo mais maligno da história do thrash se tornou quase que unânime na preferência dos fãs, que foram fisgados pela velocidade corrosiva das músicas, praticamente sem intervalo entre elas, o material seguinte mostrou um Slayer mais ousado, despejando seu peso habitual, só que agora em composições cadenciadas e obscuras.

Pela primeira vez na carreira do SlayerTom Araya (vocal e baixo), Dave Lombardo (bateria), Kerry King Jeff Hanneman (guitarristas) decidiram fazer um planejamento sobre como o próximo álbum deveria soar. “Não temos reuniões de banda. A única vez que tomamos uma decisão coletiva de fazer algo diferente foi com South of Heaven. Tínhamos feito Reign in Blood, e dissemos: ‘vamos dar à eles algo que não esperam’. E foi também parar tornar os sets ao vivo mais interessantes, porque subir lá e tocar rápido é uma barragem que as pessoas não podem suportar. Queríamos misturar tudo e tornar nosso show uma montanha-russa”, declarou King em 2006 à revista Guitar World. Mas não foi bem assim como o guitarrista explicou, a mudança sonora não aconteceu apenas como um desafio musical. O que rolou foi uma dose de humildade e consenço por parte dos integrantes, que admitiram que qualquer coisa que fizessem no novo álbum, inevitavelmente seria comparada à Reign in Blood – e dificilmente atingiria o mesmo nível. “Foi como se não pudéssemos superá-lo”, revelou Hanneman à Revolver Magazine. “É por isso que fizemos South of Heaven Seasons in the Abyss. Nós meio que amadurecemos um pouco – não amadurecemos, mas diminuímos a velocidade”.

Slayer antes das gravações de “South of Heaven” | Foto: Chris Walter/WireImage

Claro que os fãs torceram o nariz quando South of Heaven chegou às lojas no dia 5 de julho de 1988. Na biografia oficial da banda, O Reino Sangrento do Slayer, Lombardo comentou a mudança sonora do álbum, que foi alvo de críticas de fãs e da imprensa: “Era como se Reign in Blood estivesse em 78 rpm e South of Heaven em 33 e 1/3 rpm!”. O próprio autor do livro, o escritor Joel McIver, explicou a mudança sonora de um álbum para o outro: “Para contrastar o ataque agressivo de Reign in Blood, o Slayer, conscientemente, diminuiu o ritmo do álbum como um todo. Eles também adicionaram elementos como guitarras não distorcidas e estilos vocais atenuados, não ouvidos nos álbuns anteriores”.

Mas antes de dar continuidade sobre South of Heaven, é importante voltar um pouco no tempo e ilustrar que as relações internas na banda não iam bem. ArayaKing Hanneman estavam descontentes com o comportamento de Lombardo. O baterista chocou seus companheiros em meio a uma turnê com o W.A.S.P., durante a promoção de Reign in Blood, comunicando-os que estava deixando a banda, ainda que tudo estivesse caminhando muito bem para o Slayer. Os fãs ficaram atordoados, sem entenderem o motivo pelo qual alguém deixaria o posto de uma banda em ascensão como o Slayer. A verdade chegou à imprensa, que noticiou que o enfurecido Lombardo pulou fora do barco porque queria levar sua esposa na turnê. O próprio baterista recordou o episódio: “Os empresários sentiram que não era uma boa ideia trazer mulheres na estrada, mas eles não conheciam minha esposa. E eu sou muito teimoso quando se trata de conseguir o que quero. Acho que eles estavam apenas com raiva de mim porque eu não achava que deveria pedir (permissão) para levar Theresa. Ela está comigo desde a primeira vez que o Slayer tocou. Ela sempre esteve por perto. Então, eu simplesmente não conseguia entender o porquê de isso ser um problema naquele momento”, justificou.

“Tivemos uma reunião séria no último show que fiz com a banda antes da separação, no Ritz, em Nova Iorque. O clima entre nós estava esquentando. Kerry dizia: ‘Eu não quero que ela fique por aqui, não mesmo’, e ela estava com a gente na época. Eu disse: ‘Olha, ela não o incomoda, não é uma porra de uma pessoa mesquinha no ônibus, sempre reclamando, ela é quieta, está comigo e é problema meu… O que é que isso tem a ver com você?’. Ele disse: ‘Nada, só não quero ela por perto’. Então chegou naquele ponto. Voltei para casa e nenhuma das minhas contas tinham sido pagas. Os contadores deveriam cuidar do meu aluguel e essas coisas, mas quando voltei tudo estava ferrado. Entrei no meu carro e estava realmente irritado. Como se não bastasse, durante a turnê inteira os caras não falavam comigo, estavam tratando Theresa como merda e não se faz isso com ninguém. Assim, com tudo acontecendo, eu disse: ‘Foda-se, eu me demito!’. Chamei a banda para uma reunião, nos sentamos na frente da casa de Tom, e eu disse que estava saindo. E a atitude deles foi dizer: ‘Tudo bem’. Sem brigas, nada. Eles não perguntaram o motivo. Eles não queriam me mostrar que ao menos se importavam. Então eu disse: ‘Caralho, isso foi fácil!’. Saí, cortei meu cabelo, consegui um emprego e fui ser feliz. Nunca sentei com eles e disse por que saí. Achei que era óbvio. Eles me trataram como um merda, e eu era um integrante como qualquer um deles na banda. Se eu queria uma coisa, esperava conseguir. Não me importaria com nada que eles quisessem fazer. Mas se eu queria fazer uma coisa, como trazer minha esposa em turnê, com ela sendo minha responsabilidade, sem incomodar ninguém, não vejo motivos para eles terem feito isso se tornar uma briga tão grande como fizeram”, concluiu.

Araya rebateu: “Em primeiro lugar, nós nunca entedemos porque Dave saiu. Indagamos: ‘Você está louco? Como você pode sair? Acabamos de assinar (com a gravadora), o álbum está indo bem, vamos cair na estrada…’. Acho que Dave se arrependeu no momento em que se demitiu. É como um casamento, você está com uma pessoa por muito tempo e ela vai embora. É devastador, mas você tem que se recompor”.

Para finalizar a turnê, o Slayer recrutou o jovem baterista do WhiplashTony Scaglione, que comentou a experiência: “Eu tinha apenas 18 anos na época, então foi um pouco difícil. Sinto que a música deve ser uma experiência de aprendizagem e a turnê que fiz com o Slayer foi exatamente isso. Tocamos em muitos espaços maiores, o que foi muito bom, e os caras da banda eram muito bacanas. Era diferente do Whiplash, porque era muito mais rápido, então tive que construir a resistência. Eu tinha apenas algumas semanas para aprender todas as músicas do catálogo deles e ir fazer a turnê, mas foi divertido. Tenho grande respeito por Dave Lombardo. Ele é um grande baterista e um cara muito legal!”. Hanneman comentou no livro sobre a atuação de Tony: “Tony era um bom baterista, mas não era para o Slayer“.

Slayer com o baterista Tony Scagliano (segundo da esq. p/ direita) no lugar de Dave Lombardo

Então o Slayer resolveu testar outra pessoa para a vaga de Lombardo. O candidato era um tal alemão de nome Nick Menza (que também fez teste para as bandas de hard rock Slaughter Autograph), conforme relembrou King: “Nick Menza fez o teste, mas, se bem me lembro, ele não tinha a dedicação (suficiente). Ele iria entrar e arrasar em todas as partes, mas ele não as ‘sabia’. Era como se ele não estivesse se esforçando. Aí ele acabou entrando para o Megadeth (em 1989), e eu só fiquei pensando, ‘você é um idiota!’. Brincadeira, eu nunca tive problema com Nick”. – vale lembrar que o próprio King passou pelo Megadeth por um curto período de tempo, antes de a banda de Dave Mustaine ter um álbum lançado.

Dave Lombardo com Nick Menza, que quase o substituiu no Slayer antes de ser oficializado no Megadeth

Não estava sendo fácil encontrar alguém a altura do talentoso Lombardo. Assim sendo, quatro meses após a saída do baterista, o jeito foi o trio remanescente dar o braço a torcer e chamá-lo de volta para seguirem em turnê pela Europa entre abril e maio de 1987. E olha que foi uma tarefa árdua convencer Lombardo, porém, no fim das contas tudo se ajeitou e em dezembro do mesmo ano o quarteto deu entrada nos estúdios Hit City West, de Los Angeles, e Chung King, de Nova Iorque, para darem início às gravações de seu quarto álbum. Para a produção, contaram com Rick Rubin, que já havia trabalhado em Reign in Blood. Curiosamente, o integrante mais beneficiado na gravação e na mixagem (de Andy Wallace) foi o próprio Dave Lombardo, já que sua bateria soa à frente dos demais instrumentos. Sua atuação em estúdio foi absurdamente cavalar – tenho essa para mim como a melhor performance de Lombardo em um álbum do Slayer. Entretanto, ele não vê o álbum com bons olhos: “Houve um incêndio em todos os discos, mas começou a escurecer quando South of Heaven entrou em cena. Novamente eu, provavelmente, estava querendo outra coisa”.

Kerry King não ficou satisfeito com seu próprio desempenho e disse à Decibel em 2006 que considera essa a sua atuação “mais sem brilho”. Ele atribui isso e o motivo de não ter participado tanto da elaboração do álbum pelo fato de ter se casado e se mudado para Phoenix, no Arizona. Com isso, Jeff Hanneman acabou sendo o responsável por todas as composições do álbum. “Às vezes passamos por períodos secos, mas o bom de ter dois guitarristas capazes de compor música é que você nunca vai ficar sem. Acho que naquela época Kerry estava passando por um período seco”, opinou Hanneman. Quanto à Araya, pela primeira vez ele deixava de ser um integrante “passivo”, e assumia um papel mais criativo do que nos três álbuns anteriores do SlayerShow No Mercy (1983), Hell Awaits (1985) e o próprio South of HeavenAraya foi o compositor e co-compositor da maioria das letras do álbum. “Jeff Kerry já tinham muito material quando gravamos (Reign in Blood), então não precisei me preocupar com as letras”, disse o frontman à revista Metal Hammer em 1988. “Escrevi algumas das letras dessa vez porque só Kerry normalmente escreve, mas ele não tinha conseguido nada recentemente, enquanto eu tinha algumas ideias guardadas. Kerry não estava muito interessado no começo, mas Jeff gostou das minhas letras, então, no final, as usou”, concluiu Araya.

O mencionado lado sombrio que o Slayer demonstrou em South of Heaven surge logo de cara na arte macabra da capa do disco, assinada novamente por Larry Carroll (o mesmo de Reign in Blood) e pelo ilustrador Howard Schwartzberg. A atmosfera diabólica e blasfema estava ainda mais evidente: uma aura horripilante revelava um ambiente dantesco ao qual em meio a duas igrejas góticas uma caveira com uma cruz invertida cravada em diagonal, com bestas e demônios saindo pelos orifícios dos olhos e narinas, imerge em um rio de sangue, aonde em uma assombrosa carnificina corpos ainda vivos afundam sem esperança de uma intervenção divina. “Sempre me disseram que meu trabalho era escuro demais para a maioria das pessoas. Portanto, o Slayer era uma boa opção para mim”, disse Carroll à Revolver Magazine. O artista disse também que não há conexão entre as duas capas que criou para o Slayer naquela década: “Cada uma delas tinha sua própria vibração. Eu me atentava às músicas e às letras para captar o que elas provocavam”.

Estava moldado o clima perfeito para um disco caótico, que começava com o dedilhado gélido e apavorante da faixa título. E o que dizer da letra insana escrita por Araya, que em certo trecho vocifera: “Filhos bastardos procriam com suas filhas vadias/mães promíscuas com seus incestuosos pais”? Simplesmente doentia! “South of Heaven é sobre como eu imagino o inferno na terra e a decadência do ser humano”, declarou o vocalista. E tanto essa quanto a impactante Mandatory Suicide se tornaram hinos imediatos. Como se não bastasse, as causticantes Silent ScreamBehind the Crooked Cross (em que a banda voltava a abordar o Terceiro Reich, como fez em discos anteriores nas músicas The Final Command Angel of Death), Ghost of WarRead Between the Lies e Cleanse the Soul (essa Kerry King odeia) tiravam o fôlego, descendo corrosivas pela garganta, enquanto que Live Undead Spill the Blood deixavam o clima do álbum ainda mais sinistro. Em meio a tamanha brutalidade musical, o brilhante cover feito para Dissident Agressor, originalmente lançada pelo Judas Priest em seu álbum Sin After Sin, de 1977, caiu muito bem. Judas Priest, aliás, que sempre foi uma das maiores influências de King Hanneman, e sua música Dissident Agressor foi escolhida para ser regravada pelo Slayer por conta de sua letra com temas de guerra. Hanneman explicou: “é uma daquelas músicas estranhas que muitas pessoas não conheciam, mas era a favorita minha e de Kerry, então a escolhemos”. Uma curiosidade sobre o ‘tracklist’ de South of Heaven, é que a banda descartou de gravar uma música instrumental chamada Stress, que acabou sendo lançada com letra no álbum seguinte, Seasons in the Abyss, sob o título Born of Fire – o título original era Stress justamente porque na época King não conseguiu escrever uma letra para essa música.

Cabe aqui uma atenção maior sobre o conteúdo lírico de Mandatory Suicide, que apresenta letras vívidas sobre soldados sendo enviados para morrer em batalha. Araya disse ter sido inspirado por filmes sombrios da Guerra do Vietnã, lançados na década de 1980. “Fui influenciado por todos os filmes anti-guerra do momento, como Platoon Full Metal Jacket, revelou à Metal Hammer. “Realmente, posso imaginar o que os pobres idiotas tiveram que aturar no Vietnã – sacrificados por muita sujeira e mentiras. Acho que o Vietnã foi um ponto negro na história americana, e isso deve ficar claro – enviar crianças ao Vietnã foi assassinato puro. Se você for à guerra por conta própria, tudo bem, mas se for forçado à isso, é crime. Então, Mandatory Suicide é basicamente uma música anti-guerra”, explicou.

A banda estava “entediada” de escrever letras satânicas e desde Reign in Blood já vinha se afastando dessa temática. Além da Guerra do Vietnã, Araya lidou com questões sociais como o aborto (Silent Scream), falsos evangelistas (Read Between the Lies) e o colapso da sociedade (South of Heaven). Por sua vez, Hanneman atacou a “obediência cega dos seguidores de Hitler” em Behind the Crooked Cross: “Éramos uma banda de black metal há três anos”, disse o guitarrista à Metal Hammer. “Letras satânicas nos aborrecem atualmente”.

Tom Araya, Dave Lombardo, Jeff Hanneman e Kerry King foram criticados na época em que lançaram “South of Heaven”, que com o passar dos tempos passou a ser considerado um dos grandes trabalhos do quarteto | Foto: Glen E. Friedman

South of Heaven foi o segundo álbum do Slayer a figurar no chart Billboard 200, ficando no 57° lugar. No dia 20 de novembro de 1992, foi certificado Disco de Ouro pela RIAA (Associação da Indústria de Gravação da América), junto com o álbum anterior. Foi o segundo trabalho do Slayer a obter esse êxito nos Estados Unidos. No Canadá, também foi Disco de Ouro. Já no Reino Unido, South of Heaven foi certificado Disco de Prata no dia 1° de janeiro de 1993. Em 2017, a Rolling Stone o listou como o 47° entre os “100 Maiores Álbuns de Metal de Todos os Tempos”. Kim Neely, jornalista da revista, classificou o álbum como “um truque satânico genuinamente ofensivo”. Em 2013, ano da morte de Jeff HannemanSouth of Heaven se tornou o segundo álbum do Slayer a receber uma indução ao Hall of Fame da revista Decibel.

Quanto a turnê de South of Heaven, ela teve um lado negativo, que foi a proibição da banda de tocar em locais em Los Angeles e na cidade de Nova Iorque. No dia 2 de novembro de 1988, por exemplo, no Centro Cívico Mid-Hudson, de Poughkeepsie, duas facções rivais na plateia atiraram fogos de artifício uma contra a outra na pista; No dia 12 de agosto, os ingressos para o show do Hollywood Palladium foram vendidos em excesso, causando raiva nas pessoas, que, para se vingarem, destruíram tudo o que elas conseguiam. Tropa de choque e helicópteros precisaram ser chamados para conter a perturbação. “Aquele tumulto no Palladium nos custou ficar anos sem tocar no condado de Los Angeles”, contou King ao LouderSound em 2015. Duas semanas depois, outra confusão aconteceu no Felt Forum, de Nova Iorque, resultando em milhares de dólares em danos ao local. Centenas de fãs arrancaram almofadas de seus assentos e as atiraram no palco, enquanto outros que estavam sentados na parte de trás danificaram o teto. Araya implorou à plateia que se acalmasse, informando que a banda poderia ser forçada a interromper o show – e foi o que aconteceu. “Muito obrigado, idiotas. Vocês estragaram tudo!”, rosnou o vocalista antes de deixar o palco à pedido da administração do local. Resultado: o Slayer ficou mais de 25 anos sem poder retornar à casa de show.

Ainda que Reign in Blood, compreensivelmente, seja o álbum preferido de uma maioria avassaladora de fãs do Slayer e não muito bem aceito por alguns dos próprios integrantes do grupo, South of Heaven sempre será o meu número 1 entre todos da discografia dessa banda que resolveu se aposentar, deixando não só o thrash metal, como o metal de modo geral bastante carentes de sua existência. E essa lacuna no cenário musical jamais será preenchida.

https://www.youtube.com/watch?v=VBl2ys0jKxo

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